Apresentação
Primeiramente agradeço a Deus por permitir que este material fosse produzido e disponibilizado para milhares de leitores no Brasil e no mundo. As ideias que você encontra aqui não são originalmente minhas, e sim fruto do que tenho aprendido da Palavra de Deus fora dos sistemas denominacionais com irmãos congregados ao nome do Senhor e também com autores de outras épocas que congregavam assim. Foram eles J. G. Bellett, C. H. Brown, J. N. Darby, E. Dennett, W. W. Fereday, J. L. Harris, W. Kelly, C. H. Mackintosh, A. Miller, F. G. Patterson, A. J. Pollock, H. L. Rossier, H. Smith, C. Stanley, W. Trotter, G. V. Wigram e muitos outros.
Para que você compreenda como este livro veio a existir, creio ser necessário voltar um pouco no tempo. Depois de um período trabalhando em São Paulo, em 1988 mudei-me com minha família de volta para Limeira, minha cidade natal, a fim de colaborar com a Editora Verdades Vivas, uma organização sem fins lucrativos que produz e distribui literatura cristã. A grande quantidade de folhetos evangelísticos, livros e calendários distribuídos no Brasil e em outros países de língua portuguesa gerava um volume considerável de correspondência, não só com pedidos de publicações, mas também com perguntas sobre a Bíblia. Todas as cartas eram devidamente respondidas.
Nessa época adquiri o hábito de manter uma cópia das respostas em formato digital. Assim ficava fácil responder perguntas semelhantes ou até mesmo mesclar trechos de diferentes respostas, além de preservar aquele conhecimento. A partir de 1996 passei a usar a Internet e aí as respostas já não precisavam ser impressas, envelopadas e enviadas por carta como era feito até então. O uso do e-mail agilizou o processo e permitiu atender mais correspondentes com maior agilidade.
Em 1998 deixei a editora para atuar como executivo de uma empresa de tecnologia da informação, porém mantendo nas horas vagas minha ocupação com o evangelismo e ministério da Palavra via Internet por meio de diferentes sites e blogs. Em 2001 passei a trabalhar por conta própria como consultor e palestrante empresarial, tendo mais tempo livre e uma agenda mais flexível para dedicar-me ao evangelho.
Em 2005 decidi lançar o blog “O que respondi” no endereço respondi.com.br para disponibilizar as respostas que tinha armazenado em formato digital desde 1988 e acrescentar as que fossem sendo criadas. Algo que muitos perguntam é a razão de o blog não permitir comentários, mas o volume de spam, debates e opiniões deixadas na área de comentários me obrigou a eliminar esta opção de contato para me concentrar no atendimento apenas por e-mail. É sempre bom lembrar que não existe uma “equipe” para responder a correspondência que chega, pois este é um exercício pessoal.
Em 2008 iniciei um trabalho chamado “O Evangelho em 3 minutos — Uma mensagem urgente para quem tem pressa”, com vídeos no Youtube e também em versões de texto e áudio no endereço 3minutos.net. Com a popularização do smartphone e da Internet móvel este formato mostrou-se excelente para alcançar pessoas a qualquer hora e em qualquer lugar com a mensagem da salvação e a sã doutrina. O site “O que respondi” passou a servir de complemento aos vídeos. Enquanto no “Evangelho em 3 minutos” a Palavra de Deus é pregada de forma rápida, no “O que respondi” ela é explicada em detalhes e com referências.
Estas e outras frentes de trabalho via Internet continuam gerando um número cada vez maior de contatos e perguntas. Em 2013 foram mais de três mil perguntas atendidas, porém graças ao blog “O que respondi” nem todas precisaram ser respondidas. Na maioria das vezes é suficiente enviar links para as mais de mil respostas existentes no blog, que já conta com cerca de quatro milhões de acessos desde sua criação.
Assim chegamos à razão deste livro que está sendo lançado nos formatos digital (e-book) e impresso (on demand). Ele atende aqueles que desejam ter acesso ao material do blog sem depender de uma conexão com a Internet. Este é um dos mais de dez volumes projetados para compor esta coleção, se considerarmos todo o conteúdo do blog “O que respondi”.
Ao ler este livro não se esqueça de que está lendo as opiniões do autor, e não a Palavra de Deus. Considere também que os textos são cartas e e-mails de minha correspondência pessoal, e não uma obra literária. A linguagem é informal e despretensiosa como acontece com uma correspondência entre duas pessoas, e é provável também que você às vezes venha a achar a linguagem meio irreverente, mas isso é apenas fruto de meu estilo literário, e não de tratar levianamente as coisas de Deus ou a pessoa a quem respondi. Lembre-se também de que, para a resposta fazer sentido, às vezes incluo o que escreveram meus interlocutores e alguns são incrédulos ou ateus com opiniões depreciativas a respeito de Deus e de sua Palavra.
Não espere encontrar aqui todas as respostas e nem sequer as trate como definitivas. Elas são fruto do meu exercício com o Senhor e do que continuo aprendendo todos os dias. Por isso leia, medite, busque referências na Bíblia e ore para que o Espírito Santo lhe dê o entendimento. Sem isto até a pessoa mais inteligente e versada nas Escrituras será incapaz de entender as coisas de Deus, pois elas se discernem espiritualmente.
É provável que você encontre erros em minhas opiniões. Pode ter certeza de que eu mesmo eventualmente sou obrigado a acessar o blog “O que respondi” para fazer correções após ter sido instruído ou alertado de alguma falha por algum irmão ou por algo que li na Palavra de Deus. Se, ao comparar uma resposta mais antiga com uma mais nova, você encontrar alguma discrepância, saiba que optei por não revisar todas as respostas, mas decidi mantê-las do modo como entendia as coisas quando as escrevi, e lembre-se de que você está lendo textos escritos ao longo de um período de cerca de trinta anos. Se encontrar algum erro de digitação ou de gramática, entre em contato para eu fazer as devidas correções, pois o desejo de disponibilizar este livro o mais rápido possível nas mãos dos leitores foi maior que o tempo que tive para revisá-lo.
Este livro é vendido em formato impresso e distribuído gratuitamente em formato e-book, porém alguns sites de terceiros ou editoras irão cobrar algum valor também para a versão e-book. Em nenhum dos casos isso implica algum ganho para o autor que optou por abrir mão dos ganhos com direitos autorais. Você poderá distribuir o conteúdo deste livro, desde que o faça gratuitamente, não altere o texto e mantenha a referência ao autor.
Peço que se lembre de incluir este trabalho em suas orações e de endereçar ao Senhor, e não a mim, qualquer sentimento de gratidão que porventura possa ter por esta leitura.
“Conheçamos e prossigamos em conhecer ao Senhor; como a alva, a sua vinda é certa” (Os 6:3).
Mario Persona
www.respondi.com.br
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Abril, 2018
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Estou sendo injustamente perseguido?
Você se converteu a Cristo e na época sentiu toda a rejeição e desprezo que todo verdadeiro crente conhece bem. Mas sua família e irmãos de seu convívio até apoiaram, pois logo você foi batizado e feito membro da congregação cristã onde seus pais já estavam. Até o dia em que entendeu que Deus não criou nenhuma denominação cristã, que a salvação é por graça e não fruto de sua perseverança, e que você agora podia dizer com todas as letras que sua salvação é eterna e ninguém pode extrair você das mãos do Pai. Obviamente estas afirmações foram um soco no estômago de sua família e irmãos mais chegados, porque contradizem muito do que é ensinado na denominação que frequenta. O seu caso é parecido com o do cego de nascença, que foi curado por Jesus, mas que precisava ainda conhecer algumas coisas se quisesse conhecer melhor quem era seu Benfeitor.
Nem todos aqueles que já conhecem ao Senhor Jesus como Salvador podem se identificar integralmente com o cego de nascença de João 9. É claro que todos podem se identificar com o fato de terem sido também libertados das trevas quando creram em Jesus, mas existe uma passagem que às vezes passa despercebida para a maioria. Ela mostra que, apesar da importância da salvação eterna, Deus não quer que o salvo pare aí. Tem algo mais. Veja você: “Isto é bom e aceitável diante de Deus, nosso Salvador, o qual deseja que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade” (1 Tm 2:3-4). Tendo este versículo em mente você irá encontrar na passagem de João 9 alguns detalhes que revelam ter ela uma aplicação mais ampla e de maior significado ainda para os dias difíceis em que vivemos, quando você encontra uma organização cristã apelidada de “igreja” em cada esquina da cidade.
No capítulo 9 do Evangelho de João encontramos o cego curado pelo Senhor, mas o povo não consegue entender como aquilo havia acontecido. Certamente os sábios fariseus teriam uma explicação para aquilo. Mas não têm. Em Marcos 3 eles alegaram que o poder para Jesus expulsar demônios vinha de Belzebu, o príncipe dos demônios. Aqui, na cura do cego de nascença, o que Jesus expulsa são as trevas da vida daquele jovem, e os líderes religiosos não conseguem entender como alguém, que nem mesmo fazia parte do clero, e que não guardava o sábado, poderia ter feito tal coisa fora do sistema religioso que eles tanto prezavam. Eles dizem: “Este homem não é de Deus, pois não guarda o sábado. Diziam outros: Como pode um homem pecador fazer tais sinais?” (Jo 9:16), e se ler isto em conexão com o que eles dizem em João 7:48, irá perceber qual era o espírito que dominava a mente daqueles clérigos: “Creu nele porventura algum dos principais ou dos fariseus? Mas esta multidão, que não sabe a lei, é maldita”.
O homem que fora cego é interrogado por aqueles clérigos e, a princípio, também não entende muita coisa, mas de uma coisa ele tem certeza: ele era cego, mas agora vê. Seus pais, por prezarem mais a religião exterior do que a verdadeira obra que Deus estava fazendo em seu próprio filho, dizem não saber de nada, pois não querem se indispor com os sacerdotes e fariseus. Afinal, é preferível ficar do lado do sistema religioso oficial, reconhecido por toda a sociedade, do que dar um testemunho comprometedor. Quem iria querer ser discípulo daquele pobre filho de carpinteiro que diziam ser o Messias? Com todas as vantagens que o convívio social e religioso lhes oferecia, os pais do ex-cego não queriam nem pensar na possibilidade de serem expulsos da sinagoga.
E assim, ignorado por sua família e rejeitado pela religião de seus pais, o que era cego acaba sendo expulso pelos líderes religiosos. Dizem-lhe eles: “Tu és nascido todo em pecados, e nos ensinas a nós?” (Jo 9:34). Todavia o veneno nas palavras dos fariseus indica também o antídoto: somente aquele que tomou consciência de sua natureza pecaminosa, está apto a aprender de Deus. O apóstolo Paulo, que fora mestre em Israel, considerou como lixo toda a bagagem religiosa carnal que trazia, ao dizer:
“Ainda que também podia confiar na carne; se algum outro cuida que pode confiar na carne, ainda mais eu: Circuncidado ao oitavo dia, da linhagem de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu de hebreus; segundo a lei, fui fariseu; segundo o zelo, perseguidor da igreja, segundo a justiça que há na lei, irrepreensível. Mas o que para mim era ganho reputei-o perda por Cristo. E, na verdade, tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo qual sofri a perda de todas estas coisas, e as considero como escória, para que possa ganhar a Cristo, e seja achado nele, não tendo a minha justiça que vem da lei, mas a que vem pela fé em Cristo, a saber, a justiça que vem de Deus pela fé” (Fp 3:4-9). Ele entendeu que, mesmo tendo sido nascido e criado na casta mais nobre e elevada da religião judaica, dentre os pecadores, ele era o principal (1 Tm 1:15).
Agora o cego já está curado; pode enxergar perfeitamente a luz. Agora vem a segunda parte do versículo que mencionei, que diz que Deus “deseja que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade” (1 Tm 2:3-4). É só depois de deixar para trás todo o sistema religioso de sua época — depois de ser expulso até pelo próprio clero — que o jovem passa a enxergar e conhecer melhor aquele que lhe havia curado. “Jesus ouviu que o tinham expulsado e, encontrando-o, disse-lhe: Crês tu no Filho de Deus? Ele respondeu, e disse: Quem é ele, Senhor, para que nele creia? E Jesus lhe disse: Tu já o tens visto, e é aquele que fala contigo. Ele disse: Creio, Senhor. E o adorou” (Jo 9:35-38).
Uma adoração livre, completa e desimpedida não teria sido possível enquanto ele fosse cego, figura do estado em que nos encontrávamos quando ainda incrédulos. Mas também, mesmo depois de ver, ele continuava em um sistema religioso de homens que, embora zelosos de Deus e portadores das Escrituras, não reconheciam plenamente os direitos e reivindicações de Cristo. Foi preciso que saísse — ou fosse expulso — para conhecer melhor o Filho de Deus em sua rejeição. O Senhor Jesus estava fora, e é nesse lugar de rejeição que ele vai encontrar aquele que tinha sido. Aqui cabe muito bem a exortação de Hebreus 13:13, que diz:
“Temos um altar, de que não têm direito de comer os que servem ao tabernáculo. Porque os corpos dos animais, cujo sangue é, pelo pecado, trazido pelo sumo sacerdote para o santuário, são queimados fora do arraial. E por isso também Jesus, para santificar o povo pelo seu próprio sangue, padeceu fora da porta. Saiamos, pois, a ele fora do arraial, levando o seu vitupério (ou rejeição). Porque não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a futura”.
O Senhor sabia que o rapaz tinha sido expulso do sistema religioso dos judeus, e sabia também que ele havia permanecido numa posição de corajosa fé diante dos líderes religiosos, não temendo as consequências que isso lhe traria de rejeição até em sua própria família. Prostrando-se aos pés de Jesus, ele o adora, numa atitude que era reservada exclusivamente a Deus. Certamente ele acabara recebendo uma medida especial de revelação. Quão precioso é estar na posição daquele que fora cego e poder adorar ao Senhor fora de tudo o que é do homem e, mesmo diante da incompreensão e ataques recebidos, poder permanecer firme junto a Cristo, professando “Eu era cego e agora vejo”! E também que tamanho privilégio ele tinha agora de adorar ao Senhor em total liberdade e sem nenhum clérigo humano para fazer a intermediação entre ele e Deus.
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Devo me aprofundar em conhecer a “Nova Era”?
Há alguns anos eu recebia muitas perguntas sobre a “Nova Era”, mas isso hoje nem desperta mais muito interesse, talvez por não ser tão nova assim. Este movimento, se podemos chamá-lo assim, não é uma religião, mas todo um conjunto de religiões, ideias, filosofias, músicas, artes, dietas, e outras atividades que estão caminhando juntas na propagação da crença de que a presente era está terminando, para dar início a uma ‘Nova Era’. Muitas coisas estão se unindo nesse propósito: astrologia, bruxaria, espiritismo, gnose, ocultismo, teosofia, yoga, medicina alternativa, etc. Não existe um líder humano por trás de tudo isso, mas Satanás certamente detém as rédeas desse movimento.
Não se trata, porém, de algo novo. Em 1981, quando eu morava em Alto Paraíso de Goiás, um lugar considerado místico por muitos simpatizantes da ‘Nova Era’ no Brasil, conheci um casal que fazia parte de um grupo empenhado no estabelecimento de sete campos de pouso (!) para discos voadores. Segundo eles, chegaria um momento em que os discos voadores iriam tirar deste planeta todas as pessoas espiritualmente ‘atrasadas’. Então, com a Terra livre desses seres ‘primitivos’, chegaria um novo líder para trazer paz a este mundo.
Mostrei a eles que a Bíblia também afirma que haverá um dia em que certas pessoas serão tiradas da Terra antes da chegada de um novo líder. Só que será o próprio Senhor Jesus (e não um disco voador) quem virá buscá-las — a todos os que foram resgatados com o seu precioso sangue derramado na cruz do Calvário. Ele virá buscar os seus que estiverem vivos naquele momento e também os que morreram em Cristo. Todos serão transformados e levados para o céu, a fim de estarem para sempre com o Senhor. Então será revelado o iníquo, o qual enganará a todos os que não deram ouvidos à verdade. As passagens bíblicas são estas:
“Não quero, porém, irmãos, que sejais ignorantes acerca dos que já dormem, para que não vos entristeçais, como os demais, que não têm esperança. Porque, se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também aos que em Jesus dormem, Deus os tornará a trazer com ele. Dizemo-vos, pois, isto, pela palavra do Senhor: que nós, os que ficarmos vivos para a vinda do Senhor, não precederemos os que dormem. Porque o mesmo Senhor descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor. Portanto, consolai-vos uns aos outros com estas palavras” (1 Ts 4:13-18).
“Agora vós sabeis o que o detém, para que a seu próprio tempo seja manifestado. Porque já o mistério da injustiça opera; somente há um que agora resiste até que do meio seja tirado; e então será revelado o iníquo, a quem o Senhor desfará pelo assopro da sua boca, e aniquilará pelo esplendor da sua vinda; a esse cuja vinda é segundo a eficácia de Satanás, com todo o poder, e sinais e prodígios de mentira, e com todo o engano da injustiça para os que perecem, porque não receberam o amor da verdade para se salvarem. E por isso Deus lhes enviará a operação do erro, para que creiam a mentira; para que sejam julgados todos os que não creram a verdade, antes tiveram prazer na iniquidade” (2 Ts 2:6-12).
Neste final de tempos o diabo está trabalhando arduamente a fim de preparar mentes e corações daqueles que não creem na verdade, a fim de que recebam a mentira. Todavia, é importante entendermos que, enquanto a Palavra de Deus nos alerta para a existência do mal, ela nunca sugere que devemos nos ocupar com o mal. Não temos que nos aprofundar no conhecimento das doutrinas e práticas demoníacas para estarmos preparados para combatê-las ou nos defendermos contra elas. “E não comuniqueis com as obras infrutuosas das trevas, mas antes condenai-as. Porque o que eles fazem em oculto até dizê-lo é torpe” (Ef 5:11-12). “Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes contra as astutas ciladas do diabo” (Ef 6:11). Repare que é “DE DEUS”, e não do inimigo, a armadura com a qual devemos estar vestidos para podermos resistir às astutas ciladas do diabo.
É triste, mas a “Nova Era” terá ao seu serviço cristãos sinceros. Serão aqueles que desejam tornar-se “especialistas” no assunto, estudando suas doutrinas e participando de suas reuniões, sob o pretexto de poderem informar os cristãos dos perigos do movimento. Satanás, que é muito astuto, não hesitará em usar tais cristãos para tornar o movimento mais conhecido. Nenhum crente deve procurar aprofundar-se nas doutrinas ligadas à ‘Nova Era’ e nem participar de reuniões e palestras promovidas por seus adeptos. Aqueles que fazem isto, mesmo com o argumento de estarem se preparando para combatê-las, estão correndo um sério risco. Suas mentes podem ser contaminadas pelas mentiras de Satanás, que tem alguns milhares de anos de experiência em enganar o homem. Não seja tolo em se achar capaz de entrar nos domínios das trevas sem ser influenciado de alguma forma por elas. “Tende cuidado, para que ninguém vos faça presa sua, por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição dos homens, segundo os rudimentos do mundo, e não segundo Cristo” (Cl 2:8). “Aparte-se do mal, e faça o bem; busque a paz, e siga-a” (1 Pe 3:11).
Não precisamos nos tornar “especialistas” no mal para podermos nos desviar dele. Se tão somente nos ocuparmos com a verdade estaremos livres de enganos. Conta-se que um barqueiro pilotava seu barco por um rio cheio de perigosas rochas submersas, quando um dos passageiros lhe perguntou: “Você conhece todas as rochas perigosas deste rio?” “Não”, respondeu o barqueiro; “Basta que eu conheça o canal por onde devo passar”. Assim deve ser conosco também.
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O capítulo 24 de Mateus fala da Igreja?
Não, o capítulo 24 de Mateus é bem específico de Israel, em especial do remanescente de judeus fieis que irá se converter após a Igreja deixar a terra. Muitos têm dificuldade para entender a profecia por não discernirem o lugar distinto que Israel e Igreja ocupam nas Escrituras e nos propósitos de Deus. O capítulo 24 de Mateus e outras passagens que falam da tribulação costuma ser conectado à Igreja na terra, mas isso é um erro. De um modo geral, este capítulo trata do futuro, do tempo da tribulação e vinda de Cristo para Israel. A Igreja, que é formada por todos os salvos, será arrebatada antes do tempo ou período da tribulação, como vemos em Apocalipse 3:10: “Como guardaste a palavra da minha paciência, também eu te guardarei da hora da tentação que há de vir sobre todo o mundo, para tentar os que habitam na terra”. Repare que “hora” na passagem é um período de tempo bem definido.
O capítulo 24 do Evangelho de Mateus trata do remanescente judeu que testemunhará e pregará o Evangelho do Reino durante o período dos cerca de sete anos que se seguem ao arrebatamento da Igreja. Ao contrário do que muitos pensam, o verbo “levar” que aparece nos versículos 40 e 41 deste capítulo nada tem a ver com o arrebatamento, mas está ali fazendo um paralelo com os que foram “levados” pela morte no dilúvio. É preciso ler o contexto a partir do versículo 37 para entender: “E, como foi nos dias de Noé, assim será também a vinda do Filho do homem. Porquanto, assim como, nos dias anteriores ao dilúvio, comiam, bebiam, casavam e davam-se em casamento, até ao dia em que Noé entrou na arca, e não o perceberam, até que veio o dilúvio, e os levou a todos, assim será também a vinda do Filho do homem. Então, estando dois no campo, será levado um, e deixado o outro; estando duas moendo no moinho, será levada uma, e deixada outra” (Mt 24:37-41).
Muitos tentam aplicar estes versículos ao arrebatamento da Igreja, mas isso é tirá-los de seu contexto. O contexto é o assunto ao qual o Senhor vem se referindo nos versículos anteriores, ou seja, o dilúvio “levou a todos”; um ato judicial — a morte — ceifando vidas. Da mesma forma, quando Cristo vier para reinar (no final da grande tribulação), a morte passará ceifando a muitos; “levando” a muitos. Os que ficarem vivos entrarão no milênio, mas não serão cristãos como os conhecemos hoje e nem farão parte da Igreja, que já terá sido levada para o céu. Eles serão judeus (e também gentios) que se converterão durante aquele período e que nunca escutaram o evangelho antes, ou não tinham idade suficiente para compreendê-lo.
A palavra “evangelho” que aparece no capítulo é também frequentemente mal aplicada. Mateus 24:14 fala do “evangelho do reino” e não do “evangelho da graça de Deus” (At 20:24). Há muitos que pensam que é necessário que o evangelho da graça seja pregado por todo o mundo para que Cristo volte para buscar sua Igreja. Mas não é o que diz a passagem; ali está falando do “evangelho do reino”. Cristo virá buscar sua Igreja após a conversão do último eleito antes da fundação do mundo para fazer parte dela. Ele virá buscar os que são seus: os santos celestiais. Aí é dada por encerrada a pregação do evangelho da graça, que tinha sido pregado enquanto a Igreja encontrava-se na Terra. “Crê no Senhor Jesus e serás salvo” é o evangelho da graça que hoje pregamos. “Arrependei-vos que o reino está próximo” é o evangelho do reino, o mesmo que foi pregado por João Batista e por Jesus e seus discípulos quando ele andou aqui, e que será pregado por um remanescente fiel que se converterá após o arrebatamento, sendo por isso perseguido ferozmente.
Outra ideia errônea, de que alguns crentes menos espirituais ou menos maduros seriam deixados para sofrerem na grande tribulação numa espécie de purgatório na terra, perde o sentido com apenas uma passagem: “Por isso Deus lhes enviará a operação do erro, para que creiam a mentira; para que sejam julgados todos os que não creram a verdade, antes tiveram prazer na iniquidade” (1 Ts 2:11-12). Aqueles que ouviram o evangelho e não creram não terão uma segunda chance. O próprio Deus fará com que creiam na mentira do diabo. Todos os que fazem parte da Igreja têm o Espírito Santo, e, juntamente com o Espírito, serão tirados da Terra quando Cristo vier. Toda a Igreja será arrebatada; Cristo não deixará um “pedaço” da noiva aqui. Hoje, se alguém “não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele” (Rm 8:9); nunca creu e não está salvo.
Alguns tentam ainda usar Apocalipse 12 para dizer que a Igreja passará pela tribulação, mas aquele capítulo não fala da Igreja. Esta desaparece do Apocalipse no final do capítulo 3 para só voltar a ser vista no final do livro, nas bodas do Cordeiro. Nesse meio tempo Deus estará tratando com Israel e com as nações na terra. A “mulher” de Apocalipse 12 é Israel e o “varão” é Cristo, aquele que há de reger com vara de ferro e que foi arrebatado para Deus, para o seu trono (Ap 12:5).
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O que é um verdadeiro arrependimento?
Quando li a notícia de que um artista, um cantor brasileiro estava arrependido, pensei em como é estranha esta palavra, “arrependimento”. Após ter decepcionado seus fãs com uma declaração de mau jeito, ele publicou uma nota na qual dizia estar arrependido, seguida da expressão: “Todo mundo erra”. Não é este o arrependimento bíblico, aquele do réu que coloca seu pescoço sob a lâmina do algoz, mesmo porque no cepo de execução só existe espaço para um pescoço. Não dá para colocar “todo mundo” ali.
O arrependimento que tenta incluir “todo mundo” é o mesmo de Adão e Eva, que se esconderam “entre as árvores do jardim” (Gn 3:8). Árvore, na Bíblia, tem o sentido de humanidade; aquilo que foi criado a partir da terra. No Antigo Testamento Jesus era tipificado por uma arca de madeira revestida de ouro, a Arca da Aliança. Ali a humanidade aparecia junto com a perfeição divina e dignidade real, representadas pelo ouro. O cego que foi curado também via as pessoas como “árvores que andam” (Mc 8:24), e Jesus comparou o juízo ao machado posto “à raiz das árvores; toda a árvore, pois, que não dá bom fruto, corta-se e lança-se no fogo” (Lc 3:9). Ele falava de pessoas, evidentemente.
O arrependimento meramente exterior procura reparar o erro — como Adão e Eva com seus aventais de folhas de figueira — porém faz isso por seus próprios meios, e escondido de Deus. Aquele avental de nada adiantou para cobrir o pecado deles, pois foi preciso Deus intervir e fazer valer o seu juízo de morte contra o pecador. Ele matou um animal inocente para dele tirar a pele que serviria para cobrir o pecado do homem. Aquilo era uma figura de Cristo, o inocente pagando pela culpa do pecador.
Outro arrependimento que me vem à mente é o de Judas. Teria Judas se arrependido de verdade? Afinal, a Bíblia diz que “Então Judas, o que o traíra, vendo que fora condenado, trouxe, arrependido, as trinta moedas de prata aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos, dizendo: Pequei, traindo o sangue inocente… E ele, atirando para o templo as moedas de prata, retirou-se e foi-se enforcar” (Mt 27:3-5). O arrependimento de Judas é o arrependimento do ladrão que é preso e o repórter do telejornal pergunta se ele está arrependido. É claro que ele diz que está, mas ele não estaria arrependido se o plano tivesse dado certo. O seu arrependimento é por ter sido preso. Depois de presenciar o poder de Jesus em tantas ocasiões, Judas talvez acreditasse que os guardas nunca conseguiriam prendê-lo e Judas sairia no lucro. Afinal, ele tinha andado com Jesus desde o princípio de olho no dinheiro, como é possível ver de outras passagens. Aquilo não foi arrependimento; aquilo foi frustração como a do ladrão na entrevista da TV.
O arrependimento de Caim é outro falso arrependimento que leva à perdição. Deus estava pronto a perdoar o seu pecado, mas ele deixou claro que desejava continuar senhor de seu próprio destino. Deus lhe disse: “Se bem fizeres, não é certo que serás aceito”? (Gn 4:7). Todavia Caim rejeitou a graça de Deus e decidiu condenar-se a si mesmo lavrando sua própria sentença: “É maior a minha maldade que a que possa ser perdoada”, e como se não bastasse, acrescenta a si mesmo uma pena que Deus não havia determinado: “Todo aquele que me achar, me matará” (Gn 4:12-14). Deus não havia dito isso e nem queria dizer, porque até providenciou uma marca em Caim para impedir que outros o matassem.
Mas, e o arrependimento de Pedro? Esse foi genuíno, pois foi gerado por Deus em Pedro. Você se lembra de que Jesus, ao revelar que Pedro o negaria, disse que intercedeu por Pedro por saber que ele seria “peneirado” como trigo? Mais tarde, após negar o Senhor três vezes, Pedro viu que “o Senhor olhou para Pedro, e Pedro lembrou-se da palavra do Senhor… E, saindo Pedro para fora, chorou amargamente” (Lc 22:60-62). Naquele momento o mundo em redor deixou de existir e ficaram só Pedro e o Senhor olhando para ele, e é este o lugar que deve ocupar o verdadeiro arrependido. A sós com Deus e horrorizado com seu pecado.
Foi o caso da mulher adúltera, embora ali a palavra arrependimento não seja mencionada. Todos ali — a mulher e seus acusadores — foram convencidos de pecado. Seus acusadores, com suas consciências atribuladas e sabendo que não poderiam atirar a primeira pedra, fugiram da presença do Senhor. Não tendo mais ninguém para acusá-la, ela poderia ter fugido também, mas não. Ficou ali reconhecendo sua culpa bem diante do único sem pecado que poderia apedrejá-la, como a Lei determinava. E ouviu as palavras de graça saídas da boca de Jesus: “Nem eu também te condeno; vai-te, e não peques mais” (Jo 8:11).
Este é o verdadeiro arrependimento. Ele é solitário diante de Deus; não se justifica dizendo que “todo mundo erra”. Foi um arrependimento assim, solitário, que moveu o coração de Jeremias: “Na verdade depois que [EU] me desviei, [EU] arrependime; e depois que [EU] fui instruído, [EU] bati na minha coxa; [EU] fiquei confundido e envergonhado, porque [EU] suportei o opróbrio da minha mocidade” (Jr 31:19).
Mas se existe o arrependimento solitário, existe também o arrependimento solidário. Nele o arrependido inclui outros em seu arrependimento, e mesmo assim é um arrependimento sincero. Falo de Daniel, no exílio em Babilônia, para onde havia sido levado ainda adolescente. O exílio era um castigo de Deus por causa da desobediência de Israel como nação, mas o menino Daniel não tinha sido diretamente culpado pelos pecados de seu povo. Mesmo assim, quando ele confessa o pecado da nação, de forma solidária ele se inclui: “[NÓS] pecamos, e [NÓS] cometemos iniquidades, e [NÓS] procedemos impiamente, e [NÓS] fomos rebeldes, apartando-nos dos teus mandamentos e dos teus juízos” (Dn 9:5).
Este também é o arrependimento substitutivo, de quem não tem responsabilidade direta pelo pecado, mas voluntariamente coloca seu pescoço sob a lâmina do algoz. É o que Jesus fez, quando não somente assumiu a humanidade para fazer-se um com os seres humanos, embora sem pecado, mas foi até o madeiro por amor dos verdadeiros culpados. Seus sentimentos, e o que ele fez por você e por mim, podem ser vistos profetizados no Salmo 69 e em outras passagens, onde também faz confissão por pecados que não tinha cometido: “Tu, ó Deus, bem conheces a minha estultice; e os meus pecados não te são encobertos… restituí o que não furtei” (Sl 69:5). “Àquele que não conheceu pecado, o fez pecado por nós; para que nele fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Co 5:21). “Levando ele mesmo em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro, para que, mortos para os pecados, pudéssemos viver para a justiça; e pelas suas feridas fostes sarados” (1 Pe 2:24).
Diante de tamanha provisão e da promessa de que “se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a injustiça” (1 Jo 1:9), por que hesitamos tanto em nos deixar conduzir a um arrependimento genuíno quando pecamos? Por que tentamos culpar outros ou nos esconder na multidão, como fizeram Adão e Eva? Por que rejeitamos a graça de Deus, como fez Caim, e passamos a viver como fugitivos? Quando criança eu não queria a injeção que o farmacêutico tentava aplicar, e lutava com todas as minhas forças. Depois eu acabava percebendo que teria sido menos dolorido se tivesse logo me sujeitado à picada, ao invés de apenas adiar a dor.
“Desprezas tu as riquezas da sua benignidade, e paciência e longanimidade, ignorando que a benignidade de Deus te leva ao arrependimento?… Porque a tristeza segundo Deus opera arrependimento para a salvação, da qual ninguém se arrepende; mas a tristeza do mundo opera a morte” (Rm 2:4; 2 Co 7:10).
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Perdi minha comunhão com Deus. O que fazer?
A resposta é simples: Volte! Sim, é o que fazemos quando entramos por uma rua errada ou passamos do endereço que estávamos procurando. Simplesmente voltamos, ainda que isso nos custe algum tempo, esforços e aborrecimentos. Quem convida é o mesmo Jesus em quem um dia você creu e prometeu que ele seria seu Senhor para toda a vida. “E Jesus lhes disse: Eu sou o Pão da vida; aquele que vem a mim não terá fome; e quem crê em mim nunca terá sede. Tudo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim de maneira nenhuma o lançarei fora” (Jo 6:35,37). Que convite de amor Cristo nos faz! O mundo nos faz muitos convites e promete uma paz fundamentada em coisas efêmeras que não duram uma vida. Mas o Senhor oferece algo que não passa: “Deixo-vos a paz, A MINHA PAZ vos dou; não vo-la dou como o mundo a dá” (Jo 14:27).
Eu li que Abraham Lincoln, ao ser eleito presidente dos Estados Unidos, preparava-se para embarcar no trem que o levaria a Washington. Então, voltando-se para a multidão que o acompanhara à estação e esperava um belo discurso, disse apenas: “Certo rei ordenou a seus sábios que escrevessem uma frase que pudesse ser usada em qualquer ocasião. E a frase que eles escolheram é a mesma que posso usar nesta ocasião: ‘Isto também é passageiro’”.
Muitas vezes somos tentados a voltar ao mundo, vivendo à sua maneira e desfrutando de suas ilusórias “vantagens”. Assim desejavam os israelitas durante a peregrinação no deserto, quando estavam enjoados do maná. Aquilo que no princípio tinha para eles o sabor de mel (Êx 16:31), mais tarde parecia ter o intragável sabor de azeite fresco (Nm 11:8). Eles se lamentavam, dizendo: “Quem nos dará carne a comer? Lembramo-nos dos peixes que no Egito comíamos de graça; e dos pepinos, e dos melões, e dos porros, e das cebolas, e dos alhos. Mas agora a nossa alma se seca; cousa nenhuma há senão este maná diante dos nossos olhos.” (Nm 11:4-6.) Quanto engano havia nesse lamento! No Egito eles não passavam de escravos, pois “os egípcios faziam servir os filhos de Israel com durezas; assim lhes fizeram amargar a vida com dura servidão, em barro e em tijolos, e com todo o trabalho no campo” (Êx 1:13-14).
O mesmo ocorre conosco; logo nos esquecemos de que éramos escravos de Satanás e queremos voltar ao nosso estado anterior, achando que “comíamos de graça”. Que triste engano! O mundo tem tanto a oferecer para o cristão como o Egito tinha para o povo de Israel. Nada havia para eles no Egito além de dura escravidão. Do mesmo modo como o povo de Israel foi liberto da escravidão, após uma noite de juízo que se abateu sobre o Egito e poupou apenas os que pela fé aplicaram o sangue de um cordeiro imolado nas ombreiras de suas portas, nós também fomos libertados pelo sangue de Cristo. Escapamos do juízo que cairá sobre este mundo e sobre aqueles que rejeitarem o favor de Deus. Mas, assim como aconteceu com os israelitas, após termos sido salvos nos encontramos em um deserto, seco e árido, onde Deus nos sustenta com o “pão da vida” que desceu do Céu (Jesus) e com a água saída da Rocha. (“e a pedra era Cristo” 1 Co 10:4).
Quão triste é para nosso Senhor, que sofreu tanto para nos salvar, ver os seus redimidos desejosos de voltar ao seu estado anterior! O quanto vale para nós todo o seu sacrifício? Nossos olhos sempre se ocupam com aquilo que nos parece de maior valor; e que valor tem para nós o sangue de Cristo derramado em nosso favor? Pilatos, ao apresentar o Senhor à multidão, perguntou: “Que farei então de Jesus, chamado Cristo? Disseram-lhe todos: Seja crucificado” (Mt 27:22.). E agora eu pergunto, a você que está com sua alma seca como um deserto por ter andado longe do Senhor: o que fará de Jesus, seu Salvador? Judas o vendeu por trinta moedas de prata, o valor de um escravo (Êx 21:32). Quanto vale o Senhor para você? Haverá alguma coisa neste mundo, ou mesmo o mundo todo, cujo valor exceda o daquele que deu sua vida por você?
Se você se afastou dele, saiba que ele não se afastou de você. Como o “filho pródigo” de Lucas 15:11, você já deve ter percebido que este mundo só pode lhe oferecer comida de porcos. Mas o Pai está esperando por você de braços abertos, desejoso de lhe dar o melhor: “o pão da vida”. Portanto, volte agora mesmo. Confesse a ele o seu pecado e, ainda que deseje culpar a outros por seu afastamento, é com o Pai que você interrompeu sua comunhão e é com ele que deve se reconciliar em primeiro lugar. Veja nesta passagem com quem você estará tratando, e qual é a disposição que ele tem para com os que lhe pertencem: “Tomei-os pelos seus braços, mas não conheceram que eu os curava. Atraí-os com cordas humanas, com cordas de amor; e fui para eles como os que tiram o jugo de sobre as suas queixadas; e lhes dei mantimento” (Os 11:3-4).
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O que fazer agora que entendi onde e como congregar?
Um irmão em Cristo perguntou qual seria o próximo passo após haver entendido onde e como deve congregar. Esta é uma dúvida de muitos que se apartam dos sistemas religiosos, ou que simplesmente se convertem fora deles, por inicialmente pensarem que devem ficar sozinhos ou juntar um grupo para formar algum tipo de igreja ou congregação. O irmão Paul Froese, que costuma visitar o Brasil e o Peru com frequência, respondeu de uma forma que achei tão clara que pedi a ele permissão para publicar aqui. A resposta você acompanha a seguir.
Você se separou do sistema religioso criado pelos homens por desejar estar congregado somente ao nome do Senhor. É importante que o objetivo não é “congregar conosco”, mas com o Senhor e onde ele colocou o seu nome, ou seja, sua autoridade. “Dos outros, porém, ninguém ousava ajuntar-se a eles; mas o povo tinha-os em grande estima. E a multidão dos que criam no Senhor, tanto homens como mulheres, crescia cada vez mais” (At 5:13-14). Em outras palavras, o objetivo não é você ajuntar-se a nós, mas é o Senhor quem faz a obra de ajuntar e é a ele que ele próprio ajunta. “Porque quem não é contra nós, é por nós… Quem não é comigo é contra mim; e quem comigo não ajunta, espalha” (Mc 9:40; Mt 12:30). Repare que existe nestes versículos uma clara distinção entre os termos “nós” e “comigo”.
Se fizermos da expressão “nós” o nosso referencial — sendo esse “nós” “os irmãos congregados ao nome do Senhor” —, então juntar-se a esses (os “nós”) não passa de sectarismo, e qualquer um que venha a se unir a essa comunhão com um motivo assim logo ficará desapontado ao descobrir que “nós” não somos diferentes de quaisquer outros cristãos sobre a face da Terra. Eventualmente nossa moral será repreensível, podemos às vezes ter má doutrina, más práticas, más atitudes, mau testemunho… Mas o ponto é, se o Senhor está no meio, então existe um recurso e autoridade para corrigir essas coisas que eventualmente estejam erradas, e para isso é usada a disciplina sempre que necessário.
Se, todavia, nos reunimos a “ELE”, no sentido de quando Jesus diz “comigo”, então ELE nunca irá nos desapontar. Nunca devemos perder este foco e referencial. Além disso, se estou congregado a Cristo, e você está congregado a Cristo, então estaremos congregados juntos. Mas jamais devo, como primeiro motivo, me congregar com você, ou você comigo, mas devemos ambos estar congregados ao Senhor Jesus Cristo, e assim descobriremos que ali eu e você estaremos também em comunhão um com o outro.
Mas sua dúvida é o que fazer agora. Não existe um formulário ou um questionário para ser respondido para se cadastrar entre irmãos congregados ao Nome do Senhor. Isto porque também não existe um governo central fora do céu onde o Senhor está assentado como a Cabeça de seu corpo. “Porque nós, sendo muitos, somos… um só corpo” (1 Co 10:17). “Todos os membros, sendo muitos, são um só corpo” (1 Co 12:12). “Assim nós, que somos muitos, somos um só corpo em Cristo, mas individualmente somos membros uns dos outros” (Rm 12:5). Você já é membro do corpo de Cristo, se é que já creu verdadeiramente nele para a salvação de sua alma.
Porém existe uma diferença entre pertencer ao corpo de Cristo e praticar essa verdade. O sinal prático dessa unidade é o partimento do pão — literalmente o participar da ceia do Senhor. “O pão que partimos não é porventura a comunhão do corpo de Cristo?” (1 Co 10:16). Existe uma diferença entre o corpo de Cristo e a comunhão do corpo de Cristo. Mas não cabe a nós começarmos partindo o pão por nós mesmos, pois se a Palavra em Efésios 4:4 diz que “há um só corpo”, o que vem imediatamente antes, no versículo 3, é que devemos procurar “guardar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (Ef 4:3). Temos de reconhecer que já existe a comunhão do corpo na Terra, e nosso dever é guardar ou manter a união na prática.
Quando nos dias do Livro de Atos o evangelho se espalhava pelo mundo, vemos que sempre foi mantida a comunhão entre as assembleias por meio das visitas dos irmãos. “Os apóstolos, pois, que estavam em Jerusalém, ouvindo que Samaria recebera a palavra de Deus, enviaram para lá Pedro e João” (At 8:14). “E a mão do Senhor era com eles; e grande número creu e se converteu ao Senhor. E chegou a fama destas coisas aos ouvidos da igreja que estava em Jerusalém; e enviaram Barnabé a Antioquia. O qual, quando chegou, e viu a graça de Deus, se alegrou, e exortou a todos a que permanecessem no Senhor, com propósito de coração” (At 11:21-23). A igreja tinha começado em Jerusalém, mas agora começava em outras cidades também. Para manter a unidade na prática os irmãos de Jerusalém chegavam a esses lugares e reconheciam o que o Senhor estava fazendo. Eles não iam a fim de estabelecer nessas cidades “a Igreja de Jerusalém”, mas simplesmente para demonstrar a comunhão do “um só corpo” que existia em ambas as localidades.
Se a ceia do Senhor — o partir do pão — serve para mostrar na prática a verdade do “um só corpo” por meio da comunhão, então para que a mesa do Senhor seja estabelecida num lugar é preciso que alguns que já participam dessa “mesa” cheguem à nova localidade e partam o pão lá com os membros do corpo de Cristo ali que têm o desejo de manter a unidade do Espírito e a comunhão do corpo de Cristo. Antes de fazerem isso é preciso que fique bem claro que é o Senhor quem está fazendo a obra naquele novo lugar, pois a “mesa” é dele, não nossa. É ele quem estabelece a “mesa”, mas também nós, que já participamos dessa comunhão, devemos ativamente manter essa comunhão e unidade onde ficar evidente que o Senhor está levantando um testemunho ao seu nome. Darby escreveu que “a fé tem um duplo caráter — a energia que vence e a paciência que espera em Deus e confia nele”. Precisamos destas duas coisas também nesta questão: energia e paciência.
Devemos também saber que, embora todos os membros do corpo de Cristo têm o seu lugar à mesa do Senhor, nem todos podem estar ali por causa do pecado que traz desonra pública ao nome do Senhor, a saber pecado moral, doutrinal ou eclesiástico. Sim, pode ser que eles sejam membros do corpo de Cristo, verdadeiros filhos de Deus, mas na assembleia existe uma disciplina, pois o Senhor está ali e é nosso dever manter a santidade do testemunho congregado ao seu nome (1 Co 5). É por isso que a Palavra diz: “A ninguém imponhas precipitadamente as mãos” (1 Tm 5:22). A razão é que não sabemos se alguém está andando de modo errado até termos tido tempo para conhecer melhor a pessoa. Além do triste assunto do pecado, não existe outro motivo para manter um membro do corpo de Cristo fora da comunhão do mesmo corpo de Cristo. Não existe diferença entre os membros neste aspecto. Sim, pode existir “diversidade de dons” espirituais entre os membros do corpo (1 Co 12:4), e há também diferentes níveis de crescimento e entendimento na vida cristã (1 Jo 2:12-13), mas mesmo assim estas coisas não pesam na dignidade do crente em Cristo para que venha a tomar seu lugar à mesa do Senhor.
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Anulamos a Lei pela fé?
Uma passagem que traz alguma dificuldade para o leitor é o último versículo do capítulo 3 de Romanos. Isto porque existe uma espécie de consenso religioso de que a Lei, dada por intermédio de Moisés, seria uma espécie de manual de como se viver para merecer a salvação. O que nem todos percebem é que a Lei é como uma placa de contramão: ela indica que você está na direção errada mas não tem qualquer poder de manobrar seu enorme caminhão entalado numa rua estreita. Selecionei alguns comentários de autores que explicam esta passagem e deixam muito claro o papel da Lei e da fé na salvação do homem. Como alguém disse, afirmar que Paulo estaria anulando a Lei por causa da fé seria o mesmo que “a semeadura de um campo demonstrar que o arado foi usado em vão” (F. W. Grant).
“Ora, nós sabemos que tudo o que a lei diz, aos que estão debaixo da lei o diz, para que toda a boca esteja fechada e todo o mundo seja condenável diante de Deus. Por isso nenhuma carne será justificada diante dele pelas obras da lei, porque pela lei vem o conhecimento do pecado… Concluímos, pois, que o homem é justificado pela fé sem as obras da lei… Anulamos, pois, a lei pela fé? De maneira nenhuma, antes estabelecemos a lei” (Rm 3:19-31).
“Nunca a lei foi tão honrada e estabelecida quanto na morte de Cristo. O Evangelho honra a lei por permitir que ela faça seu trabalho de despertar o conhecimento do pecado. Então o Evangelho entra em cena e faz aquilo que a lei nunca era para fazer. O Evangelho traz justificação completa ao crente em Jesus” – F. B. Hole.
“A lei exige total obediência. A pena pela quebra da lei deve ser paga, e a pena é a morte. Se um transgressor da lei pagar a pena ele estará perdido eternamente. O Evangelho mostra como Cristo morreu para pagar a pena da lei que foi transgredida. Ele não tratou a lei como algo a ser ignorado; ele pagou completamente a dívida. Agora qualquer um que tenha transgredido a lei pode se beneficiar do fato de que Cristo pagou a pena em seu lugar. Assim o Evangelho da salvação pela fé honra a lei ao insistir que suas demandas sejam total e completamente atendidas” – W. MacDonald.
“A fé estabelece a lei; ela coloca a lei em seu devido lugar e concede a ela toda a sua força, considerando-a em sua absoluta severidade, justiça e inflexibilidade. Reconhece totalmente seu ‘ministério da morte’ (2 Co 3:7), seu ‘ministério da condenação’ (2 Co 3:9), que ela condena e não poderá justificar o pecador. Portanto, a fé não pode imputar à lei o ‘ministério da vida’ (2 Co 3:6), o ‘ministério da justiça’ (2 Co 3:9), pois esses ministérios não são pela lei de Deus, mas pela graça de Deus (2 Co 3:1-18)”. – L. M. Grant.
“Seria isso a anulação da lei como princípio? Muito pelo contrário. A lei nunca teve o papel que tem o Evangelho que é proposto para a fé, quer alguém olhe para o pecador que está completamente condenado sob a lei, quer olhe para Cristo feito maldição na cruz. Por outro lado, aqueles que querem considerar os cristãos como estando sob a lei para a regra desta não enfraquecer a autoridade deles, ensinando-os a esperar por salvação ao mesmo tempo em que fracassam em atender as exigências da mesma lei, esses são os que não estão estabelecendo a lei, mas anulando-a” – W. Kelly.
“Aqueles que afirmam que ainda estamos sob a lei a tornam nula, pois ela amaldiçoa os que se encontram sob ela, já que não a guardam. Aqueles que estavam antes sob a lei precisaram ser redimidos de sua maldição pela morte de Jesus. Sendo assim, se as Escrituras nos colocam sob a lei novamente, então seria preciso que Jesus morresse outra vez para nos redimir da maldição da lei. (Veja Gl 3:10-13; 4:4-5.) ‘Anulamos, pois, a lei pela fé? De maneira nenhuma, antes estabelecemos a lei’ (Rm 3:31). Jesus é revelado aos olhos da fé, levando a maldição da lei transgredida no lugar daqueles que se encontravam sob ela — se isto não estabelece as reivindicações da lei de Deus, o que mais pode fazê-lo? Mas se fôssemos novamente colocados sob a lei então suas reivindicações teriam que ser novamente estabelecidas, ou ela seria tornada nula.” – C. Stanley.
“Será que a fé anulou a autoridade da lei? De maneira nenhuma. A fé estabeleceu completamente a autoridade da lei, mas fez com que o homem participasse da justiça divina ao mesmo tempo em que reconhecia sua justa e total condenação pela lei como estando sob ela — a condenação que fez com que outra justiça fosse necessária, já que de acordo com a lei o homem não tinha justiça alguma de si mesmo. A lei exigia a justiça, mas ela apontava que havia pecado ali. Se a justiça que ela demandava não tivesse sido necessária, ao falhar em produzir tal justiça no homem não haveria necessidade de outra justiça. Mas a fé afirmou haver tal necessidade e que era válida a condenação do homem sob a lei, ao fazer com que o crente participasse dessa outra justiça, que é de Deus. Aquilo que a lei demandava ela não podia dar; e até mesmo por ela ter demandado isso, o homem falhou em produzir tal justiça. Se a lei lhe tivesse concedido tal justiça, a obrigação teria sido anulada. Deus age em graça, quando a obrigatoriedade a lei é totalmente mantida na condenação. Ele concede justiça, pois ela deve ser possuída. Ele não anula a obrigação da lei, segundo a qual o homem está totalmente condenado, mas, ao mesmo tempo em que reconhece e afirma a justiça dessa condenação, Deus glorifica a si mesmo em graça ao garantir ao homem uma justiça que é divina, quando este não há qualquer justiça humana para ser apresentada a Deus em conexão com a obrigação imposta sobre o homem pela lei. Nada jamais deu tanta sanção divina à lei como fez a morte de Cristo, que levou sua maldição, mas não nos deixou sob ela. Portanto a fé não anula a lei, mas estabelece sua autoridade completamente. Ela mostra o homem condenado justamente sob a lei, e mantém a autoridade da lei nessa condenação, pois considera que todos os que estão sob a lei estão sob maldição. Você irá reparar que o que é distintamente apresentado até o final do capítulo 3 de Romanos é o sangue de Cristo sendo aplicado aos pecados do velho homem, fazendo do perdão algo justo, e tornando o crente livre de seus pecados, já que estes foram purificados pelo sangue de Cristo. Isto atende plenamente a culpa do velho homem.”. – J. N. Darby
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Podemos congregar ao nome do Senhor numa praça?
Não há nada de errado em se pregar o evangelho para incrédulos numa praça, mas quando estamos congregados ao nome do Senhor é importante entender o caráter reservado dessa reunião. Nos evangelhos sempre que o Senhor tinha coisas mais elevadas para dizer ele não dizia para a multidão, mas chamava os discípulos à parte ou a uma casa. Quando ele os enviou para preparar a páscoa, não foi numa praça, mas num cenáculo, um andar elevado acima do nível do chão e do mundo.
“Chegou, porém, o dia dos ázimos, em que importava sacrificar a páscoa. E mandou a Pedro e a João, dizendo: Ide, preparai-nos a páscoa, para que a comamos. E eles lhe perguntaram: onde queres que a preparemos? E ele lhes disse: Eis que, quando entrardes na cidade, encontrareis um homem, levando um cântaro de água; segui-o até à casa em que ele entrar. E direis ao pai de família da casa: O Mestre te diz: onde está o aposento em que hei de comer a páscoa com os meus discípulos? Então ele vos mostrará um grande cenáculo mobilado; aí fazei preparativos. E, indo eles, acharam como lhes havia sido dito; e prepararam a páscoa. E, chegada a hora, pôs-se à mesa, e com ele os doze apóstolos” (Lc 22:7-14).
E vemos também que foi num lugar assim que a igreja teve início, em um cenáculo, mas entenda que estou falando do aspecto de estar congregado acima do nível do chão e dos homens, e não que a Igreja precisaria se reunir literalmente num sobrado:
“Então voltaram para Jerusalém, do monte chamado das Oliveiras, o qual está perto de Jerusalém, à distância do caminho de um sábado. E, entrando, subiram ao cenáculo, onde habitavam Pedro e Tiago, João e André, Filipe e Tomé, Bartolomeu e Mateus, Tiago, filho de Alfeu, Simão, o Zelote, e Judas, irmão de Tiago. Todos estes perseveravam unanimemente em oração e súplicas, com as mulheres, e Maria mãe de Jesus, e com seus irmãos. E naqueles dias, levantando-se Pedro no meio dos discípulos (ora a multidão junta era de quase cento e vinte pessoas) disse…” e aqui Pedro e os outros vão tratar da escolha de Matias para ocupar o lugar de Judas entre os doze apóstolos.
Mas fica evidente que as mesmas cento e vinte pessoas estavam no cenáculo quando, no capítulo 2, o Espírito Santo desceu e teve início a Igreja, que é o Corpo de Cristo, quando Deus reverteu o que fez em Gênesis, ao dividir os seres humanos por diferentes línguas. Agora, como Igreja, seria possível que todos tivessem um mesmo pensamento e um mesmo entendimento, mesmo que falassem diferentes idiomas. Tudo isso ocorreu no mesmo cenáculo do capítulo 1:
“E, cumprindo-se o dia de Pentecostes, estavam todos concordemente no mesmo lugar; e de repente veio do céu um som, como de um vento veemente e impetuoso, e encheu toda a casa em que estavam assentados. E foram vistas por eles línguas repartidas, como que de fogo, as quais pousaram sobre cada um deles. E todos foram cheios do Espírito Santo, e começaram a falar noutras línguas, conforme o Espírito Santo lhes concedia que falassem” (At 2:1-4).
Também quando Paulo partiu o pão com os irmãos e Êutico caiu da janela, era um lugar elevado, e isso nos fala de estarmos em um lugar separado e acima do movimento deste mundo.
“E no primeiro dia da semana, ajuntando-se os discípulos para partir o pão, Paulo, que havia de partir no dia seguinte, falava com eles; e prolongou a prática até à meia-noite. E havia muitas luzes no cenáculo onde estavam juntos. E, estando um certo jovem, por nome Êutico, assentado numa janela, caiu do terceiro andar, tomado de um sono profundo que lhe sobreveio durante o extenso discurso de Paulo; e foi levantado morto. Paulo, porém, descendo, inclinou-se sobre ele e, abraçando-o, disse: Não vos perturbeis, que a sua alma nele está. E subindo, e partindo o pão, e comendo, ainda lhes falou largamente até à alvorada; e assim partiu” (At 20:7-11).
Tudo isso nos ajuda a enxergar que a reunião da igreja não é um evento público, é reservada para os salvos, embora um ou outro visitante possa eventualmente assistir sem participar do ministério, ceia do Senhor e orações. As atividades da reunião da igreja ou assembleia não incluem a pregação do evangelho, embora obviamente o tema sempre irá girar em torno da pessoa e obra de nosso Senhor Jesus Cristo. Mas as atividades que cabem à reunião da igreja ou assembleia são a doutrina e comunhão dos apóstolos para a Igreja, a ceia do Senhor e as orações, como mostra Atos 2:42: “E perseveravam na doutrina dos apóstolos, e na comunhão, e no partir do pão, e nas orações”.
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Quem seria o Profeta?
Quem seria esse misterioso Profeta acerca do qual os sacerdotes e levitas indagam de João Batista? Obviamente muitos charlatães têm levantado a mão e, com a maior cara de pau, declarado: “Eu sou o Profeta! Eu sou o Profeta!”.
“Então, lhe perguntaram: Quem és, pois? És tu Elias? Ele disse: Não sou. És tu o profeta? Respondeu: Não…. E perguntaram-lhe: Então, por que batizas, se não és o Cristo, nem Elias, nem o profeta?” (Jo 1:21, 25).
Moisés havia profetizado a vinda de um profeta e era esse que eles perguntam se poderia ser:
“O Senhor, teu Deus, te suscitará um profeta do meio de ti, de teus irmãos, semelhante a mim; a ele ouvirás… Suscitar-lhes-ei um profeta do meio de seus irmãos, semelhante a ti, em cuja boca porei as minhas palavras, e ele lhes falará tudo o que eu lhe ordenar. De todo aquele que não ouvir as minhas palavras, que ele falar em meu nome, disso lhe pedirei contas” (Dt 18:15-19).
Mas o Profeta de quem Moisés falava seria o Cristo, conforme vemos em Atos:
“E agora, irmãos, eu sei que o fizestes por ignorância, como também as vossas autoridades; mas Deus, assim, cumpriu o que dantes anunciara por boca de todos os profetas: que o seu Cristo havia de padecer. Arrependei-vos, pois, e convertei-vos para serem cancelados os vossos pecados, a fim de que, da presença do Senhor, venham tempos de refrigério, e que envie ele o Cristo, que já vos foi designado, Jesus, ao qual é necessário que o céu receba até aos tempos da restauração de todas as coisas, de que Deus falou por boca dos seus santos profetas desde a antiguidade. Disse, na verdade, Moisés: O Senhor Deus vos suscitará dentre vossos irmãos um profeta semelhante a mim; a ele ouvireis em tudo quanto vos disser. Acontecerá que toda alma que não ouvir a esse profeta será exterminada do meio do povo. E todos os profetas, a começar com Samuel, assim como todos quantos depois falaram, também anunciaram estes dias. Vós sois os filhos dos profetas e da aliança que Deus estabeleceu com vossos pais, dizendo a Abraão: Na tua descendência, serão abençoadas todas as nações da terra. Tendo Deus ressuscitado o seu Servo, enviou-o primeiramente a vós outros para vos abençoar, no sentido de que cada um se aparte das suas perversidades” (At 3:17-26).
Eu realmente fico intrigado de ver tanta gente querendo seguir um “profeta”. Será que Jesus não é suficiente para essas pessoas? Será que precisam tanto assim “ver para crer” e ficar ocupadas com supostos sinais visíveis e palpáveis? Certamente isso não tem nada a ver com a fé que salva e que é mencionada tantas vezes na Palavra de Deus. E também nada tem a ver com o verdadeiro Profeta que Moisés previu que viria, já veio e a qualquer momento voltará. Portanto, da próxima vez que alguém se apresentar a você como sendo “O Profeta”, antes de segui-lo peça para ele mostrar as mãos e o lado.
“Passados oito dias, estavam outra vez ali reunidos os seus discípulos, e Tomé, com eles. Estando as portas trancadas, veio Jesus, pôs-se no meio e disse-lhes: Paz seja convosco! E logo disse a Tomé: Põe aqui o dedo e vê as minhas mãos; chega também a mão e põe-na no meu lado; não sejas incrédulo, mas crente. Respondeu-lhe Tomé: Senhor meu e Deus meu!” (Jo 20:26).
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O apóstolo recorre à lei para ordenar o silêncio das mulheres?
Sua dúvida está em 1 Coríntios 14:34-37, que diz: “As vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar; mas estejam sujeitas, como também ordena a lei. E, se querem aprender alguma coisa, interroguem em casa a seus próprios maridos; porque é vergonhoso que as mulheres falem na igreja. Porventura saiu dentre vós a palavra de Deus? Ou veio ela somente para vós? Se alguém cuida ser profeta, ou espiritual, reconheça que as coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor”.
Você perguntou se essa “lei” seria a lei de Moisés dada no Antigo Testamento, e mostrou-se confuso, porque se os discípulos já não estavam mais debaixo da lei, e sim da graça, como Paulo poderia ter feito referência à lei neste caso.
Entendo que a ênfase do que ele diz esteja na palavra “também”, de “como TAMBÉM ordena a lei…”. Ou seja, o apóstolo poderia estar dando um mandamento que coincidisse com aquilo que era praticado na Lei, não que existisse na Lei um mandamento do tipo “Mulheres: Não falem nas igrejas”, mas a submissão da mulher ao marido estava implicada em muitos outros preceitos da Lei. A doutrina dada à igreja não está na Lei dada a Israel, embora você também encontre alguns pontos semelhantes ou coincidentes em ambas.
Mas também pode ser que Paulo estivesse se referindo a uma lei mais antiga ainda dada no Éden, quando após a queda Deus disse à mulher: “O teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará” (Gn 3:16). Lembre-se de que, ainda que não estejamos debaixo da Lei mosaica, estamos debaixo da Lei de Cristo e de seus mandamentos. Sim, existe uma “Lei de Cristo” e existem “Mandamentos do Senhor” espalhados pelas epístolas, e faremos bem se os seguirmos, não para sermos salvos, mas para andarmos de maneira agradável ao Senhor. Estas passagens são exemplos da “Lei de Cristo”:
“Aos sem lei, como se eu mesmo o fosse, não estando sem lei para com Deus, mas debaixo da lei de Cristo, para ganhar os que vivem fora do regime da lei” (1 Co 9:21).
“Levai as cargas uns dos outros e, assim, cumprireis a lei de Cristo” (Gl 6:2).
Certamente para alguém envolvido em uma cristandade que há muito tempo deixou de lado a Palavra de Deus e passou a decidir o que quer ou não seguir dela, um “mandamento do Senhor” como este que Paulo menciona, não é nada atrativo. Em nossa “sociedade moderna” isso irá parecer politicamente incorreto, machista, opressor e tantos outros adjetivos que no passado só eram encontrados na boca de incrédulos ao se referirem à Bíblia, mas hoje é usual até entre cristãos professos. Por isso, como que prevendo esse abandono da verdade, o Espírito Santo fez questão de frisar no final do preceito para o silêncio da mulher nas reuniões da igreja o seguinte: “Porventura saiu dentre vós a palavra de Deus? Ou veio ela somente para vós? Se alguém cuida ser profeta, ou espiritual, reconheça que as coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor” (1 Co 14:36-37).
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O que acha de direitos autorais para literatura cristã?
Existem duas áreas aí que é importante fazermos distinção. Por exemplo, quando se trata de um livro impresso você tem custos de impressão, editoração, capa, sistema de distribuição para as livrarias, transporte, correios, loja física que tem custos de aluguel, etc. Então o material tangível tem um custo mesmo que a parte intangível da obra, que é sua criação, não tenha custado algo além do tempo, criatividade e empenho do autor. Portanto não me proponho a achar que tudo o que esteja relacionado ao cristianismo tenha que ser grátis. Quando você compra um CD, a música foi composta pelo autor da letra, mas ele pagou uma banda para tocar, gastou com músicos, estúdio, gravadora, instrumentos, etc. Portanto ele teve um custo e nada mais normal que seja ressarcido por seus gastos com tangíveis. Assim existe uma diferença entre a parta intangível, que é a criação do autor, e a parte tangível de sua obra, que pode ser a mídia usada para sua distribuição.
Muitos autores do século 19 e mais recentes, que fazem parte dos que costumo ler e consultar, não se preocuparam em restringir suas obras por meio de artifícios legais como direitos autorais ou “copyright”, por isso essas obras são em sua maioria de domínio público. Hoje, digitalizações desses livros em diferentes idiomas podem ser encontradas por qualquer um que realmente queira encontrá-las em vários sites e publicadas por diferentes pessoas. Quem conhece como funciona a Internet sabe que é impossível evitar isso, pois uma vez publicado na rede, os próprios robôs se incumbem de multiplicá-los e espalhá-los por diferentes servidores na grande nuvem.
Sei de casos quando um autor ou editora faz formalmente um pedido para que uma obra não seja publicada em formato digital e isso por diferentes razões. Uma seria a de preservar seu conteúdo de incorreções ou adulterações, mas na maioria das vezes o que se quer mesmo é preservar seu investimento para poder recuperá-lo na forma de venda. Uma tentativa bíblica de se justificar isso pode ser o versículo “O lavrador que trabalha deve ser o primeiro a gozar dos frutos” (2 Tm 2:6). Todavia acredito que isso tenha sido dito no sentido de um encorajamento para um dia futuro, quando o Senhor recompensará a obra de cada um, e não para fazer tilintar a caixa registradora de alguma editora, escritor ou tradutor na vida presente.
Naquele dia o Senhor “manifestará os desígnios dos corações; e então cada um receberá de Deus o louvor” (1 Co 4:5). Naquele dia “a obra de cada um se manifestará; na verdade o dia a declarará, porque pelo fogo será descoberta; e o fogo provará qual seja a obra de cada um. Se a obra que alguém edificou nessa parte permanecer, esse receberá galardão” (1 Co 3:13-14). Todavia essa obra é feita de forma múltipla, e não de forma individualista. Em um momento quando os cristãos em Éfeso faziam distinção entre os irmãos que labutavam na obra, Paulo escreveu: “Pois, quem é Paulo, e quem é Apolo, senão ministros pelos quais crestes, e conforme o que o Senhor deu a cada um? Eu plantei, Apolo regou; mas Deus deu o crescimento. Por isso, nem o que planta é alguma coisa, nem o que rega, mas Deus, que dá o crescimento. Ora, o que planta e o que rega são um; mas cada um receberá o seu galardão segundo o seu trabalho. Porque nós somos cooperadores de Deus; vós sois” (1 Co 3:5-9).
Se há alguns anos esse problema de alguém publicar a obra de outrem, fosse este o autor ou tradutor de uma versão, não existia, pois apenas uma editora com capital e estrutura de impressão e distribuição poderia fazê-lo, a coisa toda mudou com o advento das novas tecnologias. Hoje qualquer pessoa usando apenas de um smartphone, tablet ou notebook tem o potencial de uma editora ou emissora de rádio e TV. Autores, editores e tradutores de Bíblias e livros cristãos acabam se sentindo impotentes em evitar que suas obras sejam pulverizadas de forma gratuita pela Web por pessoas que não fizeram qualquer investimento além de seu tempo e vontade. Então partem para notificações informais ou legais para a retirada do material do ar, ou podem chegar a processar os que violam os direitos que possuem pela legislação.
Mas aí vem uma questão: quando alguém produz ou traduz essas obras, qual teria sido realmente seu objetivo? Na maioria das vezes a preocupação desses foi levar o Evangelho e a sã doutrina a um número maior de pessoas. Mas podem existir também os que têm um interesse conjunto, evangelístico e monetário, e proíbem uma distribuição livre e gratuita se amparando no argumento de que usaram de seus parcos recursos para aquele trabalho e, portanto, devem ser os primeiros a usufruir de seus frutos.
Mas basta adotar a visão que Deus tem de sua obra, e não uma visão setorial ou de um grupo ou instituição, para perceber a fragilidade do argumento. Qualquer um sabe que as obras editoriais cristãs sem fins lucrativos lutam para obter recursos para levar o evangelho e oram constantemente por isso. Se entendessem que a obra é de Deus e que aqueles que surgem dispostos a colaborar de forma espontânea e voluntária são a resposta de suas orações por recursos, ficariam felizes de ter seu trabalho multiplicado para os diferentes formatos e mídias hoje disponíveis graças às novas tecnologias. Veja, por exemplo, a transformação de Bíblias e livros cristãos em audiolivros, que é uma excelente alternativa para deficientes visuais ou simplesmente para quem deseja ouvir enquanto dirige ou viaja. A maioria das editoras não está preparada para isso por lhes faltar conhecimento tecnológico ou talento de oratória entre seus membros. Enquanto isso, há muitos cristãos que têm tudo isso e estariam prontos a auxiliar.
Sou autor de uma série de mais de uma dúzia de livros de comentários bíblicos, além de várias traduções de autores de textos de domínio público, e minha atitude pessoal para com alguém que deseje ampliar a disponibilização desse material é: “Vá em frente”. Se considero o que tenho feito como parte da obra de Deus para a divulgação do evangelho, e vejo que Deus colocou no coração de um servo seu tal desejo de colaborar, desde que o faça de forma respeitosa, quem sou eu para impedir? É claro que há situações em que devemos tratar o assunto com rigor, como quando não autorizei um jovem que queria editar os vídeos com esses programas que distorcem a voz e transformam a fala em um rap com fundo musical.
Mas também precisei aprender (e continuo aprendendo) sobre o poder que Deus tem de usar algo segundo a sua (e não minha) vontade. Quando comecei o trabalho de vídeos de “O Evangelho em 3 Minutos” no Youtube, eu colocava no final de cada vídeo a mensagem: “Uso permitido em blogs pessoais. Proibido em igrejas, organizações, rádio e TV”. Minha preocupação era evitar associar minha imagem e meu trabalho a algum pastor sem escrúpulos que usasse meus vídeos para pedir doações em igrejas e programas de rádio e TV. Logo entendi que pessoas sem escrúpulos não respeitam avisos assim, por isso algum tempo depois recebi um e-mail de uma pessoa agradecendo porque alguém em sua família havia comprado um DVD pirata do “Evangelho em 3 Minutos” em um camelô e se reconciliou com o Senhor. Outro escreveu que se converteu ao ouvir o áudio de um vídeo meu em um programa evangélico na rádio de sua cidade.
Então tirei a proibição dos vídeos (os antigos ainda trazem o aviso, mas não é mais válido) e deixei que o material pudesse ser utilizado pelo Espírito Santo com a maior liberdade e liberalidade possíveis. Vem-me à mente o versículo “Não extingais o Espírito” (1 Ts 5:19), que tem o sentido de não limitar ou tolher a ação do Espírito de Deus no ministério de sua Palavra. Aqueles que apelam para instrumentos legais ou tradições dos homens para colocar obstáculos à propagação da Palavra e da sã doutrina podem incorrer no erro de tentarem extinguir o Espírito ao limitarem a amplitude de sua ação. Não tenho dúvidas de que muitos foram abençoados pelas Bíblias e livros “ilegais” disponibilizados na Web à revelia dos detentores de seus direitos. “No céu está o nosso Deus e tudo faz como lhe agrada” (Sl 115:3).
Se os autores do século dezenove, e também os contemporâneos, em especial aqueles que se congregavam ou congregam somente ao nome do Senhor Jesus, não se preocuparam com copyright, apesar do ônus do trabalho que tiveram e da vida que dedicaram debruçados sobre seus textos, desejando que sua mensagem alcançasse o máximo de pessoas, por que deveria um autor, tradutor ou editora sem fins lucrativos fazê-lo? Não digo isso levianamente, mas com base em minha experiência de assumir o ônus do tempo e trabalho empregados quando ofereço gratuitamente para download todos os livros de minha autoria e também os traduzidos por mim de obras de domínio público.
Uma experiência interessante que vale contar aqui foi a do irmão que criou e mantém um site de Bíblia online e também em forma de aplicativo para smartphone. Quando ele iniciou seu trabalho, publicou as versões da Bíblia que encontrou na Web, mas não demorou para receber uma intimação da SBB ou Sociedade Bíblica do Brasil exigindo a retirada de todas as versões daquela instituição, o que ele fez. Deixou apenas uma versão Almeida Revista e Atualizada que, por descuido da SBB, caiu em domínio público. Digo “descuido” porque a SBB tem por hábito fazer pequenas alterações nas versões de sua propriedade e relançá-las renovando assim os direitos sobre elas.
Quando nosso irmão procurou a SBB em busca de autorização, foi convidado a pagar uma taxa para a utilização dos textos em seu site. Ele preferiu abrir mão de ter aquelas versões e fez contato com a Sociedade Bíblica Trinitariana, que o autorizou a utilizar sua excelente versão da “Almeida Corrigida Fiel”. Em 2009 escrevi para a SBB sobre a possibilidade de eles liberarem suas versões para uso em websites e em diferentes aplicativos de Bíblia para dispositivos móveis. Meu e-mail dizia:
“Enquanto existem diversas versões da Bíblia em muitas línguas, o que permite ao leitor utilizar seus textos nas plataformas que preferir (e-Sword, MySword, PDF, ePub, Mobi, mp3, etc.), as Bíblias em Português publicadas no Brasil pela SBB têm direitos autorais reservados e sua reprodução proibida. Como a SBB não é capaz de disponibilizar versões em todos os formatos possíveis e adequados a diferentes leitores e plataformas, isso obriga o leitor a se valer de edições ilegais de um texto que deveria ser de domínio público, não fossem as hábeis pequenas alterações que os editores fazem de tempos em tempos para preservar seus direitos. Que tal rever essa política?”
A resposta da SBB, que inclui dizer que atendem solicitações, contradiz a prática no caso daquele irmão que solicitou o uso para distribuição gratuita, porém recebeu uma proposta com custo. A SBB me respondeu:
“A tradução original de Almeida e outras traduções estão em domínio público, ou seja, não tem direitos reservados, permitindo o seu uso livremente. Mas os textos atualmente publicados pela SBB estão, sim, protegidos pela Lei de Direito Autoral. Os textos bíblicos são o nosso maior tesouro. Prepará-los e mantê-los tem o seu custo. Para manter esses custos a SBB vende as Bíblias que produz. A SBB também recebe doações de voluntários que querem ajudar na causa da Bíblia, mas essas doações no Brasil são muito pequenas se comparadas aos gastos que temos.
“Não somos contra o software livre ou novas mídias, nem quanto a uma maior distribuição da Palavra de Deus, mas prezamos pelas leis de direito autoral e não podemos concordar com o uso indevido dos nossos textos em ‘edições ilegais’. Quanto à nossa política, ela prevê, em certos casos, até mesmo a cessão gratuita de nossos textos, desde que seja feito um pedido e seu uso, justificado.”
Voltei a escrever para a SBB em 2011, desta vez motivado por um artigo em sua revista que parecia dizer que a SBB tinha por objetivo fazer a Bíblia chegar ao maior número possível de pessoas. Infelizmente na prática o discurso era outro. Meu e-mail foi:
“É louvável o trabalho da SBB na produção e distribuição de Bíblias. Porém, ao ler o editorial da última edição da revista, me animei pensando que iria encontrar na matéria o que se prometia no início: ‘Hoje, o desafio de levar a Bíblia para o jovem é diferente do que em outros tempos. O jovem usa celular e computador’. No entanto a matéria fala de iniciativas antigas de organizações e igrejas, apenas com nova roupagem. A matéria se perde na compreensão do que são as redes sociais e de como é o comportamento do jovem.
“Redes sociais são redes de pessoas, não de instituições. E é nessas redes e nas iniciativas individuais que está a verdadeira revolução do acesso à Palavra de Deus. Em sua lentidão em atender a demanda digital (por medo do uso indevido de suas traduções com direitos reservados) a SBB não é a opção dos jovens, que leem a Bíblia no computador, celular, iPad, etc. Uma tímida nota na mesma revista revela o lançamento de uma edição para e-book, explicando que ‘a maneira como os jovens usam estes instrumentos para se comunicar não é entendida pela maioria dos adultos’. Infelizmente este é o caso dos adultos da SBB. Hoje as Bíblia digitais mais lidas pelos jovens na Internet têm números de acessos substancialmente superiores aos do site da SBB, e em sua maioria são iniciativas individuais de jovens que amam a Palavra de Deus e mantém seus sites nas horas vagas com recursos próprios.
“Talvez fosse interessante rever sua política de direitos autorais para não incorrerem no alerta de seu próprio texto na revista que dizia: ‘A própria Bíblia nos ensina que, se falharmos em transmitir a fé a uma geração, ela desaparecerá da face da terra. Crianças e jovens são públicos para os quais Deus deu toda a atenção. Jesus Cristo foi procurado por jovens e tem uma mensagem para eles.’ Como seu próprio texto diz, ‘o jovem usa celular e computador’. Que tal avançar para o século 21 e disponibilizar todas as versões na Internet e permitir que os jovens as coloquem por meio de gadgets em seus próprios sites e blogs?
“Sim, eu sei que vocês já lançaram uma Bíblia em CD, mas nem os netbooks hoje trazem o CD por este estar obsoleto. Vocês têm ideia de como uma política de direitos autorais mais flexível aumentaria o acesso dos jovens à Palavra de Deus? A quase totalidade das Bíblias em português hoje disponíveis em sites, computadores, celulares, tablets e outros leitores digitais é ilegal, se consideradas as restrições de copyright da SBB. São 3 as possibilidades: fazer vista grossa e manter uma situação de ilegalidade para cristãos de língua portuguesa que querem ler a Bíblia em formato digital (a Bíblia no site da SBB não contempla a grande maioria dos meios digitais), sair à caça e repreensão desses que ‘insistem’ em ler a Bíblia ilegalmente (parece que a Inquisição já fazia isso), ou rever sua política de direitos autorais”.
A Gerente de Comunicação Social e Editora Responsável pela revista “A Bíblia no Brasil” da SBB respondeu:
“Para se aproximar ainda mais do público jovem, conforme até veiculado no conteúdo da própria revista, a Sociedade Bíblica do Brasil (SBB) aderiu há mais de um ano às redes sociais, como Twitter e Facebook (veja matéria na página 22 desta mesma edição). Nesse período, a experiência de interação com o público nessas mídias tem sido enriquecedora e gratificante. Além disso, a organização desenvolveu seu mobile site m.sbb.org.br a fim de facilitar a pesquisa online gratuita da Bíblia, entre outros recursos, por meio de aparelhos móveis com conexão à Internet.
Por meio de um sistema chamado Webservice, a Sociedade Bíblica do Brasil também disponibiliza gratuitamente suas traduções bíblicas — Almeida Revista e Atualizada, Almeida Revista e Corrigida e Nova Tradução na Linguagem de Hoje — a todos os interessados em oferecer o texto bíblico online. Dezenas de sites já aderiram a esse sistema, além de inúmeros outros que utilizam o link da pesquisa bíblica do site da SBB em suas páginas na Internet.
Ainda nesse sentido, no final de 2010, a SBB lançou algumas publicações e edições bíblicas para a versão e-book, seja gratuitamente ou com preços bem abaixo do formato impresso. A tendência neste ano é a expansão do material bíblico para o meio e-pub. Além disso, estão nos planos da entidade os lançamentos bíblicos – incluindo a criação de aplicativos – para a plataforma digital. A mais recente novidade do gênero, por exemplo, é a Bíblia Digital Glow, Trata-se de uma plataforma multimídia, que oferece uma navegação simples e intuitiva pelo universo do Livro Sagrado.
Mas sem dúvida, há muito ainda a ser feito. Tanto isso é verdade que a disseminação da Palavra às atuais gerações é uma preocupação de todas as 147 Sociedades Bíblicas espalhadas pelo mundo (veja matéria na página 8 desta mesma edição). Na última Assembleia Mundial das Sociedades Bíblicas, promovida em Seul entre 20 e 24 de setembro último, a globalização e a juventude no mundo cristão foram os principais temas abordados. Esses desafios fizeram as Sociedades Bíblicas reverem seu papel e modo de trabalho neste contexto de novas tecnologias e modernos meios de comunicação”.
Bem, se você tentou seguir os links informados pela SBB nessa comunicação de 2011 deve ter percebido que as páginas não existem. Obviamente existiam quando me responderam, mas o fato de não existirem hoje significa que, ou foram tiradas do ar, ou o responsável pelo site não sabe que links de Internet, uma vez criados, nunca devem ser deletados sob o risco de se perderem os apontamentos a esses links em outros sites ou mesmo em sites de busca. O que um bom entendedor de Web faria seria criar um redirecionamento. A mensagem da SBB termina com uma frase bem ao estilo “relações públicas”, que diz: “A SBB segue imbuída da missão de semear a Palavra que transforma vidas para todas as pessoas. E, diante do atual cenário global, os jovens demandarão seus maiores esforços e trabalhos pelos próximos anos”.
Repito, para reflexão, a afirmação feita a respeito dos jovens na matéria da revista da SBB com a qual concordo totalmente: “A própria Bíblia nos ensina que, se falharmos em transmitir a fé a uma geração, ela desaparecerá da face da terra. Crianças e jovens são públicos para os quais Deus deu toda a atenção. Jesus Cristo foi procurado por jovens e tem uma mensagem para eles”.
Ao acatarem a determinação da SBB para que tirasse do ar as versões da Bíblia “ilegais” aos olhos daquela organização, aqueles que as utilizavam em sites e aplicativos passam a bola para o campo da SBB. Sobre os que fazem parte daquela organização recai agora a responsabilidade diante de Deus de sua própria afirmação de transmitir ou não o que pode ser útil a toda uma geração. Espero que a SBB e outras organizações cristãs detentoras de direitos sobre Bíblias e livros cristãos façam isso com a maior celeridade, pois diante do Senhor não há como alegar que lhe faltam recursos com tantos voluntários que tentaram ajudar, cada um à sua maneira, e foram impedidos por intimações legais.
Aos responsáveis pelo trabalho da SBB peço que não tomem isso como uma crítica às pessoas que fazem esse grande trabalho da SBB que faz chegar a Bíblia impressa a tanta gente em lugares inacessíveis deste Brasil. Esse trabalho é fantástico, eles vendem Bíblias a preço de jornal, algo que ninguém seria capaz de fazer se não tivesse realmente o desejo de levar a Palavra de Deus às pessoas. Minha intenção é fazer um alerta, um “wake up call”, chamar a atenção, tipo “Cara acorda! O mundo mudou!” Se vocês alegam que precisam proteger suas versões porque os recursos que recebem são parcos, então aceitem a ajuda desse batalhão de voluntários querendo levar a Palavra de Deus a lugares onde talvez a Bíblia impressa ou os formatos que vocês disponibilizam não seriam capazes de chegar. Aquela oração que vocês fizeram pedindo recursos para levar a Bíblia a mais gente, eu creio que já foi respondida. Vocês é que não quiseram aceitar a resposta de Deus que ofereceu centenas ou milhares de voluntários para levar a Palavra de Deus a mais leitores.
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Na Bíblia existe o casamento civil?
Sim, na Bíblia encontramos o casamento civil e é ele, acompanhado da união que é feita por Deus segundo o propósito de um homem e uma mulher de se unirem, que determina quando duas pessoas mudam seus status de solteiras para casadas. Apesar de a legislação brasileira prever hoje a chamada “união estável” como suficiente para a formação de uma célula familiar, essa união não é a mesma coisa de um matrimônio civil, e é fácil de perceber as razões.
A união estável não altera o estado civil das pessoas, portanto elas continuam identificadas como solteiras. Já o casamento civil dá aos cônjuges o status de casado. Assim, se você se acostumou a dizer aos outros que é casado por viver em uma união estável, sinto informar que sua afirmação falta com a verdade. Você é solteiro. Na união estável o homem e a mulher não são legalmente considerados cônjuges, mas companheiros.
Por esta razão um cristão que deseje andar em obediência à Palavra de Deus não poderá alegar estar casado — e a Bíblia contempla o casamento — a menos que providencie seu matrimônio civil. O casamento é um ato formal e solene e exige um processo de habilitação e celebração feita por um juiz de paz ou de direito. Ao dar entrada com a documentação, o cartório publica um edital para descobrir se não existe algum impedimento à união do casal. Isso já não acontece na união estável, e até mesmo existe jurisprudência em que pessoas apenas separadas e nem ainda oficialmente divorciadas podem obter a união estável dependendo da interpretação do cartório. Em países ou tribos onde existam outras formalidades para serem considerados casados naquela sociedade e diante de suas respectivas autoridades, caberá aos cristãos seguirem essas formalidades.
Do ponto de vista divino, naquilo que a tradição se acostumou a chamar de “casamento religioso” a verdade é que ninguém tem o poder de unir um casal em matrimônio perante Deus. Isso não impede que um casal cristão, que tenha se unido no matrimônio civil diante de um juiz de paz, promova também uma festa convidando um irmão para dirigir uma palavra aos ouvintes ou mesmo fazer uma oração pelos noivos. Mas ele nunca os declarará marido e mulher perante Deus. Isto é um costume estranho à Palavra de Deus e foi aceito pelo protestantismo juntamente com outras coisas que trouxeram do catolicismo romano.
O casamento civil, por sua vez, é um contrato lavrado na presença de testemunhas e com a autoridade delegada pelo Estado ao juiz de paz, que declara: “De acordo com a vontade de ambos, que acabais de pronunciar perante mim, de vos receberdes por marido e mulher, eu, em nome da lei, vos declaro casados”. Isso muda dependendo do país ou da época, mas temos sim exemplos de contratos firmados na Bíblia para a união civil, bem como envolvendo questões relacionadas à herança de linhagem (antigamente não existiam sobrenomes) e bens. Um casamento bem completo é o matrimônio civil de Boaz e Rute, celebrado “à porta da cidade” que era o equivalente ao cartório da época, e na presença das autoridades (juízes) e testemunhas:
“Então Boaz disse aos anciãos e a todo o povo: Sois hoje testemunhas de que tomei tudo quanto foi de Elimeleque, e de Quiliom, e de Malom, da mão de Noemi, e de que também tomo por mulher a Rute, a moabita, que foi mulher de Malom, para suscitar o nome do falecido sobre a sua herança, para que o nome do falecido não seja desarraigado dentre seus irmãos e da porta do seu lugar; disto sois hoje testemunhas. E todo o povo que estava na porta, e os anciãos, disseram: Somos testemunhas; o Senhor faça a esta mulher, que entra na tua casa, como a Raquel e como a Lia, que ambas edificaram a casa de Israel; e porta-te valorosamente em Efrata, e faze-te nome afamado em Belém. E seja a tua casa como a casa de Perez (que Tamar deu à luz a Judá), pela descendência que o Senhor te der desta moça. Assim tomou Boaz a Rute, e ela lhe foi por mulher; e ele a possuiu, e o Senhor lhe fez conceber, e deu à luz um filho” (Rt 4:9-13).
Aos olhos de Deus o casal será considerado neste novo status de casados quando cumprir com as obrigações legais das autoridades de seu país. Enquanto isso não acontece eles são solteiros. A Palavra de Deus mostra que o cristão deve viver em obediência às autoridades instituídas por Deus no governo do mundo:
“Toda a alma esteja sujeita às potestades superiores; porque não há potestade que não venha de Deus; e as potestades que há foram ordenadas por Deus. Por isso quem resiste à potestade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos a condenação. Porque os magistrados não são terror para as boas obras, mas para as más. Queres tu, pois, não temer a potestade? Faze o bem, e terás louvor dela. Porque ela é ministro de Deus para teu bem. Mas, se fizeres o mal, teme, pois não traz debalde a espada; porque é ministro de Deus, e vingador para castigar o que faz o mal. Portanto é necessário que lhe estejais sujeitos, não somente pelo castigo, mas também pela consciência. Por esta razão também pagais tributos, porque são ministros de Deus, atendendo sempre a isto mesmo. Portanto, dai a cada um o que deveis: a quem tributo, tributo; a quem imposto, imposto; a quem temor, temor; a quem honra, honra” (Rm 13:1-7).
Então o que é um casal em união estável? Não é um casal aos olhos de Deus, pois nem sequer a lei de nosso país lhes atribui o status de casados ou cônjuges. Perante a lei brasileira eles são considerados companheiros solteiros. Talvez você alegue que isso seja diferente de uma condição de fornicação entre dois solteiros que praticam sexo casual, mas eu pergunto: Quando foi que a relação casual se transformou numa união formal? Se a Bíblia mostra que contratos devem ter ao menos duas testemunhas, quando foi que isso aconteceu de forma oficial e solene diante de duas testemunhas? “Por boca de duas ou três testemunhas será confirmada toda a palavra” (2 Co 13:1). As “bodas de Caná” são um exemplo de uma união formal reconhecida até por Jesus, que inclusive fez ali seu primeiro milagre (João 2).
Alguns alegam que seria o ato sexual o que definiria se duas pessoas são ou não casadas, mas não é assim na Bíblia. Quando Deus uniu Adão e Eva formando um casal, isso foi feito sem um ato sexual. Esse ato viria depois como um selo daquele contrato, mas não como o fator determinante. Mesmo porque existem muitos casais que se unem em matrimônio e por questões diversas não podem consumar um ato sexual, e nem por isso são considerados menos casados. Além disso, aprendemos da Palavra de Deus que o sexo fora do casamento é considerado uma união espúria: “Por causa da prostituição, cada um tenha a sua própria mulher, e cada uma tenha o seu próprio marido… Fugi da prostituição. Todo o pecado que o homem comete é fora do corpo; mas o que se prostitui peca contra o seu próprio corpo” (1 Co 7:2; 6:18). Se o casamento se iniciasse no ato sexual então Deus não iria considerar imoral a união sexual de dois solteiros.
Cabe aqui acrescentar algumas passagens mostrando a importância que Deus dá ao casamento, inclusive fazendo dele um tipo da esperada união a ser celebrada nas bodas do Cordeiro, quando Cristo receberá a Igreja ataviada como esposa. Talvez seja por isso que Jesus, dirigindo-se a Maria nas bodas de Caná, disse: “Ainda não é chegada a minha hora” (Jo 2:4). Matrimônio não é algo que ocorre pela repetição de um costume de dois dormirem juntos, mas tem uma hora determinada para começar. A de Cristo ainda está por vir, e quando acontecer será motivo de júbilo: “Regozijemo-nos, e alegremo-nos, e demos-lhe glória; porque vindas são as bodas do Cordeiro, e já a sua esposa se aprontou” (Ap 19:7).
“E da costela que o Senhor Deus tomou do homem, formou uma mulher, e trouxe-a a Adão. E disse Adão: Esta é agora osso dos meus ossos, e carne da minha carne; esta será chamada mulher, porquanto do homem foi tomada. Portanto deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e apegar-se-á à sua mulher, e serão ambos uma carne” (Gn 2:22-24).
“Vós, mulheres, sujeitai-vos a vossos maridos, como ao Senhor; porque o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja, sendo ele próprio o salvador do corpo. De sorte que, assim como a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo sujeitas a seus maridos. Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela, para a santificar, purificando-a com a lavagem da água, pela palavra, para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível. Assim devem os maridos amar as suas próprias mulheres, como a seus próprios corpos. Quem ama a sua mulher, ama-se a si mesmo. Porque nunca ninguém odiou a sua própria carne; antes a alimenta e sustenta, como também o Senhor à igreja; porque somos membros do seu corpo, da sua carne, e dos seus ossos. Por isso deixará o homem seu pai e sua mãe, e se unirá a sua mulher; e serão dois numa carne. Grande é este mistério; digo-o, porém, a respeito de Cristo e da igreja. Assim também vós, cada um em particular, ame a sua própria mulher como a si mesmo, e a mulher reverencie o marido” (Ef 5:22-33).
“Porém, desde o princípio da criação, Deus os fez macho e fêmea. Por isso deixará o homem a seu pai e a sua mãe, e unir-se-á a sua mulher, e serão os dois uma só carne; e assim já não serão dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem” (Mc 10:6-9).
Isto é o que determina a Palavra de Deus: o matrimônio é formado por um macho e uma fêmea, é feito de maneira solene e diante de uma autoridade e com testemunhas, na parte que tange aos homens, e naquilo que diz respeito a Deus é ele quem une, e não um padre, sacerdote ou pastor. Mas vejo que alguns têm dificuldade em entender isso por não entenderem que em nenhum lugar da doutrina dos apóstolos existe a figura do sacerdote ou pastor como um líder de uma congregação e das reuniões dos cristãos. Nenhum padre ou pastor tem autoridade para lavrar o matrimônio, quem tem autoridade é o juiz de paz. Dependendo da legislação do país qualquer cidadão pode obter uma autorização com poderes de autoridade civil para fazer isso.
Aí você talvez pergunte: “Então onde entra o pastor ou padre na celebração do casamento?” A resposta é que não existe “pastor” na doutrina dos apóstolos neste sentido de um homem à frente de uma congregação. Pastor é um dos dons, como evangelista e mestre, dados à igreja como um todo e não a uma congregação em particular. Sugiro ler o livro “A Ordem de Deus”, de Bruce Anstey, que mostra que a figura do “pastor” das denominações protestantes foi emprestada do “sacerdote” judeu e católico, mas não existe na doutrina ensinada pelos apóstolos. Tente encontrar o “pastor” na descrição de uma reunião da igreja em 1 Coríntios 14 a partir do versículo 26 quando diz: “Que fazer, pois, irmãos? Quando vos reunis…”, você não achará um homem à frente da congregação dirigindo essa reunião.
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Como usar os recursos da coleta?
Se você já entendeu que os salvos por Cristo da atual dispensação são a Igreja, uma companhia de pessoas com vocação celestial que formam o corpo de Cristo, e não Israel, o povo de Deus do passado que foi escolhido para uma vocação terrena, então terá entendido que o dízimo não se aplica nesta dispensação. Muitas outras coisas que haviam sido ordenadas na Lei dada a Moisés, como templos, sacrifícios, sacerdotes, utensílios santos, etc., igualmente ficaram para trás e são para o cristão figuras das realidades apresentadas em Cristo no Novo Testamento, em especial nas epístolas. Se não entendeu isso é melhor fazer uma leitura atenta da carta aos Hebreus que mostra que hoje temos coisas melhores do que as que tinham os israelitas que lidavam na terra com coisas materiais que eram figuras de coisas celestiais.
Mas por não existir o dízimo na Igreja será que o cristão não teria de ofertar algo daquilo que Deus lhe dá? Teria sim, mas os recursos da assembleia ou igreja devem vir da coleta, e esta oferta não está baseada em uma porcentagem do que recebe por provisão de Deus, mas segundo o coração de cada um. Numa assembleia congregada ao nome do Senhor são estes os recursos que ela terá, não para sustentar algum líder assalariado, mas para as necessidades da assembleia como um todo. Ela também poderá receber ofertas de outras assembleias, quando existirem necessidades específicas e eventuais, como vemos os cristãos fazerem nas epístolas quando enviavam ajuda para assembleias de regiões assoladas pela fome.
Todavia, não vejo na Bíblia algum respaldo para se pedir dinheiro ou estabelecer quanto cada um deva dar, mas certamente encontramos a exortação para sermos generosos. Onde estou congregado com outros irmãos somente ao nome do Senhor costumamos fazer menção a isso quando existe alguma necessidade extraordinária, como por exemplo quando decidimos promover uma conferência ou encontro visando convidar irmãos de outras assembleias. Mas isso não é feito no sentido de constranger ou exigir uma quantia específica de cada um, mas apenas para nortear os exercícios dos irmãos diante de uma necessidade extraordinária.
Uma das necessidades da assembleia pode ser a de um local apropriado para os irmãos se reunirem. É sempre um privilégio irmãos poderem abrir suas casas para receber a assembleia, e vemos na Palavra que assim faziam alguns irmãos do primeiro século. Tive o privilégio de hospedar as reuniões da assembleia dos irmãos reunidos em São Paulo quando ela teve início no minúsculo apartamento onde morava. As reuniões eram na pequena sala que não era suficiente para abrigar todos os irmãos. Então as crianças sentavam-se no chão e nos dois corredores, um que dava para a cozinha e outro para os quartos, colocávamos banquinhos com uma tábua sobre eles para criar um banco comprido onde irmãos mais jovens se sentavam olhando para a parede. Eles podiam ouvir o que era ministrado, mas só viam parede diante de si. Apesar das dificuldades, o que guardo na memória são dias felizes que deixaram saudades, pois às vezes os irmãos chegavam com algumas horas de antecedência e iam embora bem depois de a reunião terminar. Tínhamos prazer em estar juntos conversando da Palavra, comendo uma refeição e principalmente lembrando o Senhor e anunciando sua morte no partir do pão à ceia do Senhor.
Com o tempo e conforme a necessidade a assembleia acabou mudando-se para diferentes lugares, sempre tentando abrigar melhor os irmãos. Sabemos que quando as reuniões são na casa de algum irmão ou irmã isso pode trazer alguns percalços se a pessoa tiver incrédulos na família ou se não puder viajar por causa das reuniões. Se a assembleia crescer, um número muito grande de pessoas pode acarretar problemas com limpeza, dificuldade de usar banheiro ou mesmo ruído excessivo quando o irmão ou irmã residirem em um apartamento. Os vizinhos podem acabar reclamando. É preciso lembrar também dos estranhos que vez ou outra aparecerão, nem sempre pessoas realmente convertidas ou com boas intenções. Por serem reuniões caseiras essas pessoas podem pensar que ali o que vale é a informalidade, e acabarem dando palpites no meio da reunião, o que talvez não fariam em um ambiente não domiciliar.
Uma forma prática de se contornar todos esses problemas é buscando um lugar maior e que dê mais conforto para os irmãos, permita maior privacidade no sentido de diminuir a ideia de informalidade que visitantes possam ter, e às vezes até como forma de escolher um bairro mais acessível a um maior número de irmãos em cidades grandes onde o transporte seja um problema. Devemos lembrar que as coisas do Senhor devem vir em primeiro lugar em nossa vida, por isso não há nada de errado em se utilizar dos recursos da assembleia para se alugar um espaço, embora eu particularmente considere que comprar não seria a melhor opção, uma vez que poderia criar problemas com herdeiros caso um dos irmãos incluídos na escritura do imóvel venha a falecer. O que algumas assembleias fazem para contornar isso é criar uma sociedade sem fins lucrativos apenas para possuir o imóvel, o qual então é emprestado ou alugado para a assembleia poder se reunir ali.
Além das necessidades permanentes, como a de um espaço de reuniões, gastos com manutenção, limpeza, auxílio a outras assembleias e provisão para receber irmãos de fora em reuniões especiais, os recursos da coleta podem também ser utilizados para ajudar irmãos que se dedicam à obra do Senhor levando o evangelho ou visitando irmãos e assembleias. Existem alguns que fazem isso entre os irmãos congregados ao nome do Senhor, mas obviamente eles nunca pedem ajuda à assembleia, e nem esta tem um vínculo ou obrigação permanente de auxiliá-los. Eles oram ao Senhor e o Senhor move corações neste sentido, tanto de irmãos individualmente, como da assembleia como um todo para eventualmente auxiliá-los em alguma obra em especial ou até em suas necessidades pessoais.
Quanto às necessidades dos santos quando ficam desempregados, onde congrego temos aprendido que é um assunto muito delicado, e já erramos tanto por falta como por excesso. Imagine que exista uma irmã congregada que tenha um marido incrédulo que fique desempregado. Aí a assembleia decide separar um auxílio mensal para as necessidades da família, o que pode levar o marido incrédulo a parar de procurar emprego por sentir-se confortável naquela situação. A irmã crente obviamente também acabará se acostumando até o dia em que os recursos forem interrompidos. Todos sabemos que até nas famílias mais unidas surgem problemas na hora de dividir o dinheiro de uma venda de imóvel ou herança. Então deixo para você imaginar o resto da história.
A assembleia não tem o papel de substituir o exercício individual que cada um tem de trabalhar para sustentar sua própria casa, e a exceção a isso eu vejo na Palavra que era feita em casos extraordinários, como de uma fome inesperada numa região, ou localmente no caso de viúvas. Ainda assim vemos que esse recurso era restrito às verdadeiramente necessitadas, que não têm filhos que possam ajudá-las a se sustentar. Aprendemos disso que o auxílio da assembleia é algo extraordinário, e não deve se transformar em um “salário” ou “cesta básica”, pois isso pode levar um irmão, irmã ou cônjuge incrédulo a se acomodar à situação de eventual falta de trabalho.
Leia atentamente esta passagem e você verá que ela impõe condições bem claras ao auxílio prestado pela assembleia, deixando claro que o dinheiro obtido por meio da coleta espontânea feita no Dia do Senhor não é um recurso para todos em todas as situações.
“Honra as viúvas verdadeiramente viúvas. Mas, se alguma viúva tem filhos ou netos, que estes aprendam primeiro a exercer piedade para com a própria casa e a recompensar a seus progenitores; pois isto é aceitável diante de Deus. Aquela, porém, que é verdadeiramente viúva e não tem amparo espera em Deus e persevera em súplicas e orações, noite e dia; entretanto, a que se entrega aos prazeres, mesmo viva, está morta. Prescreve, pois, estas coisas, para que sejam irrepreensíveis. Ora, se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente. Não seja inscrita senão viúva que conte ao menos sessenta anos de idade, tenha sido esposa de um só marido, seja recomendada pelo testemunho de boas obras, tenha criado filhos, exercitado hospitalidade, lavado os pés aos santos, socorrido a atribulados, se viveu na prática zelosa de toda boa obra. Mas rejeita viúvas mais novas, porque, quando se tornam levianas contra Cristo, querem casar-se, tornando-se condenáveis por anularem o seu primeiro compromisso. Além do mais, aprendem também a viver ociosas, andando de casa em casa; e não somente ociosas, mas ainda tagarelas e intrigantes, falando o que não devem. Quero, portanto, que as viúvas mais novas se casem, criem filhos, sejam boas donas de casa e não deem ao adversário ocasião favorável de maledicência. Pois, com efeito, já algumas se desviaram, seguindo a Satanás. Se alguma crente tem viúvas em sua família, socorra-as, e não fique sobrecarregada a igreja, para que esta possa socorrer as que são verdadeiramente viúvas. Devem ser considerados merecedores de dobrados honorários os presbíteros que presidem bem, com especialidade os que se afadigam na palavra e no ensino. Pois a Escritura declara: Não amordaces o boi, quando pisa o trigo. E ainda: O trabalhador é digno do seu salári.” (1 Tm 5:3-18).
Alguns pontos deste texto devem ser observados. Primeiro, existem pessoas (no caso aqui as viúvas) que são realmente necessitadas, outras não. O irmão ou irmã passando por um problema de desemprego com uma Ferrari na garagem certamente possui recursos para se manter se estiver disposto a cortar na própria carne ao invés de esperar a beneficência de outros. A assembleia também não é uma instituição filantrópica ou de beneficência voltada a resolver o problema da pobreza e da fome no mundo. Hoje é comum as chamadas “igrejas” da cristandade se transformarem em entidades assistenciais, e a tendência é cada vez maior justamente em países desenvolvidos, onde “igreja” se tornou sinônimo de obra beneficente, uma vez que nos países principalmente da Europa existem até mesmo clérigos agnósticos e ateus dirigindo essas congregações. Quando você tira Cristo como centro e motivo da reunião dos cristãos, a caridade acaba sendo um substituto aceito e louvado pela sociedade incrédula para justificar a existência de um agrupamento de cristãos. Lembre-se de que na cabeça de um incrédulo, que não compreende a salvação pela fé em Cristo e no seu sacrifício, “cristão” é aquele que está tentando ir para o céu fazendo caridade.
Mas será que é isso o que encontramos na doutrina dos apóstolos? Aqueles que individualmente quiserem fazer algo com seus próprios recursos para ajudar necessitados, enfermos, drogados, independente de quem sejam ou onde estejam, podem fazer isso como uma iniciativa pessoal sem envolver a assembleia. Mas os recursos da assembleia devem ser voltados para as necessidades da própria assembleia, e talvez um versículo que nos ajude a entender isso seja este, dirigido inicialmente às igrejas da Galácia: “E não nos cansemos de fazer o bem, porque a seu tempo ceifaremos, se não desfalecermos. Por isso, enquanto tivermos oportunidade, façamos o bem a todos, mas principalmente aos da família da fé” (Gl 6:9-10). Os “da família da fé” são crentes, não incrédulos.
No caso de irmãs viúvas e necessitadas que tenham familiares em comunhão, os parentes devem ser os primeiros a ajudar. Quando não ajudam, a opinião que Deus tem deles é a pior possível: “Se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente” (1 Tm 5:8). O auxílio é restrito às que são verdadeiramente viúvas e sem nenhuma fonte de recursos ou familiares crentes que possam ajudá-las. Mas o apóstolo ainda ensina que alguém assim deve ter tido uma história de dedicação ao marido, aos filhos e aos irmãos em suas necessidades. Obviamente ele não está aqui falando de viúvas que vivam ociosas ou estejam em busca de um novo relacionamento, como o apóstolo diz no final da passagem, e nem daquelas que nunca tiveram um exercício sequer de hospitalidade, cuidado e liberalidade para com as necessidades dos santos.
O texto inclui também aqueles que trabalham na obra do Senhor ou se afadigam na Palavra e no ensino. Apesar de não existir aqui a ideia de um salário mensal, embora algumas traduções, como a Almeida Revista e Atualizada, possam induzir esse pensamento ao colocar “dobrados honorários”, o sentido é melhor traduzido pela Almeida Revista e Corrigida como “duplicada honra”, a continuação que usa o exemplo do boi que debulha, mostra que é obrigação da assembleia verificar se esses irmãos estão tendo os recursos necessários para que seu trabalho na obra do Senhor não seja interrompido. Nos países de tradição católica muitos chegam à coleta com as moedas que sobraram do troco da padaria, condicionados que fomos a pensar que a coleta seja uma esmola. Mas a Palavra de Deus não fala em esmola, mas em recursos para a obra do Senhor e para os que são realmente necessitados.
Se você vê um irmão ou irmã empenhado ativamente na obra do evangelho e nas visitas aos irmãos, tendo despesas com a própria família por abrirem mão de um trabalho secular, e também gastando com viagens, hospedagem e material de evangelização, de onde você acha que ele obteve aqueles recursos? Certamente não terá sido de alguma esmola no estilo ao que estamos acostumados. Sem pedir nada a ninguém, ele deve ter orado ao Senhor e apresentado ao Senhor da seara suas necessidades. Então o próprio Senhor, que é o maior interessado na sua obra e é quem envia os obreiros, terá movido corações, tanto de irmãos individualmente, como de assembleias coletivamente, para auxiliarem em suas necessidades.
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Vai ter Chip, Lua Vermelha, Tsunami, Trombetas, Blue Beam, etc.?
Se eu cobrasse um real de cada pessoa que me pergunta se é verdade algum vídeo ou texto conspiratório e sensacionalista eu logo estaria milionário. É impossível prever qual será a teoria conspiratória de amanhã que irá tirar o sono de quem faz parte da turma do “me engana que eu gosto”. Eu já fiz parte dessa turma, porém antes de minha conversão, quando era espiritualista e crédulo ao extremo. Só para você ter uma ideia, eu dormia debaixo de uma pirâmide de arame na escala da Pirâmide de Quéops, e jurava que minha lâmina de barbear ficava mais afiada depois de algumas horas absorvendo sua energia. Se na época já existisse celular eu teria jogado fora o carregador do meu.
Hoje são os que se dizem cristãos, os melhores clientes da sinistrose pregada pelos falsos profetas que abundam nas igrejas. Será isso alguma epidemia de masoquismo a afligir a cristandade? Talvez a melhor cura para este mal esteja neste versículo de Provérbios 14:15: “O ingênuo acredita em tudo o que se diz” (Bíblia Versão Ave Maria). Mas o crédulo supersticioso não vai acreditar e ainda dirá que sou agente do Vaticano por ter usado uma versão católica da Bíblia nesta citação. Caso você não saiba, o Vaticano é aquele que teria supostamente adulterado a Bíblia que dizem que foi adulterada, mas que ninguém tem o original para provar.
Fico ponderando quanta gente mais irá me perguntar sobre o chip da Dilma que agora virou chip do Temer? Sobre o suposto tsunami que vai varrer o Brasil? Sobre a lua de sangue, a Terceira Guerra Mundial e o próximo fim do mundo? Sobre gente que está ouvindo trombetas tocando em Israel? Sobre o Projeto Blue Beam que vai fazer você pensar que viu o que nunca existiu? Não, nada a ver com o Projeto Mr. Bean. Se for sobre uma destas ou outras teorias conspiratórias que você pretende saber mais, por favor, pegue a senha, entre na fila e espere. Sentado.
Se você gosta mesmo de acreditar em duendes e teorias conspiratórias, então vou inventar mais uma: será que todos esses boatos não fariam parte de uma estratégia diabólica para tirar o sono dos cristãos e fazê-los viver uma vida miserável neste mundo? Será que Satanás não está rindo à beça de ver como é fácil tirar a paz e o foco de alguns para que deixem de esperar pela vinda do Senhor e passem a esperar por tragédias?
Se você não acredita que o diabo esteja por detrás desses boatos para criar inquietação e, apesar de meu alerta, quiser encontrar uma maneira de se defender dessas coisas, aqui vão algumas ideias. No caso de alguém implantar um chip em sua mão, compre uma pulseira magnética que o chip já era. Acaso você nunca guardou a chave magnética do quarto do hotel no mesmo bolso do celular e só descobriu quando chegou na porta com a bexiga estourando? Se o tsunami for sua maior preocupação, compre uma casa no Pico da Neblina ou um escafandro. Para Lua de Sangue e Projeto Blue Beam, que supostamente iria servir também para as projeções holográficas no céu, a solução é uma cortina bem grossa ou óculos escuros.
Satanás é ladino e muitos não percebem que quando dão ouvidos a esses boatos estão caindo como patinhos na estratégia dele, que é a de tirar dos cristãos o foco que deveria estar em Cristo e em sua vinda. “Ah”, dirá você, “mas a vinda de Cristo não será com sinais, tragédias e um tempo de grande tribulação?”. Sim, a vinda dele para julgar as nações e estabelecer seu reino será assim, mas antes dessa hora ele vem buscar sua Igreja e a esta prometeu: “Eu te guardarei da hora da provação que há de vir sobre o mundo inteiro, para experimentar os que habitam sobre a terra” (Ap 3:10). Mesmo que você não acredite que será nesta ordem, então vou lhe dar algo para pensar que não fará diferença se você for pré, meso ou pós tribulacionista: você está esperando pela vinda de Cristo ou pelo Cristo da vinda?
São os falsos profetas, que hoje vestem terno e gravata, trazem títulos eclesiásticos e teológicos, e vociferam suas falsas profecias de cima de seus púlpitos nos intervalos dos apelos por mais ofertas. Se você fosse um deles iria também querer uma boa teoria conspiratória para manter a adrenalina no máximo. Gente dormindo nos cultos não enfia a mão no bolso. Quem cai nessa conversa não percebe que o “outro evangelho”, do qual o Espírito Santo alertou através de Paulo, pode tomar diferentes cores e sabores, mas sempre traz um elemento comum: INQUIETAÇÃO.
Por que razão um verdadeiro salvo por Cristo iria viver de sobressaltos se sabe que seus pecados foram TODOS pagos e ele está pronto para a glória? E daí se um suposto “chip da Dilma” for remanufaturado para “chip do Temer”? E daí se um tsunami varrer o Brasil e o sertão virar mar e o mar virar sertão? (Xi, roubaram a profecia do Antonio Conselheiro!). E daí se a Lua ficar tão vermelha quanto picanha e o Mr. Beam começar a projetar imagens falsas no céu? Em que está firmada sua fé, na segurança etérea desta vida ou na pessoa de Cristo Jesus? Que tipo de cristianismo você aceitou que transformou sua vida numa angústia permanente? “E esta é a promessa que ele nos fez: a vida eterna. Estas coisas vos escrevi ACERCA DOS QUE VOS ENGANAM” (1 Jo 2:25-26).
Quando eu achava que já tinha visto de tudo alguém me envia a letra da música “Índio” de Caetano Veloso, com suas frases enigmáticas como “Um índio descerá de uma estrela colorida e brilhante, de uma estrela que virá numa velocidade estonteante, e pousará no coração do hemisfério sul, na América, num claro instante…Virá, impávido que nem Mohammed Ali… Tranquilo e infalível como Bruce Lee… Em todo sólido, todo gás e todo líquido…”.
Com a letra que me foi enviada veio a pergunta: “Será que isso não seria uma profecia que está para se cumprir?!” Perguntei se ele estava de brincadeira, mas era sério. Disse que devemos examinar tudo porque Deus pode estar querendo nos revelar algo na música.
Isso me ajudou a entender a razão de os mercenários da fé nadarem de braçada nessa cristandade ávida por sensações e inquietações. Ficar examinando tudo em busca de alguma profecia e adivinhação não é diferente de tentar achar significado na borra do café ou no modo com os búzios caem no colo da vidente, ou o caminho das linhas da mão examinada pela cigana. É tudo a mesma coisa, a mesma superstição, a mesma tentativa de adivinhação pagã que acha que cada pedra tem algo a dizer, que as nuvens formam cachorrinhos no céu e que abraçar árvores nos enche de bioenergia. Fico até pensando se quando a Celly Campello cantava “Tomo banho de Lua…” ela não estaria querendo dizer algo…
O ser humano é realmente muito crédulo e qualquer bobagem que alguém diga pode cativá-lo. Lembre-se, “O ingênuo acredita em tudo o que se diz” (Pv 14:15). Neste caso muitos que se denominam evangélicos não são diferentes dos católicos supersticiosos que enxergam “Nossa Senhora” na mancha de bolor da parede. Ao que me escreveu perguntando da “revelação” do índio do Caetano eu respondi que no dia em que ele terminar de descobrir todas as revelações que Deus nos deixou em sua palavra, então que gaste seu tempo procurando nas letras do Caetano. Ele não gostou.
“Maravilho-me de que tão depressa passásseis daquele que vos chamou à graça de Cristo para outro evangelho; o qual não é outro, mas há ALGUNS QUE VOS INQUIETAM e querem transtornar o evangelho de Cristo. Mas, ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos anuncie outro evangelho além do que já vos tenho anunciado, seja anátema. Assim, como já vo-lo dissemos, agora de novo também vo-lo digo. Se alguém vos anunciar outro evangelho além do que já recebestes, seja anátema” (Gl 1:6-9).
Satanás não pode tirar a salvação de um verdadeiro crente em Cristo, mas pode inquietá-lo, desviar o seu olhar para ocupar-se com fantasias, perturbá-lo, atrapalhando sua comunhão e testemunho neste mundo. Sim, essas coisas atrapalham também o testemunho, pois não são poucos os ímpios que rolam de rir da ignorância de alguns que seguem as “profetadas” dos lobos no rádio e na TV, os mesmos que vendem Bíblias superfaturadas, azeite ungido, sal do Mar Morto e outros objetos para alimentar a superstição do fiel e encher os bolsos do pastor. Hoje qualquer cristão sincero precisa lidar o tempo todo com aquele olhar zombeteiro ao evangelizar alguém, pois no balãozinho de pensamentos sobre a cabeça do incrédulo está a seguinte pergunta: “Será que esse é o estelionatário que pede dinheiro ou o otário que dá?”.
“Se alguém ensina outra doutrina e não concorda com as sãs palavras de nosso Senhor Jesus Cristo e com o ensino segundo a piedade, é enfatuado, nada entende, mas tem mania por questões e contendas de palavras, de que nascem inveja, provocação, difamações, suspeitas malignas, altercações sem fim, por homens cuja mente é pervertida e privados da verdade, SUPONDO QUE A PIEDADE É FONTE DE LUCRO” (1 Tm 6:3-5).
Conhece alguém que faz da piedade fonte de lucro e vive assombrando seus seguidores com alarmes falsos? Fuja dele. Siga o verdadeiro PASTOR de nossas almas, que não atribula suas ovelhas com sensacionalismo barato, mas lhes dá tranquilidade.
“Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração; e ACHAREIS DESCANSO para a vossa alma” (Mt 11:28-29).
“Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me MANSAMENTE A ÁGUAS TRANQUILAS” (Sl 23:2).
Jesus diz: “Aquele, porém, que entra pela porta é o pastor das ovelhas. A este o porteiro abre, e as ovelhas ouvem a sua voz, e chama pelo nome às suas ovelhas, e as traz para fora. E, quando tira para fora as suas ovelhas, vai adiante delas, e as ovelhas o seguem, porque conhecem a sua voz. Mas de modo nenhum seguirão o estranho, antes fugirão dele, porque não conhecem a voz dos estranhos… Todos quantos vieram antes de mim são ladrões e salteadores; mas as ovelhas não os ouviram. Eu sou a porta; se alguém entrar por mim, salvar-se-á, e entrará, e sairá, e achará pastagens. O ladrão não vem senão a roubar, a matar, e a destruir; eu vim para que tenham vida, e a tenham com abundância. Eu sou o bom Pastor; o bom Pastor dá a sua vida pelas ovelhas. Mas o mercenário, e o que não é pastor, de quem não são as ovelhas, vê vir o lobo, e deixa as ovelhas, e foge; e o lobo as arrebata e dispersa as ovelhas. Ora, o mercenário foge, porque é mercenário, e não tem cuidado das ovelhas. Eu sou o bom Pastor, e conheço as minhas ovelhas, e das minhas sou conhecido. Assim como o Pai me conhece a mim, também eu conheço o Pai, e dou a minha vida pelas ovelhas” (Jo 10:1-15).
“Ora, irmãos, rogamo-vos, pela vinda de nosso Senhor Jesus Cristo, e pela nossa reunião com ele, que não vos movais facilmente do vosso entendimento, NEM VOS PERTURBEIS, quer por espírito, quer por palavra, quer por epístola, como de nós, como se o dia de Cristo estivesse já perto” (2 Ts 2:1).
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Como me preparar para evangelizar?
Todo cristão deveria estar preparado e disposto a falar do evangelho, conforme nos ensina Pedro em sua carta: “Antes, santificai ao Senhor Deus em vossos corações; e estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós” (1 Pe 3:15). Nem todos têm o dom de evangelista, mas podem comunicar o evangelho de alguma maneira. Timóteo provavelmente não tinha o dom de evangelista quando Paulo o exortou: “Tu, porém, sê sóbrio em todas as coisas, suporta as aflições, faze o trabalho de um evangelista” (2 Tm 4:5).
Para todos os efeitos devemos ter em mente que o único capaz de convencer um pecador do pecado e da justiça, levando-o a crer no Salvador, é o Espírito Santo. Portanto nenhuma técnica de persuasão irá convencer verdadeiramente uma pessoa. Algumas denominações enviam seus pastores para treinamentos de persuasão porque o que buscam não é abrir os corações dos ouvintes para o evangelho da salvação, mas entrar em suas mentes e manipulá-los para abrir seus bolsos.
Se não podemos fazer nada para salvar um pecador com nossa pregação, podemos fazer muito para que a mensagem de salvação chegue até ele sem ruídos e interferências a fim de a Palavra de Deus ser transformada em vida e salvação em sua alma. Pregar o evangelho é uma interação na qual o papel do pregador é ajudar o ouvinte a fazer um diagnóstico de sua condição e apresentá-lo a Cristo como o Salvador. Um bom roteiro é a pregação de Pedro a Cornélio e seus companheiros no livro de Atos. Cornélio não era um pagão, mas um prosélito, isto é, um gentio convertido ao judaísmo. A Palavra de Deus já havia atingido sua alma e lhe incutido vida, porém ainda não era um homem salvo por não conhecer a obra de Cristo para salvá-lo. Então Pedro apresenta os pontos principais de sua mensagem que aparece em Atos 10:34-44:
“Então, falou Pedro, dizendo: Reconheço, por verdade, que Deus não faz acepção de pessoas; pelo contrário, em qualquer nação, aquele que o teme e faz o que é justo lhe é aceitável” (At 10:34-35).
Até aqui o que Cornélio já sabia, pois como dizia no início do capítulo, ele era um homem “piedoso e temente a Deus com toda a sua casa e que fazia muitas esmolas ao povo e, de contínuo, orava a Deus” (At 10:2). Então Pedro traz uma novidade para Cornélio: “Esta é a palavra que Deus enviou aos filhos de Israel, anunciando-lhes o evangelho da paz, por meio de Jesus Cristo. Este é o Senhor de todos” (At 10:36).
Não existe um evangelho à parte do Nome de Jesus, porque nenhum outro nome foi dado entre os homens para que sejamos salvos. Por isso se a sua pregação falar de um milhão de verdades da Bíblia e deixar de fora o nome de Jesus, tudo o que ele é e fez, você só aborreceu seus ouvintes.
Agora Pedro dá mais detalhes sobre essa pessoa, Jesus, de quem Cornélio devia ter ouvido falar sem saber exatamente quem era ele ou o que fez: “Vós conheceis a palavra que se divulgou por toda a Judeia, tendo começado desde a Galileia, depois do batismo que João pregou, como Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com poder, o qual andou por toda parte, fazendo o bem e curando a todos os oprimidos do diabo, porque Deus era com ele; e nós somos testemunhas de tudo o que ele fez na terra dos judeus e em Jerusalém; ao qual também tiraram a vida, pendurando-o no madeiro. A este ressuscitou Deus no terceiro dia e concedeu que fosse manifesto, não a todo o povo, mas às testemunhas que foram anteriormente escolhidas por Deus, isto é, a nós que comemos e bebemos com ele, depois que ressurgiu dentre os mortos; e nos mandou pregar ao povo e testificar que ele é quem foi constituído por Deus Juiz de vivos e de mortos. Dele todos os profetas dão testemunho de que, por meio de seu nome, todo aquele que nele crê recebe remissão de pecados. Ainda Pedro falava estas coisas quando caiu o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a palavra” (At 10:37-44).
Repare em todos os elementos da pregação de Pedro, primeiro trazendo para o centro da mensagem o Nome de Jesus, então deixando claro ter ele sido o escolhido de Deus, por meio de quem o Espírito de Deus deu provas disso. Então ele fala da morte e ressurreição de Cristo, pois não é possível um evangelho que não tenha sangue, já que é o sangue que purifica o pecador de seus pecados. O papel de Jesus como o Juiz que virá é o tema seguinte para deixar claro que haverá um juízo e condenação para aqueles que rejeitarem a graça de Deus, mostrando também que esse Juiz não será alguém que desconheça o que é ser humano, mas o próprio Jesus em carne e ossos. Finalmente o anúncio e convite de que todo aquele que nele crê recebe a remissão ou retirada dos pecados.
A passagem da conversa de Jesus com a mulher samaritana em João 4:1 também apresenta um roteiro para o evangelista:
A primeira lição da passagem é que pregar o evangelho é uma ação urgente e você precisa passar por cima de seu desejo de autopreservação de imagem e pensar na perdição à beira da qual seu interlocutor pode estar porque a vida de qualquer um neste mundo está sempre por um fio. É verdade o ditado popular de que “para morrer basta estar vivo”. Por isso em João 4:4 diz, de Jesus, que “era-lhe necessário passar por Samaria”. Não era o caminho usual para um judeu da época, que geralmente preferia evitar a Samaria e contorná-la. Mas para Jesus era “necessário passar por Samaria”, pois havia ali uma alma preciosa necessitada de salvação e, por assim dizer, “ao ponto” para ouvir as boas novas.
Jesus não se apresenta como um Super-Homem, à semelhança de alguns cristãos que querem passar uma imagem de perfeitos, poderosos e capazes de agarrar o diabo na unha em uma luta corpo a corpo. Você não é um lutador de UFC num ringue, você é um socorrista tentando salvar uma alma da condenação. Por isso na passagem vemos Jesus “cansado do caminho” (Jo 4:6) e demonstrando estar com sede. Ele desce ao nível da mulher samaritana e não se coloca acima dela com aquele olhar de desprezo típico do fariseu cheio de justiça própria no templo quando se comparava com o publicano pecador em Lucas 18:9-14. Jesus até mesmo pede água a ela: “Dá-me de beber” (Jo 4:7).
“Porque os seus discípulos tinham ido à cidade comprar comida” (Jo 4:8) vemos que Jesus está só quando conversa com a mulher, e isso nos ajuda a entender a necessidade de se ter alguma privacidade, principalmente no caso de uma evangelização pessoal. É fácil percebermos o quanto o excesso de pessoas pode atrapalhar quando vemos a reação dos discípulos no versículo 27: “E nisto vieram os seus discípulos, e maravilharam-se de que estivesse falando com uma mulher; todavia nenhum lhe disse: Que perguntas? Ou: Por que falas com ela?”. A razão é que “os judeus não se comunicam com os samaritanos” (Jo 4:9), e por isso os discípulos de Jesus, que eram judeus, eram naturalmente preconceituosos e poderiam tratar a mulher com desprezo e discriminação, não apenas por não ser judia, mas também por sua condição moral.
Evangelizar sozinho traz algumas vantagens, como evitar que um companheiro seu desconstrua toda uma estratégia que você construir para levar o ouvinte ao ponto de uma conclusão e tomada de decisão. Nessa hora um parceiro de pouco entendimento pode puxar o assunto para algo que não tem nada a ver e acabar tirando o ouvinte da frente da cruz aonde você o tinha levado. Estar sozinho, ou no máximo em dois, pode evitar aquela impressão que o ouvinte tem de estar cercado por um bando de hienas, cada uma rindo de sua ignorância da Bíblia e querendo tirar um pedaço para depois apresentar de troféu, do tipo “Eu ganhei aquela alma para Cristo!”.
Até aqui Jesus havia chamado a ATENÇÃO da mulher de diferentes formas. Agora, diante da surpresa dela de um judeu estar conversando com uma samaritana, ele aproveita para apresentar uma oferta que irá despertar seu INTERESSE. “Se tu conheceras o dom de Deus, e quem é o que te diz: Dá-me de beber, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva” (Jo 4:10). Ela não apenas tem seu interesse despertado, como retruca com um impedimento prático de receber o que Jesus oferece. “Disse-lhe a mulher: Senhor, tu não tens com que a tirar, e o poço é fundo; onde, pois, tens a água viva? És tu maior do que o nosso pai Jacó, que nos deu o poço, bebendo ele próprio dele, e os seus filhos, e o seu gado?” (Jo 4:11-12).
Lembre-se de que ao iniciar uma conversa evangelística você estará falando de coisas eternas e celestiais com um interlocutor incrédulo que estará pensando em termos temporais e terrenos. É preciso criar aquilo que em comunicação chamamos de “rapport”, ou seja, uma conexão para os dois entrarem no mesmo clima e propósito. Quem é do tempo da conexão de Internet discada ainda se lembra do barulhinho que o modem fazia antes de conectar. Naquele momento, o seu modem conversava com o modem do provedor para estabelecer os parâmetros da troca de dados. Isso é o rapport ou a sincronização de propósitos na comunicação.
Chega a hora de Jesus introduzir o PROBLEMA na conversa: “Qualquer que beber desta água tornará a ter sede” (Jo 4:13), o qual decorre da SITUAÇÃO da mulher que claramente tinha percebido a falta de água e a necessidade de buscá-la. Todo ser humano têm naturalmente uma sede existencial por perceber em si um vazio que nada pode preencher, pois é do tamanho de Deus. O ser humano não entende qual é a origem desse vazio e nem como fazer para preenchê-lo de forma definitiva, mas antes mesmo de explicar a razão do vazio, Jesus procura despertar o DESEJO pela solução:
“Mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede, porque a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água que salte para a vida eterna. Disse-lhe a mulher: Senhor, dá-me dessa água, para que não mais tenha sede, e não venha aqui tirá-la” (Jo 4:14-15).
Este é o momento de colocar o dedo na ferida, isto é, colocar o PROBLEMA sob o holofote para a pessoa não achar que está lidando apenas com alguma mensagem motivacional de uma vida melhor. O grande problema de todo ser humano tem sua raiz no PECADO que entrou na Criação com a queda de Adão e Eva e com isso arruinou a raça humana. “Por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens por isso que todos pecaram” (Rm 5:12). O PROBLEMA e suas CONSEQUÊNCIAS devem ser claramente apresentados, mas não só isso — é preciso levar o ouvinte a sentir isso na própria pele. Por isso Jesus diz: “Vai, chama o teu marido, e vem cá. A mulher respondeu, e disse: Não tenho marido. Disse-lhe Jesus: Disseste bem: Não tenho marido; porque tiveste cinco maridos, e o que agora tens não é teu marido; isto disseste com verdade” (Jo 4:16-18).
Como costumamos dizer, “a batata quente” agora está na mão de seu interlocutor que agora precisa lidar com isso. Enquanto uma pessoa não se reconhece pecadora não há como reconhecer em Cristo o Salvador. Afinal, Jesus deixa bem claro em Marcos 2:17: “Os sãos não necessitam de médico, mas, sim, os que estão doentes; eu não vim chamar os justos, mas, sim, os pecadores ao arrependimento”. Alguns pregam uma hora falando da necessidade de seu interlocutor ser salvo e em nenhum momento explicam que ele precisa ser salvo. Então não se esqueça de deixar bem claro que seu ouvinte tem um problema que precisa ser resolvido, e foi para isso que Cristo veio.
Pregar o evangelho não é passar a mão na cabeça do ouvinte com frases do tipo “Você é especial… Você precisa evoluir… Você precisa desenvolver… Você é um diamante bruto que precisa ser lapidado… Deus vai lhe dar a vitória…”. Já pensou um médico diante de um paciente com câncer dizer que é só um arranhão? Não, o pecado — a condição natural do ser humano que o levará à morte e condenação eterna — precisa ficar muito patente, ainda que ao fazer isso você possa ser considerada a pessoa mais politicamente incorreta do mundo.
Quando colocado diante do seu pecado e da consequente condenação, que aquela mulher conhecia muito bem por serem os samaritanos conhecedores das Escrituras do Antigo Testamento, seu interlocutor vai querer fugir da raia. Talvez pergunte como vai sua família (que traduzido é “vai cuidar da sua vida e não se intrometa na minha”), ou pergunte onde foi que você estudou para conhecer tão bem a Bíblia (que traduzido é “quero alisar seu ego para você parar de prestar atenção no meu”), ou até diga que isso que você está falando seria bom a Fulana escutar (como se estivesse preocupado com mais alguém além de livrar a própria pele daquela conversa).
Tudo isso não passa de uma tentativa de fuga, e a mulher samaritana irá fazer isso usando, primeiro de um elogio à guisa de reconhecimento: “Senhor, vejo que és profeta”. Em seguida ela faz uma afirmação de caráter social, teológico e doutrinário para levar o assunto para longe de si mesma: “Nossos pais adoraram neste monte, e vós dizeis que é em Jerusalém o lugar onde se deve adorar” (Jo 4:19). Jesus poderia ter caído na conversa e corrido atrás da bomba de fumaça que ela lançou para desviar dela própria e de seu pecado que urgia uma solução, e de Jesus que devia ser sempre o centro de toda conversação. Ele faz questão de mostrar que tudo o que ela sabia até ali já não iria valer, além de frisar a urgência da situação em que uma mudança precisava ser adotada imediatamente. Além disso, depois de uma breve explanação sobre adoração ele a conduz de volta ao cerne da questão que é a própria pessoa de Cristo:
“‘Vós adorais o que não conheceis; nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus. Mas vem a hora e já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque são estes que o Pai procura para seus adoradores. Deus é espírito; e importa que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade.’ ‘Eu sei’, respondeu a mulher, que há de vir o Messias, chamado Cristo; quando ele vier, nos anunciará todas as coisas’. Disse-lhe Jesus: ‘Eu o sou, eu que falo contigo’” (Jo 4:22-26).
É importante lembrar que este episódio ocorre antes da cruz, portanto o que interessa aqui é que ela reconheça ser ele o Messias ou Cristo que fora prometido pelos profetas. Naquele momento era ainda o Evangelho do Reino que estava sendo pregado, como o de João Batista que anunciava a chegada do Rei de Israel e convidava: “Arrependei-vos que o Reino é chegado!”. Após a morte e ressurreição de Jesus os discípulos passariam a pregar o Evangelho da Graça que é o que pregamos hoje: “Crê no Senhor Jesus e serás salvo” (At 16:31).
Lembre-se de que seu ouvinte não é um cristão convertido, então muitos termos e expressões não farão qualquer sentido para ele. Ao invés de dizer “A Palavra nos diz…” prefira “Na Bíblia diz…”. Não precisa exigir que seu ouvinte procure passagens na Bíblia, porque isso poderá distraí-lo e perder o que você está querendo dizer. Prefira você mesmo citar versículos de memória ou lendo de sua Bíblia. Se a evangelização for pessoal, talvez uma ou outra vez você possa estender a Bíblia e apontar com o dedo pedindo: “Leia aqui”. A importância dos versículos é evidente: O que irá convencer o pecador é a Palavra de Deus, e não seus raciocínios e argumentos. O poder é dela, não do pregador.
“O evangelho de Cristo… é o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê… Porque a palavra da cruz é loucura para os que perecem; mas para nós, que somos salvos, é o poder de Deus… Mas para os que são chamados, tanto judeus como gregos, lhes pregamos a Cristo, poder de Deus, e sabedoria de Deus… Para que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria dos homens, mas no poder de Deus” (Rm 1:16; 1 Co 1:18, 24; 2:5).
Todos gostamos de ouvir histórias e elas ajudam a fazer o ouvinte retomar o foco se o pensamento já estiver voando para longe de sua pregação. Por isso introduza alguma história interessante em sua pregação. Existem muitos livros com exemplos para pregadores, ou você pode pegar uma história de sua experiência ou até uma notícia de jornal e usá-la à guisa de parábola para o que deseja dizer. Foi o que Jesus fez quando ouviu alguns comentando do que seria o equivalente ao telejornal da época: “Naquela mesma ocasião, chegando alguns, falavam a Jesus a respeito dos galileus cujo sangue Pilatos misturara com os sacrifícios que os mesmos realizavam. Ele, porém, lhes disse: Pensais que esses galileus eram mais pecadores do que todos os outros galileus, por terem padecido estas coisas? Não eram, eu vo-lo afirmo; se, porém, não vos arrependerdes, todos igualmente perecereis. Ou cuidais que aqueles dezoito sobre os quais desabou a torre de Siloé e os matou eram mais culpados que todos os outros habitantes de Jerusalém? Não eram, eu vo-lo afirmo; mas, se não vos arrependerdes, todos igualmente perecereis” (Lc 13:1-5).
Repare que, assim como fez para iniciar a conversa com a mulher samaritana à beira do poço, Jesus partiu de um assunto que estava fresco na memória dos judeus e era objeto do comentário de todos ali. Paulo fez algo assim quando iniciou sua pregação em Atenas. Ele toma como ponto de partida o pedestal vazio que os gregos dedicavam ao “Deus Desconhecido” e passa a falar desse “Deus” que eles desconheciam, mas Paulo conhecia bem.
Fuja da abstração o mais que puder. Se o uso de figuras do Antigo Testamento pode ser de muito proveito em ensino para crentes que já conhecem a realidade dessas figuras no Novo Testamento, para um incrédulo, que não conhece nem um nem outro, isso será um enigma indecifrável. Você só irá confundi-lo.
Nem pense em transformar as boas novas do Evangelho em uma lista de “faça isso, não faça aquilo”. Se você foi evangelizado com algo assim sinto dizer que não foi evangelizado, mas “judaizado”. É melhor fazer a lição de casa e crer na graça de Deus antes de sair por aí fazendo prosélitos para sua religião. Grande parte das religiões cristãs prega um misto de fé e obras da Lei, mas isso não é o Evangelho da Graça e basta ler a carta aos Gálatas para perceber. O Evangelho da Graça é Graça em contraste com a Lei. Não é por seguir uma lista de compromissos que um pecador recebe a salvação e ninguém em sã consciência iria acreditar em um evangelho, cujo significado é “boas novas” ou “boa notícia”, que exija atender a uma lista de deveres. Isso não seria uma boa notícia de jeito nenhum. Nem preciso dizer que pregar o evangelho não é convidar alguém para “ir à igreja” ou para congregar onde quer que seja. É o Espírito Santo quem congrega aqueles que Cristo acrescenta ao seu próprio corpo, não ao rol de membros de alguma denominação religiosa.
Resista ao máximo à tentação de ensinar doutrina e desvendar as profundezas da Palavra de Deus querendo impressionar seus irmãos em Cristo com o tanto que você já aprendeu. Lembre-se de que você está falando com incrédulos e estes estão tão mortos quanto a descrição dada por Paulo no início do capítulo 2 de Efésios: “…mortos em ofensas e pecados, em que noutro tempo andastes segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos da desobediência. Entre os quais todos nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como os outros também” (Ef 2:1-3). Tudo o que você deseja e deve fazer é conseguir que esses mortos ouçam a Palavra de Deus que é a única capaz de lhe dar vida e chamá-lo para fora de seu túmulo. Um morto não entende nada, está morto. A chave do sarcófago é a fé em Cristo como Salvador, e tudo o que você precisa explicar é como Jesus tomou o lugar de seus ouvintes morrendo numa cruz para pagar seus pecados.
Uma vez eu estava conversando com uma jovem e perguntei a ela se sabia qual era seu destino eterno, para onde ela iria após a morte. Ela disse que acreditava ir para o céu, e eu perguntei a razão de sua crença. Ela disse que era uma pessoa boa, que não fazia mal a ninguém, procurava seguir uma religião e coisa e tal. Então falei do evangelho da graça e de como ela, como pecadora perdida, nada poderia fazer para escapar da pena e do juízo aos quais estava destinada por causa do pecado. Mas mostrei como Deus a amava tanto que dera seu Filho para morrer numa cruz substituindo-a no juízo. Agora Deus oferecia o perdão de todos os seus pecados e a salvação graciosamente se ela tão somente cresse em Jesus como Salvador.
Quando terminei perguntei: “Entendeu como ser salva?”. Ela respondeu: “Ah, sim, agora entendi!”. Então perguntei para onde ela iria se morresse e respondeu que agora tinha certeza de que iria para o céu. Perguntei o que lhe dava tal certeza e ela disse que era uma pessoa boa, que tratava bem a todos, seguia uma religião…. Então falei tudo de novo de outra maneira, e depois mais uma outra vez de outra maneira com exemplos diferentes e não sei quantas vezes repeti a velha história de diferentes maneiras. Até hoje não sei se ela chegou a crer no Salvador.
O que eu quero dizer com isso é que enquanto uma pessoa não se converter a Cristo você pode repetir a mesma coisa centenas de vezes que para ela sempre será a primeira vez. Da vez anterior aquilo terá entrado por um ouvido e saído pelo outro sem atingir a consciência. A ideia de pregar o evangelho é usar a técnica da tautologia. A palavra “tautó” vem do grego e significa “o mesmo” e a palavra “logos” significa “assunto” ou “conhecimento”. Portanto tautologia é dizer sempre a mesma coisa de maneiras diferentes, usando diferentes exemplos. É isso que faz o pregador do evangelho. Sua mensagem nunca será inédita e você não deve cair na tentação de inventar algo novo.
Evite também tentar impressionar seus ouvintes que já são cristãos, exibindo o conhecimento que você adquiriu. Não são eles o seu alvo. Se os convertidos acharem que já ouviram o que você está dizendo, ótimo, porque assim não existe o perigo de errar. Talvez eles se impressionem com a forma e roupagem diferente como você apresentou, mas a história deve ser sempre a mesma. Então repita, repita, repita a velha história da cruz como diz o hino “A velha história”, de autoria de William Howard Doane (1832-1915) e Katherine Hankey (1834-1911), extraído do Hinário “Cantor Cristão”:
Contai-me a velha história, do Grande Salvador
De Cristo e Sua glória, de Cristo e seu amor
Com calma e com paciência; pois quero penetrar
À altura do mistério: que Deus nos pode amar.
Falai-me com doçura, do amante Redentor
Falai com sentimento pois sou um pecador!
Querendo consolar-me, em tempos de aflição
Sempre essa velha história; dizei do coração.
Se o brilho deste mundo, toldar do céu a luz,
Narrai a mesma história; da graça de Jesus
E quando enfim a glória do mundo além raiar,
Contai-me a velha história que veio aqui salvar.
*
A Palavra de Deus proíbe tatuagens?
Você escreveu perguntando se li a passagem de Levítico 19:28 normalmente usada para condenar tatuagens. Ali diz: “Pelos mortos não dareis golpes na vossa carne; nem fareis marca alguma sobre vós. Eu sou o Senhor” ou, na versão de J. N. Darby, “Cortar a própria carne por causa de uma pessoa morta vós não fareis, nem colocareis quaisquer escritos de tatuagem sobre vós”. Também citou 1 Coríntios 6:20, que seria a afirmação feita por Deus no Novo Testamento de que nossos corpos pertencem a ele: “Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus”.
Sim, conheço as passagens e elas têm sido minha resposta “default” ou “padrão” ao longo dos anos para aqueles que me escrevem perguntando o que a Bíblia diz de tatuagens. Tenho até dois textos publicados em meu site “O que respondi” sobre o assunto, “O cristão pode fazer tatuagem?” e “Posso me tatuar para a glória de Deus?”.
Neles cito essas passagens entre outras, e também falo da origem pagã, idólatra, ocultista e espiritualista da tatuagem, a qual não era encontrada entre o povo terreno de Deus, Israel. Também já escrevi uma crônica chamada “Diversidade à flor da pele” sobre tatuagens do ponto de vista de carreira, independentemente de a pessoa ser ou não cristã, pois é notório que muitas empresas têm reservas quanto a contratar alguém tatuado. Qual não é a decepção de alguns que se prepararam para uma carreira e se veem descartados na hora da decisão final, perdendo a vaga para alguém talvez não tão bem preparado, mas sem causar o impacto que sua tatuagem causou no entrevistador.
Apesar de não gostar de pele tatuada, ainda que possa amar a pessoa que carrega a tatuagem, ultimamente tem sido um desafio responder às muitas dúvidas de pessoas que me escrevem querendo saber, não minhas opiniões ou preferências pessoais, mas o que a Bíblia realmente diz sobre o assunto. Não posso responder com frases do tipo “É assim que os irmãos pensam…” ou “Não fazemos tal coisa porque poderia escandalizar…”. O problema é que o argumento do escândalo pode ser usado para qualquer coisa, e hoje há tantas ideias na cristandade que se não quiséssemos escandalizar teríamos de voltar a viver na Lei mosaica do Antigo Testamento, pois é lá que a maioria dos cristãos busca suas doutrinas. Mas aí estaríamos escandalizando aqueles que sabem que já não estamos sob a Lei, mas na graça.
Quando a fotografia foi inventada, muitos cristãos fizeram oposição àquilo porque entendiam que era pecado fazer imagens, conforme diz o mandamento da Lei. “Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra” (Êx 20:4). Em 1992 visitei uma irmã em Cristo na Escócia em companhia de um irmão mais velho, e antes de chegarmos à casa dela ele me avisou para guardar a câmera. Ela congregava em um grupo de cristãos que não aprovavam fotografias. Isso foi nos anos 1990 e acredito que o grupo nem exista mais.
Obviamente muitos desses costumes mudaram mesmo entre irmãos que tinham dificuldades para aceitar as novas tecnologias que surgiram na idade moderna. Tome, por exemplo, a televisão. Em casa não tivemos TV até nossos filhos chegarem aos 17 ou 18 anos, que foi quando nos mudamos para um apartamento em um condomínio no qual o custo da TV a cabo estava incluído. Então emprestamos uma velha TV de meus pais com o argumento de que, sendo TV a cabo, poderíamos filtrar a programação e assistir apenas History Channel, Mundo Animal e coisas do gênero. Obviamente estávamos enganados. Mas mesmo que hoje existam irmãos que preferem não assistir TV em casa (e até aqui tem sido esta a opção que meus filhos fizeram em seus próprios lares), já não é possível deixar de levar a TV no bolso, no mesmo smartphone onde levamos nossa Bíblia, hinário e uma coleção de livros cristãos. Agora o “não ter TV” deixou de ser uma opção e o controle próprio passou a ser uma necessidade.
Quando comecei a produzir os vídeos de “O Evangelho em 3 Minutos” alguns irmãos não gostaram da novidade, pois achavam que seria errado usar vídeos para evangelizar. Eu já tinha enfrentado alguma oposição e críticas quando criei meu primeiro site “Histórias de Verdade”, numa época quando quase ninguém tinha Internet e muitos achavam que as coisas de Deus não poderiam se misturar com as coisas do mundo em uma mesma plataforma. Uma das razões apresentadas era a ideia do “carro de boi”, tirada do Antigo Testamento em 1 Samuel 6, quando o povo de Israel usou dos mesmos meios dos incrédulos filisteus para carregar a Arca da Aliança que teria de ser carregada só da maneira ditada por Deus, ou seja, por meio de varais nos ombros dos levitas.
Mas se tomarmos a passagem como regra teremos de limitar a evangelização às pregações orais e o ensino bíblico a cartas manuscritas, pois eram estas as mídias utilizadas nos tempos bíblicos. Não poderíamos usar microfones, e já ouvi falar de ao menos um cristão que abomina os microfones sem fio por achar que o príncipe das potestades do ar poderia distorcer o que é dito e transmitido através das ondas eletromagnéticas que viajam pelo ar. Também não poderíamos usar mensagens gravadas em áudio ou vídeo, além de calendários com fotos coloridas, telefone, rádio, Internet, etc. E até mesmo teríamos de deixar de usar o papel, já que este surgiu muito tempo depois dos tempos bíblicos. Nossas Bíblias seriam em tabletes de argila, rolos de peles de animais ou papiros vindos do Egito.
Mesmo hoje acredito que muitos irmãos mais velhos não aprovem o uso de vídeos ou de textos na Internet para evangelizar ou publicar a sã doutrina. Já ouvi um argumento de que não devemos colocar as coisas de Deus lado a lado com as coisas imorais e pagãs que existem na Internet. Um irmão me disse conhecer alguém que usava desse argumento para não concordar com a venda de livros de sã doutrina em sites como o da Amazon.
O argumento “os irmãos não costumam fazer assim” que podemos ser tentados a usar no caso da tatuagem pode incluir a questão do vestir e da maquiagem, que costuma ser a dúvida de muitos que me escrevem. Existe sempre o risco de aceitarmos algo apenas como tradição humana, mesmo que seja uma boa tradição, porque a linha que separa uma boa tradição da discriminação e preconceito é muito tênue.
Para a questão das tatuagens não existe uma resposta simples do tipo “pode” ou “não pode”. Aqueles que lidam com a questão devem buscar sabedoria na Palavra e a direção do Espírito Santo antes de agir. É tentador considerar algo certo ou errado por termos afirmado algo ao longo dos anos e mantermos nossa posição até por conta da preservação da imagem própria. Alguém poderia nos cobrar: “Você dizia que isso é errado, como agora diz que é certo?!” Li sobre J. N. Darby, que quando seu editor foi publicar uma nova edição de um de seus primeiros livros, perguntou a ele se queria mudar algumas coisas no texto, pois sabia que Darby havia mudado de opinião sobre algumas afirmações que fizera na época. Ele respondeu que publicasse do jeito que estava, pois era assim que ele entendia essas coisas na época.
Mas antes que me interprete como um “vira-casaca” neste assunto, é bom saber que continuo achando que a tatuagem não traz qualquer benefício a um cristão, mas pode servir sim de tropeço na hora de compartilhar sua fé. Uma pessoa incrédula e tatuada não faria caso de ouvir o evangelho de alguém que não tenha tatuagens, mas existem muitos em todo o mundo, e isso pode variar para mais e para menos dependendo do país, que nem sequer parariam para ouvir o evangelho ou pegar um folheto evangelístico de alguém tatuado. Portanto, antes de decidir-se por fazer uma tatuagem é bom perguntar se aquilo será um auxílio ou empecilho na hora de compartilhar sua fé. “Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm” (1 Co 6:12).
Quando Paulo escreveu sobre a questão do escândalo entre irmãos em Cristo, um assunto na época muito propício porque a mistura de judeus e gentios gerava grandes discussões sobre alimentos puros e impuros do ponto de vista do judaísmo, ele disse: “Não destruas por causa da tua comida aquele por quem Cristo morreu” (Rm 14:15). Eu poderia parafrasear isso trocando “comida” por “tatuagem” no sentido da evangelização dos incrédulos, e para isso temos um preceito claro em outra epístola do apóstolo que fala do cuidado que devemos ter, não apenas para com nossos irmãos na Igreja de Deus, mas também com incrédulos: “Portai-vos de modo que não deis escândalo nem aos judeus, nem aos gregos, nem à igreja de Deus” (1 Co 10:32).
Deixando de lado meus gostos e preferências pessoais, devo admitir que o versículo que fala da tatuagem em Levítico 19:28 está claramente associado ao luto pelo que morreu e naquele contexto a tatuagem fazia parte de um ritual pagão. “Pelos mortos não dareis golpes na vossa carne; nem fareis marca alguma sobre vós. Eu sou o Senhor.” Na versão de Darby a palavra “marca” aparece traduzida como “tattoo”. Esses cortes ou marcas parecem ser os mesmos “golpes na carne” de Levítico 21:5: “Não farão calva na sua cabeça, e não raparão as extremidades da sua barba, nem darão golpes na sua carne”. Aqui a proibição inclui não fazer “calva na cabeça” e nem rapar “as extremidades de sua barba”.
Os monges budistas têm a cabeça rapada, e os sacerdotes católicos praticam a “tonsura”, que é rapar um pequeno círculo de cabelo no topo da cabeça. Ambos fazem isso por razões religiosas. Outros podem rapar o cabelo não só por razões religiosas, mas para se livrarem de piolhos, para a prática de esportes, ou mesmo quando são vítimas de “trotes” ao entrarem na universidade. A proibição de se cortar as extremidades da barba é obedecida por alguns judeus, muçulmanos e cristãos tradicionais e fundamentalistas até hoje. Se acatarmos como regra para o cristão a parte do versículo que proíbe a tatuagem teremos de acatar também aquela que proíbe rapar a cabeça e cortar as pontas da barba.
A tatuagem ou prática de se cortar a carne volta a aparecer em Deuteronômio 14:1, também associada a práticas ritualísticas pagãs em respeito aos mortos: “Filhos sois do Senhor vosso Deus; não vos dareis golpes, nem fareis calva entre vossos olhos por causa de algum morto”. Neste caso talvez se refira ou inclua o autoflagelo, comum entre católicos na Idade Média e ainda hoje entre católicos do México e Filipinas, além de muçulmanos. Jeremias é outro que fala do assunto: “E morrerão grandes e pequenos nesta terra, e não serão sepultados, e não os prantearão, nem se farão por eles incisões, nem por eles se raparão os cabelos” (Jr 16:6).
Não creio que iremos encontrar hoje muitos cristãos rapando a cabeça, cortando a barba ou se tatuando em um ritual pelos mortos. São muitas as outras razões pelas quais pessoas fazem tatuagens, umas ruins, outras não. Talvez a razão de eu não gostar de tatuagem tenha a ver com minha idade e criação, pois na minha infância aprendi que tatuagem era coisa de piratas, presidiários e prostitutas. Mas embora eu me posicione contra tatuagens por uma questão de gosto pessoal ou de costumes adquiridos pelo modo como fui criado, seria desleal querer usar da Bíblia para justificar meus pensamentos e dizer que encontro nela uma proibição declarada, como era o argumento que eu costumava usar há algum tempo baseado nesses versículos do Antigo Testamento.
Algumas pessoas precisam tatuar avisos na pele caso venham a precisar de socorro médico de urgência. Isso é feito por diabéticos, pessoas sujeitas a acidentes que precisam tatuar seu tipo sanguíneo, pessoas com alergias a medicamentos ou alimentos, etc. Existem pessoas que sofrem de amnésia e têm nome, endereço e outras informações tatuadas no corpo para o caso de se perderem. Hoje é cada vez mais comum a tatuagem das sobrancelhas, que no início era feita apenas por pessoas que perderam o cabelo por causa de tratamentos médicos. Outros usam a tatuagem para disfarçar partes do couro cabeludo onde existam falhas sem cabelo. Oftalmologistas usam de um procedimento para tatuar o olho cego de alguns pacientes para evitar que a perda da coloração crie uma aparência repulsiva nas pessoas. Médicos também tatuam pontos na pele de pessoas que precisam passar por aplicações repetidas de radiação, para não perderem o local exato da aplicação. Nenhum destes casos poderia ser incluído na proibição citada no Antigo Testamento, embora eu tenha ouvido casos de cristãs que acreditem que a Bíblia condene a tatuagem, mas que renovaram o formato de suas sobrancelhas por meio de… tatuagem!
Outra passagem usada como argumento contra a tatuagem é 1 Coríntios 6:20, que fala do cuidado e respeito que devemos ter ao corpo como templo do Espírito Santo. Mas talvez o versículo pudesse ser usado em casos de autoflagelo como o praticado por católicos e muçulmanos, e mais adiante explico a razão.
Existe também entre alguns adolescentes a automutilação feita com o corte da pele com lâminas. Isso costuma estar associado a trauma, abuso, drogas, ou tendência de autodestruição e suicídio, além de problemas mentais. Mas será que poderíamos chamar de automutilação ou falta de respeito para com o corpo o caso de alguém que faz uma tatuagem por razões estéticas? Na mente daquela pessoa a tatuagem é um investimento de melhoria para seu corpo, não um dano ou automutilação. Tatuagens artísticas podem custar bem caro e para aqueles que gastam com isso são vistas como um investimento na boa aparência, como aquele que é feito com cirurgias plásticas, tratamentos para perda de peso, academia, salão de beleza e barbearia. Uma tatuagem pode significar também uma prova de amor para com um filho, cônjuge ou progenitor.
Portanto, se a tatuagem moderna nada tem a ver com os cortes na pele por razões ritualísticas pagãs, conforme a citação do Antigo Testamento, talvez não possa também ser considerada, no crente, um ataque contra o corpo que é o templo do Espírito. Então qual seria a razão para não fazer uma tatuagem ou mesmo trabalhar nesse segmento de negócios? Além dos problemas que uma tatuagem pode trazer, por exemplo para arranjar emprego ou até um namorado ou namorada com o mesmo nome do relacionamento anterior, a gama de figuras demoníacas e ritualísticas existente nos catálogos de tatuagem já seria motivo suficiente para um cristão ficar longe dessa prática. A maioria das pessoas que escolhe uma figura nem faz ideia da mensagem que pode estar passando por meio de seu corpo a homens e anjos.
Um cristão que trabalhe com tatuagem poderá ter problemas de consciência quando o cliente escolher uma figura claramente satânica, mística ou idólatra, às vezes até ligada à bruxaria, e o tatuador precisará ficar ocupado com essa imagem por horas e dias seguidos. Muitos cristãos, por razões de consciência, recusam-se a ir à guerra, trabalhar em determinados segmentos de negócio, atender determinados clientes ou fazer certos tipos de serviços. Eventualmente o tatuador cristão teria de lidar com isso, mas é difícil prever quantos clientes ele perderia se evitasse figuras inapropriadas do ponto de vista bíblico e que violassem sua consciência. Não se trata de discriminação, mas de problema de consciência.
Outra dificuldade seria quando clientes solicitassem tatuagens nos órgãos genitais e em outras partes íntimas, o que obrigaria o tatuador ou tatuadora a se ocupar com um corpo nu por horas a fio. Talvez alguém argumente que médicos, estilistas, massagistas e outros profissionais passam por isso, mas também sabemos do risco moral que isso envolve e de casos em que profissionais assim acabaram se envolvendo com um paciente ou cliente depois de ter tido acesso à sua intimidade. Alguns até mesmo acabaram processados ou presos por assédio ou estupro, em razão de seus avanços sobre um corpo nu que lhes pareceu convidativo depois de ter ganhado acesso à sua intimidade.
Existe outro pensamento que gostaria de compartilhar, o qual pode ou não ser válido. No século 19 e início do século 20 os filhos usavam as mesmas roupas dos pais, falavam da mesma maneira e tinham as mesmas tecnologias, pois as coisas não chegavam a mudar muito em um século. Hoje vivemos quatro ou cinco gerações de costumes, ideias e tecnologias em apenas uma vida. É difícil nos acostumarmos com coisas que não faziam parte de nosso hábito quando éramos mais jovens, mas que hoje fazem parte da vida diária de nossos filhos. Por esta razão muitos pais precisam hoje dos filhos para usar tecnologia, algo que no passado sempre foi o inverso.
A maneira como abordamos questões como a da tatuagem irá dizer se estamos fundamentados na Palavra de Deus ou apenas repetindo costumes, preceitos e tradições que recebemos da geração anterior. O Senhor Jesus repreendeu os fariseus por fazerem algo assim: “Invalidastes, pela vossa tradição, o mandamento de Deus. Hipócritas, bem profetizou Isaías a vosso respeito, dizendo: Este povo se aproxima de mim com a sua boca e me honra com os seus lábios, mas o seu coração está longe de mim. Mas, em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos dos homens” (Mt 15:6-9). Esta passagem pode ser lida de mais de uma maneira. Podemos, por exemplo, anular algo que Deus disse quando tinha em mente a idolatria, como é o caso dos versículos sobre tatuagem, só por não se adequar às tradições que recebemos de nossos pais.
Costumo receber de pentecostais perguntas sobre o “espírito das prostituições”, pois seus pastores pregam que se caírem em algum pecado moral ficarão possessos do “espírito das prostituições”. Você já pode imaginar o estrago que isso faz na mente de um jovem cristão quando sai dos trilhos em assuntos envolvendo namoro e relacionamentos. A verdade é que ninguém verdadeiramente convertido a Cristo pode ser possuído por algum espírito imundo, pois já é habitado pelo Espírito Santo que foi prometido por Jesus para ficar para sempre com os salvos.
Ao tirar o versículo de Oséias 5:4 de seu contexto, que tinha a ver com a infidelidade de Israel e sua prostituição com os ídolos pagãos, os pastores fazem disso uma ferramenta de terror. Costumo receber e-mails de pessoas desesperadas por terem cometido um pecado moral, pois onde congregam são ensinadas que aquilo selou para sempre seu destino eterno e que não há mais volta. Nunca mais terão perdão e estão possessas de um espírito de prostituição. Essa irresponsabilidade de alguns pregadores já levou pessoas ao suicídio.
Vou transcrever aqui a passagem toda de Oséias para mostrar como muitos são manipulados e aterrorizados por líderes religiosos inescrupulosos, e acredito que sirva também como alerta para sabermos dividir bem a Palavra da verdade a fim de não usarmos passagens fora do contexto que possam afligir nossos irmãos.
Depois de dizer em Oseias 4 que “O meu povo consulta a sua madeira, e a sua vara lhe responde… Sacrificam sobre os cumes dos montes, e queimam incenso sobre os outeiros… e com as meretrizes sacrificam… Efraim está entregue aos ídolos”, indicando claramente que prostituição nesta mensagem tem um aspecto de infidelidade para com Jeová e idolatria, o profeta continua “Ouvi isto, ó sacerdotes, e escutai, ó casa de Israel, e dai ouvidos, ó casa do rei, porque contra vós se dirige este juízo, visto que fostes um laço para Mizpá, e rede estendida sobre o Tabor. Os revoltos se aprofundaram na matança; mas eu castigarei a todos eles. Eu conheço a Efraim, e Israel não se esconde de mim; porque agora te tens prostituído, ó Efraim, e Israel se contaminou. Não querem ordenar as suas ações a fim de voltarem para o seu Deus, porque o espírito das prostituições está no meio deles, e não conhecem ao Senhor” (Os 5:1-4).
Espero que compreenda que tudo o que escrevi não é um aval às tatuagens. Se alguém me perguntar se deve fazer uma tatuagem ou trabalhar neste segmento de negócio minha resposta será “Não” e isso pelas várias razões pessoais que apresentei aqui. Mas seria temerário tentar fundamentar minhas razões na Bíblia e em especial nos versículos comumente citados para este caso. Sei de irmãos que fizeram tatuagem depois de convertidos e não tenho nada a ver com suas razões para isso. Conheço também os que fizeram antes de sua conversão e hoje não fariam e são contra por diferentes razões.
Cada um dará conta de si mesmo a Deus, tanto por fazer algo que possa servir de empecilho ao seu testemunho e à evangelização, quanto causar dificuldades em sua vida sentimental e profissional. Se esse “algo” for uma tatuagem, é melhor você pensar seriamente sobre isso, principalmente porque mudamos muito ao longo de nossa vida. Até mesmo aquilo que você considerava belo há dez ou vinte anos pode não achar tão bonito agora e talvez venha a detestar no futuro. Isso acontece com modelo de roupa, cor de carro ou decoração da casa. Por que você acharia que com uma arte qualquer estampada em sua pele aconteceria diferente?
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O que você fará se alguém pedir para ser curado?
Você contou de uma amiga que sofria de uma doença rara e não conseguia se curar. Então ela foi a uma dessas igrejas neopentecostais e alguém lá determinou sua cura e ela foi curada completamente. Você afirma que constatou ter sido verdade e perguntou: “Se no momento em que vocês estiverem congregados ao nome de Jesus aparecesse uma pessoa enferma e pedisse que vocês a curassem, o que fariam”?
É impressionante como na cristandade as pessoas estão ficando cada vez mais ousadas. Olham para o Senhor como se fosse um escravo à sua disposição para obedecer às vontades e caprichos daqueles que invocam o seu nome. Por isso já nem causa espanto quando alguém escreve contando de uma pessoa sabidamente doente que “foi a uma igreja e uma pessoa DETERMINOU a sua cura e ela foi curada completamente”. Como assim, “determinou a sua cura”? Será que podemos agora nos colocar acima de Deus e determinar como ele deve agir? Essa moda de dar ordens para Deus é de arrepiar. “Eu determino!”, “Eu ordeno!”, “Eu decreto!”, “Eu profetizo!”. Você consegue imaginar-se falando assim para o patrão em seu emprego? Então nem ouse usar tais termos para Deus.
Ninguém tem o dom de curar como se fosse um poder constante, algo que ele possa tirar do bolso do colete quando bem entender. Paulo eventualmente curava quando guiado pelo Espírito, mas nem sempre o fazia. Ele não curou Timóteo do estômago (1 Tm 5:23) e nem Trófimo, que ele deixou doente em Mileto (2 Tm 4:20). Muitas curas que você vê por aí na TV e nas chamadas “igrejas” podem ser erro de diagnóstico, sugestionamento ou até truques de mágica (como mágicos de salão). Ou até mesmo picaretagem pura e simples. Na melhor das hipóteses é a cura que é conseguida também com placebos, e na pior das hipóteses pode ser sim que uma cura tenha ocorrido, porém não pelo poder de Deus. Os magos de Faraó imitaram os milagres de Moisés com um poder vindo do mesmo Satanás que foi poderoso e capaz de transportar Jesus para um alto monte durante a tentação. O fato de você ter histórias de curas para contar não prova nada. Qualquer pajé, feiticeiro ou invocador de espíritos também tem.
Sei de alguns casos em que tudo era combinado entre o “doente” e o pregador. Uma grande “igreja” em Fortaleza contratou um rapaz perfeitamente são de outro estado para aparecer “aleijado” e de muletas no culto e ser curado. Depois de receber seu cachê ele pegou um voo de volta para casa. O técnico de som de um evento empresarial no qual participei contou-me de seu primo, que mora e trabalha nos Estados Unidos, e ficou chocado com o que viu. Um famoso pregador de curas de lá o contratou para cuidar do som. Depois de tudo preparado no grande auditório o pregador ordenou que todos os que não faziam parte de sua equipe de pastores e obreiros saíssem. Mas ninguém viu que o rapaz do som ficou nos bastidores ligando alguns fios. Então ele viu pela fresta da cortina chegar uma turma de atores trazendo cadeiras de rodas e começaram a ensaiar com o pregador como seriam as curas e milagres daquela noite.
Não faça da TV sua “Bíblia”, querendo aprender a verdade a partir do que fazem os pregadores ali entre um e outro pedido de dinheiro, promessas de prosperidade para quem abrir a carteira, e ameaças para quem não ofertar. Procure saber e entender o que diz a Palavra de Deus. Eventualmente, sim, Deus cura, e devemos orar por um doente que busca ser curado. Mas devemos também fazer isso colocando a vontade de Deus acima de tudo, pois é preciso ter em mente que uma doença pode ter sido permitida por Deus para tratar com algum problema daquela pessoa. Era este o caso de Paulo, que tinha um espinho na carne (provavelmente uma doença crônica), e Deus permitia que ficasse assim para não se gloriar das revelações que tinha recebido. Paulo pediu por três vezes para se ver livre daquilo, mas depois entendeu que estava nos planos de Deus.
Voltando ao dom de curar, repare que em 1 Co 12 fala “dons de curar”, no plural, porque ali não está falando dos dons como os citados em Efésios 4, que são aqueles que estão incorporados na pessoa que os tem. Os “dons” de 1 Coríntios 12 numa tradução literal seriam “manifestações”, ou seja, ocorrências eventuais de poder do Espírito Santo conforme a necessidade e disposição de Deus de fazer com que se manifestem. Algo como você dar dinheiro a seu filho só quando é para ele ir comprar algo específico, e não deixar com ele um cartão de crédito para gastar quando e onde ele bem entender. Ninguém tem um “cartão de crédito de Deus” com um saldo de curas para gastar à vontade.
Quer um exemplo do que estou falando? Paulo libertou possessos de demônios, mas isso não era como se ele dissesse uma palavra mágica e o demônio saísse. Isso ele fazia quando o Espírito o capacitava para aquela tarefa em particular, no lugar, momento e com um objetivo bem definido. Repare que a jovem possessa de Atos 16 seguiu a Paulo “por muitos dias” sem que ele tomasse qualquer providência de libertá-la. Por que? Porque ele ainda não tinha tido a manifestação do Espírito Santo neste sentido. Ou você acha que ele não teve vontade de se livrar daquele aborrecimento de ser seguido por uma possessa de demônio desde o primeiro dia? Veja a passagem.
“E aconteceu que, indo nós à oração, nos saiu ao encontro uma jovem, que tinha espírito de adivinhação, a qual, adivinhando, dava grande lucro aos seus senhores. Esta, seguindo a Paulo e a nós, clamava, dizendo: Estes homens, que nos anunciam o caminho da salvação, são servos do Deus Altíssimo. E isto fez ela POR MUITOS DIAS. Mas Paulo, perturbado, voltou-se e disse ao espírito: Em nome de Jesus Cristo, te mando que saias dela. E na mesma hora saiu” (At 16:16-18).
As curas que encontramos na Bíblia tinham um propósito bem definido, principalmente o de chamar atenção para uma obra que Deus estava fazendo. Foi assim quando Jesus esteve no mundo, porque ele era o cumprimento da profecia de Isaías, como é explicado por Mateus: “E Jesus, entrando em casa de Pedro, viu a sogra deste acamada, e com febre. E tocou-lhe na mão, e a febre a deixou; e levantou-se, e serviu-os. E, chegada a tarde, trouxeram-lhe muitos endemoninhados, e ele com a sua palavra expulsou deles os espíritos, e curou todos os que estavam enfermos; para que se cumprisse o que fora dito pelo profeta Isaías, que diz: Ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e levou as nossas doenças” (Mt 814-17).
Repare que aí diz que ele curava com o propósito definido de cumprir as profecias, e o modo de Jesus curar era tomar a enfermidade para si, sem contudo morrer por causa dela porque era perfeito e sem pecado. Ele deu também poder aos discípulos para curar e eles faziam isso sempre que Deus tinha um propósito de chamar a atenção das pessoas para a grande obra de salvação que estava agora disponível ao homem. Quando passa em frente à minha casa uma carreata de veículos novos de uma agência de automóveis oferecendo algum tipo de “feirão” ou promoção, eles soltam fogos, mas não são os fogos que estão vendendo. Estes servem apenas para chamar a atenção das pessoas para o que realmente importa.
Todos aqueles que foram curados, libertados e ressuscitados na Bíblia morreram depois, porque o objetivo de Deus nunca foi preservar a vida do ser humano nesse estado lastimável em que se encontra, ao menos até que Cristo venha restaurar todas as coisas. Assim as curas, além de serem evidências do poder de Deus agindo, em algumas situações tinham por objetivo mostrar como será o reino milenial de Cristo na terra, quando as pessoas terão acesso total à cura e saúde perene:
“E mostrou-me o rio puro da água da vida, claro como cristal, que procedia do trono de Deus e do Cordeiro. No meio da sua praça, e de um e de outro lado do rio, estava a árvore da vida, que produz doze frutos, dando seu fruto de mês em mês; e as folhas da árvore são para a saúde das nações. E ali nunca mais haverá maldição contra alguém; e nela estará o trono de Deus e do Cordeiro, e os seus servos o servirão” (Ap 22:1-3).
Agora voltando à sua pergunta do princípio, que foi “o que eu faria quando estivesse congregado com os irmãos e alguém entrasse pedindo para ser curado”. Primeiro é preciso entender que quando a igreja se reúne não é para pregar o evangelho e nem para promover curas ou algo do tipo. A igreja é congregada pelo Espírito Santo para as atividades muito bem definidas em Atos 2:42; “E perseveravam na doutrina dos apóstolos, e na comunhão, e no partir do pão, e nas orações”. A igreja se reúne para aprender da doutrina dos apóstolos por meio dos dons em seu meio, para ter comunhão uns com os outros, para celebrar a ceia do Senhor recordando dele e anunciando sua morte, e para oração.
Se alguém pedir para ser curado é preciso então saber quem é essa pessoa. Se for incrédula, a maior doença do mundo ainda não é nada comparada à doença de seu pecado não perdoado. De nada adiantará lhe dar um paliativo e ela passar a eternidade nas trevas do lago de fogo. Se for um convertido a Cristo, então irei orar por essa pessoa em particular ou trazer essa necessidade nas orações da assembleia, mas sempre colocando de modo que seja feita a vontade de Deus, e não exigindo de Deus uma cura ou “determinando” que a pessoa seja curada. Como saber se não é Deus tratando com alguma questão da vida daquela pessoa que só poderia ser tratada por meio de algum tipo de aflição como uma enfermidade? Deus tocou a coxa de Jacó para quebrar sua vontade própria e o resto da vida ele não foi curado disso, mas viveu manco pelo resto de seus dias.
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O que você pensa da hipnose?
Alguém perguntou o que penso da hipnose, e acredito que isso possa valer também para qualquer sistema de manipulação da mente. Hipnose, segundo a atual definição pela Associação Americana de Psicologia, “é um estado de consciência que envolve atenção focada e consciência periférica reduzida, caracterizado por uma maior capacidade de resposta à sugestão”. Talvez você argumente que um sedativo para dor ou anestesia para procedimento cirúrgico também nos coloca em um estado de letargia suficiente para perdermos o controle próprio, mas aí temos um objetivo muito claro envolvendo a saúde do corpo ou a eliminação de uma dor crônica, sem contudo manipular a mente do paciente.
O uso de anestésicos, sedativos e analgésicos para dor ou para se executar procedimentos médicos ou cirúrgicos não são usados para induzir um estado ou disposição mental visando obter informações sobre o passado da pessoa ou seus traumas ocultos. Eles apenas servem para tirar a consciência, enquanto a hipnose mantém a pessoa em um estado de semiconsciência para que o hipnotizador faça perguntas ou até mesmo crie sugestionamentos que poderão manipular o hipnotizado e levá-lo a uma mudança de comportamento.
Seria possível o hipnotizador criar “memórias” falsas pela indução ou sugestionamento? Eu acredito que sim, porque nossa memória não é como o HD de um computador. Nós não armazenamos coisas exatamente como aconteceram, mas a memória é reconstruída sempre que nós a invocamos.
Dou um exemplo: Você vai atravessar a rua e um carro quase o atropela. Você gravou na memória um quase atropelamento, mas foi tudo tão rápido que nem teve tempo de perceber a cor do carro, sua marca, se o motorista era homem ou mulher, loiro ou moreno e muito menos a roupa que vestia. Amanhã um amigo lhe diz que viu o que aconteceu, quando aquele Volkswagen Gol quase pegou você. Depois de amanhã outro amigo conta que estava na outra calçada quando viu aquele homem de cabelo preto e camisa vermelha quase passar por cima de você. Num outro dia alguém acrescenta mais uma informação e dez anos depois, quando alguém lhe pergunta se alguma vez foi atropelado, você conta:
“Nem me diga! Eu quase fui atropelado na Avenida Principal, em frente ao número 1234 onde tem uma loja de ferramentas. Eu ia atravessar quando um Volkswagen Gol de cor branca perolizada, com rodas de liga e o som ligado bem alto tocando samba, veio em alta velocidade, dirigido por um homem alto e moreno, de camisa vermelha, ultrapassou uma perua Kombi azul com uma propaganda das Casas Dias na lateral, dirigida por uma mulher loira, veio para cima de mim. Se na hora um senhor calvo, de meia idade e vestindo camisa xadrez, não tivesse gritado eu teria sido atropelado”.
Considerando que a hipnose e também aqueles programas de “mudança de mente” que ficam cada vez mais populares, têm por objetivo o controle da pessoa e de sua mente, por melhores que sejam as intenções de quem hipnotiza ou se deixa hipnotizar, não acredito que seja algo a que um cristão deva se submeter. Devemos ser controlados apenas pelo Espírito Santo, e se já é uma luta diária termos em nós uma carne ou velho homem que insiste em voltar ao controle de nosso ser, quanto mais permitir que alguém de fora consiga acesso à nossa mente para extrair de nós alguma memória ou fabricar outras segundo sua própria agenda.
A Palavra de Deus diz: “Sede sóbrios e vigilantes” (1 Pe 5:8). Você não está sóbrio quando é hipnotizado ou se coloca sob o efeito de alucinógenos. Ao contrário, você perde o controle de si mesmo e no caso de hipnotismo isso fica ainda mais grave porque você passa o controle para outra pessoa. Agora veja a continuação do mesmo versículo para entender as implicações do que o apóstolo estava escrevendo: “Sede sóbrios e vigilantes porque o diabo, vosso adversário, anda em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar”. A palavra grega traduzida como “tragar” pode ser traduzida também como beber ou engolir algo até o fim. Ou seja, ter a posse completa daquilo que é engolido.
Nem Satanás, e nem algum de seus espíritos malignos, jamais poderá se apossar de alguém que foi verdadeiramente salvo por Cristo e tem agora o Espírito Santo habitando em si. Mas ele pode influenciar a mente dessa pessoa. Pense de onde eu e você fomos tirados quando nos convertemos a Cristo e o Espírito Santo passou a habitar em nós. Andávamos antes “segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos da desobediência… nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos” (Ef 2:2-3).
É claro que todo crente em Cristo continua tendo desejos da carne e pensamentos carnais, mas agora ele possui um recurso para fazer frente a esses pensamentos, que é o Espírito Santo e a nova vida que tem em si. Ele não anda mais como antes, comandado pelo príncipe dos poderes do ar, e nem opera em si o espírito que opera nos filhos da desobediência. Em si agora opera o Espírito Santo. Por que razão ele se deixaria fragilizar mentalmente ao ponto de se colocar debaixo da operação de outra pessoa que terá acesso à sua mente, seus segredos, desejos e até a memórias que nem mesmo são reais, uma vez que são reconstruídas sempre que forem invocadas?
No versículo “Sede sóbrios e vigilantes” (1 Pe 5:8) a palavra sóbrio indica total controle próprio (ao contrário de um bêbado ou drogado que perdeu o autocontrole). A palavra “vigilante” indica alguém que está percebendo tudo ao redor, ao contrário de uma pessoa que dorme. Acho que isso já mostra como o cristão deve agir em relação a hipnotismo. Obviamente não inclui o sono que é um mecanismo natural e não coloca você sob o comando de outra pessoa.
Outra passagem diz: Gl 5:22 “Mas o fruto do Espírito é… domínio próprio”. Alguém sob o domínio da hipnose perde o domínio próprio, embora o hipnotizador possa alegar que nunca conseguirá fazer o hipnotizado agir de modo contrário às suas convicções morais.
Normalmente a hipnose é usada como meio para a pessoa encontrar respostas para seus problemas dentro de si mesma, o que também é outro problema para um cristão. Afinal, o que temos de nós mesmos, de nossa natureza original, que não tenha sido corrompido pelo pecado? Se “eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum” (Rm 7:18), por que razão eu iria querer buscar em mim mesmo, isto é, em minha natureza herdada de Adão, algo que possa me auxiliar? Acaso não seria em outra direção que eu deveria olhar em busca de socorro, “olhando para Jesus, autor e consumador da fé”? (Hb 12:2).
Romanos 6:16-23 mostra que não devemos nos deixar controlar por nada e nem ninguém, além do Espírito Santo: “Não sabeis que daquele a quem vos ofereceis como servos para obediência, desse mesmo a quem obedeceis sois servos, seja do pecado para a morte ou da obediência para a justiça?”. Um processo externo de indução, seja ele por métodos hipnóticos ou drogas, pode criar dependência física e psíquica, e no caso da hipnose criar um vínculo de dependência do hipnotizado por seu hipnotizador.
Agora vem um questão importante: Quem foi o pai das modernas técnicas de hipnotismo? Apesar do termo “hipnose” ter sido usado por um médico britânico, James Braid (1795-1860), que alegava tratar-se de uma espécie de sono induzido, foi Franz Anton Mesmer (1734-1815) quem parece ter criado o conceito moderno de algo que sempre foi largamente utilizado nas religiões pagãs por seus sacerdotes, pajés e feiticeiros. Estes sempre usaram de movimentos das mãos, plantas alucinógenas e muito ritmo para tirar seus seguidores do estado de consciência e induzi-los a um transe, um estado geralmente aproveitado por espíritos imundos para se apossarem de suas vítimas. Os livros de Franz Anton Mesmer, de quem vem o verbo “mesmerizar”, encontram-se entre os clássicos de religiões ocultistas e espiritualistas como espiritismo, rosa-cruz e magia em suas diferentes vertentes,
Mas existem outras formas de se induzir as pessoas a pensarem e agirem de uma maneira pré-programada, e às vezes não são utilizadas técnicas de hipnose clássica para isso, mas outras que envolvem persuasão e condicionamento. Quando você pesquisa sobre hipnose descobre que até mesmo a psicologia científica do comportamento desenvolvida por Pavlov traz algumas técnicas de sugestionamento pela aplicação de estímulos com o fim determinado de se treinar a mente ou o físico de uma pessoa ou animal.
Ideologias políticas usam técnicas assim todos os dias e, no Brasil vemos uma forma até branda dessa forma de persuasão que transforma militantes, principalmente estudantes e pessoas de baixa renda, em marionetes políticos. Ensine um adolescente sem muita perspectiva a repetir um mantra ideológico qualquer e sentir-se gratificado ao participar do poder momentâneo de uma boiada em loja de cristais e você terá um pequeno exército pronto para agir ao seu comando. A expansão do islamismo radical mostra até onde é possível chegar unindo militância política e fanatismo religioso no mesmo caldeirão. Jovens revoltados e sem horizonte político ou religioso são vítimas fáceis se forem seduzidos com o poder de mudar o mundo, algo que ele geralmente nem tentou, começando por arrumar a própria cama. Um jovem assim pode se tornar num soldadinho pronto a vestir um colete de explosivos, sejam estes reais ou apenas de ações que causem um impacto na sociedade.
Antes de minha conversão passei tanto por militância eco política quanto filosófico-religiosa e é impossível passar por isso sem perceber as técnicas utilizadas. Numa pseudofilosofia de origem japonesa que frequentei por três anos percebi que as palestras tinham um crescendo de comando-recompensa-controle. O preletor iniciava ordenando que o público fizesse coisas simples, como aplaudir, abraçar a pessoa ao lado ou levantar as mãos. Aos poucos ele ia aumentando a dificuldade dessas ordens que podiam passar de subir na cadeira, dar gritos e gargalhadas forjadas a pulinhos e rodopios. Como tudo era feito de maneira muito divertida, todos se sentiam gratificados, sem perceberem que não teriam sido capazes de obedecer aos últimos e mais constrangedores comandos sem terem passado antes pelos mais simples e banais. Mas como a recompensa vinha sempre na forma de alegria, ao final da pequena sessão de condicionamento psicológico do tipo causa-efeito todos alegremente passavam a ouvir com atenção e sem questionamento ao bloco doutrinário e ideológico que se seguia. Suas guardas haviam sido baixadas e a vontade-própria quebrada com as técnicas usadas no início.
Nos anos 70, década de minha conversão, era comum encontrar também os “Meninos de Deus”, uma seita religiosa que usava do sexo das meninas como forma de atração, principalmente de homens com dinheiro. Mais tarde, com a morte de seu guru e proibição da organização em vários países, aquela seita passaria a se denominar “A Família” em razão dos escândalos e casos de suicídios, prostituição e pedofilia de que eram acusados em vários países. Havia também os alegres jovens do Hare-Krishna, aliciados entre jovens insatisfeitos principalmente de classes média-alta, condicionados a acreditar no que seus gurus ensinavam por meio da privação do sono e de proteína animal. Na época eram comuns nos Estados Unidos os “desprogramadores” profissionais, contratados pela família para sequestrar, aprisionar e reprogramar jovens vítimas dessas seitas. Um dos mais famosos e que inaugurou a ideia foi Ted Patrick, que ajudaria a desprogramar centenas de jovens iludidos pelas seitas religiosas. Todavia, seus métodos radicais de sequestro do paciente e uso de força física lhe renderam dezenas de processos na justiça americana.
Mais recentemente as técnicas de hipnose e persuasão chegaram também ao meio evangélico, e se você fizer uma busca por “hipnose” + “pastores” encontrará dezenas de artigos revelando como a hipnose é usada principalmente por pastores neopentecostais para criar estados de falsa possessão demoníaca e também induzir pessoas a contribuírem para a religião. Líderes religiosos também estudam métodos e palavras usadas por agências de espionagem em torturas psicológicas. O objetivo disso no meio neopentecostal é seduzir os fiéis e quebrar sua vontade própria e resistência, levando-os a aceitar como verdade tudo o que vem após a aplicação da técnica de persuasão. Nesse contexto são também utilizadas as técnicas que descrevi antes de comando-recompensa-controle. Quão diferente é isso do que o apóstolo Paulo ensinou ao descrever sua abordagem para com os Coríntios:
“E eu, irmãos, quando fui ter convosco, anunciando-vos o testemunho de Deus, não fui com sublimidade de palavras ou de sabedoria. Porque nada me propus saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado. E eu estive convosco em fraqueza, e em temor, e em grande tremor. A minha palavra, e a minha pregação, não consistiram em palavras persuasivas de sabedoria humana, mas em demonstração de Espírito e de poder; para que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria dos homens, mas no poder de Deus” (1 Co 2:1-5).
Embora a passagem a seguir tenha sido escrita originalmente para descrever a mulher adúltera e sedutora, acredito que possa ser aplicada como princípio para alertar contra o risco que corre qualquer vítima de hipnose e técnicas de sedução:
“Assim, o seduziu com palavras muito suaves e o persuadiu com as lisonjas dos seus lábios. E ele logo a segue, como o boi que vai para o matadouro, e como vai o insensato para o castigo das prisões; até que a flecha lhe atravesse o fígado; ou como a ave que se apressa para o laço, e não sabe que está armado contra a sua vida” (Pv 7:21-23).
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De que pecado Jesus estava falando neste versículo?
Sua dúvida é de que pecado Jesus estaria falando neste versículo que você copiou em seu e-mail: “Eu vou embora, e vocês vão me procurar, porém morrerão sem o perdão dos seus pecados. Para onde eu vou vocês não podem ir” (João 8:21 NTLH). Meu conselho é que jogue fora essa Bíblia NTLH porque é uma versão adulterada. Onde ela diz “pecados” o correto é “pecado”, mas este não é o pior ‘pecado’ dessa versão que traz um número enorme de passagens modificadas.
Use uma versão tradicional Almeida Revista e Corrigida, ou Almeida Revista e Atualizada, ou até uma versão católica que é melhor que essa NTLH da SBB. Compare com a tradução de uma versão Almeida tradicional: “De outra feita, lhes falou, dizendo: Vou retirar-me, e vós me procurareis, mas perecereis no vosso pecado; para onde eu vou vós não podeis ir” (João 8:21 – Almeida Revista e Atualizada).
Jesus estava dizendo isso aos judeus que duvidavam dele, portanto tinham um pecado que impedia que fossem salvos por ele, que era o pecado de não crerem nele. Eles também tinham outros pecados, que não poderiam ser perdoados sem essa fé. Era preciso que cressem que Jesus era o mesmo JEOVÁ, o “EU SOU” do Antigo Testamento, caso contrário não poderiam ser salvos. Leia sempre o contexto para entender.
“De outra feita, lhes falou, dizendo: Vou retirar-me, e vós me procurareis, mas perecereis no vosso pecado; para onde eu vou vós não podeis ir. Então, diziam os judeus: Terá ele, acaso, a intenção de suicidar-se? Porque diz: Para onde eu vou vós não podeis ir. E prosseguiu: Vós sois cá de baixo, eu sou lá de cima; vós sois deste mundo, eu deste mundo não sou. Por isso, eu vos disse que morrereis nos vossos pecados; porque, se não crerdes que EU SOU, morrereis nos vossos pecados. Então, lhe perguntaram: Quem és tu? Respondeu-lhes Jesus: Que é que desde o princípio vos tenho dito? Muitas coisas tenho para dizer a vosso respeito e vos julgar; porém aquele que me enviou é verdadeiro, de modo que as coisas que dele tenho ouvido, essas digo ao mundo. Eles, porém, não atinaram que lhes falava do Pai. Disselhes, pois, Jesus: Quando levantardes o Filho do Homem, então, sabereis que EU SOU e que nada faço por mim mesmo; mas falo como o Pai me ensinou. E aquele que me enviou está comigo, não me deixou só, porque eu faço sempre o que lhe agrada. Ditas estas coisas, muitos creram nele” (João 8:21-30).
Devo lembrá-lo de que Deus perdoa os pecados de alguém, mas não o pecado dessa pessoa, que é a natureza original e arruinada que produz seus pecados. O pecado não foi perdoado, o pecado foi julgado em Cristo na cruz quando ele foi feito pecado ali.
Acho que você já entendeu que é impossível a alguém ser salvo seguindo qualquer religião que se diz cristã, porém sem crer na divindade de Cristo, que ele é o mesmo EU SOU que falou com Moisés, o mesmo Jeová que acompanhou Israel no Antigo Testamento. A salvação é pela fé em Cristo, mas não naquele inventado por algumas religiões que negam sua divindade, mas no único verdadeiro.
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Para que pregar o evangelho se ele já foi pregado a toda criatura?
Sua dúvida é por que razão teríamos de pregar o evangelho quando a própria Bíblia diz que ele já foi pregado a toda criatura. A dúvida surge ao ler Colossenses 1:23 “Se, na verdade, permanecerdes fundados e firmes na fé, e não vos moverdes da esperança do evangelho que tendes ouvido, o qual foi pregado a toda criatura que há debaixo do céu, e do qual eu, Paulo, estou feito ministro”.
A dificuldade aí está na versão da Bíblia que traduz incorretamente a palavra que no original significa “toda criação” como se fosse “toda criatura”. Se vou ao terreiro onde estão as galinhas no sítio e jogo ao ar um punhado de milho posso dizer que joguei milho para toda a criação de galinhas. Mas se eu separar uma e der milho a ela, estarei atingindo uma galinha individualmente. Algumas versões, como a em espanhol, italiano e em inglês (Darby) estão corretas: “en toda la creación”, “in tutta la creazione”, “in the whole creation”.
Isso é mais ou menos como quando uma lei é publicada no Diário Oficial da União e passa a valer em todo o país, mesmo para aqueles que nunca leram o Diário Oficial. Ninguém pode alegar desconhecer uma lei publicada no Diário Oficial, o que torna todos os cidadãos brasileiros responsáveis por obedecê-la, mesmo os analfabetos.
No início do mesmo capítulo 1 de Colossenses que gerou a dúvida você encontra algo que mostra bem o sentido do que Paulo está falando: “Por causa da esperança que vos está reservada nos céus, da qual já antes ouvistes pela palavra da verdade do evangelho, que já chegou a vós, como também está em todo o mundo; e já vai frutificando, como também entre vós, desde o dia em que ouvistes e conhecestes a graça de Deus em verdade” (Cl 1:5-6).
O “já chegou a vós” é para um círculo menor dos ouvintes, e o “como também está em todo o mundo” mostra a amplitude alcançada pela mensagem, isto é, como se já estivesse publicada no “Diário Oficial”.
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Existe um padrão para a vida de cada pessoa?
Se existe um padrão para a vida de cada pessoa? Certamente. Afinal, todos viemos ao mundo a partir de uma mesma matriz com um defeito chamado “pecado”, que é nossa natureza que busca a autossuficiência em rebelião contra o Criador. Essa matriz foi gerada no Jardim do Éden, quando Satanás prometeu a Eva: “Sereis como Deus”. A partir daí nascemos achando que somos donos de nosso próprio nariz e destino. E uma vez dada a partida, corremos todos uma corrida semelhante e seguindo um mesmo padrão, que pode ou não ter um final feliz.
O processo de rebelião do homem, seja ele crente ou incrédulo, é mostrado nas etapas de distanciamento do “filho pródigo” ou perdulário no capítulo 15 do Evangelho de Lucas:
1. Começa com o filho mais novo fazendo exigências como se Deus estivesse ao seu dispor. Hoje você encontra essa disposição até entre pessoas que se dizem cristãs e acham que Deus lhes deve a obrigação de dar saúde e dinheiro em abundância: “Dá-me a parte da fazenda que me pertence” (vers. 12).
2. O filho pródigo se afasta o máximo possível do Pai, e acaso não é este o sentimento no coração de toda criatura que ainda não conhece a Cristo como Salvador e até mesmo daqueles que conhecem, mas deliberadamente preferem andar em pecado? “…partiu para uma terra longínqua” (vers. 13).
3. Ele desperdiça tudo o que recebeu por graça: “…ali desperdiçou a sua fazenda” (vers. 13).
4. Ele chega à estaca zero, fica sem nada: “…havendo ele gastado tudo” (vers. 14).
5. Ele passa necessidade: “…começou a padecer necessidades” (vers. 14).
6. Ele fica dependente de alguém, como um viciado depende do traficante fornecedor: “…e chegou-se a um dos cidadãos daquela terra” (vers. 15).
7. Ele sofre degradação, pois o diabo promete, mas não entrega: “…o mandou… a apascentar porcos” (vers. 16) – apascentar porcos era uma profissão degradante aos olhos dos judeus.
8. Ele passa a desejar só o pior: “…desejava… o que os porcos comiam” (vers. 16).
9. Ninguém lhe dá nada no lugar que escolheu para viver longe do Pai: “…e ninguém lhe dava nada” (vers. 16) – como eu disse, o diabo promete, mas não entrega.
10. Felizmente ele cai em si quando percebe a graça e a abundância que há na casa do Pai e decide voltar arrependido, mesmo que seja na condição de “jornaleiro” ou “diarista”: “E, tornando em si, disse: Quantos jornaleiros de meu pai têm abundância de pão, e eu aqui pereço de fome! Levantar-me-ei, e irei ter com meu pai, e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e perante ti; já não sou digno de ser chamado teu filho; faze-me como um dos teus jornaleiros” (vers. 17-19).
11. Mas ao invés de ser recebido como um jornaleiro ou diarista seu pai o vê ainda longe e corre para ele, recebendo-o com um beijo, um abraço, roupas limpas, anel no dedo e sandálias nos pés. Uma festa é dada e o Pai se alegra com o filho que voltou. “E, levantando-se, foi para seu pai; e, quando ainda estava longe, viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou. E o filho lhe disse: Pai, pequei contra o céu e perante ti, e já não sou digno de ser chamado teu filho. Mas o pai disse aos seus servos: Trazei depressa a melhor roupa; e vesti-lho, e ponde-lhe um anel na mão, e alparcas nos pés; e trazei o bezerro cevado, e matai-o; e comamos, e alegremo-nos; porque este meu filho estava morto, e reviveu, tinha-se perdido, e foi achado. E começaram a alegrar-se.” (vers. 20-24).
12. Enquanto o filho reconhecidamente pecador cai em si e volta arrependido para os braços do Pai, o filho mais velho, como qualquer religioso que se considera justo e correto e nunca saiu da casa do Pai, ao menos de modo visível, recusa-se a entrar na casa: “ele se indignou, e não queria entrar” (vers. 28). A verdade é que ele sempre viveu longe do Pai por valorizar mais seus amigos, talvez “justos e corretos” como ele, e isso fica claro em sua reclamação: “Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me COM OS MEUS AMIGOS” (vers. 29).
Se você for como o filho mais jovem, que reconhece que pisou na bola toda a sua vida, em que estágio você se encontra? Que tal voltar arrependido de seu pecado e receber por graça o perdão e a comunhão do Pai? Ou será que você é como o filho mais velho, que se acha justo e correto e fica indignado ao saber “que Cristo Jesus veio ao mundo, para salvar os pecadores” (1 Tm 1:15)? Então espero que seja como Paulo, que era justo e correto segundo sua religião judaica, e isso o levou a ser cúmplice e culpado da prisão e assassinato de famílias inteiras de cristãos, até ser alcançado pela misericórdia de Deus e considerar como esterco toda aquela tradição religiosa que recebeu de seus pais, aceitando que a salvação era tão somente pela fé e que ele era o principal dentre os pecadores.
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Podemos usar novas mídias na evangelização?
Quando a fotografia foi inventada, muitos cristãos fizeram oposição àquilo porque entendiam que era pecado fazer imagens, conforme diz o mandamento da Lei. “Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra” (Êx 20:4). Em 1992 visitei uma irmã em Cristo na Escócia em companhia de um irmão mais velho, e antes de chegarmos à casa dela ele me avisou para guardar a câmera. Ela congregava em um grupo de cristãos que não aprovavam fotografias. Isso foi nos anos 1990 e acredito que o grupo nem exista mais.
Obviamente muitos desses costumes mudaram mesmo entre irmãos que tinham dificuldades para aceitar as novas tecnologias que surgiram na idade moderna. Tome, por exemplo, a televisão. Em casa não tivemos TV até nossos filhos chegarem aos 17 ou 18 anos, que foi quando nos mudamos para um apartamento em um condomínio no qual o custo da TV a cabo estava incluído. Então emprestamos uma velha TV de meus pais com o argumento de que, sendo TV a cabo, poderíamos filtrar a programação e assistir apenas History Channel, Mundo Animal e coisas do gênero. Obviamente estávamos enganados. Mas mesmo que hoje existam irmãos que preferem não assistir TV em casa (e até aqui tem sido esta a opção que meus filhos fizeram em seus próprios lares), já não é possível deixar de levar a TV no bolso, no mesmo smartphone onde levamos nossa Bíblia, hinário e uma coleção de livros cristãos. Agora o “não ter TV” deixou de ser uma opção e o controle próprio passou a ser uma necessidade.
Quando comecei a produzir os vídeos de “O Evangelho em 3 Minutos” alguns irmãos não gostaram da novidade, pois achavam que seria errado usar vídeos para evangelizar. Eu já tinha enfrentado alguma oposição e críticas quando criei meu primeiro site “Histórias de Verdade”, numa época quando quase ninguém tinha Internet e muitos achavam que as coisas de Deus não poderiam se misturar com as coisas do mundo em uma mesma plataforma. Uma das razões apresentadas era a ideia do “carro de boi”, tirada do Antigo Testamento em 1 Samuel 6, quando o povo de Israel usou dos mesmos meios dos incrédulos filisteus para carregar a Arca da Aliança que teria de ser carregada só da maneira ditada por Deus, ou seja, por meio de varais nos ombros dos levitas.
Mas, se tomarmos a passagem como regra, teremos de limitar a evangelização às pregações orais e o ensino bíblico a cartas manuscritas, pois eram estas as mídias utilizadas nos tempos bíblicos. Não poderíamos usar microfones, e já ouvi falar de ao menos um cristão que abomina os microfones sem fio por achar que o príncipe das potestades do ar poderia distorcer o que é dito e transmitido através das ondas eletromagnéticas que viajam pelo ar. Também não poderíamos usar mensagens gravadas em áudio ou vídeo, além de calendários com fotos coloridas, telefone, rádio, Internet etc. E até mesmo teríamos de deixar de usar o papel, já que este surgiu muito tempo depois dos tempos bíblicos. Nossas Bíblias seriam em tabletes de argila, rolos de peles de animais ou papiros vindos do Egito.
Mesmo hoje acredito que muitos irmãos mais velhos não aprovem o uso de vídeos ou de textos na Internet para evangelizar ou publicar a sã doutrina. Já ouvi um argumento de que não devemos colocar as coisas de Deus lado a lado com as coisas imorais e pagãs que existem na Internet. Um irmão me disse conhecer alguém que usava desse argumento para não concordar com a venda de livros de sã doutrina em sites como o da Amazon.
Existe sempre o risco de aceitarmos algo apenas como tradição humana, mesmo que seja uma boa tradição, porque a linha que separa uma boa tradição da discriminação e preconceito é muito tênue. No século 19 e início do século 20 os filhos usavam as mesmas roupas dos pais, falavam da mesma maneira e tinham as mesmas tecnologias, pois as coisas não chegavam a mudar muito em um século. Hoje vivemos quatro ou cinco gerações de costumes, ideias e tecnologias em apenas uma vida. É difícil nos acostumarmos com coisas que não faziam parte de nosso hábito quando éramos mais jovens, mas que hoje fazem parte da vida diária de nossos filhos. Por esta razão muitos pais precisam hoje dos filhos para usar tecnologia, algo que no passado sempre foi o inverso.
“Ora, este é o número dos homens armados para a peleja, que vieram a Davi, em Hebrom, para lhe transferirem o reino de Saul, segundo a palavra do Senhor… dos filhos de Issacar, conhecedores da época, para saberem o que Israel devia fazer, duzentos chefes e todos os seus irmãos sob suas ordens” (1 Cr 12:23; 32).
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Fui possuída por um “espírito de prostituição”?
Costumo receber de pentecostais perguntas sobre o “espírito das prostituições”, pois seus pastores pregam que se caírem em algum pecado moral ficarão possessos do “espírito das prostituições”. Você já pode imaginar o estrago que isso faz na mente de um jovem cristão quando sai dos trilhos em assuntos envolvendo namoro e relacionamentos. A verdade é que ninguém verdadeiramente convertido a Cristo pode ser possuído por algum espírito imundo, pois já é habitado pelo Espírito Santo que foi prometido por Jesus para ficar para sempre com os salvos.
Ao tirar o versículo de Oseias 5:4 de seu contexto, que tinha a ver com a infidelidade de Israel e sua prostituição com os ídolos pagãos, os pastores fazem disso uma ferramenta de terror. Costumo receber e-mails de pessoas desesperadas por terem cometido um pecado moral, pois onde congregam são ensinadas que aquilo selou para sempre seu destino eterno e que não há mais volta. Nunca mais terão perdão e estão possessas de um espírito de prostituição. Essa irresponsabilidade de alguns pregadores já levou pessoas ao suicídio.
Vou transcrever aqui a passagem toda de Oseias para mostrar como muitos são manipulados e aterrorizados por líderes religiosos inescrupulosos, e acredito que sirva também como alerta para sabermos dividir bem a palavra da verdade a fim de não usarmos passagens fora do contexto que possam afligir nossos irmãos.
Depois de dizer em Oseias 4 que “O meu povo consulta a sua madeira, e a sua vara lhe responde… Sacrificam sobre os cumes dos montes, e queimam incenso sobre os outeiros… e com as meretrizes sacrificam… Efraim está entregue aos ídolos”, indicando claramente que prostituição nesta mensagem tem um aspecto de infidelidade para com Jeová e idolatria, o profeta continua “Ouvi isto, ó sacerdotes, e escutai, ó casa de Israel, e dai ouvidos, ó casa do rei, porque contra vós se dirige este juízo, visto que fostes um laço para Mizpá, e rede estendida sobre o Tabor. Os revoltos se aprofundaram na matança; mas eu castigarei a todos eles. Eu conheço a Efraim, e Israel não se esconde de mim; porque agora te tens prostituído, ó Efraim, e Israel se contaminou. Não querem ordenar as suas ações a fim de voltarem para o seu Deus, porque o espírito das prostituições está no meio deles, e não conhecem ao Senhor” (Os 5:1-4).
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Por que Pedro disse que as mulheres iriam profetizar?
Você questiona a razão de eu dizer que a mulher não pode pregar, se em Atos 2:17-18 diz que “vossas filhas profetizarão… e sobre as minhas servas derramarei do meu Espírito naqueles dias, e profetizarão”. Eu não disse que a mulher não pode pregar. Quem diz isto é o Espírito Santo em sua palavra que proíbe a mulher de ensinar em 1 Timóteo 2: “A mulher aprenda em silêncio, com toda a submissão. E não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem; esteja, porém, em silêncio. Porque, primeiro, foi formado Adão, depois, Eva. E Adão não foi iludido, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão” (1 Tm 2:11-14).
A mesma Palavra de Deus ordena que as mulheres não falem nas reuniões da igreja: “Conservem-se as mulheres caladas nas igrejas, porque não lhes é permitido falar; mas estejam submissas como também a lei o determina. Se, porém, querem aprender alguma coisa, interroguem, em casa, a seu próprio marido; porque para a mulher é vergonhoso falar na igreja. Porventura, a palavra de Deus se originou no meio de vós ou veio ela exclusivamente para vós outros? Se alguém se considera profeta ou espiritual, reconheça ser mandamento do Senhor o que vos escrevo” (1 Co 14:34-37).
Existe uma esfera de atuação da mulher em muitas áreas, como falar de Cristo a alguém sem entrar no ensino de doutrina e fazendo isso fora das reuniões da igreja. Veja que foi uma mulher que Jesus escolheu para contar aos discípulos que ele havia ressuscitado. Você também encontra Priscila ajudando seu marido Áquila a esclarecer melhor o evangelho a Apolo, um cristão eloquente, porém sem muito conhecimento. “Quando o ouviram Priscila e Áquila, o levaram consigo e lhe declararam mais precisamente o caminho de Deus” (At 18:26). Mulheres também podem falar do evangelho a crianças, consolar enfermos e ajudar no ministério prático das necessidades dos santos. Você encontra várias mulheres mencionadas nas cartas de Paulo pelo trabalho que faziam dentro da esfera que lhes era adequada.
Também em Tito vemos um ministério importantíssimo dado às mulheres para a edificação de um lar cristão: “As mulheres idosas, semelhantemente, que sejam sérias no seu viver, como convém a santas, não caluniadoras, não dadas a muito vinho, mestras no bem; para que ensinem as mulheres novas a serem prudentes, a amarem seus maridos, a amarem seus filhos, a serem moderadas, castas, boas donas de casa, sujeitas a seus maridos, a fim de que a palavra de Deus não seja blasfemada” (Tt 2:3-5).
A passagem que citou de Atos 2 é uma profecia de Joel que ainda não se cumpriu em sua totalidade, e Pedro a mencionou apenas para indicar que o que estava acontecendo ali, quando o Espírito Santo desceu em poder para formar a Igreja, era uma amostra do que acontecerá quando Cristo vier para estabelecer seu reino. É simples perceber que a passagem não se cumpriu na sua totalidade lendo o restante da mesma profecia:
“E acontecerá nos últimos dias, diz o Senhor, que derramarei do meu Espírito sobre toda a carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão, vossos jovens terão visões, e sonharão vossos velhos; até sobre os meus servos e sobre as minhas servas derramarei do meu Espírito naqueles dias, e profetizarão. Mostrarei prodígios em cima no céu e sinais embaixo na terra: sangue, fogo e vapor de fumaça. O sol se converterá em trevas, e a lua, em sangue, antes que venha o grande e glorioso Dia do Senhor. E acontecerá que todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo” (At 2:17-21).
Esses “últimos dias” não são o fim do mundo, mas os últimos dias de Israel na terra encerrando o tempo de sua desobediência e provação, antes da inauguração do Reino de mil anos de Cristo. Acho que você já percebeu que naquele dia mencionado em Atos 2 e nem desde então, aconteceram esses “prodígios em cima no céu e sinais embaixo na terra”, com “sangue, fogo e vapor de fumaça”, e nem o sol se converteu em trevas e a lua em sangue. Isso se refere ao “grande e glorioso Dia do Senhor”. Tudo isso acontecerá quando Cristo descer ao mundo para julgar as nações. Antes disso um remanescente fiel de Israel se converterá no período dos sete anos após o arrebatamento da Igreja e receberá seu Messias tão esperado.
Esses sinais de que fala a passagem são os mesmos descritos no Evangelho de Mateus: “Logo em seguida à tribulação daqueles dias, o sol escurecerá, a lua não dará a sua claridade, as estrelas cairão do firmamento, e os poderes dos céus serão abalados. Então, aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem; todos os povos da terra se lamentarão e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e muita glória” (Mt 24:29-30).
Repare também que o que aconteceu no dia de Pentecostes em Atos 2 não foi o Espírito Santo ser derramado “sobre toda a carne” como prevê a profecia, mas apenas sobre as cento e vinte pessoas (At 1:15) que estavam naquele cenáculo.
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Posso me manter atualizado?
O cristão não é deste mundo, mas também não é um alienado que sequer saiba o que está acontecendo ao seu redor. Uma vez um irmão brasileiro conheceu nos Estados Unidos um irmão de lá, quando na época o presidente era Jimmy Carter. O irmão norte-americano era tão parecido com o presidente dos Estados Unidos que o brasileiro não se furtou a comentar: “Uau, você se parece com o Jimmy Carter!”, ao que o americano respondeu: “Quem é Jimmy Carter?”.
No meu entender a alienação e ignorância podem fechar portas para o testemunho cristão. O Senhor Jesus estava atento aos acontecimentos de seus dias quando comentou “dos galileus, cujo sangue Pilatos misturara com os seus sacrifícios” e “daqueles dezoito, sobre os quais caiu a torre de Siloé e os matou” (Lc 13:1-4). O apóstolo Paulo não era um ignorante da cultura grega, quando citou seus poetas, ao dizer aos gregos: “Também alguns dos vossos poetas disseram: ‘Pois somos também sua geração’” (At 17:28).
Qualquer conhecimento mínimo de economia, cultura, geografia, arquitetura, religião, sociologia ou política pode servir de gancho para levar uma conversa para aquilo que realmente importa: testemunhar de Cristo. Paulo não precisou estudar profundamente a idolatria grega; bastou ter um olhar observador e atento para levar a verdade àquele povo pagão e idólatra. Em sua visita a Atenas, estando no meio do Areópago, declarou: “Passando eu e vendo os vossos santuários, achei também um altar em que estava escrito: AO DEUS DESCONHECIDO. Esse, pois, que vós honrais, não o conhecendo, é o que eu vos anuncio” (At 17:23).
Quando Davi montou seu “ministério” um dos grupos de pessoas que escolheu era de homens que sabiam discernir sua época, e acredito que esta qualidade também seja útil a um cristão: “Ora, este é o número dos homens armados para a peleja, que vieram a Davi, em Hebrom, para lhe transferirem o reino de Saul, segundo a palavra do Senhor… dos filhos de Issacar, conhecedores da época, para saberem o que Israel devia fazer, duzentos chefes e todos os seus irmãos sob suas ordens” (1 Cr 12:23; 32).
O homem que Deus escolheu para levar o evangelho a reis e príncipes não foi um Pedro pescador, mas um Paulo que podia circular nessas esferas sem se deixar intimidar, seduzir ou influenciar pelo status de seus interlocutores. Antes Deus já tinha levantado, para pedirem a liberação do corpo de Jesus, a Nicodemos e José de Arimateia, homens ilustres da sociedade judaica, que tinham acesso garantido ao governador Pôncio Pilatos.
Ao longo da Bíblia temos muita informação política, pois reis e governantes são continuamente mencionados para situar no tempo o contexto do que está sendo dito, e isso não se limita ao Antigo Testamento ou aos Evangelhos, mas continua em Atos e nas epístolas. Eu precisaria arrancar várias páginas do Novo Testamento se dissesse que não me interesso por política.
A chegada de Cristo ao mundo teve repercussões políticas e sua morte também. O cenário político teria também impacto nos primeiros cristãos e isso continuaria ao longo da história do testemunho cristão na terra profetizado nas sete cartas de Apocalipse, quando sete estágios desse testemunho são ali apresentados em relação com o grau de seu envolvimento com a política e as coisas que são de homens.
No Antigo Testamento tudo tinha relação com política, porque Deus havia estabelecido um povo na terra — Israel — para se assenhorear das outras nações e inclusive fazer valer seus direitos pela espada. Por causa de sua rebelião e idolatria, Israel perdeu seu mandato de governar o mundo com um “rei de reis”, tendo esse poder e autoridade sido transferido por Deus aos gentios, começando por Nabucodonosor que seria depois sucedido por outros grandes reinos até o dia quando o “Rei de reis” vier estabelecer seu reino.
Nos evangelhos ainda vemos uma intervenção política ativa de um profeta que representava o Antigo Testamento em sua transição, João Batista, interferindo até nos relacionamentos amorosos de um governante. Mas o próprio Jesus não se deu ao trabalho de tentar mudar o regime romano que se estabelecera na Judeia, tratando apenas de denunciar a ruína do povo que outrora Deus escolhera para representá-lo aqui, o qual chegou a transformar o Templo de Deus em covil de ladrões.
A partir de Atos, quando a Igreja foi formada, os cristãos passaram a ser não mais que espectadores e figurantes numa peça na qual o único impacto que têm é pela sua presença como “sal e luz”. Assim como esses elementos têm influência no mundo, os cristãos agem sem agir, e mesmo assim causam um impacto maior do que teria qualquer político com poder de puxar o gatilho atômico. O cristão é cidadão celestial e sabe que é Deus quem põe e tira reis, portanto não cabe a ele interferir no processo para não se fazer culpado de estar agindo na contramão do que Deus quer para este mundo.
Mesmo assim cristãos estiveram infiltrados em todas as esferas da sociedade da época do início da Igreja. Nós os encontramos nas prisões e nas forças armadas, como foi o caso de Paulo que testemunhou ali para “toda a guarda pretoriana” (Fp 1:13), até nos altos escalões do governo, então a corte romana, “especialmente os da casa de César” (Fp 4:22). Onde você lê “casa de César” leia “família de César” porque é este o sentido.
Pode imaginar o impacto que teve o evangelho talvez ouvido na prisão por algum oficial romano que, depois de convertido, o tenha levado até o círculo familiar mais íntimo do homem mais poderoso do mundo, o imperador de Roma? Você conseguiria ter esse impacto fazendo política? Não. Você conseguiria ter esse impacto sendo cristão e testemunhando de Cristo? Sim.
Ao participarmos do cenário político apenas como “observadores”, como aqueles jornalistas e especialistas que nos enviam notícias do exterior sem interferir nelas, aprendemos a “conhecer a época” como faziam os servos de Davi para entendermos que às vezes Deus permite um Napoleão ou Hitler como a sua vara, como permitiu que um Nabucodonosor invadisse a terra outrora prometida ao povo que Deus chamou de “menina dos olhos” para levá-lo cativo à Babilônia.
Os problemas começam quando saímos da posição de figurantes ou pessoas que querem apenas se manter informadas e entender sua época, e passamos à militância ativa como atores de algum partido ou ideologia política, e somos seduzidos pela crença de que temos algum poder de mudar o mundo pela eleição da pessoa certa. O problema é que a pessoa certa será aquela que Deus colocar no poder, e isso nem sempre para a felicidade do povo. Ao contrário do dito popular e dos anseios democráticos de nossa sociedade, a voz do povo NÃO É a voz de Deus.
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Submissão feminina é coisa do passado?
Você perguntou se estaria fora de moda as mulheres serem submissas aos seus maridos, e eu lhe pergunto se estaria fora de moda a Palavra de Deus e os mandamentos do Senhor dados à Igreja. Você pergunta por viver numa cultura ocidental, pois talvez nem perguntasse caso tivesse sido criado em outra cultura. É que durante milênios a sujeição da esposa ao marido foi a norma de todas as civilizações, e não é de estanhar que justamente neste fim de tempos isso também esteja sendo questionado.
Para a Igreja a Palavra de Deus ordenou em Efésios 5:22 e 24: “Mulheres, sujeitem-se a seus maridos, como ao Senhor, assim como a igreja está sujeita a Cristo, também as mulheres estejam em tudo sujeitas a seus maridos”. Mas embora a ordem tenha sido dada à Igreja, e também mostrado que através dessa sujeição a mulher estaria representando a Igreja em sua relação com Cristo, esse mandamento é muito anterior à Igreja ou até mesmo a Israel. É um mandamento dado na Criação do homem, mas suas raízes estão na eternidade, quando o Pai designou o Filho para morrer e do seu lado aberto sair uma esposa que seria submissa a ele.
Na ordem dada para a reunião da Igreja temos: “As vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar; mas estejam sujeitas, como também ordena a lei. E, se querem aprender alguma coisa, interroguem em casa a seus próprios maridos; porque é vergonhoso que as mulheres falem na igreja”. E para deixar claro que a Palavra de Deus não está sujeita aos nossos caprichos ou preferências, o apóstolo complementa: “Porventura saiu dentre vós a palavra de Deus? Ou veio ela somente para vós? Se alguém cuida ser profeta, ou espiritual, reconheça que as coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor” (1 Co 14:34-37).
Mas sua dúvida surgiu depois de ler um texto de um teólogo dizendo que “os homens que se agarram aos textos de Paulo sobre o tema são dominadores, preconceituosos e inseguros, mas, com uma Bíblia nas mãos, eles se servem da força do dogma que impede uma leitura de Paulo condicionada ao prisma da sociedade em que ele vivia — machista e patriarcal — ou seja, uma cosmovisão totalmente diferente da nossa”. Evidentemente se a Bíblia fosse ilustrada Paulo teria desenhado para esse teólogo entender que o que ele escrevia inspirado pelo Espírito Santo de Deus não eram ideias próprias, mas “mandamentos do Senhor” (1 Co 14:37).
Na tentativa de tornar nula a Palavra de Deus o teólogo lança mão, não apenas dos aspectos históricos e culturais da época, mas da teologia moderna que é seletiva na interpretação dessas passagens, já que hoje mulheres já são ordenadas para posições clericais, ensinam em escolas de teologia e pregam nos templos católicos e protestantes. Ou seja, tomando por base o erro generalizado da cristandade em acatar apenas 50% da ordem dada na Palavra de Deus, ele tenta atingir os 100%. Acho que é um novo significado para a expressão “jogar fora o bebê junto com a água do banho”.
Então o texto que você me enviou segue dizendo: “Nós sabemos que o texto [bíblico] é inspirado, mas também precisamos compreender que, alguns deles, em função de questões religiosas, culturais, políticas, econômicas, sociais, dentre outras, expirou! É o caso da submissão da mulher”. Para fundamentar suas afirmações o autor apela para dados do IBGE, que Paulo obviamente desconhecia, para mostrar que mais da metade dos lares brasileiros são comandados por mulheres sem marido. Quando alguém usa de uma estatística para dar suporte a uma situação contrária ao plano inicial de Deus eu não posso deixar de lembrar de outra frase, a de que deveríamos nos alimentar de esterco, pois “um bilhão de moscas não podem estar erradas”.
Aplicando os dados do IBGE, que nada mais é que a constatação da ruína do homem em preservar o que Deus ordenou, ele tenta deslocar o eixo do princípio de autoridade que foi estabelecido por Deus que é Deus – Cristo – Homem – Mulher, onde o Espírito Santo diz que “Cristo é a cabeça de todo o homem, e o homem a cabeça da mulher; e Deus a cabeça de Cristo” (1 Co 11:3). Perverter esta afirmação é transformá-la em algo como: “Cristo é a cabeça de quem o IBGE determinar, e Deus a cabeça de Cristo”.
Mas ao concentrar-se no que chama de “textos de Paulo”, ele usa de ironia ao dizer que aqueles que afirmam que os princípios de Deus são irrevogáveis, ficam sem condição de defesa diante de “argumentos básicos da exegese, coisa que criança em escola dominical já sabe fazer”. É típico de teólogos introduzirem algum termo de teologia na argumentação para deixar claro que estão falando de cima para baixo, e neste caso chamando de menos letrados que uma criança de escola dominical quem contestar suas afirmações. Quando vejo alguém querer ostentar conhecimento acadêmico nas coisas de Deus me lembro logo da historinha do ilustre doutor que contratou um humilde barqueiro para atravessar o rio. Enquanto o barqueiro remava, o doutor humilhava:
— Você sabe matemática?
— Sei não sinhô.
— Então perdeu dez anos de sua vida. Geografia?
— Nem imagino.
— Perdeu mais dez anos. Química?
— Nunca estudei, seu dotô.
E assim foi o diálogo e a humilhação até a canoa chegar no meio do rio e o pobre barqueiro pedir licença para perguntar:
— Me desculpe interromper, dotô, mas o senhor sabe nadar?
— Não, nunca me preocupei em aprender algo tão desnecessário em minha profissão acadêmica.
— Então o dotô perdeu a vida inteira, porque a canoa está afundando.
Bem, eu não sou teólogo e nem perito em exegese, que significa trazer à tona o significado de um texto, mas nunca é bom colocar o foco em uma passagem ou princípio e deixar passar tudo o que foi revelado por Deus na sua Palavra. É o caso, por exemplo, desta afirmação na carta aos Coríntios, quando fala da submissão da mulher: “estejam sujeitas, como também ordena a lei” (1 Co 14:34). Mas será que Paulo estaria se referindo só à Lei dada a Moisés? Também, pois em todo o Pentateuco vemos o homem assumindo o controle das coisas de Deus.
Mas essa “lei” da submissão feminina ao marido foi dada no jardim do Éden muito antes da Lei mosaica, e não foi exclusivamente para o povo de Israel, mas para toda a espécie humana. E é bom entender isso, porque o teólogo que você citou não entendeu e afirmou que Paulo teria dado essa ordem “no que diz respeito a observância da Lei”, certamente referindo-se à Lei dada a Israel. Seria estranho que Paulo fizesse isso com os Coríntios que eram gentios.
O melhor caminho é entender que a palavra “lei” na Bíblia nem sempre se refere exclusivamente à Lei mosaica, mas pode se referir à “lei de Cristo” (1 Co 9:21; Gl 6:2), o qual também deixou seus mandamentos, que eventualmente acrescentavam ao que havia sido dito na Lei mosaica, ou a modificava, quando eram precedidos de um “eu porém vos digo”.
Portanto a submissão da esposa ao marido não se originou na Lei dada a Israel, nem nos ensinos de Jesus nos evangelhos, nem na doutrina dos apóstolos nas epístolas. Ela foi concebida na eternidade e depois, na Criação, estabelecida no Éden, primeiro quando Deus criou a mulher para ser uma ajudadora de Adão: “E disse o Senhor Deus: Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma ajudadora idônea para ele” (Gn 2:18). Depois, quando seduzida pela conversa de Satanás, a mulher caiu em pecado e Adão deliberadamente decidiu segui-la, ainda que depois tentasse culpar a mulher e Deus, que a havia dado como esposa: “A mulher que me deste por companheira, ela me deu da árvore, e comi” (Gn 3:12).
Então veio a sentença para Satanás, travestido na serpente, ao mesmo tempo em que Deus providenciava a quebra do encanto exercido pelo diabo sobre a mulher, transformando-os em inimigos, anunciava que da mesma mulher viria aquele que esmagaria a cabeça da serpente, Cristo: “E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente; esta [a semente da mulher] te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar” (Gn 3:15).
A ordem da submissão que veio em seguida foi uma forma de Deus proteger a mulher, e não reprimi-la, como explicarei daqui a pouco: “O teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará”, seguida da reprimenda e maldição contra a terra e o fruto do trabalho de Adão justamente por ter dado ouvidos à mulher: “Porquanto deste ouvidos à voz de tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei, dizendo: Não comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás dela todos os dias da tua vida” (Gn 3:16, 17).
Resumindo o que diz em Gênesis:
1. A serpente (Satanás) foi amaldiçoada por Deus.
2. A serpente passaria a ser inimiga da mulher.
3. A serpente feriria o calcanhar da semente da mulher (Jesus).
4. A semente da mulher (Jesus) feriria a cabeça da serpente (na cruz).
5. Por ganhar um inimigo (a Serpente) a mulher deve ser submissa ao marido.
6. Por ter dado ouvidos à mulher o homem precisará trabalhar duro.
Agora podemos entender melhor o que diz em 1 Timóteo 2:11-15: “A mulher aprenda em silêncio, com toda a submissão. E não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem; esteja, porém, em silêncio. Porque, primeiro, foi formado Adão, depois, Eva. E Adão não foi iludido, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão. Todavia, será preservada através de sua missão de mãe, se ela permanece em fé, e amor, e santificação, com bom senso”.
A única maneira de Deus trazer ao mundo o Salvador, aquele que esmagaria a cabeça da serpente, seria através de uma mulher. Antes que alguma mulher pense que a maternidade seja uma posição inferior à do homem, leia com atenção o que vou repetir: O Salvador só poderia vir ao mundo por meio de uma mulher. Jesus não teve pai humano, mas teve mãe humana. O homem era, por assim dizer, dispensável no processo da vinda do Salvador ao mundo. A mulher não.
Dada a importância da mulher na obra da salvação do mundo, Deus quis “salvá-la” da influência de seu arqui-inimigo, o Diabo. Este continua sendo o principal inimigo da mulher até hoje, daí Deus preferir não expor a mulher para que ela não volte a ser enganada pelo Diabo. Mas essa salvaguarda a mulher só tem enquanto permanece na posição que Deus reservou para ela, ou seja, submissa ao homem. A passagem de 1 Timóteo 2 foi melhor traduzida na versão Almeida Revista e Atualizada, que traz “homem” ao invés de “marido”, porque a ordem é universal e não restrita ao matrimônio, e “será preservada” e não “será salva” como aparece em outras traduções, porque aqui não está falando de salvação eterna. A submissão ou sujeição foi o modo escolhido por Deus para proteger a mulher e mantê-la a salvo dos ataques de Satanás.
As mulheres que deliberadamente abrem mão dessa proteção ficam expostas ao mal, em especial doutrinário. Sabendo que Deus quis dar à mulher um lugar de proteção contra a influência do Diabo, não é de admirar que esta doutrina do lugar da mulher tenha sofrido tantos ataques e esteja hoje tão desacreditada. E não poderia ser diferente. Vivemos em tempos de apostasia (abandono da verdade), em um estado de ruína muito parecido com o que é descrito pelo último versículo do livro de Juízes, que relata um dos períodos mais tristes da história de Israel. Naquele livro você encontra mulheres no papel de juízas porque os homens tinham falhado em manter sua posição. E o livro termina assim: “Naqueles dias não havia rei em Israel; porém cada um fazia o que parecia reto aos seus olhos” (Jz 21:25).
Acredito que você já tenha entendido, mas como algum teólogo moderninho pode querer ler este texto e acabar não entendendo, permita-me desenhar para mostrar como são maravilhosos os desígnios eternos de Deus, nos quais estava incluída a submissão da mulher ao homem porque prefigurava a Igreja em sua sujeição a Cristo:
“Vós, mulheres, sujeitai-vos a vossos maridos, como ao Senhor; porque o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja, sendo ele próprio o salvador do corpo. De sorte que, assim como a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo sujeitas a seus maridos. Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela, para a santificar, purificando-a com a lavagem da água, pela palavra, para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível. Assim devem os maridos amar as suas próprias mulheres, como a seus próprios corpos. Quem ama a sua mulher, ama-se a si mesmo. Porque nunca ninguém odiou a sua própria carne; antes a alimenta e sustenta, como também o Senhor à igreja; porque somos membros do seu corpo, da sua carne, e dos seus ossos. Por isso deixará o homem seu pai e sua mãe, e se unirá a sua mulher; e serão dois numa carne. Grande é este mistério; digo-o, porém, a respeito de Cristo e da igreja. Assim também vós, cada um em particular, ame a sua própria mulher como a si mesmo, e a mulher reverencie o marido” (Ef 5:22-33).
Agora vem a pergunta que dá sentido a este desenho: Quando foi que Deus determinou que seu Filho viria ao mundo como um sacrifício? Nos tempos eternos, pois “Cristo… um cordeiro imaculado e incontaminado, o qual, na verdade, em outro tempo foi conhecido, ainda antes da fundação do mundo, mas manifestado nestes últimos tempos por amor de vós” (1 Pe 1:19-20). Do mesmo modo Deus “também nos elegeu nele [em Cristo] antes da fundação do mundo, para que fôssemos santos e irrepreensíveis diante dele em amor” (Ef 1:4). Então quando você pergunta se “Submissão feminina é coisa do passado” tenho de admitir que é sim, bem do passado, lá da eternidade passada quando nada e ninguém existia, além de Deus evidentemente.
E tem mais! A esse mesmo Paulo, tão desprezado pelos teólogos moderninhos, Deus revelou o mistério da Igreja, que nem os profetas do Antigo Testamento conheciam, e vamos deixar que Paulo explique: “Regozijo-me agora no que padeço por vós, e na minha carne cumpro o resto das aflições de Cristo, pelo seu corpo, que é a igreja; Da qual eu estou feito ministro segundo a dispensação de Deus, que me foi concedida para convosco, para cumprir [completar] a palavra de Deus; O mistério que esteve oculto desde todos os séculos, e em todas as gerações, e que agora foi manifesto aos seus santos” (Cl 1:24-26).
Com tudo isso, para mim fica muito claro que a insubordinação feminina destrói o desenho que Deus traçou nos tempos eternos. Obviamente um homem precisaria ser muito bronco para achar que isso coloca a mulher aos seus pés como uma espécie de escrava diante de seu feitor. O homem espiritual “que é espiritual discerne bem tudo” (1 Co 2:15), inclusive que o papel exigido da mulher pode ser difícil se ela viver numa sociedade como a atual, mas o papel exigido do homem é impossível se quiser viver esse relacionamento na força da carne, e não no poder do Espírito e da nova vida em Cristo. Digo isto porque dele se exige: “Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela” (Ef 5:22-33).
Prevendo que muitos iriam rejeitar o que Deus revelou a Paulo, o apóstolo Pedro deixou uma exortação em sua epístola: “Tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor; como também o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada; falando disto, como em todas as suas epístolas, entre as quais há pontos difíceis de entender, que os indoutos e inconstantes torcem, e igualmente as outras Escrituras, para sua própria perdição. Vós, portanto, amados, sabendo isto de antemão, guardai-vos de que, pelo engano dos homens abomináveis, sejais juntamente arrebatados, e descaiais da vossa firmeza; antes crescei na graça e conhecimento de nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo. A ele seja dada a glória, assim agora, como no dia da eternidade” (2 Pe 3:15-18).
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Devo convencer o outro a trocar de religião?
Com a facilidade que temos hoje de promover debates nas redes sociais, é preciso cuidado para não gastar saliva querendo ensinar doutrina a incrédulos ou tentar fazer o outro mudar de religião. Evangelismo não é proselitismo religioso. Não queremos ganhar um simpatizante para a causa cristã; não queremos contabilizar mais um que acredite que a Bíblia é a Palavra de Deus, que troque o funk pelo gospel, que creia na Criação e não na Evolução, que ache que prostituição e homossexualismo são pecados aos olhos de Deus, que fique livre das drogas ou mude a maneira de vestir. Fuja da tentação de conseguir prosélitos ou simpatizantes da causa cristã. De simpatizantes do cristianismo as igrejas estão cheias, e muitos deles são incrédulos que estão ali apenas em busca de bênçãos materiais, financeiras ou sentimentais.
Um religioso de qualquer religião irá querer nos dizer que sua religião também crê em Jesus e que em todas religiões existem pessoas boas e ruins, etc. Não adianta querer replicar. Se ele concordar com você, de que adiantou? Será apenas mais um simpatizante no fogo eterno. A questão é saber se ele, pessoalmente, tem ou não a certeza de sua salvação eterna. Se não tem é porque sua religião pode até dizer que acredita em Jesus, mas não lhe deu nada em troca.
Se você está congregado ao nome do Senhor fora dos sistemas denominacionais resista também à tentação de explicar isso a quem nunca se converteu a Cristo. Como saber? Bem, se a pessoa acha que para ser salva precisa ser boa ou perseverar até o fim é porque não entendeu o valor do sangue derramado no madeiro. Ela precisa do bom e velho evangelho antes de ser banhada em doutrina.
Outro dia estávamos conversando entre alguns irmãos e um deles disse que devemos olhar para evangélicos como olhamos para católicos, ou seja, pessoas que têm uma religião cristã, mas não estão necessariamente salvas por frequentarem uma religião. A cada dia fico mais convencido disso. Recebi de um agora irmão, um e-mail igual a outros que já recebi. Ele dizia que “se converteu” numa igreja evangélica, a qual frequentou durante anos até se decepcionar e voltar a ler a Bíblia. Foi aí que se converteu de verdade ao entender a libertação de seus pecados. Como costumamos dizer, foi só agora que ele chegou ao capítulo 8 de Romanos, o da consciência da libertação. Ele escreveu:
“Me senti livre, mas não o livre que o mundo ‘gospel’ fala, porém livre da ira de Deus, mesmo sem merecer. ‘E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará’, diz João 8:36. Foi literalmente um choque em minha vida. Tudo o que eu havia ouvido durante uns 10 anos da minha vida, ia contra tudo o que o Evangelho de Cristo mostra”.
Quando alguém se interessar em congregar somente ao nome do Senhor Jesus, comece perguntando se é convertido a Cristo. Se ele frequentar alguma igreja irá dizer que vai à igreja, que foi batizado e talvez até diga que é convertido. Então pergunte, assim, na lata: “Se você morrer agora, para onde vai?”. As respostas podem variar. Um verdadeiro crente em Cristo dirá que vai para o céu e se você perguntar a razão ele dirá que seus pecados foram pagos na cruz. Um religioso talvez diga ‘não sei’, ‘espero ir para o céu’, ‘Deus é quem vai julgar’, ‘ninguém sabe’, ‘procuro fazer o melhor que posso’, ‘sempre vou à igreja’, etc. Esse pode até ter nascido de novo como aconteceu com Cornélio, o centurião, antes de ouvir o evangelho da boca de Pedro (Atos 10), daí seu interesse nas coisas de Deus, mas provavelmente ainda não se converteu.
Em um diálogo com alguém assim, descobri que ele havia frequentado umas três igrejas e estava insatisfeito. Ao perguntar sobre sua salvação eterna respondeu que não sabia qual era seu destino, mas que sempre foi ‘abençoado’. Quando você escutar isso de um evangélico provavelmente ele está dizendo que tem recebido saúde, prosperidade e sorte no amor. A expectativa de muitos que se dizem cristãos nestes dias não é muito diferente de um pagão, que procura sacrificar para seus deuses não se irarem com ele e darem colheitas abundantes enquanto afugentam o temporal e os maus espíritos.
Esse meu interlocutor se decepcionou com as igrejas que frequentou porque numa o pastor pedia muito dinheiro, na outra o pastor exigia que as pessoas tivessem visões durante o culto e contassem suas visões (obviamente muita gente achava que que tinha visto algo no meio da gritaria). Resumindo, ele ia a essas igrejas esperando encontrar algo nelas, nas pessoas, na instituição, nos cultos.
Então percebi que ainda não tinha entendido o evangelho quando me perguntou se não teria perigo ele sair da igreja que frequentava, pois temia ser amaldiçoado e tudo dar errado em sua vida, como costumam alertar alguns desses lobos vestidos de pastores para não perderem a receita das ofertas. Obviamente eu estava diante de um religioso supersticioso, como qualquer católico ou membro de igrejas pentecostais. Dali em diante me concentrei no evangelho, e nem me preocupei em falar de doutrinas ou sobre o congregar, porque na cabeça dele reunir significa frequentar um lugar onde irá ser abençoado, as coisas vão melhorar, vai ter saúde e ficar protegido de espíritos malignos.
Uma coisa que aprendi há anos com um irmão mais velho é que, ao evangelizarmos, a melhor estratégia é manter a serpente sobre a rocha, isto é, não deixar que os arbustos de doutrinas, opiniões e religiões interfiram. É na superfície limpa da penha ou rocha que podemos bater na cabeça da serpente. Quando os arbustos doutrinários (mesmo que sejam corretos) são misturados ao cenário fica difícil ver onde está a cabeça da serpente.
“Estas três coisas me maravilham; e quatro há que não conheço: o caminho da águia no ar; o caminho da cobra na penha; o caminho do navio no meio do mar; e o caminho do homem com uma virgem” (Pv 30:18,19). Paulo resumiu isso quando relatou o modo como evangelizou os Coríntios e mostrou que não se interessou em nada além de apresentar Cristo a eles: “Porque nada me propus saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado” (1 Co 2:2).
O incrédulo sempre vai querer afastar o holofote da conversa desviando-o de si mesmo e de Cristo para apontá-lo aos homens, dogmas, doutrinas, religiões, etc. Ele fará tudo para fugir do constrangimento de ficar entre a cruz e a espada, no sentido de entre a salvação e o juízo que está diante de si. O papel de quem evangeliza é não deixá-lo escapar da cruz e nem da percepção da espada do juízo, e manter o holofote em Cristo e sua obra.
Quando evangelizamos é uma tentação sairmos no braço da disputa religiosa em um embate de opiniões. Quando a coisa toma o rumo da inutilidade é quando se envereda por aspecto históricos, culturais e sociológicos das religiões. Mas precisamos nos conter e nos concentrar no que realmente importa: estamos diante de uma alma sem Cristo que pode nem terminar sua conversa conosco e entrar na eternidade perdida. Se ela se converter a Cristo não precisarei dizer que precisará abandonar a religião A ou a crença B. O Espírito Santo fará isso como fez com os que se converteram das artes mágicas em Atos e queimaram seus livros.
“Também muitos dos que seguiam artes mágicas trouxeram os seus livros, e os queimaram na presença de todos e, feita a conta do seu preço, acharam que montava a cinquenta mil peças de prata” (At 19:19).
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Como entender tempo e matéria?
Sua dúvida partiu de um versículo no Salmo 90:4: “Porque mil anos são aos teus olhos como o dia de ontem que passou, e como a vigília da noite”. Eu acrescentaria também, “Mas, amados, não ignoreis uma coisa, que um dia para o Senhor é como mil anos, e mil anos como um dia” (2 Pe 3:8). Entender tempo e matéria é algo complicado para a mente humana e os cientistas têm se debruçado sobre este tema por séculos. O tempo foi criado junto com a matéria, portanto não existia antes. E ele deixará de existir com o fim do universo material quando terão início os novos céus e a nova terra dos quais a Bíblia nem fala muito porque seria impossível entender, a nós, criados para este universo de tempo e espaço.
Para Deus o tempo é apenas uma linha que ele criou em algum momento no passado e que irá terminar no futuro. Então tudo voltará a ser o estado eterno, sem tempo e sem linearidade nos acontecimentos. Como fomos criados no tempo, não somos capazes de entender o que ocorre fora do contexto do tempo, mas quando formos transformados (ou ressuscitarmos) estaremos aptos para viver na eternidade, sem tempo.
Para você ter uma leve ideia do que é Deus agindo hoje, independente do tempo, pense na estrela mais próxima da terra: Proxima Centauri que está a 4,22 anos-luz de nós, ou seja a quarenta trilhões de quilômetros. Só para você se situar, quando olhamos para essa estrela no céu vemos como ela era há 4,22 anos, e não como ela é agora. Se ela explodir agora, só veremos a explosão daqui a quatro anos. Se quisermos viajar para lá com o pé na tábua nos meios hoje disponíveis (sondas espaciais) levaremos 60 mil anos. Se formos a pé levaremos um bilhão de anos.
Agora imagine que Deus fosse um gigante muito alto, tão enorme que pudesse enxergar Proxima Centauri bem diante de seus olhos e ao mesmo tempo ter a Terra em sua visão periférica. Ou seja, ele seria capaz de ver a estrela e a Terra ao mesmo tempo! Eu entendo que é assim que Deus pode ver o passado, o presente e o futuro tudo ao mesmo tempo. Em nós, com esse raciocínio linear que temos do tempo, algo assim não faria qualquer sentido, mas para Deus é tudo perfeitamente normal.
Jesus, o Filho de Deus, Deus e Homem, ficou sujeito ao tempo quando se fez carne e veio habitar na terra. Que ele já era o Filho de Deus na eternidade, não há como contestar: “O Pai enviou seu Filho para Salvador do mundo” (1 Jo 4:14). O Pai não enviou Jesus para ser Filho, mas enviou o Filho para ser Jesus em humanidade, “Deus enviou seu Filho, nascido de mulher” (Gl 4:4). Não tente entender a encarnação, pois “sem dúvida alguma, grande é o mistério da piedade: Deus se manifestou em carne, foi justificado no Espírito, visto dos anjos, pregado aos gentios, crido no mundo, recebido acima na glória” (1 Tm 3:16).
O Filho de Deus não foi criado em carne, mas sim manifestado em carne, por ter existência prévia. “Nisto conhecereis o Espírito de Deus: Todo o espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus. E todo o espírito que não confessa que Jesus Cristo veio em carne não é de Deus; mas este é o espírito do anticristo, do qual já ouvistes que há de vir, e eis que já está no mundo… Porque já muitos enganadores entraram no mundo, os quais não confessam que Jesus Cristo veio em carne. Este tal é o enganador e o anticristo” (1 Jo 4:2-3; 2 Jo 1:7).
Mas, apesar de viver no contexto do tempo, ele deu provas de não estar limitado ao tempo e de ser capaz de manipular a matéria. Ele é o “Filho Eterno” de Deus. A palavra ‘eterno’ não faz muito sentido para nós, que nascemos e vivemos no tempo. Assim como os céus e a Terra, o tempo também foi criado e está intimamente ligado ao mundo material. A Bíblia afirma isso e Einstein também. Ele disse: “Supondo que toda matéria desaparecesse do mundo, então, antes da relatividade, acreditava-se que espaço e tempo continuariam a existir em um mundo vazio. Mas, de acordo com a Teoria da Relatividade, se matéria e movimento desaparecessem, já não haveria mais espaço ou tempo” – Albert Einstein Muito antes de Einstein, Agostinho escreveu: “Não há dúvida de que o mundo não foi criado no tempo, mas com o tempo”, e acerca de Deus, ele diz: “Teus anos permanecem ao mesmo tempo… Teus anos são um dia, e Teu dia não é como nossa sequência de dias, mas é hoje”. Agora imagine você o nó na cabeça dos judeus quando nos evangelhos escutavam Jesus dizer: “Em verdade, em verdade vos digo que, antes que Abraão existisse, EU SOU” (Jo 8:58). Ele não diz “antes que Abraão existisse, eu já existia”, mas usa novamente a mesma expressão usada por Deus para se apresentar a Moisés: “EU SOU” (Êx 3:13-14).
Isto revela que Jesus é Deus, o Filho Eterno, não sujeito ao tempo, ou pelo menos não mais do que naquilo que ele mesmo quis se sujeitar em sua relação com a criação. Este aspecto atemporal de Jesus pode ser visto no mesmo evangelho de João, quando ele diz no capítulo 3: “ninguém subiu ao céu, senão o que desceu do céu, o Filho do homem, que está no céu” (Jo 3:13).
Veja que na passagem o “Filho do Homem”, que é o Filho Eterno em sua condição humana, desceu do céu, está no céu e, ao mesmo tempo, conversa na terra com Nicodemos. Quer mais? Então veja o capítulo 1 da carta aos Colossenses: Jesus “é imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação, porque nele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis… tudo foi criado por ele e para ele. Ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por ele”.
Em João 17 Jesus ora: “Glorifica-me tu, ó Pai, junto de ti mesmo, com aquela glória que eu tinha contigo antes que o mundo existisse”. O Filho Eterno já estava com o Pai antes que o tempo e a matéria viessem a existir. Em Hebreus diz que ele sustenta “todas as coisas pela palavra do seu poder”. Além de ser o Verbo ativo da criação, Jesus governa as leis da física e mantém coesas as partículas que compõem a matéria. O capítulo 8 do Evangelho de João termina dizendo que os judeus “pegaram em pedras para lhe atirarem; mas Jesus ocultou-se, e saiu do templo, passando pelo meio deles, e assim se retirou”. Como ele fez isso?
Se você tiver familiaridade com a língua inglesa poderá ler o excelente artigo publicado na Web com o título “The Complexities of Time” de um cientista chamado Lambert Dolphin.
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Mulheres podem ocupar cargos de chefia?
Você perguntou se é correto uma mulher ocupar uma posição de autoridade numa empresa ou no governo. É preciso entender que o que vou dizer tem a ver com a posição da mulher cristã neste mundo. Não me interessa nem um pouco convencer incrédulos, sejam homens ou mulheres, a adotarem o padrão bíblico, porque isso só faria deles hipócritas como os fariseus, que tentavam aparentar que seguiam a Palavra de Deus mas eram apenas sepulcros caiados. Quando me dirijo a alguém que ainda não tem certeza de seu destino eterno, não vou tentar fazê-lo viver como um cristão, porque o lago de fogo estará repleto de “cristãos” que nunca nasceram de novo. Foram pessoas que apenas adotaram uma religiosidade cristã para aplacar suas consciências. Para alguém assim eu falo da salvação que se recebe pela fé em Cristo Jesus.
No caso da mulher cristã é preciso sempre sabermos separar as coisas. Se você me perguntar se a mulher pode exercer autoridade de homem, a resposta muito clara das Escrituras é “Não”: “E não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem; esteja, porém, em silêncio. Porque, primeiro, foi formado Adão, depois, Eva. E Adão não foi iludido, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão. Todavia, será preservada através de sua missão de mãe, se ela permanece em fé, e amor, e santificação, com bom senso” (1 Tm 2:12-15 ARA).
Antes que alguém considere isso machismo, devo lembrar que na ordem que Deus colocou a mulher até Cristo é incluído como estando sob a autoridade de Deus: “Quero, entretanto, que saibais ser Cristo o cabeça de todo homem, e o homem, o cabeça da mulher, e Deus, o cabeça de Cristo” (1 Co 11:3). Portanto, entendendo essa hierarquia que é para esta vida, a mulher cristã saberá se sujeitar à vontade de Deus e não irá querer alegar independência, como é comum hoje na cristandade que se utiliza de uma passagem fora do contexto na tentativa de igualar os gêneros. Qual passagem? Esta aqui: “Porque todos sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus. Porque todos quantos fostes batizados em Cristo já vos revestistes de Cristo. Nisto não há judeu nem grego; não há servo nem livre; não há macho nem fêmea; porque todos vós sois um em Cristo Jesus. E, se sois de Cristo, então sois descendência de Abraão, e herdeiros conforme a promessa” (Gl 3:26-29).
Quando um líder religioso citou esta passagem tentando justificar a posição de sua mulher como “pastora” de sua igreja, senti vontade de perguntar por que ele não se casou com um homem ao invés de se casar com sua esposa. Se “não há macho nem fêmea”, então está liberado! Obviamente não está, porque a passagem fala da posição que temos em Cristo, e não neste mundo. Porque aqui continuarão existindo judeus e gregos, servos e livres, machos e fêmeas, ou Deus não daria em sua Palavra instruções específicas a pessoas dessas diferentes classes mesmo entre cristãos. Se abrirmos mão dessas diferenças acabaremos numa espécie de anarquia.
“Vós, servos, obedecei em tudo a vossos senhores segundo a carne, não servindo só na aparência, como para agradar aos homens, mas em simplicidade de coração, temendo a Deus” (Cl 3:22); “Vós, mulheres, sujeitai-vos a vossos maridos, como ao Senhor” (Ef 5:22); “Sujeitai-vos, pois, a toda a ordenação humana por amor do Senhor; quer ao rei, como superior; quer aos governadores, como por ele enviados para castigo dos malfeitores, e para louvor dos que fazem o bem” (1 Pe 2:13-14); “Vós, filhos, obedecei em tudo a vossos pais, porque isto é agradável ao Senhor” (Cl 3:20).
A passagem de 1 Timóteo 2:12-15 diz claramente que “a mulher não ensine”, mas isso não significa deixar de ensinar álgebra ou física quântica, mas doutrina ou qualquer coisa que tenha a ver com Deus. Também entendo que existe uma esfera em que a mulher pode ser usada por Deus para anunciar as boas novas, pois é bom lembrar que foi o Senhor Jesus quem ordenou que Maria fosse avisar os discípulos de sua ressurreição, que certamente era uma tremenda de uma “boa nova”. Se tivermos uma visão ampla das Escrituras veremos que mulheres ensinam sim, tanto as Escrituras como o comportamento que é apropriado aos santos, mas dentro da esfera que Deus designou a elas e observando sua posição sob a autoridade do homem. Você as encontrará ensinando e sendo louvadas por isso em passagens como a que Paulo menciona a mãe e avó de Timóteo que lhe ensinaram as “sagradas letras” em 2 Timóteo 1:5 e 3:14-15: “Trazendo à memória a fé não fingida que em ti há, a qual habitou primeiro em tua avó Lóide, e em tua mãe Eunice, e estou certo de que também habita em ti… Tu, porém, permanece naquilo que aprendeste, e de que foste inteirado, sabendo de quem o tens aprendido, e que desde a tua meninice sabes as sagradas Escrituras, que podem fazer-te sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus”.
Também Tito é exortado por Paulo a escolher irmãs mais velhas para ensinarem as mais novas: “As mulheres idosas, semelhantemente, que sejam sérias no seu viver, como convém a santas, não caluniadoras, não dadas a muito vinho, mestras no bem; para que ensinem as mulheres novas a serem prudentes, a amarem seus maridos, a amarem seus filhos, a serem moderadas, castas, boas donas de casa, sujeitas a seus maridos, a fim de que a palavra de Deus não seja blasfemada” (Tt 2:3-5).
Portanto, ao perguntar se a mulher deve exercer autoridade de homem, como já disse a resposta é não, porque na ordem estabelecida nesta Criação e também na Igreja o homem é a cabeça da mulher, assim como Cristo é a cabeça do homem e Deus a cabeça de Cristo. A própria relação de Cristo (o Noivo) como cabeça da Igreja (a Noiva) é uma relação simbolizada pelo homem como cabeça da mulher. “Porque o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja” (Ef 5:23).
Se perguntar se a mulher pode ensinar, a resposta é que depende do assunto e contexto, e também se ela faz isso sob a autoridade do homem. Lembre-se de que sob a autoridade de seu marido Priscila ajudou a instruir Apolo nos caminhos do Senhor: “Ele começou a falar ousadamente na sinagoga; e, quando o ouviram Priscila e Áquila, o levaram consigo e lhe declararam mais precisamente o caminho de Deus” (At 18:26).
Se perguntar se a mulher pode falar nas igrejas (as reuniões da assembleia), a resposta é “Não”, pois existe uma ordem clara neste sentido e é chamada de “mandamento do Senhor”, e não se restringe ao ensinar, mas também a meramente falar: “As vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar; mas estejam sujeitas, como também ordena a lei. E, se querem aprender alguma coisa, interroguem em casa a seus próprios maridos; porque é vergonhoso que as mulheres falem na igreja. Porventura saiu dentre vós a palavra de Deus? Ou veio ela somente para vós? Se alguém cuida ser profeta, ou espiritual, reconheça que as coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor” (1 Co 14:34-37).
Mas agora voltando ao assunto inicial de sua dúvida, entendo que até certo ponto é possível uma mulher ocupar uma posição de autoridade sobre outras pessoas, como empregados por exemplo, quando está sob a autoridade do marido. Por exemplo, a mulher virtuosa de Provérbios 31:10-31 era quem comandava sua casa e seus servos, portanto tomava também decisões de negócios.
A passagem começa mostrando quem é cabeça — o marido (vers. 11) — e segue descrevendo suas atividades, que incluem prover o suficiente para complementar o rendimento do lar (“seu marido… não necessitará de despojo”), trabalhar com as próprias mãos produzindo algo com “lã e linho”, saindo de casa em busca de suprimento, “ela traz de longe o seu pão”, ministrando para as necessidades dos filhos, “para dar de comer aos da casa”, administrando sua equipe de colaboradoras, ao “distribuir a tarefa das servas”. Atuando como corretora de imóveis para a família ela “examina uma propriedade e adquire-a”. Ela promove a produção quando “planta uma vinha com o fruto de suas mãos”, fazendo controle de qualidade de sua empresa doméstica, “vê que é boa a sua mercadoria”. Ela também trabalha em turnos pois “sua lâmpada não se apaga de noite”, e participa de ações sociais quando “abre a mão ao pobre, e estende as suas mãos ao necessitado”. Mais uma vez nós a vemos cuidando desde a produção até a venda e distribuição dos produtos: “Faz panos de linho fino e vende-os, e entrega cintos aos mercadores”.
Repare que mais uma vez o marido é mencionado, como “conhecido nas portas, e assenta-se entre os anciãos da terra”, o que equivale dizer que ele tem uma posição de autoridade e respeito na sociedade, e a citação aqui nos faz deduzir que grande parte desse respeito vem graças à esposa laboriosa e previdente que ele possui.
Em minha opinião uma mulher cristã assim ativa, que tenha muito bem definida sua posição de submissão ao marido, e que já tenha o total controle da educação de seus filhos e da provisão para seu lar, poderia ocupar postos de liderança, como diretoras de escolas, empresas e autarquias públicas. A dificuldade começa quando a mulher ocupa o posto máximo, como uma juíza ou presidente, porque aí ela não tem outro homem acima dela a quem se reportar. Vemos mulheres assim como figura do mal que entrou em Israel e na Igreja, como é o caso desse desvio ser comparado a Jezabel e Babilônia, esta última um sistema identificado no feminino, mulher e meretriz. Mas não podemos nos esquecer que nos países que professam serem cristãos, e que são governados por rainhas, estas reconhecem, nem que seja apenas como formalidade, que estão sob a autoridade de Deus no posto que ocupam, e do marido no lar.
Considerando que a mulher deve estar sujeita ao marido, a questão de ela trabalhar ou não fora, ou exercer ou não um posto de chefia, deve ser algo discutido entre o casal. Existem algumas “pistas” para as quais devemos atentar. Por exemplo, em primeiro lugar quem deve inicialmente prover para as necessidades da família é o marido, pois é a cabeça da família. “Então sai o homem à sua obra e ao seu trabalho, até à tarde” (Sl 104:23). Porém mais uma vez não podemos nos esquecer da “mulher virtuosa” de Provérbios 31, a esposa que eventualmente possui seu próprio trabalho para auxiliar nos gastos da família.
Creio que se uma mulher puder se dedicar integralmente a criar seus filhos no Senhor e a provisão trazida pelo marido for suficiente, então que se dedique primeiro àquilo que é mais importante e que dará frutos para a eternidade. Quando eu olho para trás em mais de 30 anos de carreira em diferentes empresas e fazendo diferentes coisas, mais ou menos importantes, percebo que todas elas passam, mas o tempo que dediquei ao Evangelho e à família permanece para sempre. Falei sobre isso em uma crônica que escrevi há alguns anos com o título “A carreira mais importante do mundo”, que você encontra facilmente na Web. Nela digo que “ainda que você ache sua profissão o máximo, se a humanidade sobreviveu sem ela até há pouco, não deve ser tão importante assim. A população do planeta conseguiria superar sua falta”.
Mas se por um lado temos mandamentos claros contra a mulher ensinar doutrina ou falar na Igreja, Deus bem sabia que nem todas as mulheres teriam o privilégio de não precisarem correr atrás do sustento, principalmente numa época quando cerca de metade dos lares tem uma mulher sozinha à frente da família, e isso em boa parte por culpa de maridos fujões ou relapsos para com suas responsabilidades de cabeça. Talvez seja por isso que Deus não tenha colocado uma ordem direta do tipo “A mulher não trabalhe fora”, ou “A mulher não seja dona de empresa”, ou “A mulher não tenha empregados sob seu comando”.
Uma busca na Bíblia irá revelar mulheres no comando de servos, mas obviamente mesmo tal posição seria sob a autoridade do marido (ou do pai ou da assembleia para mulheres solteiras). Não há nada que nos leve a crer que Lídia tenha precisado largar sua profissão para ser cristã, e lembre-se de que ela era uma mulher de negócios, “vendedora de púrpura” (At 16:14-15). Não seria demais supor que ela tivesse empregados e também fornecedores com os quais negociar, além de clientes como acontece com qualquer empresa moderna. Por sinal, o negócio de Lídia não era de bens de primeira necessidade, mas um comércio de produtos de luxo (púrpura) voltado para as elites. Priscila era sócia de seu marido Áquila em uma fábrica de tendas, à qual Paulo se uniu para ganhar seu sustento e não precisar sobrecarregar os irmãos. “…pois tinham por ofício fazer tendas” (At 18:1-3). Na Bíblia você irá encontrar mulheres trabalhando em comércio, agricultura, moinhos, pastoreio, artesanato, fabricantes de perfumes, cozinheiras, parteiras, enfermeiras, empregadas domésticas e até como carpideiras, que eram contratadas para chorar nos velórios. Encontrei até uma mulher que construiu uma cidade: “Seerá, que edificou a Bete-Horom, a baixa e a alta, como também a Uzém-Seerá” (1 Cr 7:24).
Mas como um cristão deve se portar quando uma mulher ocupa a mais alta posição de um país? Bem, certamente devemos obedecê-la porque ela está numa posição de autoridade, e posição de autoridade não tem gênero masculino ou feminino, pois é Deus quem reveste alguém que ocupe tal posição. No Livro de Juízes, uma das épocas de maior degradação do povo de Israel, Deus permitiu que mulheres ocupassem a posição de Juízas porque os homens se acovardaram. Basta ver o que diz o relato de Juízes 4, quando em um momento de grande aflição Deus dá ordens através de Débora, que era profetisa e juíza, embora em seu “currículo” seja mencionado seu marido Lapidote, indicando assim que Deus permitia que ela praticasse seu ofício sob a autoridade do homem: “Então os filhos de Israel clamaram ao Senhor, porquanto ele tinha novecentos carros de ferro, e por vinte anos oprimia violentamente os filhos de Israel. E Débora, mulher profetisa, mulher de Lapidote, julgava a Israel naquele tempo. Ela assentava-se debaixo das palmeiras de Débora, entre Ramá e Betel, nas montanhas de Efraim; e os filhos de Israel subiam a ela a juízo. E mandou chamar a Baraque, filho de Abinoão de Quedes de Naftali, e disse-lhe: Porventura o Senhor Deus de Israel não deu ordem, dizendo: Vai, e atrai gente ao monte Tabor, e toma contigo dez mil homens dos filhos de Naftali e dos filhos de Zebulom? E atrairei a ti para o ribeiro de Quisom, a Sísera, capitão do exército de Jabim, com os seus carros, e com a sua multidão; e o darei na tua mão. Então lhe disse Baraque: Se fores comigo, irei; porém, se não fores comigo, não irei. E disse ela: Certamente irei contigo, porém não será tua a honra da jornada que empreenderes; pois à mão de uma mulher o Senhor venderá a Sísera. E Débora se levantou, e partiu com Baraque para Quedes” (Jz 4:3-9).
Foi um homem, Baraque, que Deus chamou para encabeçar esse ataque, mas ele se acovardou e, por assim dizer, respondeu que só iria se fosse agarrado à barra da saia de Débora. E é assim que acontece, mas quando lemos o parecer final de Deus em Hebreus 11:32 é Baraque, e não Débora, quem aparece na lista dos homens de fé. Isto funciona mais ou menos como quando lemos a notícia de que o prefeito construiu uma ponte na cidade, mesmo sabendo que o prefeito não é capaz de levantar sequer uma parede de tijolos. O crédito é dado a quem foi designado para encabeçar a obra, independente de ela ter sido feita por outros.
Repare nesta outra passagem quando Deus afirma que não viu iniquidade em Israel, quando sabemos que havia aos montes, e nem maldade em Jacó, quando conhecemos bem seus estratagemas para enganar. “Não viu iniquidade em Israel, nem contemplou maldade em Jacó” (Nm 23:21). É importante entender este princípio da Palavra de Deus, quando ele faz o “relatório final” dando sua opinião sobre algo ou alguém. É por isso que no dia em que forem distribuídos galardões ou recompensas haverá diferentes materiais representando aquilo que é ou não duradouro.
Se colocarmos todas as nossas energias nas coisas que parecem importantes a nós, é bom lembrar que não será nossa avaliação que prevalecerá no final, mas a de Deus. Então um homem ou uma mulher que anseie por uma carreira de sucesso no mundo profissional pode ver todo seu esforço virar cinzas naquele dia. O que importa para Deus é aquilo que ele, e não os homens, considera importante. E isso nós encontramos claramente em sua Palavra, embora nem sempre estejamos prontos a acatar, seja por questões de ego, seja por influência da cultura em que vivemos, que mede o sucesso em cifrões e bens materiais.
“E, se alguém sobre este fundamento formar um edifício de ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno, palha, a obra de cada um se manifestará; na verdade o dia a declarará, porque pelo fogo será descoberta; e o fogo provará qual seja a obra de cada um. Se a obra que alguém edificou nessa parte permanecer, esse receberá galardão. Se a obra de alguém se queimar, sofrerá detrimento; mas o tal será salvo, todavia como pelo fogo” (1 Co 3:12-15).
Quando alguém se aposenta, dependendo da empresa e do posto que ocupava, poderá receber uma homenagem que irá descrever tudo o que fez de importante ali: se liderou pessoas, se aumentou a receita, se incrementou os processos de produção, se fez crescer o valor da marca no mercado, se manteve em alta as ações, etc. Agora veja a avaliação de uma mulher aposentada segundo o valor de Deus: “Se criou os filhos, se exercitou hospitalidade, se lavou os pés aos santos, se socorreu os aflitos, se praticou toda a boa obra” (1 Tm 5:10).
Vou transcrever um comentário de um irmão (Lineu Binotti) que pode agregar algo ao tema: “A submissão da mulher ao cabeça é, creio eu, intrínseca à esfera de autoridade em que se encontra, ou seja, no lar ao marido, na assembleia a Cristo, no trabalho ao seu superior. Acontece que na assembleia e no lar não há como estar acima de Cristo ou do marido uma vez que sua posição não é fruto de seus méritos (ela se coloca sob o senhorio de Cristo na assembleia e se submete ao seu marido no casamento), porém na esfera do trabalho sua posição é alcançada de acordo com seus atributos e competências. Mas mesmo na esfera profissional ela deve estar submissa a Deus (e aí vale para o homem também) e os versículos abaixo muito nos instruem: ‘Vós, servos, obedecei a vosso senhor segundo a carne, com temor e tremor, na sinceridade de vosso coração, como a Cristo, não servindo à vista, como para agradar aos homens, mas como servos de Cristo, fazendo de coração a vontade de Deus; servindo de boa vontade como ao Senhor e não como aos homens, sabendo que cada um receberá do Senhor todo o bem que fizer, seja servo, seja livre. E vós, senhores, fazei o mesmo para com eles, deixando as ameaças, sabendo também que o Senhor deles e vosso está no céu e que para com ele não há acepção de pessoas.’ (Efésios 6:5-9)”.
Deixo aqui um versículo para você meditar:
“Os opressores do meu povo são crianças, e mulheres dominam sobre ele; ah, povo meu! Os que te guiam te enganam, e destroem o caminho das tuas veredas” (Isaías 3:12).
Enquanto algumas mulheres podem se escandalizar e achar tudo o que eu disse aqui com forte teor machista segundo a cultura ocidental de nossos dias, é importante saber que procuro enxergar as coisas do ponto de vista das Escrituras. E dificilmente você irá encontrar na Bíblia alguma depreciação da mulher. O que acontece é que aquilo que Deus valoriza nem sempre é a mesma coisa que a sociedade valoriza, pois “o que entre os homens é elevado, perante Deus é abominação” (Lc 16:15).
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Qual Bíblia de Estudo você utiliza?
Nenhuma “Bíblia de Estudo”. Uso uma Bíblia comum traduzida por João Ferreira de Almeida, e intercalo entre a Versão Almeida Corrigida Fiel, a Versão Almeida Revista e Corrigida e a Versão Almeida Revista e Atualizada. Para o “voto de Minerva” de algum texto duvidoso na forma de traduzir eu uso a versão inglesa da “New Translation” de John Nelson Darby, mas não deixo de considerar também algumas boas versões católicas.
Não existe “Bíblia de Estudo Almeida Corrigida” ou “Bíblia de Estudo Almeida Atualizada”, como alguma editora possa ter publicado por aí. João Ferreira de Almeida traduziu a Bíblia para o português e seu Novo Testamento foi publicado em 1681. Mas ele faleceu antes de terminar o Antigo Testamento e por isso outros completaram seu trabalho. O que diferentes editoras fazem é pegar a tradução Almeida, acrescentar comentários nos rodapés e lançar como “Bíblia de Estudo” acrescentando o nome de Almeida ou do comentarista.
Não uso nenhuma Bíblia de Estudo porque as que existem em Português em sua maioria trazem erros graves nos comentários (não no texto bíblico, obviamente). Até mesmo os subtítulos que são introduzidos pelos editores segundo seu próprio entendimento trazem erros graves, como o subtítulo que encabeça o capítulo 54 de Isaías que na Bíblia impresso que utilizo traz “O progresso e a glória da Igreja”, quando a Igreja sequer aparece uma única vez no Antigo Testamento, por ser um mistério que ficou oculto em Deus e escondido inclusive dos profetas do Antigo Testamento, até ser revelado a Paulo.
Quando as Bíblias de Estudo que existem por aí são publicadas por editoras pentecostais, acabam incluindo essa doutrina que não ensina a salvação por graça, mas a manutenção da salvação por perseverança. Quando são de comentaristas católicos ou protestantes fundamentalistas trazem uma visão equivocada da Igreja, por a considerarem como um Israel 2.0, perdendo de vista as diferentes dispensações e maneiras distintas de Deus tratar com o homem ao longo das eras.
A Bíblia de estudo “menos ruim” é a comentada por Scofield, mas considerando que ele era um pastor denominacional alguns de seus comentários podem induzir o leitor a achar que está tudo bem pertencer a uma denominação. Os comentários que ele inclui são de coisas que aprendeu com irmãos que viveram antes dele e não pertenciam a nenhum sistema denominacional, mas obviamente Scofield deixou de fora aquilo que poderia apontar que não existe um clero na Palavra de Deus para a Igreja, mesmo porque ele próprio era um clérigo.
Já usei a Bíblia comentada por Scofield no início de minha conversão e quando comecei a congregar ao nome do Senhor somente. Com o tempo descobri que eu ganharia mais indo direto aos autores com os quais o próprio Scofield havia aprendido alguns de seus comentários e passei a usar uma Bíblia comum Almeida (versão Corrigida ou Atualizada) e a ler os comentários em livros. Um irmão costumava dizer que quando via um cristão denominacional lendo uma Bíblia de Estudo Scofield ele se alegrava, pois poderia aprender algo sobre as dispensações e algumas verdades sobre a Igreja. Mas quando via um irmão em comunhão congregado ao nome do Senhor com uma Bíblia Scofield ele se entristecia.
Hoje uso no PC o aplicativo de Bíblias e-Sword e no Android o MySword. Ambos permitem sincronizar a passagem das Escrituras em diferentes versões com comentários (em inglês) de autores do século 19. Você pode encontrar estes aplicativos fazendo buscas pelos respectivos nomes e também garimpando módulos de Bíblias, comentários, livros e mapas convertidos para esses formatos. Tenho disponível no computador e smartphone quase 30 versões da Bíblia e mais um tanto assim de comentários e mais ainda de livros. Hoje é possível levar no computador ou smartphone uma biblioteca cristã para a qual precisaria de uma Kombi para carregar, se fossem Bíblias e livros impressos. Com tantas possibilidades não há motivo para se limitar a uma “Bíblia de Estudo”, principalmente se ela for tendenciosa ao representar alguma denominação católica ou protestante.
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A ordem “falem dois ou três” é no sentido literal?
Sua dúvida está na passagem de 1 Coríntios 14 quando o Espírito Santo, através do apóstolo Paulo, estabelece as diretrizes para a ordem na reunião da assembleia dos cristãos (leia o artigo “Uma variedade de reuniões” para entender o que vou dizer). “E falem dois ou três profetas, e os outros julguem. Mas, se a outro, que estiver assentado, for revelada alguma coisa, cale-se o primeiro. Porque todos podereis profetizar, uns depois dos outros; para que todos aprendam, e todos sejam consolados. E os espíritos dos profetas estão sujeitos aos profetas. Porque Deus não é Deus de confusão, senão de paz, como em todas as igrejas dos santos” (1 Co 14:29-33).
Será que “dois ou três” é literalmente um máximo de três? Será que não existe a possibilidade de interpretar que, por existir a cláusula “se a outro, que estiver assentado, for revelada alguma coisa” que segue a ordem, não estaria assim abrindo a possibilidade de mais gente ministrar? E por ele não acrescentar “quando muito três”, como fez no caso das línguas no versículo 27, não deveríamos entender isso como uma direção geral para a ordem da reunião de ministério da Palavra, e não um número específico?
O assunto começa no versículo 26 quando diz, “Que fazer, pois, irmãos? Quando vos reunis…”, mostrando claramente serem estas as instruções para a reunião da igreja ou assembleia. A cristandade como um todo parece não ter muito problema com esta passagem, já que em quase a totalidade das reuniões cristãs nas denominações religiosas só existe um que fala e os outros apenas escutam sem a possibilidade de julgarem o que está sendo dito e intervirem no caso de alguma coisa fora dos fundamentos bíblicos. É como se os sistemas religiosos tivessem criado suas próprias instruções à revelia do plano colocado pelo Espírito Santo e trocassem o “Falem dois ou três profetas, e os outros julguem” por “Fale só o padre ou pastor e ai do leigo que ousar julgar”.
Mas quando nos propomos a estar congregados pelo Espírito somente ao nome do Senhor segundo a direção da Palavra de Deus e não dos dogmas e regras criados pelos teólogos, é preciso antes entender a diferença entre uma reunião de estudo bíblico — quando, por exemplo, seguimos uma ordem pré-definida lendo capítulo a capítulo de um determinado livro das Escrituras —, e uma reunião aberta, quando deixamos aberto para ver o que o Espírito pode ter para nós. É o Espírito Santo quem conhece a condição da assembleia naquele momento e pode trazer o alimento ou remédio necessário aos santos.
No primeiro caso continua existindo ordem na reunião, mas não vejo que se aplique essa limitação de no máximo três para uma simples reunião de estudo ou leitura da Palavra. Mas na reunião aberta de ministério da Palavra sim, esta é a ordem que o Espírito Santo colocou por se tratar de uma reunião que faz parte dos pilares colocados pela Palavra ou o “A-B-C” das atividades da assembleia reunida, quando não seguimos alguma ordem de leitura preestabelecida, mas deixamos a reunião aberta à direção do Espírito para trazer o assunto que ele achar propício: “E perseveravam na doutrina e comunhão dos apóstolos (A), e no partir do pão (B), e nas orações (C)” (At 2:42 – JND).
O item que chamei de “A” refere-se ao ministério e aprendizado em comunhão com o que os apóstolos nos legaram, a “sã doutrina”. “Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si doutores conforme as suas próprias concupiscências” (2 Tm 4:3); “Retendo firme a fiel palavra, que é conforme a doutrina, para que seja poderoso, tanto para admoestar com a sã doutrina, como para convencer os contradizentes” (Tt 1:9); “Tu, porém, fala o que convém à sã doutrina” (Tt 2:1); “…como também o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada; falando disto, como em todas as suas epístolas, entre as quais há pontos difíceis de entender, que os indoutos e inconstantes torcem, e igualmente as outras Escrituras, para sua própria perdição” (2 Pe 3:15-16).
O item “B” se refere à ceia do Senhor celebrada com pão e vinho como símbolos do corpo e sangue de Jesus em sua morte, para a qual temos instruções específicas em 1 Coríntios 11 e também em outras passagens, e o “C” às orações em assembleia, que têm um caráter diferente das orações privativas de cada um, pois devem ser apresentadas dentro daquilo que é de conhecimento ou necessidade dos santos, e não as coisas que oramos todos os dias em casa com a família, que podem ser assuntos particulares demais para serem expostos publicamente.
Em razão da extrema fraqueza em que vivemos hoje, muitas assembleias acabam substituindo a reunião aberta de ministério da Palavra por uma de leitura, ou como fazemos em Limeira, abrem o momento como uma reunião aberta dando um tempo para ver se algum irmão se manifesta e, se não acontece, seguem com a leitura de um capítulo das Escrituras numa reunião de caráter de leitura. Mas eu soube de uma conferência anual em uma assembleia nos Estados Unidos de cujo programa os irmãos tinham tirado a reunião aberta por às vezes ninguém trazer nenhuma palavra. Porém, da última vez, decidiram retornar com a reunião aberta no programa da conferência e ficaram surpresos em como foram edificados pelo ministério da Palavra. Por isso é bom identificar nossa fraqueza, mas também é bom não nos esquecermos de que o Espírito Santo deve ter liberdade.
No caso de revelação, como é mencionado ali — “se a outro, que estiver assentado, for revelada alguma coisa, cale-se o primeiro” (1 Co 14:30) — não as temos hoje como era no tempo dos apóstolos, pois naquela época ninguém podia dizer “vamos abrir em Romanos, capítulo tal…” porque não tinham ainda a revelação completa. A revelação de Deus completou-se com o que foi entregue ao apóstolo Paulo, portanto esqueça aquelas reuniões de cristãos em que algum se levanta e com a maior ousadia (eu chamaria “cara de pau”) muda o tom da voz e diz algo como “Meus filhos, tenho uma revelação para vós…”. Normalmente o que se segue é uma mera profetada que pode ser tanto para aterrorizar como para encher o ego de alguém, mas pode também estragar um casamento ou a vida de alguém.
Mas essa limitação de dois ou três falarem nas reuniões abertas exige responsabilidade de quem fala e de quem não fala. Se um irmão diz uma breve frase ou simplesmente faz uma pergunta, sabendo que estamos ali aguardando pelo ministério do Espírito através dos dons, ele não está entendendo bem o que é a reunião de ministério da Palavra, pois, por assim dizer, “queimou” um cartucho e limitou a liberdade do Espírito de usar outros para profetizarem. Imagine se três numa reunião fizessem a mesma coisa e fizessem apenas uma pergunta cada um ou dissessem apenas uma frase que totalizasse, digamos, três minutos do tempo reservado para toda a reunião. Criaria uma situação difícil para que outros se aventurassem a ministrar sabendo que estariam fora da ordem do “dois ou três”.
Obviamente estou exagerando só para entendermos a responsabilidade que existe daqueles que ministram que devem trazer algo que seja para edificação, exortação e consolação dos santos. Não que necessariamente irá receber uma inspiração instantânea, mas geralmente o que trará será o fruto de alguma meditação e comunhão que tenha na Palavra de Deus, algo que poderia já estar em sua “sacola” como os pães e peixes que o jovem entregou aos discípulos, e este ao Senhor, para serem multiplicados em algo suficiente para alimentar a todos. Os que ministram também devem fazê-lo segundo a direção do Espírito e não só esperar sua vez, como também aguardar para ver se acaso o Espírito não estaria querendo outro para falar naquele momento. Voltando ao exemplo que dei — de alguém trazer apenas uma frase ou pergunta — é claro que o Espírito Santo poderia muito bem querer que só fosse dita uma frase naquela reunião, mas certamente seria uma frase de tamanho significado que todos sairiam dali consolados, exortados ou edificados. “Mas o que profetiza fala aos homens, para edificação, exortação e consolação” (1 Co 14:3).
Eu mesmo confesso que algumas vezes “transgredi” a ordem do “falem dois ou três”, até por não ter prestado atenção em quantos já haviam falado. Mas se a ordem está ali poderíamos ter um milhão de argumentos para colocá-la de lado (como fazem muitos cristãos no caso da ordem dada para que a mulher fique em silêncio, por exemplo), mas ao fazer assim estaríamos indo na contramão do que o Espírito determinou. Outro ponto importante é aquele que ministra não querer ocupar todo o tempo da reunião com seu discurso, mas fazer pausas para esperar para ver se o Espírito gostaria de introduzir algo pelo ministério de outro.
Isso vale também para outras reuniões, e neste caso o princípio mostrado pelo apóstolo em 1 Coríntios 11:33, obviamente falando de outro assunto mas que indica bem o espírito em que devemos estar quando reunidos: “Portanto, meus irmãos, quando vos ajuntais para comer, esperai uns pelos outros.” Quando o assunto é parcimônia no uso do tempo da reunião, sempre me recordo do que um irmão comentou com outro depois de uma longa oração: “Irmão, sua oração me elevou aos mais altos céus, e a mesma oração me trouxe de volta à terra”.
Mais uma coisa: o “falem dois ou três” não significa que um que já falou não possa voltar a falar. Entendo que esse é o número de profetas que falam, não de mensagens trazidas, e como “profeta” entenda alguém que esteja proferindo o ministério tirado da Palavra escrita, e não alguém trazendo alguma revelação inédita ou aviso de uma catástrofe futura, como muitos acreditam ser. O sentido de profeta aqui é o de um porta-voz de Deus para a assembleia. Mas dois ou três falando é um número mais que suficiente, principalmente por termos capacidade limitada de assimilar o que é falado e também por não desejarmos que alguém fuja da reunião prolongada por ter algum compromisso inadiável de família, trabalho ou estudo, como mostra o texto de W. T. P Wolston que traduzo aqui: “Esta é a instrução distinta dada por Deus, e revela sua mente e vontade para sua assembleia, quando reunida. Nada poderia ser mais claro, e, com tristeza seja dito, nada foi mais desatendido pela Igreja. A regra em quase todos os corpos eclesiásticos foi colocar tudo, de antemão, nas mãos de um homem. Assim, o Espírito é extinguido e, como consequência, todos sofrem. Mas por que você acha que o Espírito Santo no meio da assembleia, disse que dois ou três profetas, e apenas dois ou três, poderiam falar? Por que não quatro, cinco ou seis? Eu acho que é uma prova prática da sabedoria infalível e do terno cuidado de nosso Deus. Se, quando reunidos em assembleia, ouvimos dois ou três discursos de nossos irmãos, recebemos o máximo que poderemos aproveitar, e se tivéssemos mais é muito provável que haveria pouco proveito nisso, considerando a fraqueza do corpo em alguns, se não em todos, poderia se manifestar. Deus sabia muito bem o que seria nossa vida aqui e, consequentemente, ele sabia que haveriam necessidades e responsabilidades, e a necessidade de alguns voltarem para casa no horário determinado. Deus não queria que a reunião de sua assembleia fosse tão indefinidamente prolongada, que alguns precisassem fugir da assembleia antes que a reunião fosse concluída. Tudo deveria ser de tal natureza que tudo seria feito ‘decentemente e com ordem’, portanto ele diz: ‘E falem dois ou três profetas, e os outros julguem. Mas, se a outro, que estiver assentado, for revelada alguma coisa, cale-se o primeiro’ (1 Co 14:29-30). Não digo que o primeiro deva terminar de falar antes de outro se levantar. O sentido é que não deveria haver dois ou três falando ao mesmo tempo, como às vezes podia estar sendo o caso, tão ávidos que podiam estar de serem ouvidos. Se o Espírito de Deus fez um sinal de que ele queria usar um certo vaso, então ‘cale-se o primeiro’. Ele deve estar sujeito ao Espírito. ‘Mas, se a outro, que estiver assentado, for revelada alguma coisa, cale-se o primeiro. Porque todos podereis profetizar, uns depois dos outros; para que todos aprendam, e todos sejam consolados. E os espíritos dos profetas estão sujeitos aos profetas. Porque Deus não é Deus de confusão, senão de paz, como em todas as igrejas dos santos’ (1 Co 14:31-33). Até o mais sábio profeta pode aprender com seu irmão.” [W. T. P. Wolston : “Another Comforter” : Lecture 11 The Gifts of the Spirit].
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Devo perder tempo lendo o Antigo Testamento?
Considerando que hoje não vivemos mais nos tempos da Lei, e a Igreja não é Israel, sua dúvida é se deveríamos realmente nos aplicar à leitura do Antigo Testamento, que você considera entediante, e usar melhor o tempo lendo o Novo Testamento. Considerando que toda a Bíblia é a Palavra de Deus é difícil querer considerar uma parte mais importante que outra, se considerarmos que toda ela fala sempre do único e mais sublime tema de todos: Jesus. Quando você adota esta perspectiva acaba indo além de achar que apenas o Novo Testamento ou as Epístolas dos Apóstolos devem ocupar seu tempo, mas compreende que se o Antigo Testamento fala de Cristo, ainda que em sombras e figuras, alguém que tem agora a nova vida em Cristo irá apreciar tudo o que diz respeito a ele.
Uma leitura que me ajudou muito a apreciar o Antigo Testamento foi a coleção “Notas Sobre o Pentateuco” de C. H. Mackintosh. Estes livros foram escritos no século 19 e estão em domínio público, portanto você deverá encontrá-los em mais de um idioma, tanto para comprar em formato impresso como para baixar em formato digital. Com essa coleção aprendi a apreciar o Antigo Testamento e mais ainda o Novo Testamento como Palavra de Deus, dada aos homens do modo como um compositor distribui sua partitura à orquestra.
Os diferentes instrumentos imprimiram nela a tonalidade de cada um, mas um só compositor e maestro esteve por detrás de suas notas. Sua execução levou 1500 anos, tocada por 40 homens de diferentes culturas e níveis sociais. Muitos nunca se conheceram e trabalharam separados por séculos e quilômetros de distância. Pense nesses vídeos que encontra no Youtube, nos quais uma mesma música é executada por artistas de diferentes países em diferentes momentos e depois o conjunto é editado como se todos estivessem tocando juntos e ao mesmo tempo. Aí você terá uma vaga ideia de como foi a composição do texto sagrado.
Um só é o tema da Bíblia, do princípio ao fim: Cristo. Ele é o Alfa, a primeira letra do alfabeto grego, e o Ômega, a última. Por isso Jesus aparece de Gênesis a Apocalipse, e se você deseja conhecer a Verdade e se aproximar de Deus precisará conhecer a Jesus. Ele disse: “Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim” (Jo 14:6). Este é o genuíno. Qualquer outro caminho, verdade e vida são falsos. Não se chega a Deus sem Jesus, por isso é tão importante conhecê-lo. Se você ainda não confia nele é porque não o conhece.
Uma vez uma senhora me ligou pedindo referências de uma empregada que havia cuidado de meu filho deficiente. Ela buscava alguém para tomar conta de sua mãe idosa, mas queria uma pessoa de confiança. À medida que eu ia falando, ela ia conhecendo melhor a pessoa e eu podia perceber que sua confiança ia crescendo. Nós pedimos referências de alguém para sabermos o quanto podemos confiar nessa pessoa. O mesmo ocorre com Jesus. Como você poderia ter total confiança nele sem conhecê-lo? Portanto, leia a Bíblia toda, não para saber o que Deus exige de você ou como se fosse um texto motivacional para recarregar suas baterias. Leia para encontrar Jesus em suas páginas, conhecê-lo, apreciar sua Pessoa e confiar nele cada vez mais.
Você sabia que ele aparece no primeiro versículo da Bíblia, em Gênesis 1:1? Sim, ali diz “No princípio criou Elohim os céus e a terra” e onde aparece “Deus” em nossas versões modernas a palavra original é “Elohim”. Sabia que esta palavra hebraica é plural? “Elohim” é plural, mas o verbo está no singular — “criou” — mostrando que Deus é UM, mas em três Pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo. No momento da criação o Filho eterno de Deus, Jesus, já participava da gênese de todas as coisas. João diz em seu Evangelho que “no princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus” (Jo 1:1-2).
Jesus está também no último versículo da Bíblia, em Apocalipse 22:21, onde diz: “A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja com todos vós”, e até nisso podemos considerar suas palavras quando ele disse ao apóstolo João no princípio do livro de Apocalipse, “Eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim, diz o Senhor, que é, e que era, e que há de vir, o Todo-Poderoso.” (Ap 1:8). Você escutou bem Jesus dizer a João que é o Todo-Poderoso”.
A dificuldade que muitos têm de entender como aquele Deus Todo-Poderoso, o Jeová do Antigo Testamento, poderia ser o mesmo Jesus dos evangelhos, tão manso e gentil. Ora, basta observar ele agindo como Juiz no livro de Apocalipse para saber que é a mesma Pessoa, apenas com diferentes atribuições. Nos evangelhos ele é aquele “que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz” (Fp 2:6-8).
No livro de Apocalipse João o vê como o “Filho do Homem, vestido até aos pés de uma roupa comprida, e cingido pelos peitos com um cinto de ouro. E a sua cabeça e cabelos eram brancos como lã branca, como a neve, e os seus olhos como chama de fogo; e os seus pés, semelhantes a latão reluzente, como se tivessem sido refinados numa fornalha, e a sua voz como a voz de muitas águas. E ele tinha na sua destra sete estrelas; e da sua boca saía uma aguda espada de dois fios; e o seu rosto era como o sol, quando na sua força resplandece”. O resultado dessa visão João descreve assim: “E eu, quando vi, caí a seus pés como morto; e ele pôs sobre mim a sua destra, dizendo-me: Não temas; eu sou o primeiro e o último; e o que vivo e fui morto, mas eis aqui estou vivo para todo o sempre” (Ap 1:13-18).
Mais adiante no mesmo livro João voltará a vê-lo em sua atribuição de guerreiro e conquistador, descendo dos céus para vingar seus inimigos e libertar seu povo: “E vi o céu aberto, e eis um cavalo branco; e o que estava assentado sobre ele chama-se Fiel e Verdadeiro; e julga e peleja com justiça. E os seus olhos eram como chama de fogo; e sobre a sua cabeça havia muitos diademas; e tinha um nome escrito, que ninguém sabia senão ele mesmo. E estava vestido de uma veste salpicada de sangue; e o nome pelo qual se chama é a Palavra de Deus. E seguiam-no os exércitos no céu em cavalos brancos, e vestidos de linho fino, branco e puro. E da sua boca saía uma aguda espada, para ferir com ela as nações; e ele as regerá com vara de ferro; e ele mesmo é o que pisa o lagar do vinho do furor e da ira do Deus Todo-Poderoso. E no manto e na sua coxa tem escrito este nome: Rei dos reis, e Senhor dos senhores” (Ap 19:11-16).
E entre o primeiro e o último versículo da Bíblia você encontrará Jesus em todas as páginas da Palavra de Deus, nos mais diversos tipos e figuras, e também em Pessoa nos evangelhos, primeiro manso e humilde, depois como Juiz para julgar os vivos e os mortos em Apocalipse. Portanto deixe-me ajudá-lo a encontrar Jesus no Antigo Testamento e tenho certeza de que você irá apreciá-lo ainda mais quando ler a Bíblia.
Em Gênesis você encontra Adão, o primeiro homem, de cuja costela Deus tirou uma esposa (Gn 2:21-24). Não é difícil enxergar nele uma figura do segundo Homem, Jesus, que Deus colocou no sono da morte para de seu lado saírem sangue e água, os meios da criação e purificação de uma noiva, a Igreja. Você acha que é muita imaginação enxergar Cristo em Adão? A carta de Paulo aos Romanos declara que Adão “é a figura daquele que havia de vir” (Rm 5:14).
Após a queda, Deus disse ao diabo: “E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar” (Gn 3:15). A passagem não diz mulher no sentido genérico, mas fala da mulher, Maria, a virgem, e isso é corroborado em outra passagem do Antigo Testamento: “Eis que a virgem conceberá, e dará à luz um filho, e chamará o seu nome Emanuel” (Is 7:14), ao que Mateus acrescenta “que [Emanuel] traduzido é: Deus conosco” (Mt 1:23).
Só existe um homem descendente apenas de mulher: Jesus, o filho da virgem Maria. Isso é significativo no fato de Deus dizer à serpente que seria da semente da mulher que viria o que pisaria sua cabeça. Mais tarde Satanás usaria seus agentes para traí-lo e levá-lo à morte, mas na cruz a cabeça da serpente — que é onde está o veneno — seria esmagada perdendo seu poder mortífero e cumprindo plenamente o que havia sido previsto no livro de Gênesis. “E, visto como os filhos participam da carne e do sangue, também ele participou das mesmas coisas, para que pela morte aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabo; e livrasse todos os que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à servidão” (Hb 2:14-15).
Logo em seguida Jesus apareceria novamente em Gênesis, desta vez tipificado no animal que Deus sacrificou para, com sua pele, cobrir a nudez de Adão e Eva: “E fez o Senhor Deus a Adão e à sua mulher túnicas de peles, e os vestiu” (Gn 3:21). Aquele ato prefigurava o Cordeiro de Deus, que um dia viria ao mundo para morrer como consequência do pecado do homem. Graças à morte de Cristo você pode ser purificado de seus pecados, perdoado de sua culpa com a cobertura proporcionada por Deus graças a um inocente sacrificado em seu lugar. Abel é outra figura de Cristo, pois ofereceu a Deus um sacrifício de sangue (Gn 4:4) e “depois de morto, ainda fala” (Hb 11:4).
Sete, outro filho de Adão e Eva, cujo nome significa “Escolhido”, nasceu depois da morte de Abel e é uma figura de Cristo ressuscitado, do qual veio a linhagem que “começou a invocar o nome do Senhor” (Gn 4:26). Um descendente de Sete foi Enoque, o “sétimo depois de Adão” (Jd 1:14), e “Enoque foi trasladado para não ver a morte, e não foi achado, porque Deus o trasladara; visto como antes da sua trasladação alcançou testemunho de que agradara a Deus” (Hb 11:5). Enoque é uma figura de Cristo subindo para o Pai, depois de andar em perfeita obediência e agradar em tudo a Deus.
Seguindo essa linha da genealogia de Adão que iria chegar a Jesus no Novo Testamento encontramos Noé, por meio de quem o Espírito de Cristo pregou aos incrédulos antes do dilúvio, os quais agora são espíritos em prisão. Muitos cristãos têm uma visão equivocada do que Pedro escreveu em sua primeira epístola, achando que ali o assunto fosse Noé, quando na verdade era o Espírito de Cristo em Noé. Veja a passagem, à qual vou acrescentar alguns comentários para você entender melhor: “Cristo padeceu uma vez pelos pecados, o justo pelos injustos, para levar-nos a Deus; mortificado, na verdade, na carne, mas vivificado pelo Espírito; no qual [Espírito] também foi, e pregou aos espíritos em prisão; os quais [que hoje estão em prisão] noutro tempo foram rebeldes, quando a longanimidade de Deus esperava nos dias de Noé, enquanto se preparava a arca” (1 Pe 3:18-20). Se ler a carta de Pedro desde o início verá que ele já tinha usado esse tipo de raciocínio no capítulo 1, quando escreveu da salvação que os profetas do Antigo Testamento tratavam de inquirir e tratar: “Da qual salvação inquiriram e trataram diligentemente os profetas que profetizaram da graça que vos foi dada, indagando que tempo ou que ocasião de tempo o Espírito de Cristo, que estava neles, indicava, anteriormente testificando os sofrimentos que a Cristo haviam de vir, e a glória que se lhes havia de seguir” (1 Pe 1:10-11). O mesmo Espírito de Cristo que estava nos profetas do Antigo Testamento estava em Noé, que também profetizou de Cristo aos rebeldes de sua época que agora, por não terem aceitado sua pregação, se encontram aprisionados no hades, o lugar de morte, e destinados ao lago de fogo.
Se Adão foi uma figura de Cristo como Senhor de todas as coisas e Cabeça da Igreja, Noé representa Jesus como o regente do mundo vindouro em seu reinado de mil anos numa terra restaurada. Ao sair da Arca, Deus disse a Noé: “todo o animal da terra… toda a ave dos céus; tudo o que se move sobre a terra, e todos os peixes do mar, nas vossas mãos são entregues” (Gn 9:2). Você encontra as mesmas palavras no Salmo 8, porém falando de Cristo.
Em nossa jornada em busca de Jesus nas páginas da Bíblia nós o encontramos em Gênesis 14 prefigurado em Melquisedeque, aquele que “não tendo princípio de dias nem fim de vida, mas sendo feito semelhante ao Filho de Deus, permanece sacerdote para sempre”. Além de ser chamado de sacerdote eternamente, Melquisedeque, “que primeiramente é, por interpretação, rei de justiça, e depois também rei de Salém, que é rei de paz” (Hb 7:2-3), títulos dados também a Jesus.
Em Gênesis 22 vemos Isaque, o filho de Abraão, como figura de Cristo tanto em sua morte como em ressurreição. A diferença entre o tipo e o antítipo foi que Deus providenciou um carneiro para substituir Isaque, porém Jesus não teve um substituto na morte. Tendo Isaque sido libertado da morte — assim como Cristo o foi pela ressurreição — no capítulo 24 de Gênesis, Abraão envia um servo através do deserto em busca de uma esposa para seu filho, uma figura de Deus Pai enviando o Espírito Santo a este mundo para reunir a Igreja, a noiva de Cristo.
Mais tarde encontramos Esaú e Jacó, representando respectivamente o fruto da carne e do Espírito, e ao seguirmos a carreira de Jacó, a vida de Cristo vai pouco a pouco sendo revelada nele, até ter sua plenitude em seu filho José. Este, o predileto de seu pai, é também uma figura de Cristo. A história toda você pode ler em sua Bíblia nos capítulos finais do livro de Gênesis, do capítulo 37 ao 50. José foi odiado por seus irmãos, vendido como escravo e dado como morto. No Egito, preso por resistir à tentação da mulher de Potifar, ele se destacou na prisão como capaz de revelar os sonhos e segredos das pessoas, uma habilidade que você encontra nos Evangelhos em Jesus, capaz de sondar os pensamentos. Mais tarde José revelaria também o que havia por detrás do sonho de Faraó e acabaria exaltado ao trono de vice-rei de todo o Egito. O Egito é uma figura do mundo e sabemos que quando Cristo voltar ele irá estabelecer o seu reino milenial sobre o mundo inteiro.
Considerando a ligação dos tipos da história de Jacó e José com o antítipo Jesus nos evangelhos, não é coincidência encontrarmos Jesus no capítulo 4 do Evangelho de João justamente à beira do poço em “uma cidade de Samaria, chamada Sicar, junto da herdade que Jacó tinha dado a seu filho José”, conversando com uma mulher samaritana. Impressionada com a capacidade de Jesus descobrir seus segredos, assim como José fazia no Egito, a mulher correu à cidade anunciando: “Vinde, vede um homem que me disse tudo quanto tenho feito”. Muitos dos habitantes do lugar, depois de conhecerem Jesus, “creram nele, por causa da sua palavra. E diziam à mulher: Já não é pelo teu dito que nós cremos; porque nós mesmos o temos ouvido, e sabemos que este é verdadeiramente o Cristo, o Salvador do mundo” (Jo 4:1-42).
Hoje Jesus é Salvador de todos os que nele creem e em breve voltará, primeiro para buscar sua Igreja e encontrá-la nos ares, entre a terra e o céu, e depois em glória para colocar seus pés sobre o Monte das Oliveiras e reinar sobre a terra. Então ele será reconhecido pelos judeus, assim como José foi reconhecido por seus irmãos em uma das mais dramáticas passagens da Bíblia no capítulo 45 de Gênesis. Depois de rejeitado, vendido e dado como morto por seus próprios irmãos, José se tornou o salvador deles e em amor e graça tirou deles qualquer temor de revanche, ao dizer: “Vós bem intentastes mal contra mim; porém Deus o intentou para bem, para fazer como se vê neste dia, para conservar muita gente com vida. Agora, pois, não temais; eu vos sustentarei a vós e a vossos filhos. Assim os consolou, e falou segundo o coração deles” (Gn 50:20-21).
Continuando em nossa busca por Jesus no Antigo Testamento chegamos a Moisés, que surge no livro de Êxodo como figura de Jesus, o Libertador de seu povo do jugo de Satanás, representado ali por Faraó. Se você leu os Evangelhos deve se lembrar de que o rei Herodes mandou matar os meninos na tentativa de livrar-se de Jesus, a mesma estratégia usada por Satanás ao inspirar Faraó a eliminar os meninos hebreus. Mas Moisés escapou da morte e mais tarde o encontramos casando-se com Zípora, uma mulher gentia cujo nome significa “passarinha”, algo pequeno e insignificante.
Paulo também descreveu a Igreja, a noiva de Cristo, como insignificante aos olhos do mundo: “Porque, vede, irmãos, a vossa vocação, que não são muitos os sábios segundo a carne, nem muitos os poderosos, nem muitos os nobres que são chamados. Mas Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias; e Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes; e Deus escolheu as coisas vis deste mundo, e as desprezíveis, e as que não são, para aniquilar as que são; para que nenhuma carne se glorie perante ele” (1 Co 1:26-29).
A libertação do povo no Egito aconteceu por meio de outra figura de Cristo: um cordeiro sem defeito sacrificado na instituição da Páscoa. Seu sangue, aplicado ao batente das portas das casas dos hebreus, seria a garantia de que a morte não entraria ali quando o juízo de Deus caísse sobre todo o Egito. Depois, em outra figura representando o crente associado a Cristo em sua morte, vemos os hebreus passando pelo fundo do mar, um lugar de morte, e saindo triunfantes e salvos do outro lado, porém ainda num deserto a caminho da terra prometida. O deserto é uma figura do mundo onde o cristão se encontra depois de salvo por Cristo. Assim como ocorre hoje com o crente em Jesus em sua jornada rumo à pátria celestial, os hebreus eram guiados por Cristo, representado na coluna de nuvem de dia, e na coluna de fogo à noite. Em sua carta aos Coríntios, Paulo explica que durante a peregrinação do povo de Deus no deserto, figura deste mundo, “todos comeram de uma mesma comida espiritual, e beberam todos de uma mesma bebida espiritual, porque bebiam da pedra espiritual que os seguia; e a pedra era Cristo” (1 Co 10:3-4).
Chegamos ao Monte Sinai, e ali Moisés é uma figura de Cristo como Mediador entre Deus e os homens e também como o Profeta. Em Deuteronômio Deus disse a Moisés, referindo-se a Jesus: “Eis lhes suscitarei um profeta do meio de seus irmãos, como tu, e porei as minhas palavras na sua boca, e ele lhes falará tudo o que eu lhe ordenar. E será que qualquer que não ouvir as minhas palavras, que ele falar em meu nome, eu o requererei dele” (Dt 18:18). E no evangelho Jesus diz: “Quem me rejeitar a mim, e não receber as minhas palavras, já tem quem o julgue; a palavra que tenho pregado, essa o há de julgar no último dia” (Jo 12:48).
No Monte Sinai Moisés ficou quarenta dias e noites ouvindo Jeová, que é o próprio Jesus, falar do Jesus que séculos mais tarde viria em carne e na forma humana, representado em cada detalhe da Lei que homem algum seria capaz de cumprir, exceto o Homem perfeito. Jesus era o único que podia dizer, como disse: “Quem dentre vós me convence de pecado?” (Jo 8:46), pois “não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém, um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado [ou ‘pecado à parte’]” (Hb 4:15). Em obediência e perfeição, ele caminhou neste mundo revelando o Homem segundo o coração de Deus. Imaculado, sem pecado e sem a possibilidade de pecar, por ser Deus e Homem, somente ele poderia, em graça soberana, libertar o pecador da maldição da Lei que o condenava, e torná-lo irrepreensível e sem pecado aos olhos de Deus. Se você for daqueles que acreditam que Jesus poderia pecar, faça a si mesmo a seguinte suposição: “E se ele, que é Deus, tivesse pecado?”. Isso será suficiente para entender quão absurda é a ideia de Deus pecando.
A Lei dada a Moisés não se limitava aos dez mandamentos, porém incluía centenas de ordenanças encontradas nos escritos de Moisés. Cada oferenda ali nos fala de Cristo e cada sacrifício aponta para o sangue que seria derramado na cruz para a glória de Deus e a salvação do pecador. Os livros “Notas sobre o Pentateuco”, de C. H. Mackintosh, são particularmente úteis para você entender isso. O Tabernáculo, a grande tenda que Deus ordenou como o lugar de adoração dos hebreus, é uma figura de Cristo, bem como seus utensílios e até mesmo o véu, a grande cortina que impedia o acesso ao Santo dos Santos, figura da presença de Deus. É disto que fala a carta aos Hebreus, ao mencionar o véu do Templo rasgado no momento da morte de Jesus: “Tendo, pois, irmãos, ousadia para entrar no santuário, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou, pelo véu, isto é, pela sua carne” (Hb 10:19-20).
Aarão, irmão de Moisés, era uma figura do sacerdócio de Cristo, intercedendo por nós junto a Deus. Cada detalhe de suas vestes e de seu ministério apontava para o caráter e ministério de Jesus como nosso Sumo Sacerdote. Porém, por mais preciosas que sejam as figuras do Antigo Testamento, a carta aos Hebreus nos exorta a não nos ocuparmos com os tabernáculos, templos, sacerdotes humanos e rituais copiados do judaísmo pela cristandade atual, mas com a realidade que agora é Cristo. Aos Colossenses Paulo referiu-se ao Antigo Testamento como “sombras das coisas futuras” (Cl 2:16-17) e aos Coríntios que “estas coisas foram-nos feitas em figura” (1 Co 10:6), e Hebreus diz que “servem de exemplo e sombra das coisas celestiais” e devem ser vistas como “figura do verdadeiro” (Hb 8:5; 9:24).
“Quando Cristo veio como sumo sacerdote dos benefícios agora presentes”, diz a carta aos Hebreus, “ele adentrou o maior e mais perfeito tabernáculo, não feito pelo homem, isto é, não pertencente a esta criação. Não por meio de sangue de bodes e novilhos, mas pelo seu próprio sangue, ele entrou no Santo dos Santos, uma vez por todas, e obteve eterna redenção… Temos um sumo sacerdote… o qual se assentou à direita do trono da Majestade nos céus e serve no santuário, no verdadeiro tabernáculo que o Senhor erigiu, e não o homem” (Hb 9:11-12; 8:1-2).
Depois de saber disto, como um cristão pode de sã consciência adorar a Deus em um templo feito de tijolos, com um sacerdote humano, um altar de mentirinha e tantos utensílios piratas, cópias baratas das figuras do Antigo Testamento?
No capítulo 21 do livro de Números encontramos Jesus representado na serpente de bronze que Moisés fez para curar os israelitas das picadas de serpentes no deserto. “O Senhor disse a Moisés: ‘Faça uma serpente e coloque-a no alto de um poste; quem for mordido e olhar para ela viverá’. Moisés fez então uma serpente de bronze e a colocou num poste. Quando alguém era mordido por uma serpente e olhava para a serpente de bronze, permanecia vivo” (Nm 21:8-9).
Não teríamos como ver Jesus ali se não fosse pela explicação dada a Nicodemos no Evangelho de João, ao falar da vida que está disponível para o pecador moribundo que crê no crucificado: “Da mesma forma como Moisés levantou a serpente no deserto, assim também é necessário que o Filho do homem seja levantado, para que todo o que nele crer tenha a vida eterna” (Jo 3:14-15). No mesmo livro de Números o mercenário Balaão, um profeta pagão, é obrigado a falar de Jesus, que virá para a Igreja como a Estrela da Manhã, e para Israel como o cetro que reinará por mil anos. Balaão profetizou: “Uma estrela surgirá de Jacó; um cetro se levantará de Israel” (Nm 24:17).
Deixamos de lado muitas outras figuras do Pentateuco para entrarmos no livro de Josué, o qual é um tipo de Jesus ressuscitado e liderando o seu povo na conquista da terra prometida. É por Jesus que “em todas estas coisas somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou… nem morte nem vida, nem anjos nem demônios, nem o presente nem o futuro, nem quaisquer poderes, nem altura nem profundidade, nem qualquer outra coisa na criação será capaz de nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8:37-39).
No livro de Juízes vemos a triste figura de um povo que se desviou de Deus, mas ainda ali é possível ver, nos diferentes juízes e libertadores levantados por Deus, uma tênue figura de Jesus, o verdadeiro Libertador e Juiz. Entramos no livro de Rute e nele visitamos Belém, onde nasceu Obede, figura do verdadeiro Servo de Deus que nasceria na mesma cidade e seria descendente do próprio Obede, pai de Jessé, e pai de Davi, do qual viria o Cristo.
Nos dois livros de Samuel vemos o profeta de mesmo nome, que Deus levantou em meio à ruína do testemunho, e ele é uma figura do verdadeiro Profeta por meio de quem Deus falaria nos últimos dias. Ali encontramos Davi, o Rei segundo o coração de Deus e figura do Rei que virá em glória e majestade para reinar. Mas no caráter de um reino de paz, Jesus é prefigurado por Salomão. Nos Evangelhos ele fez questão de se apresentar como aquele “que é maior do que Salomão” (Mt 12:42), mostrando que as sombras, por mais representativas que sejam da realidade, podem se desvanecer como aconteceu com o final inglório da vida do primeiro Salomão.
Deve ter sido maravilhoso para os dois discípulos a caminho de Emaús ouvirem Jesus falar do Antigo Testamento. “E começando por Moisés e todos os profetas, explicou-lhes o que constava a respeito dele em todas as Escrituras”. Mais tarde ele diria aos discípulos: ‘Foi isso que eu lhes falei enquanto ainda estava com vocês: era necessário que se cumprisse tudo o que a meu respeito estava escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos’. Então lhes abriu o entendimento, para que pudessem compreender as Escrituras” (Lc 24:27; 44-45).
Embora ele tenha citado apenas a Lei, os Profetas e os Salmos, é possível vê-lo também nos livros de Reis e Crônicas, porém com uma nitidez cada vez menor à medida que Deus esgotava as tentativas de despertar fidelidade em seu povo. Guardadas as devidas proporções, alguns outros reis — Asa, Josafá, Ezequias e Josias — são também figuras de Cristo. Então vem o cativeiro e chegamos ao livro de Ester, o único livro da Bíblia que não menciona o nome de Deus, e nele conhecemos Mordecai, um tipo do verdadeiro Libertador dos judeus. Em Esdras e Neemias vemos figuras de Jesus como o Restaurador do povo e da adoração ao Deus verdadeiro.
A chave para entendermos o livro de Jó continua sendo Cristo, porém ali demonstrado como aquele que é o único cuja justiça pode prevalecer aos olhos de Deus. Era esta a lição que Jó, orgulhoso de sua justiça própria, precisava aprender. Para isto Deus usou Eliú, uma figura de Cristo, nosso Grande Sumo Sacerdote. Ao mesmo tempo em que intercedia por Jó, “Eliú… indignou-se muito contra Jó, porque este se justificava a si mesmo diante de Deus” (Jó 32:2).
O livro de Salmos é como um diário pessoal de Jesus, no qual ele anotou os seus sentimentos em sua identificação com o seu povo. No Salmo 16 encontramos “Jesus, autor e consumador da nossa fé” (Hb 12:2) e em muitos outros ele pode ser visto sofrendo o abandono que sofrerá o remanescente judeu fiel—os “pequeninos irmãos” de Mateus 25—na “grande tribulação”. O Salmo 22 mostra sua senda de sofrimento, desamparado por Deus e massacrado pelos homens. No Salmo 40 ele aparece cumprindo a vontade de Deus pelo sacrifício de si mesmo, e mais detalhes surgem no Salmo 69. O Salmo 102 revela seus sentimentos de pequenez, “como o pardal solitário no telhado” (Sl 102:7).
Porém nos Salmos 8 e 91 nós o vemos como o Segundo Homem, em seu domínio sobre todas as coisas, e no Salmo 18 o Rei aparece triunfante, e no Salmo 24 o Rei da glória toma posse daquilo que é seu por direito. No Salmo 45 ele é o Conquistador, cuja espada não poupa os ímpios em sua vingança a favor do sofrido remanescente fiel, que é amparado na jornada rumo ao reino milenial. Este tem suas glórias descritas no Salmo 100. Falta tempo para mostrar Jesus em todos os Salmos, portanto leia todos eles, começando com o Salmo 1, que mostra a perfeição da sua Pessoa, verdadeiro Deus e genuíno Homem.
No livro de Provérbios encontramos Jesus, o verdadeiro Filho de Davi e aquele que é “maior do que Salomão”, como a personificação da sabedoria de Deus. Reserve alguns minutos para ler o capítulo 8 de Provérbios e conhecer melhor este que é de “eternidade a eternidade, porque dele são a sabedoria e a força” (Dn 2:20). É neste livro que você encontra Jesus também como “o amigo [que] ama em todos os momentos” e “um irmão na adversidade” (Pv 17:17).
O livro de Eclesiastes quase deixa Cristo de fora, por ser um compêndio de sabedoria humana debaixo do sol, ou seja, como o homem enxerga sua vida neste mundo. Mesmo assim nós o encontramos na alegoria de “uma pequena cidade em que havia poucos homens, e veio contra ela um grande rei, e a cercou e levantou contra ela grandes baluartes; e encontrou-se nela um sábio pobre, que livrou aquela cidade pela sua sabedoria, e ninguém se lembrava daquele pobre homem” (Ec 9:14-15). A carta de Paulo aos Coríntios nos faz lembrar de “nosso Senhor Jesus Cristo que, sendo rico, por amor de vós se fez pobre; para que pela sua pobreza enriquecêsseis” (2 Co 8:9).
Mas se a descrição árida de sabedoria humana encontrada no livro de Eclesiastes só aumenta nossa sede por Jesus, o livro de Cantares abre um manancial de água pura. Trata-se de uma alegoria que fala de Salomão, uma figura de Cristo, e sua noiva, a Sulamita, uma figura do povo terrenal de Deus, em especial o remanescente judeu fiel que será oprimido durante a “grande tribulação”. Ali tudo aponta para Cristo e sua extrema formosura. Ao perguntarem: “Que é o teu amado mais do que outro amado, ó tu, a mais formosa entre as mulheres?”, a Sulamita responde: “O meu amado é branco e rosado; ele é o primeiro entre dez mil. A sua cabeça é como o ouro mais apurado, os seus cabelos são crespos, pretos como o corvo. Os seus olhos são como os das pombas junto às correntes das águas, lavados em leite, postos em engaste. As suas faces são como um canteiro de bálsamo, como flores perfumadas; os seus lábios são como lírios gotejando mirra com doce aroma. As suas mãos são como anéis de ouro engastados de berilo; o seu ventre como alvo marfim, coberto de safiras. As suas pernas como colunas de mármore colocadas sobre bases de ouro puro; o seu aspecto como o Líbano, excelente como os cedros. A sua boca é muitíssimo suave, sim, ele é totalmente desejável. Tal é o meu amado, e tal o meu amigo, ó filhas de Jerusalém” (Ct 5:9-16).
Seguem-se os livros dos profetas, que falam de Cristo, de sua obra e do reino vindouro. Digno de nota é o capítulo 53 de Isaías, escrito 700 anos antes da morte de Jesus e dizendo que ele “Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados… porquanto derramou a sua alma na morte, e foi contado com os transgressores; mas ele levou sobre si o pecado de muitos”.
Chegamos, então, aos Evangelhos e em Mateus Jesus é o Rei de Israel, em Marcos o Profeta e Servo fiel, em Lucas o perfeito Homem e em João o Verbo de Deus, a própria habitação de Deus com os homens.
A revelação dada por Deus aos homens foi progressiva, portanto Moisés e os profetas que vieram depois dele não entenderam a profundidade das revelações que eles próprios recebiam. Muitas coisas só fariam sentido para aqueles que tivessem a revelação completa de Deus, por isso é impossível alguém entender corretamente as sombras e figuras do Antigo Testamento sem ler a realidade apresentada no Novo Testamento. Em sua primeira carta o apóstolo Pedro nos dá uma ideia mais clara disto, ao mencionar a salvação eterna pela fé em Jesus, que hoje o crente pode ter como certa e segura. Ele escreveu: “Da qual salvação inquiriram e trataram diligentemente os profetas que profetizaram da graça que vos foi dada, indagando que tempo ou que ocasião de tempo o Espírito de Cristo, que estava neles, indicava, anteriormente testificando os sofrimentos que a Cristo haviam de vir, e a glória que se lhes havia de seguir. Aos quais foi revelado que, não para si mesmos, mas para nós, eles ministravam estas coisas que agora vos foram anunciadas por aqueles que, pelo Espírito Santo enviado do céu, vos pregaram o evangelho; para as quais coisas os anjos desejam bem atentar” (1 Pe 1:10-12).
Mesmo assim, nem os próprios apóstolos tiveram toda a revelação de Deus durante o período dos Evangelhos. Algumas coisas ficaram ocultas como “mistérios” e foram reveladas especificamente ao apóstolo Paulo. Ele é o autor do “quinto evangelho”, a carta aos Romanos, que ele chama de “o meu evangelho e a pregação de Jesus Cristo, conforme a revelação do mistério que desde tempos eternos esteve oculto, mas que se manifestou agora, e se notificou pelas Escrituras dos profetas, segundo o mandamento do Deus eterno” (Rm 16:25-26). A expressão “que se manifestou agora” significa que antes de Paulo isso ainda era um mistério.
Um dos mistérios revelados a Paulo foi a ressurreição dos santos no arrebatamento. Ele escreveu: “Eis aqui vos digo um mistério: Na verdade, nem todos dormiremos, mas todos seremos transformados; num momento, num abrir e fechar de olhos, ante a última trombeta; porque a trombeta soará, e os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados” (1 Co 15:51-52). A carta aos Tessalonicenses dá mais detalhes deste mistério, e Paulo se inclui ali entre os que já esperavam por este evento: “Dizemo-vos, pois, isto, pela palavra do Senhor: que nós, os que ficarmos vivos para a vinda do Senhor, não precederemos os que dormem. Porque o mesmo Senhor descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor” (1 Ts 4:15-17).
No Antigo Testamento Jesus foi apresentado em tipos e figuras e depois sua Pessoa descrita em detalhes nos Evangelhos. Mas o modo como ele se revelou a Paulo foi peculiar. Os outros discípulos haviam conhecido Jesus antes de sua morte e também depois, já ressuscitado. A Paulo ele apareceu glorificado e, como se isto não bastasse, levou-o para conhecer o Paraíso ou “terceiro céu”, onde o apóstolo “ouviu palavras inefáveis, que ao homem não é lícito falar” (2 Co 12:4).
Portanto, ainda que você encontre Jesus em figuras no Antigo Testamento, e vivo, morto e ressuscitado nos Evangelhos, é por meio de Paulo que poderá conhecê-lo glorificado e em sua relação com a Igreja, o corpo de Cristo. Isto por causa da “revelação do mistério que desde tempos eternos esteve oculto, Mas que se manifestou agora, e se notificou pelas Escrituras dos profetas, segundo o mandamento do Deus eterno, a todas as nações para obediência da fé” (Rm 16:25-26). A chave para você abrir o cofre dos segredos ou mistérios de Deus é a “obediência da fé”. Não apenas fé, mas a fé daquele que está disposto a obedecer para conhecer a “a sabedoria de Deus, oculta em mistério, a qual Deus ordenou antes dos séculos para nossa glória” (1 Co 2:7).
Trata-se de coisas que pertencem a outra dimensão; que Deus tinha em mente antes que existisse o tempo, pois são “coisas que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, e não subiram ao coração do homem, são as que Deus preparou para os que o amam.”, diz o apóstolo Paulo em sua carta aos Coríntios (1 Co 2:8-9). Por mais privilegiados que tenham sido os homens de Deus do Antigo Testamento ou mesmo os discípulos no período dos evangelhos, nenhum deles teve o Espírito Santo habitando em si como o crente tem agora, depois de Pentecostes, e é somente pelo Espírito que estas coisas podem ser compreendidas.
Quando Deus decidiu revelar a verdade do mistério ele escolheu um vaso muito especial, e sabemos disso porque em Efésios 3 Paulo diz: “Se é que tendes ouvido a dispensação da graça de Deus, que para convosco me foi dada; como me foi este mistério manifestado pela revelação, como antes um pouco vos escrevi” (Ef 3:2-3). Paulo ainda não tinha recebido a revelação do mistério quando o Senhor mostrou a ele a essência da verdade deste mistério no caminho para Damasco, ao perguntar: “Saulo, Saulo, por que me persegues?” (At 9:4). Jesus revelava assim que os santos, que Saulo perseguia na terra, formavam um corpo e estavam unidos a Cristo, a Cabeça, nos céus.
Faltava um mistério a ser revelado, e a tarefa coube a Paulo. Com este segredo trazido à tona, a revelação de Deus estaria completa. É o que ele diz aos Colossenses, ao falar da Igreja, o corpo de Cristo e habitação do Espírito: “da qual eu estou feito ministro segundo a dispensação de Deus, que me foi concedida para convosco, para cumprir a palavra de Deus; o mistério que esteve oculto desde todos os séculos, e em todas as gerações, e que agora foi manifesto aos seus santos; aos quais Deus quis fazer conhecer quais são as riquezas da glória deste mistério entre os gentios, que é Cristo em vós, esperança da glória” (Cl 1:24-27).
No grego a palavra traduzida como “cumprir” tem o sentido de completar ou preencher uma lacuna. É a mesma usada por João, ao dizer: “Estas coisas vos escrevemos, para que o vosso gozo se cumpra.” (1 Jo 1:4). Paulo colocou a peça que faltava na revelação de Deus e nos fez saber que “os gentios são coerdeiros, e de um mesmo corpo, e participantes da promessa em Cristo pelo evangelho”, e continua dizendo do privilégio que ele recebeu pela revelação do evangelho da graça de Deus: “do qual fui feito ministro, pelo dom da graça de Deus, que me foi dado segundo a operação do seu poder. A mim, o mínimo de todos os santos, me foi dada esta graça de anunciar entre os gentios, por meio do evangelho, as riquezas incompreensíveis de Cristo, E demonstrar a todos qual seja a dispensação do mistério, que desde os séculos esteve oculto em Deus, que tudo criou por meio de Jesus Cristo; para que agora, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades nos céus, segundo o eterno propósito que fez em Cristo Jesus nosso Senhor” (Ef 3:6-11).
Por ser um mistério que ficou oculto no passado, a Igreja não existia no Antigo Testamento e nem mesmo nos evangelhos. Jesus a menciona pela primeira vez em Mateus 16:18, mas como algo ainda futuro. Ele diz: “Edificarei a minha igreja”. Como toda edificação da época, ela teria um alicerce com uma pedra de canto ou esquina — Cristo —, seguida das outras pedras do alicerce que seriam os apóstolos e profetas do Novo Testamento. Sobre este fundamento as paredes seriam levantadas com o acréscimo de cada salvo por Cristo.
É desta edificação que Paulo fala no capítulo 2 de Efésios ao dizer que somos “edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra da esquina; no qual todo o edifício, bem ajustado, cresce para templo santo no Senhor. No qual também vós juntamente sois edificados para morada de Deus em Espírito” (Ef 2:20-22). Em 1 Coríntios o apóstolo fala de sua responsabilidade em lançar os fundamentos da Igreja: “Segundo a graça de Deus que me foi dada, pus eu, como sábio arquiteto, o fundamento, e outro edifica sobre ele; mas veja cada um como edifica sobre ele. Porque ninguém pode pôr outro fundamento além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo” (1 Co 3:10-11). Portanto é impossível você entender o que é a Igreja e saber como ela deve funcionar sem ler as cartas do apóstolo Paulo, a quem foi dada a tarefa de completar a Palavra de Deus.
Obviamente muitos pentecostais ou carismáticos não gostam da ideia de termos uma revelação completa, pois isto não lhes permite trazer suas próprias “revelações”, ou algum tipo de “pão quente”, como alguns costumam chamar aquilo que é falado espontaneamente em um púlpito, nem sempre com respaldo bíblico. Por isso é comum ouvirmos frases do tipo “O Espírito Santo me revelou….”, “Deus me disse…”, ou pessoas mudando a voz como se estivessem possuídas pelo próprio Espírito de Deus e falando na primeira pessoa coisas do tipo “Meu servo, eis que te ordeno…” ou “Meu servo, nenhuma obra maligna virá contra ti…”, etc. Será isso uma necessidade de autoafirmação ou insatisfação com a suficiência das Escrituras? Ou talvez um desejo por novidades? Pode ser, pois Paulo avisou a Timóteo: “Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si doutores conforme as suas próprias concupiscências; e desviarão os ouvidos da verdade, voltando às fábulas” (2 Tm 4:3-4).
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Por que você não permite comentários?
A verdade é que permito sim comentários, porque qualquer um pode entrar em contato comigo e comentar algo que eu escrevi ou disse numa gravação ou vídeo. Meu e-mail de contato pode ser encontrado em todos os meus sites e canais, e sempre que alguém me escreve eu procuro responder, embora isso às vezes leve algum tempo em razão do número de mensagens. Só em 2016 foram mais de dez mil e-mails que recebi com dúvidas, além de perguntas feitas nas redes sociais. A maior parte eu respondo apenas com um link para uma resposta que já existe em algum de meus sites, como “O que respondi”, “O Evangelho em 3 Minutos”, “Manjar Celestial”, etc. Afinal, cabe aos cristãos estarem “sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós” (1 Pe 3:15).
Alguns alegam ser “falta de democracia” eu manter fechadas as áreas de comentários de meus sites, blogs e canais no Youtube, como se a casa da gente fosse um espaço anárquico onde qualquer um pudesse entrar e pichar as paredes em nome de uma suposta democracia. Algumas reclamações são educadas, outras iradas me chamando de “covarde” dentre outros nomes. Muitos nem mesmo estão interessados em comentar ou perguntar algo, mas apenas em se valer de uma plataforma com milhares de pessoas na audiência para expor suas próprias ideias, divulgar heresias ou fazer propaganda de alguma igreja ou religião.
Diante disso eu fecho a possibilidade de comentários públicos, primeiro porque é impossível evitar que a área de comentários de um blog, site ou canal do Youtube acabe virando uma versão digital de porta de banheiro de rodoviária, com palavrões, xingamentos, insultos, propaganda, etc. Para mantê-los eu teria de dedicar todo o meu tempo moderando os comentários e, acredite-me, sei bem o que é isso. Nos primórdios da Internet criei uma das primeiras comunidades de discussões de negócios da Web no Brasil, a Widebiz no milênio passado, pela qual recebi o Prêmio Empreendedor 2000. Então sei bem o trabalho que dá moderar uma comunidade e comentários na Web.
Outra razão de eu limitar comentários é que esta é uma tendência dos maiores sites de mídia. Isto porque muita gente que comenta está apenas querendo ganhar visibilidade para suas ideias às custas do site muito visitado, enquanto outras podem praticar crimes de ofensa moral ou bullying que irão levar o dono do site como corresponsável no caso de um processo por crime. Veja alguns dos sites mais importantes do mundo que já bloquearam sua área de comentários: CNN, Bloomberg, The Verge, The Daily Beas, Motherboard, Recode, Reuters, Popular Science, The Week, Mic, The Verge, USA Today, The Week… e obviamente os sites do Mario Persona.
Quem quiser fazer comentários sobre diferentes assuntos, o lugar apropriado para isso hoje são as mídias sociais. Mas mesmo nelas existe a possibilidade de filtrar quem pode ou não comentar, e eu exerço esse direito bloqueando pessoas que tentem publicar em meu mural comentários que sejam inconvenientes e principalmente aqueles que possam depreciar a Pessoa de Cristo, sua divindade e sua obra para salvar o pecador.
Nem todos sabem como se comportar nas redes sociais. No Facebook existem diferentes possibilidades e espaços para interagir. O mural de cada um é sua sala de estar, restrito a convidados e ainda assim configurável para que fique calado quem o dono do mural quiser calar. Como eu tenho no Facebook cerca de cinco mil “amigos”, e mais de dezessete mil seguidores, em meu mural só aparecem as minhas postagens e as de quem eu aprovo na filtragem. Também só vejo as postagens daqueles que sigo.
O Facebook permite também criar grupos, que podem ser públicos ou restritos a convidados. Se não quiser ser chato, nunca inscreva pessoas em um grupo que você criou sem antes perguntar se elas querem participar. Perco um bom tempo cancelando inscrições feitas à revelia em grupos de assuntos que nada têm a ver comigo. Mas se você está num grupo aberto é porque o dono abriu o espaço para discussão e ali podem até ocorrer discussões acaloradas, pois participam pessoas que nem sempre têm a mesma opinião, mas devem se comportar segundo as regras daquele grupo.
Agora voltando ao perfil e ao mural de cada um, ele é como sua sala de estar e os convidados são bem-vindos como fazemos em nossa casa. O problema é que, mesmo que consiga calar ou controlar as publicações de outros, os comentários podem estar abertos e nem todos comentam em sintonia com aquilo que agrada o dono da casa. Você acha que seria de bom tom você estar vendo um filme em sua sala e eu entrar, pegar o controle e mudar para novela? Certamente eu estaria indo contra todas as regras de educação e boa conduta.
No Facebook não tenho o costume de publicar opiniões no mural de outros, mesmo que às vezes não concorde com o que a pessoa disse. Ali é sua sala de estar e não me sinto na liberdade de invadi-la. Por isso quando alguém faz comentários em minha “sala de estar” que venham a comprometer a Pessoa de Cristo e a fidelidade e inerrância das Escrituras, não me resta alternativa além de pedir à pessoa para sair. Você não faria o mesmo se alguém entrasse em sua sala de estar para colocar em dúvida a idoneidade e fidelidade de seus pais na frente dos convidados?
Nas redes sociais e também em meus sites e vídeos procuro pautar o que escrevo pelas páginas das Escrituras e fico feliz quando alguém me corrige também segundo as Escrituras, mas sem colocar em dúvida suas páginas. Mas se alguém não crê na fonte, como podemos conversar sem essa base comum? Talvez tenhamos uma boa conversa sobre política, economia, esportes, artes etc., mas é impossível conversar sobre Deus sem crer que Deus disse o que disse. Se uma pessoa me xinga ou critica com veemência, me entristeço, mas não considero isso grave. Afinal, sou falho como qualquer um e em hipótese nenhuma gostaria que alguém seguisse minha pessoa como alguns seguem gurus religiosos. Mas quando alguém fala mal de meu Senhor ou das Sagradas Escrituras uso logo os recursos de bloqueio do comentarista.
O homem que não crê no que Deus diz nas páginas das Escrituras está tentando fugir do padrão que Deus estabeleceu para estabelecer seu próprio padrão fundamentado em seu intelecto ou talvez até em alguma religião que coloque de lado as Escrituras para se ocupar com supostas revelações fresquinhas saídas da boca e algum pretenso profeta ou profetiza. Isso apenas atesta que Deus está com a razão ao não crer no que o homem diz, quando afirma em sua Palavra:
“Sempre seja Deus verdadeiro, e todo o homem mentiroso” (Rm 3:4); “À lei e ao testemunho! Se eles não falarem segundo esta palavra, é porque não há luz neles” (Is 8:20); “Os sábios são envergonhados, espantados e presos; eis que rejeitaram a palavra do Senhor; que sabedoria, pois, têm eles?” (Jr 8:9); “Não é a minha palavra fogo, diz o Senhor, e martelo que esmiúça a penha? Portanto, eis que eu sou contra esses profetas, diz o Senhor, que furtam as minhas palavras, cada um ao seu companheiro. Eis que eu sou contra esses profetas, diz o Senhor, que pregam a sua própria palavra e afirmam: Ele disse” (Jr 23:29-31).
Um artigo que traduzi do “The Bible Treasury” sobre as Escrituras, publicado em 1870 e de autor desconhecido, pode ajudar a entender qual é também a minha posição a respeito:
“O cristianismo tradicional não passa de infidelidade, pois nega as Escrituras e estabelece sua própria suficiência, fazendo de si mesmos o padrão. Em dias de maior fidelidade quem traísse o livro era julgado como ímpio tanto quanto quem negasse a fé. Mas se alguns fazem isso por infidelidade profana, outros o fazem por infidelidade religiosa, e muitos preferem escolher esta última. Ela permite que eles mantenham Deus a distância, que é o que o homem ou sua carne deseja, enquanto ao mesmo tempo lhe permite conservar uma consciência de paz com a religião, que é também um desejo humano.” [The Bible Treasury : Volume 8 : On the Scriptures – 1870 – Autor desconhecido].
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A Policia Federal desrespeitou a Bíblia?
Não vejo que o uso de um versículo da Bíblia para dar nome a uma operação da Polícia Federal — no caso a “Operação Timóteo” — seja um desrespeito à Palavra de Deus. Ao contrário, isso só expõe a vergonha em que se tornou o testemunho cristão no mundo, que está hoje em seu estágio de Laodiceia, quando o Senhor diz “estou a ponto de vomitá-lo da minha boca” (Ap 3:16). Quando a degradação da cristandade provoca ânsias de vômito no próprio Senhor é porque as coisas foram longe demais e tudo indica que ainda irão. A Polícia Federal tão somente trouxe à tona a vergonhosa atitude de muitos cristãos que buscam prosperidade a todo custo em uma clara desobediência à admoestação do versículo de 1 Timóteo 6:9 usado para dar nome à operação.
O contexto da passagem é mais amplo do que o versículo 9 usado pela Polícia Federal e fala justamente daqueles que querem fazer da piedade fonte de lucro, algo que está visível e patente a qualquer hora do dia ou da noite em templos, rádios e TVs que transmitem programas neopentecostais. Tudo gira em torno de se adquirir dinheiro e poder nesta vida. Vamos ao trecho: “…homens corruptos de entendimento, e privados da verdade, cuidando que a piedade seja causa de ganho; aparta-te dos tais. Mas é grande ganho a piedade com contentamento. Porque nada trouxemos para este mundo, e manifesto é que nada podemos levar dele. Tendo, porém, sustento, e com que nos cobrirmos, estejamos com isso contentes. Mas os que querem ser ricos caem em tentação, e em laço, e em muitas concupiscências loucas e nocivas, que submergem os homens na perdição e ruína. Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores” (1 Tm 6:5-10).
Sabemos que Paulo escreve a Timóteo em sua primeira epístola indicando “como convém andar na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, a coluna e firmeza da verdade. E, sem dúvida alguma, grande é o mistério da piedade: Deus se manifestou em carne, foi justificado no Espírito, visto dos anjos, pregado aos gentios, crido no mundo, recebido acima na glória” (1 Tm 3:15-16). É dessa piedade que ele fala em 1 Timóteo 6, que homens corruptos achavam “que a piedade é fonte de lucro” (1 Tm 6:5 ARA). O tema da segunda carta a Timóteo é a degeneração dessa casa de Deus e sua ruína, que de uma casa que devia ser “a coluna e firmeza da verdade” se transformou “numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra” (2 Tm 2:20). Numa situação assim o apóstolo alerta para que “o Senhor conhece os que são seus, e qualquer que profere o nome de Cristo aparte-se da iniquidade” (2 Tm 2:19).
Tudo isso tem uma ligação direta com o capítulo 18 de Apocalipse, que descreve o último estágio da Babilônia, chamada de “a grande” tal qual a “grande casa”, que é a cristandade professa que irá permanecer aqui na terra após a igreja, os verdadeiros salvos, serem arrebatados. Essa cristandade oca, vazia de Cristo após o arrebatamento dos verdadeiros cristãos. A profissão cristã continuará com todos os seus sistemas, seus templos, seus cultos caminhando da maneira como sempre caminhou, em ganância e na busca por cada vez mais poder e influência secular.
O que vemos em Babilônia nos capítulos 17 e 18 de Apocalipse é a cristandade que quis ser rica; a cristandade que quis ser grande. Ali ela é chamada várias vezes de “grande cidade”, porque sempre foi isso que a cristandade quis ser no mundo. Quando lemos em Apocalipse 18:2 que “caiu a grande Babilônia, e se tornou morada de demônios, e covil de todo espírito imundo, e esconderijo de toda ave imunda e odiável”, isso nos leva ao capítulo 13 do Evangelho de Mateus. Ali o Senhor fala as parábolas do reino dos céus e começa com a parábola do Semeador.
O Semeador semeia a semente e esta cai em diferentes solos, e em um deles o maligno arrebata a semente. Na parábola do joio e do trigo Jesus mostra que existe mistura no reino dos céus, onde aquilo que é falso convive lado a lado com aquilo que é verdadeiro. Trigo e joio crescem juntos no mesmo campo que é o mundo. Quando o Senhor chega à parábola do grão de mostarda, ele fala de uma pequena semente que se transforma numa grande árvore e as aves dos céus se aninham em seus ramos. Um pé de mostarda que se transforma em árvore é uma aberração. Eu nunca vi uma criança amarrando seu balanço no galho de um pé de mostarda para balançar, ou dizendo que caiu de um pé de mostarda.
A mostarda é uma hortaliça que não deveria atingir a estatura de uma árvore, com tronco e galhos, e nesta árvore da parábola vemos aninhadas toda sorte de aves do céu. Que aves são essas? O Senhor Jesus explica na parábola do Semeador: “e, quando semeava, uma parte da semente caiu ao pé do caminho, e vieram as aves, e comeram-na” (Mt 13:4). Quando ele explica no versículo 19 que, “ouvindo alguém a palavra do reino, e não a entendendo, vem o maligno, e arrebata o que foi semeado no seu coração; este é o que foi semeado ao pé do caminho”, podemos associar as aves como emissários de Satanás, os mesmos que aparecem aninhados nos galhos da árvore de mostarda.
Embora a cristandade interprete as parábolas do grão de mostarda e da massa levedada de uma ótica benigna, como se fosse a expansão do evangelho no mundo, o cristão “que é espiritual discerne bem tudo” saberá que os apóstolos e profetas da Igreja — e isso inclui os que escreveram os Evangelhos — não ensinavam com “palavras de sabedoria humana, mas com as que o Espírito Santo ensina, comparando as coisas espirituais com as espirituais.” (1 Co 2:13-16). Comparando “coisas espirituais com espirituais” você irá encontrar na Bíblia exemplos de aves usadas no sentido maligno e fermento sempre como figura do pecado e contaminação. Nada de positivo, portanto, no crescimento daquela massa da parábola do fermento que uma mulher introduziu. A massa cresceu como consequência do alerta dado pelo Senhor à igreja de Tiatira em Apocalipse 2:20: “Tenho contra ti que toleras Jezabel, mulher que se diz profetisa, ensinar e enganar os meus servos, para que se prostituam e comam dos sacrifícios da idolatria”. Uma das doutrinas cardeais do catolicismo romano é que a igreja, que é um termo feminino, é quem ensina, quando na doutrina dos apóstolos sabemos que a igreja, ou a mulher que a simboliza, nunca ensina. A igreja aprende.
Juntando tudo, esta é a condição agora da grande Babilônia de Apocalipse 17 e 18, o grande sistema em que se tornou o testemunho cristão no mundo ao ponto de se tornar “morada de demônios, e covil de todo espírito imundo, e esconderijo de toda ave imunda e odiável” (Ap 18:2). À medida que a cristandade cresceu como a grande árvore de mostarda, ela não apenas se desviou da verdade, mas também deixou-se contaminar pelo fermento do pecado e corrupção, passando a abrigar demônios e homens energizados pelo próprio diabo, como o apóstolo Paulo alertou em sua carta aos Coríntios: “Porque tais falsos apóstolos são obreiros fraudulentos, transfigurando-se em apóstolos de Cristo. E não é maravilha, porque o próprio Satanás se transfigura em anjo de luz. Não é muito, pois, que os seus ministros se transfigurem em ministros da justiça; o fim dos quais será conforme as suas obras” (2 Co 11:13-15).
Essa é a cristandade que temos já em nossos dias, e quando vemos a Polícia Federal investigando lavagem de dinheiro e usando um versículo da Bíblia para dar nome à sua operação, por essa lavagem de dinheiro estar supostamente sendo feita com a utilização de igrejas, vemos a que ponto chegou a cristandade. Alguém postou em meu Twitter o vídeo de um líder religioso vociferando indignado contra as autoridades por sua reputação ter sido maculada ao ter seu nome envolvido nessa operação da Polícia Federal. Achei graça. Afinal, que reputação tem o crente que possa ser manchada? A única reputação de um crente é a de um pecador perdido salvo por Cristo, que não tem que defender-se a si mesmo, mas testemunhar de Cristo. Quanto à sua reputação segundo os valores da carne e deste mundo, ele deve deixá-la no mesmo chão da cocheira onde o apóstolo Paulo deixou a dele, após considerá-la estrume. Ele escreveu: “Ainda que também podia confiar na carne; se algum outro cuida que pode confiar na carne, ainda mais eu… Mas o que para mim era ganho reputei-o perda por Cristo. E, na verdade, tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo qual sofri a perda de todas estas coisas e as considero como esterco, para que possa ganhar a Cristo, e seja achado nele, não tendo a minha justiça que vem da lei, mas a que vem pela fé em Cristo, a saber, a justiça que vem de Deus, pela fé” (Fp 3:4-9).
Nosso exemplo deve ser o que foi dado pelo próprio Senhor Jesus. Quando sua reputação era manchada, a reação dele não era de revanche ou defesa acalorada. “Quando o injuriavam, não injuriava, e quando padecia não ameaçava, mas entregava-se àquele que julga justamente” (1 Pe 2:23). Na verdade, ao nos tornarmos cristãos devemos estar prontos a receber toda a ignomínia e vergonha que ele recebeu neste mundo até ao ponto de ter sido pregado numa cruz como um criminoso qualquer. A passagem toda de 1 Pedro é tão instrutiva que vale a pena transcrever aqui todo o contexto, o qual inclui a sujeição passiva às autoridades constituídas: “Sujeitai-vos, pois, a toda a ordenação humana por amor do Senhor; quer ao rei, como superior; quer aos governadores, como por ele enviados para castigo dos malfeitores, e para louvor dos que fazem o bem. Porque assim é a vontade de Deus, que, fazendo bem, tapeis a boca à ignorância dos homens insensatos; como livres, e não tendo a liberdade por cobertura da malícia, mas como servos de Deus. Honrai a todos. Amai a fraternidade. Temei a Deus. Honrai ao rei. Vós, servos, sujeitai-vos com todo o temor aos senhores, não somente aos bons e humanos, mas também aos maus. Porque é coisa agradável, que alguém, por causa da consciência para com Deus, sofra agravos, padecendo injustamente. Porque, que glória será essa, se, pecando, sois esbofeteados e sofreis? Mas se, fazendo o bem, sois afligidos e o sofreis, isso é agradável a Deus. Porque para isto sois chamados; pois também Cristo padeceu por nós, deixando-nos o exemplo, para que sigais as suas pisadas” (1 Pe 2:13-21).
Na descrição da grande Babilônia de Apocalipse, a expressão final da cristandade corrompida, vemos que o que a motivou desde o princípio foi o mesmo desejo do homem carnal de ser grande. Babilônia é chamada de grande cidade, mas a primeira cidade da história surgiu em Gênesis, construída por Caim em seu caminho de rebelião. “E conheceu Caim sua mulher e ela concebeu e teve a Enoque, e ele edificou uma cidade e chamou o nome da cidade pelo nome de seu filho Enoque” (Gn 4:17). Ali surgiram muitas primeiras coisas, todas elas numa tentativa de Caim tornar o mundo arruinado mais confortável para sua habitação, e permitir ao homem deixar de ser um peregrino errante e fincar sua bandeira na terra.
O caminho de Caim nos ensina que o homem afastado de Deus irá querer ser grande no mundo, e Caim seguiu à risca o provérbio brasileiro chamado de “Lei de Gerson”, e conseguiu ser o primeiro em muitas coisas. Tendo sido o primeiro filho do primeiro casal, cometeu o primeiro assassinato ao matar seu irmão Abel. Construiu a primeira cidade, foi o primeiro a praticar o costume de dar nomes de homens a cidades, ruas e praças, um seu descendente, Lameque, foi o primeiro polígamo, outro descendente, Jabal, “foi o pai dos que habitam em tendas e têm gado. E o nome do seu irmão era Jubal; este foi o pai de todos os que tocam harpa e órgão. E Zilá também deu à luz a Tubalcaim, mestre de toda a obra de cobre e ferro”. Essa sociedade, da qual costumamos nos orgulhar e desfrutar, com suas cidades, produção, comércio, arte e ciência, foi em grande parte iniciada pela linhagem de Caim.
Lameque, descendente de Caim e o primeiro polígamo, confessa às “suas mulheres Ada e Zilá: ‘Ouvi a minha voz; vós, mulheres de Lameque, escutai as minhas palavras; porque eu matei um homem por me ferir, e um jovem por me pisar. Porque sete vezes Caim será castigado; mas Lameque setenta vezes sete’” (Gn 4:23-24). Apesar de estarmos acostumados a passar rapidamente por esta passagem e entendê-la como se fosse um desejo dele de ser considerado muito mais culpado que Caim, a intenção dessa confissão era outra. Uma melhor tradução aí é “Porque sete vezes Caim será vingado; mas Lameque setenta vezes sete.”. Lameque está se referindo à proteção e vingança prometidas por Deus ao homicida Caim um pouco antes: “Portanto qualquer que matar a Caim, sete vezes será castigado” (Gn 4:15).
Lameque é o protótipo do corrupto, libertino e prepotente. Ele se acha menos culpado que Caim, pois no seu caso matou dois homens por ter sido ferido por eles, portanto merece setenta vezes sete atos de vingança contra quem quiser prejudicá-lo. Acaso não é esse o mesmo sentimento de impunidade que prevalece nos corruptos? Não é esta a arrogância típica de todo aquele que se acha cheio de direitos apesar de seus crimes e sempre encontra alguém mais criminoso para culpar? Quando você lê a epístola de Judas descobre lá o tripé da religião descrito como “caminho de Caim… engano de Balaão e… contradição de Coré”, três homens ímpios que são mostrados ali para tipificar os falsos mestres e falsos profetas em sua volúpia por prosperidade, libertinagem e poder.
Mas essa iniciativa de Caim irá se agravar no capítulo 11 de Gênesis quando os homens, que ainda eram de um mesmo idioma, se reúnem em um vale na terra de Sinar e começam a construir uma torre. “E era toda a terra de uma mesma língua e de uma mesma fala. E aconteceu que, partindo eles do oriente, acharam um vale na terra de Sinar; e habitaram ali. E disseram uns aos outros: Eia, façamos tijolos e queimemo-los bem. E foi-lhes o tijolo por pedra, e o betume por cal. E disseram: Eia, edifiquemos nós uma cidade e uma torre cujo cume toque nos céus, e façamo-nos um nome, para que não sejamos espalhados sobre a face de toda a terra” (Gn 11:1-4).
Ninguém em sã consciência escolheria um vale para construir uma torre alta, pois o mais lógico seria construir num planalto ou topo de uma montanha. Mas o que eles queriam mesmo era fazer um nome, desafiar a Deus, afirmar: “Nós somos os senhores da terra”. Essa intenção de atingir os céus eles realmente conseguem, depois de terem atingido seu intento de chamar a atenção de Deus que veio e confundiu suas línguas dispersando-os em diferentes povos e nações. O nome Babel, do qual vem Babilônia, significa “confusão” e foi isso o que aconteceu. Mas quando digo que a torre que construíram realmente atingiu os céus, estou pensando também em Apocalipse 18:5, e na Babilônia moderna que representa a cristandade apóstata e corrompida. Ali diz: “os seus pecados se acumularam até ao céu, e Deus se lembrou das iniquidades dela”.
Babel chegou realmente até o céu na forma da Babilônia em sua ânsia de prosperidade e poder, e ela acaba sendo destruída em Apocalipse 18 porque a única torre que conseguiram construir para atingir o céu não foi uma torre de tijolos, mas de pecados. No capítulo 17 de Apocalipse nós a vemos derrubada pela besta do poder civil, na qual ela esteve montada até ser jogada ao chão. Em Apocalipse 18:17 a Palavra de Deus nos mostra bem o espírito dessa Babilônia, uma cristandade vazia de Cristo: “porque diz em seu coração: Estou assentada como rainha, e não sou viúva, e não verei o pranto”.
A cada domingo nós somos congregados como igreja ou assembleia ao nome do Senhor para, na ceia, recordarmos o Senhor e anunciarmos sua morte. Sentimos falta dele, porque é este o sentimento apropriado a uma viúva. A Igreja, a Noiva de Cristo, sente falta daquele que morreu para salvá-la. Sabemos que o Senhor ressuscitou e está vivo no céu, mas ele nos deixou na ceia uma celebração que fala de morte, a morte daquele que é o Noivo da Igreja. Então o sentimento apropriado à Igreja, a Noiva de Cristo, é o de uma viúva sim, e não de uma rainha entronizada neste mundo que crucificou o Senhor e prostituindo-se com os mercadores da terra. O sentimento que compete à Igreja é o de quem sofre pela saudade do esposo e aguarda ansiosamente por sua volta. Mas para a falsa noiva, a Babilônia, a grande e promíscua meretriz, o sentimento é justamente o oposto. A última coisa que ela deseja é que o Noivo volte, pois isso estragaria a festa e o reinado dessa falsa rainha que vive em luxúria.
A volúpia vivida por Babilônia é descrita no final do capítulo 18 de Apocalipse por meio das coisas que ela desfrutava antes de ser destruída. Ali os mercadores lamentam sua destruição e fazem isso porque ganhavam tanto dinheiro com Babilônia que nem mesmo tinham se dado conta disso até ela ter desaparecido da terra. Quando a besta do poder civil destrói Babilônia no capítulo 17 ainda não faz ideia da influência que ela tinha na riqueza das nações. Hoje nós igualmente não fazemos ideia do quanto de dinheiro circula graças às religiões cristãs e a importância que isso tem no comércio mundial. Se as religiões cristãs desaparecessem (e chamo de religiões cristãs aqui os sistemas religiosos que os homens criaram), o impacto econômico no mundo seria enorme. Basta ver a descrição de tudo o que é comercializado na mística Babilônia no final do capítulo: “E em ti não se ouvirá mais a voz de harpistas, e de músicos, e de flautistas, e de trombeteiros, e nenhum artífice de arte alguma se achará mais em ti; e ruído de mó em ti não se ouvirá mais; e luz de candeia não mais luzirá em ti, e voz de esposo e de esposa não mais em ti se ouvirá; porque os teus mercadores eram os grandes da terra; porque todas as nações foram enganadas pelas tuas feitiçarias” (Ap 18:22-23).
Música, entretenimento, artes, produção industrial, comércio, etc. Digno de nota é ver que na Babilônia existe feitiçaria, que ela usa para enganar os homens e isso com a ajuda do poder de demônios. Mas o que Babilônia pensa dos homens, essa que quis ser grande no mundo? Ela coloca os homens no final de sua lista, reputando-os como mercadoria de menor valor. Cristo Jesus veio ao mundo dar sua vida para salvar seres humanos, por causa do amor que ele nutria pelo homem como coroa da Criação. Mas na lista de mercadorias pelas quais os mercadores irão chorar, por não estarem mais sendo comercializadas com o fim da Babilônia, a ordem de valor é invertida e começa com o ouro.
“Mercadorias de ouro, e de prata, e de pedras preciosas, e de pérolas, e de linho fino, e de púrpura, e de seda, e de escarlata; e toda a madeira odorífera, e todo o vaso de marfim, e todo o vaso de madeira preciosíssima, de bronze e de ferro, e de mármore; e canela, e perfume, e mirra, e incenso, e vinho, e azeite, e flor de farinha, e trigo, e gado, e ovelhas; e cavalos, e carros, e corpos e almas de homens” (Ap 18:12-13).
Em primeiríssimo lugar vem o ouro, e isso tem a ver com o fato de a Polícia Federal estar investigando igrejas por suposta lavagem de dinheiro, porque o ouro ocupa o topo da lista de valor das religiões que só fazem de conta que estão ocupadas com Cristo. Lembre-se daquele versículo que fala dos que pensam que piedade seja fonte de lucro. Segue-se uma relação de itens que vai decrescendo no valor normalmente dado a eles até chegar ao ser humano: “corpos e almas de homens”. É em último lugar que a cristandade representada por Babilônia coloca os homens em sua lista de prioridades. Ser grande, rica e abastada é sua prioridade, a mesma de Laodiceia do capítulo 3 de Apocalipse.
No versículo 4 de Apocalipse 18 o Espírito Santo dá uma ordem que é de importância para nós já em nossos dias, quando vivemos nessa grande casa em que se tornou a profissão cristã: “E ouvi outra voz do céu, que dizia: Sai dela, povo meu, para que não sejas participante dos seus pecados, e para que não incorras nas suas pragas”. Não é de surpreender que é a mesma ordem dada em 2 Timóteo 2, quando aquela casa de Deus que deveria ter sido coluna e firmeza da verdade se transformou numa grande casa onde existe de tudo um pouco: “Todavia o fundamento de Deus fica firme, tendo este selo: O Senhor conhece os que são seus, e qualquer que profere o nome de Cristo aparte-se da iniquidade. Ora, numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra. De sorte que, se alguém se purificar destas coisas, será vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra” (2 Tm 2:19-21).
Se você continuar lendo o capítulo 3 de 2 Timóteo verá que ali são descritos os homens que compõem a cristandade professa, porém são joio no meio do trigo. A descrição tem tudo a ver com o que almeja a Babilônia de Apocalipse: “homens amantes de si mesmos, avarentos, presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes a pais e mães, ingratos, profanos, sem afeto natural, irreconciliáveis, caluniadores, incontinentes, cruéis, sem amor para com os bons, traidores, obstinados, orgulhosos, mais amigos dos deleites do que amigos de Deus, tendo aparência de piedade, mas negando a eficácia dela” (2 Tm 3:2-5).
Ficar associado a qualquer coisa que use o cristianismo como fonte de lucro, é ser participante dos pecados de Babilônia; é iniquidade, é corrupção. Ou pode até mesmo se configurar crime, quando vemos nos jornais as igrejas e seus líderes sendo investigados por lavagem de dinheiro. A ânsia por riqueza e prosperidade material foge ao propósito de Cristo para a Igreja, que deveria viver neste mundo em humildade, em pequenez, não querendo ser grande, não tendo uma reputação para defender, porém aguardando a vinda de seu Noivo amado.
Cabe aqui um parêntese para a expressão “grande Babilônia” e “grande cidade” que aparece muitas vezes relacionada à essa cristandade corrupta. Digo isto porque alguns poderiam alegar que em Apocalipse 21:10 a Jerusalém que desce do céu também é chamada de “grande cidade”, mas se você comparar diferentes versões da Bíblia verá que as melhores traduções trazem “santa cidade” ao invés de “grande cidade”. A verdadeira Igreja não é tratada na Bíblia como grande, mas como santa, e isso revela o contraste de tudo o que é do mundo e o que é de Cristo na terra. Não era para a Igreja ser algo grande no mundo que crucificou seu Noivo, e tampouco ter influência política e econômica aqui associando-se aos que mandam neste mundo.
Na descrição de Babilônia existem muitas evidências que a identificam com a igreja católica romana, que sempre arvorou ser a verdadeira igreja de Cristo. Os papas, cardeais e bispos de Roma sempre tiveram grande influência neste mundo, ao ponto de coroarem reis e assim literalmente estarem montados na besta do poder civil. Grandes conquistas da humanidade, como as da era das navegações e descobertas, foram patrocinadas pela igreja católica, que é sabido manter um pé bem estabelecido no mundo financeiro e de negócios. Se você mora na cidade do Rio de Janeiro deve saber que até hoje esse território pertence à sé romana, e por isso é que todo imóvel negociado paga um imposto para lembrar que está apenas ocupando um espaço que pertence a Roma, como acontece também com imóveis na faixa litorânea do Brasil que é considerada propriedade da Marinha.
Em Apocalipse 2, quando lemos das sete cartas em seu sentido profético, encontramos na quarta carta de Tiatira, a partir do versículo 18, a descrição da igreja católica romana, que se estende até os dias atuais, e contra a qual foi dito que se não se arrependesse de sua prostituição seria castigada: “Dei-lhe tempo para que se arrependesse; ela, todavia, não quer arrepender-se da sua prostituição. Eis que a prostro de cama, bem como em grande tribulação os que com ela adulteram, caso não se arrependam das obras que ela incita.” (Ap 2:21-22).
Mas o que conhecemos como protestantismo, que é descrito no capítulo 3 de Apocalipse pela igreja de Sardo ou Sardis, já aparece no capítulo 2 na descrição de Tiatira: “Matarei os seus filhos” (Ap 2:23). O protestantismo com sua profusão de igrejas pode estar aqui representado por esses “filhos”, que no original tem o sentido de descendência. Todas as igrejas protestantes se incluem nessa condição de “filhos” do catolicismo romano, pois foi daí que se originaram. A Reforma, que foi uma tentativa de reformar a igreja católica, acabou se pulverizando nessa profusão de igrejas como filhas do sistema de onde saíram. Hoje quando olhamos para aquilo em que se tornou o protestantismo vemos que em nada difere do catolicismo em sua busca por poder, riquezas e glória no mundo. Não é à toa que todas acabarão se alinhando com a igreja romana formando esse sistema gigantesco identificado em Apocalipse como a “a grande Babilônia, a mãe das prostituições e abominações da terra” (Ap 17:5).
O versículo 23 de Apocalipse 18 diz: “porque os teus mercadores eram os grandes da terra”. Está falando dos mercadores de Babilônia como os mais importantes do mundo, e isso já denuncia o caráter mercantilista da religião cristã naquilo em que os homens a transformaram. Estes são homens com poder e dinheiro suficientes para influenciar a política, o comércio, a mudança de governos, a declaração de guerras com fins comerciais, etc. Onde estão hoje esses homens da grande Babilônia? Estão na grande cristandade, e todo cristão faz parte dela hoje. Não estamos imunes a essa corrupção que se abateu sobre a cristandade, mas a raiz e veneno disso está no desejo de ser grande. Basta entrar numa denominação cristã para perceber o quanto a grandeza humana é acalentada ali. Existem títulos, prêmios, medalhas, diplomas, tudo para elevar o status das pessoas que participam daquele sistema. Nessa organização o homem é exaltado e recebe títulos pomposos, alguns, como Reverendo, que na Bíblia são exclusividade de Deus, indo na contramão daquilo que João Batista declarou de si mesmo e de Cristo: “É necessário que ele cresça e que eu diminua” (Jo 3:30).
Não é, pois, de se espantar que alguns recebam a visita da Polícia Federal que mais sabiamente até do que aqueles que professam crer em Jesus e seguir seus mandamentos, batiza uma operação contra a lavagem de dinheiro como “Operação Timóteo”, para lembrar os seguidores da teologia da prosperidade que “os que querem ser ricos caem em tentação, e em laço, e em muitas concupiscências loucas e nocivas, que submergem os homens na perdição e ruína. Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores” (1 Tm 6:9-10).
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Como lidar com argumentos de Testemunhas de Jeová?
Você disse que está tendo dificuldade para falar do evangelho a um amigo que está sendo influenciado por Testemunhas de Jeová, por isso me enviou uma lista dos argumentos desse seu amigo pedindo minha ajuda. Vou transcrever a lista de argumentos e meus comentários a seguir.
1) Números 23:19 – “… Deus não é homem nem filho do homem”
Seu amigo deveria ter citado a passagem inteira, pois o contexto é mais amplo. Ali diz: “Deus não é homem, para que minta; nem filho do homem, para que se arrependa; porventura diria ele, e não o faria? Ou falaria, e não o confirmaria?”
Jesus sempre foi eternamente o Filho de Deus, mas não era e nunca foi homem até os tempos dos evangelhos, quando o Filho de Deus (que é Deus) se fez Homem. O foco da passagem de Números é a capacidade de mentir, a qual obviamente é inerente à humanidade caída. Tentar usá-la para referir-se a Cristo, Deus e Homem perfeito, é tirá-la de seu contexto. Jesus nunca mentiu e nem precisou se arrepender ou retirar o que disse. Quando ele questionou os fariseus estes ficaram sem resposta: “Quem dentre vós me convence de pecado?” (Jo 8:46).
2) Mesmo sendo “filho de Deus” Jesus nasceu humano.
Jesus não nasceu como qualquer ser humano costuma nascer, mas “veio em carne”, o que implica que tinha pré-existência. Nós somos criados na forma de seres vivos com um corpo de carne no momento em que somos gerados no ventre de nossa mãe, e depois de alguns meses nascemos. Jesus já existia desde a eternidade, e seu corpo humano foi gerado pelo Espírito Santo no ventre da virgem para que ele pudesse ter um corpo humano de carne. As Testemunhas de Jeová podem ser classificadas como anticristos por negarem que Jesus veio em carne, isto é, que tinha pré-existência como Deus que é. Não sou eu quem afirma que são anticristos, é João quem o faz:
“Nisto conhecereis o Espírito de Deus: Todo o espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; e todo o espírito que não confessa que Jesus Cristo veio em carne não é de Deus; mas este é o espírito do anticristo, do qual já ouvistes que há de vir, e eis que já está no mundo… Porque já muitos enganadores entraram no mundo, os quais não confessam que Jesus Cristo veio em carne. Este tal é o enganador e o anticristo” (1 Jo 4:2-3; 2 Jo 1:7).
Paulo deixa claro que Jesus não veio como um homem comum em Gálatas 1:1: “Paulo, apóstolo (não da parte dos homens, nem por homem algum, mas por Jesus Cristo, e por Deus Pai, que o ressuscitou dentre os mortos)…”. Uma tradução literal seria “Não da parte de homens ou através de homem”.
3) Jesus foi tentado por Satanás (Mateus 4)
Jesus não foi tentado no sentido da tentação que recebemos, pois era impossível que ele fosse tentado pelo pecado ou pelo diabo do modo como somos. Ele foi “provado” ou “testado” no sentido de comprovar que era quem ele afirmava ser, ou seja, o Filho de Deus puro e sem pecado (sem a natureza pecaminosa que todos nós herdamos de Adão). Se ele tivesse a natureza pecadora que temos iria precisar de um Salvador para si mesmo e não poderia ser o Cordeiro de Deus.
“Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém, um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado” (Hb 4:15) [trad. alternativa: à parte o pecado].
4) Satanás também e filho de Deus (Jó 1:6 e 7)
Sim, pois ele foi criado por Deus, como também Adão é chamado filho de Deus e hoje os salvos por Cristo também o são. Mas Jesus é Filho Eterno porque é uma condição que já tinha antes de vir ao mundo. Deus ENVIOU o seu Filho ao mundo porque já era Filho na eternidade, e não o fez filho quando chegou ao mundo. Ele foi enviado no caráter que sempre possuiu.
“O que era desde o princípio [eternidade], o que ouvimos, o que vimos com os nossos olhos, o que temos contemplado, e as nossas mãos tocaram da Palavra da vida (Porque a vida foi manifestada, e nós a vimos, e testificamos dela, e vos anunciamos a vida eterna, que estava com o Pai, e nos foi manifestada); o que vimos e ouvimos, isso vos anunciamos, para que também tenhais comunhão conosco; e a nossa comunhão é com o Pai, e com seu Filho Jesus Cristo… E vimos, e testificamos que o Pai enviou seu Filho para Salvador do mundo” (1 Jo 1:1-3; 1 Jo 4:14).
5) Deus não pode ser provado (Tiago 1:13)
Não pode mesmo, pois o sentido de Tiago é o da tentação que encontra resposta na natureza pecaminosa que temos. Jesus nasceu sem a natureza caída que possuímos e foi gerado pelo Espírito Santo no ventre da virgem, algo inusitado em todos os sentidos. A entrada do Filho de Deus no mundo, mesmo vindo em carne, não poderia ser igual ao nascimento convencional de um pecador. Se colocar o contexto do versículo verá:
“Mas cada um é tentado, quando atraído e engodado pela sua própria concupiscência. Depois, havendo a concupiscência concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, sendo consumado, gera a morte” (Tg 1:14-15).
6) Jesus foi batizado por João Batista (Mateus 3:16)
Sim, em um ato solidário para com os que estavam sendo batizados, pois o batismo de João Batista era para arrependimento e Jesus não tinha nada de que se arrepender. O sentido do que ele fez é o mesmo de uma mãe que rapa a cabeça para ficar parecida com a filha que está fazendo quimioterapia. O próprio João Batista se surpreendeu de seu desejo de ser batizado, mas ele deixou claro a razão:
“Jesus, porém, respondendo, disse-lhe: Deixa por agora, porque assim nos convém cumprir toda a justiça. Então ele o permitiu. E, sendo Jesus batizado, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba e vindo sobre ele. E eis que uma voz dos céus dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo” (Mt 3:15-16).
Se reparar verá que a passagem mostra a Trindade numa mesma cena: Jesus sai da água, o Espírito Santo vem sobre ele como uma pomba e a voz do Pai é ouvida dos céus.
7) Por que Deus enviaria a si mesmo para morrer e ser ressuscitado?
Deus não se enviou a si mesmo. O Pai enviou o Filho (e não o Espírito Santo) para vir em carne porque o pecado só poderia ser resolvido por um sacrifício de sangue como era prefigurado pelos sacrifícios do Antigo Testamento. Esse mesmo HOMEM que hoje está ressuscitado em um corpo de carne e ossos (algo que as Testemunhas de Jeová negam) virá outra vez para julgar, e aí os homens pecadores impenitentes serão julgados, não por um Deus que nunca soube o que é andar neste mundo, mas pelo Filho do Homem, que é Deus, mas também é HOMEM. Assim como o pecado entrou na Criação por um homem, a salvação só pode ser obtida pela fé em um único HOMEM, e a condenação será lavrada por um juiz justo e na condição de HOMEM.
“Mas não é assim o dom gratuito como a ofensa. Porque, se pela ofensa de um morreram muitos, muito mais a graça de Deus, e o dom pela graça, que é de um só homem, Jesus Cristo, abundou sobre muitos” (Rm 5:15).
“Porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem” (1 Tm 2:5).
“E sabemos que já o Filho de Deus é vindo, e nos deu entendimento para conhecermos o que é verdadeiro; e no que é verdadeiro estamos, isto é, em seu Filho Jesus Cristo. Este é o verdadeiro Deus e a vida eterna” (1 Jo 5:20).
“Conjuro-te, pois, diante de Deus, e do Senhor Jesus Cristo, que há de julgar os vivos e os mortos, na sua vinda e no seu reino… Os quais hão de dar conta ao que está preparado para julgar os vivos e os mortos… E nos mandou pregar ao povo, e testificar que ele é o que por Deus foi constituído juiz dos vivos e dos mortos” (2 Tm 4:1, 5; At 10:42).
8) Jesus teve medo (Mateus 26:42)
Sim, porque homens sentem medo e ele temeu o que estava diante de si: ser feito pecado na cruz e suportar o juízo eterno nas três horas de trevas. Ele não só sentiu medo, como também sede (João 19:28), fome (Mateus 4:2), cansaço (João 4:6), etc. Embora sendo perfeitamente divino, ele também era perfeitamente humano.
“[Jesus] sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens; e, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz. Por isso, também Deus o exaltou soberanamente, e lhe deu um nome que é sobre todo o nome; para que ao nome de Jesus se dobre todo o joelho dos que estão nos céus, e na terra, e debaixo da terra, e toda a língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai” (Fp 2:6-11).
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Lutero odiava judeus e disse que Jesus era adúltero?
Sua dúvida vem de dois textos, o primeiro geralmente citado em livros católicos como forma de desacreditar o reformador que, juntamente com outros, foi usado por Deus para trazer à tona a verdade bíblica da justificação pela fé. A suposta citação, como sendo de Lutero, aparece em vários livros e sites assim: “Cristo foi um adúltero pela primeira vez com a mulher no poço, pois foi dito ‘Ninguém sabe o que ele está fazendo com ela’ (João 4:27). Novamente com Madalena, e ainda com a mulher adúltera em João 8:2-11, a quem ele facilmente deixou ir. Assim o bom Cristo teve que se tornar um adúltero antes de morrer”.
Em “Sobre os judeus e suas mentiras” Lutero escreveu:
“(…) Finalmente, no meu tempo, [os judeus] foram expulsos de Ratisbona, Magdeburgo e de muitos outros lugares… Um judeu, um coração judaico, são tão duros como a madeira, a pedra, o ferro, como o próprio diabo. Em suma, são filhos do demônio, condenados às chamas do Inferno. Os judeus são pequenos demônios destinados ao inferno… Queime suas sinagogas. Negue a eles o que disse anteriormente. Force-os a trabalhar e trate-os com toda sorte de severidade … são inúteis, devemos tratá-los como cachorros loucos, para não sermos parceiros em suas blasfêmias e vícios, e para que não recebamos a ira de Deus sobre nós. Eu estou fazendo a minha parte… Resumindo, caros príncipes e nobres que têm judeus em seus domínios, se este meu conselho não vos serve, encontrai solução melhor, para que vós e nós possamos nos ver livres dessa insuportável carga infernal – os judeus.”
Que Lutero não gostava de Judeus é sabido pois escreveu um texto com o título “Sobre os judeus e suas mentiras”. Ele não fazia nada mais que seguir o pensamento católico de sua época, pois afinal Martinho Lutero tinha sido criado no catolicismo e a igreja católica obrigava os judeus a serem batizados como cristãos sob pena de serem queimados vivos caso se recusassem a fazê-lo. Grande parte do tesouro acumulado pelo Vaticano vem dessa época, quando a Inquisição dividia os bens dos presos e mortos com o rei. Então não fica difícil entender o interesse de Roma em acabar com judeus, ciganos, protestantes e todo mundo que não rezasse pelo seu catecismo, principalmente se fosse podre de rico como muitos judeus eram. Assim como praticamente todos os cristãos de sua época, Lutero seguia a Teologia do Pacto, que considera a igreja apenas uma versão 2.0 de Israel, e neste raciocínio os judeus já não teriam direito às bênçãos de prosperidade prometidas por Deus no Antigo Testamento, e elas teriam sido então destinadas à Igreja.
O sentimento dos cristãos da época (e da maioria das denominações fundamentalistas de hoje) seria como o de um filho adotivo que, depois que o filho legítimo e herdeiro caiu em desgraça e foi deserdado pelo pai, passa a persegui-lo para evitar que ele venha a apropriar-se indevidamente da herança. Se quiser entender melhor o que é a teologia do pacto leia o livro “Teologia do Pacto ou Dispensações – Qual a maneira correta de se interpretar as Escrituras?”, por Bruce Anstey. Fazendo uma busca na Web você poderá encontrar a versão e-book gratuita e a versão impressa, que é vendida. Também já escrevi algo sobre o texto de Lutero contra os judeus em um artigo com o título “Por que cristãos perseguiram judeus na Segunda Guerra Mundial?” disponível em meu site Respondi.com.br.
Mas a acusação de um suposto adultério de Jesus com diferentes mulheres como sendo uma citação de Lutero, que você encontra em muitos sites e livros católicos, nada mais é do que a versão truncada de citações de pessoas que conviveram com ele. O texto foi originalmente publicado em um volume chamado “Luther’s Table Talk”, LW 54:154. Os textos desse livro não são da pena de Lutero — daí o título “Conversas à Mesa” — mas comentários escritos por seus amigos e alunos e publicados após sua morte. Seria como hoje publicar os comentários que alguém faz numa rede social sem o contexto, isso é, a postagem que originou aqueles comentários truncados. Não é muito difícil entender como Lutero poderia ter dito algo assim (se é que disse com essas palavras), quando se conhece um de seus sermões. Em 1536 ele afirmou que Cristo foi criticado pelo mundo como sendo glutão, beberrão e até mesmo adúltero. Conecte isso à frase encontrada nos comentários de seus alunos e publicada como sendo dele e você teria algo assim [entre chaves meu acréscimo]:
“[Jesus foi criticado pelo mundo como sendo glutão, beberrão e até mesmo adúltero. Para seus opositores,] Cristo foi um adúltero pela primeira vez com a mulher no poço, pois foi dito ‘Ninguém sabe o que ele está fazendo com ela’ (João 4:27). Novamente com Madalena, e ainda com a mulher adúltera em João 8:2-11, a quem ele facilmente deixou ir. Assim o bom Cristo teve que se tornar um adúltero antes de morrer”.
É covardia atribuir a Lutero uma frase truncada e fora de contexto citada por seus amigos e alunos numa conversa ao redor de uma mesa (e sem saber quanta cerveja aqueles alemães bebiam em ocasiões assim). Pior ainda é que a frase só foi publicada após a morte de Lutero, que então seria incapaz de corrigi-la ou colocá-la no seu devido contexto. Seria a mesma coisa alguém dizer que encontrou na Bíblia a afirmação: “Não há Deus” (Sl 53:1). Sim, pode correr lá que vai encontrar. Mas teria Davi realmente dito isso? Você só saberia o que ele disse colocando a afirmação dentro de seu contexto: “Disse o néscio no seu coração: ‘Não há Deus’” (Sl 53:1).
Lutero pode ter cometido muitos erros e ensinado muitas coisas equivocadas, por conta até do que era comum ser ensinado por cristãos na época, tanto dentro do catolicismo romano, como entre os reformadores que Deus usou para trazer de volta a verdade da justificação pela fé. Mas seria uma insanidade acusar Lutero de considerar Jesus um mero pecador, e muito mais um adúltero! Em seus sermões ele deixa claro como Deus enviou o seu Filho ao mundo por ser o único que poderia substituir o homem pecador e ser o Cordeiro de Deus para tirar o pecado do mundo. Lutero sabia muito bem que Jesus, sendo divino, era o único Homem sem pecado. Lutero tinha muito claro em sua mente e em seus escritos que “Àquele que não conheceu pecado, o fez pecado por nós; para que nele fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Co 5:21).
Portanto a citação na qual Lutero estaria supostamente dizendo que Cristo cometeu pecado nada mais é do que um texto truncado escrito por alguém que disse que alguém falou que Lutero teria dito. Já ouviu a expressão “Rádio Peão”? Pois é, ela já existia há 500 anos. Portanto se eu fosse você não acreditaria que Lutero tenha disso isso, ao menos como uma afirmação fora de um contexto mais amplo.
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Cristãos devem celebrar festas judaicas?
Você conhece cristãos que insistem em celebrar as festas judaicas em conformidade com Levítico 23 e queria saber se essas coisas são para a Igreja na atual dispensação da graça de Deus. Segundo eles, o fato de Deus repetir no capítulo a expressão “estatuto perpétuo” significa que essas festas nunca deveriam deixar de ser celebradas. Então eles as celebram do jeito que Deus ordenou. Será que celebram? Não, eles apenas fingem celebrar.
Para entender a Bíblia é preciso sempre perguntar quando uma determinada passagem foi escrita, em que contexto, com qual objetivo, e primeiro de tudo a quem ela foi dirigida. Moro em um condomínio e quando o porteiro entrega a correspondência eu confiro se todas as cartas são para mim. Ele pode se enganar e eu abrir a carta que chegou para meu vizinho. Como sou distraído, corro o risco de pagar um boleto que não é meu! Aplique o mesmo critério ao capítulo 23 de Levítico, que sua amiga diz obedecer à risca, e você descobre os destinatários daquelas instruções.
“Fala aos filhos de Israel, e dize-lhes: As solenidades do SENHOR, que convocareis, serão santas convocações; estas são as minhas solenidades…” (Lv 23:2).
Essas pessoas que insistem em celebrar as festas judaicas são israelitas? Guardam o sábado? Celebram a Páscoa com um cordeiro sacrificado e queimado ao fogo? Comem pães sem fermento? Têm um sacerdote da linhagem de Aarão para dirigi-las nas comemorações? Fazem ofertas de alimentos com flor de farinha amassada com azeite e ofertas queimadas com libação de vinho? Matam sete cordeiros de um ano, um novilho e dois carneiros? Sacrificam também um bode e dois cordeiros de um ano? Habitam sete dias em tendas?
Provavelmente não fazem nada disso, mas inventaram alguma festinha à fantasia só para dar um ar de judaísmo às suas reuniões. Alguns se fantasiam de israelitas, enfeitam o lugar com panos pintados de motivos judaicos, acendem candelabros e tocam um berrante de chifre, só que menor que aquele tocado pelos peões nos rodeios. Os homens costumam deixar a barba crescer para ficarem parecidos com judeus, como faziam os simpatizantes de partidos de esquerda no Brasil para ficarem parecidos com Fidel Castro. Tudo artificial, puro fingimento seletivo. Como alguém que rouba a correspondência da caixa de correio do vizinho e quer ficar só com as cartas românticas, devolvendo as contas a pagar.
O capítulo 23 de Levítico termina mais uma vez deixando claro quem são os destinatários dessa ordem que foi dada para ser cumprida de forma perpétua: “Assim pronunciou Moisés as solenidades do SENHOR aos filhos de Israel” (Lv 23:44).
Mas por que tantos cristãos insistem em roubar a correspondência dirigida a Israel? Porque a carne religiosa gosta de pompa, rituais e fantasias. As religiões cristãs católicas e protestantes sempre fizeram isso em alguma medida, construindo templos com altares, queimando incenso, criando uma ordem sacerdotal paramentada, acendendo velas em candelabros e introduzindo outros elementos alienígenas à adoração cristã ensinada pela doutrina dos apóstolos, que deveria ser simples e despojada. Quando não existe fé, o homem procura elementos para andar por vista. Todavia, “andamos por fé, e não por vista” (2 Co 5:7).
A esses que querem parecer judeus vale a repreensão feita por Paulo a Pedro: “E, chegando Pedro à Antioquia, lhe resisti na cara, porque era repreensível. Porque, antes que alguns tivessem chegado da parte de Tiago, comia com os gentios; mas, depois que chegaram, se foi retirando, e se apartou deles, temendo os que eram da circuncisão. E os outros judeus também dissimulavam com ele, de maneira que até Barnabé se deixou levar pela sua dissimulação” (Gl 2:11-12). Dissimular significa se disfarçar para parecer que você é alguém que na verdade não é.
Um bom antídoto para essa “juidaidice” que tem invadido a cristandade é o capítulo 2 da carta aos Colossenses. Aquela assembleia estava enfrentando a invasão de pessoas trazendo ideias emprestadas da filosofia, do legalismo judaico, do misticismo e do asceticismo orientais. As religiões cristãs da atualidade também trazem essas coisas em um grau maior ou menor, e se Paulo falava que “grande combate tenho por vós e pelos que estão em Laodiceia” (Cl 2:1) é porque essas coisas estavam realmente causando danos ao testemunho cristão. Então ele vai direto naquilo que deveria ocupar os corações deles: Cristo! “Para que os seus corações sejam consolados, e estejam unidos em amor, e enriquecidos da plenitude da inteligência, para conhecimento do mistério de Deus e Pai, e de Cristo, em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência” (Cl 2:2-3).
Os sacrifícios e festas dados a Israel na dispensação da Lei têm para nós hoje um aspecto simbólico, pois como sabemos eram “sombras das coisas futuras” (Cl 2:17). Assim é consolador lermos o Antigo Testamento e descobrirmos quantas coisas ali prefiguravam Cristo e sua obra em diferentes aspectos. Hoje não nos ocupamos com as sombras, mas com a realidade. Quando uma pessoa querida vem visitar você, a sombra dela pode chegar um segundo antes e aparecer na parede da entrada de sua casa. Você se alegra ao ver a sombra. Mas no momento em que essa pessoa entra no aposento você não irá nem pensar em convidar a sombra para tomar café. É com a pessoa real que irá querer se ocupar. Quando vejo cristãos hoje ocupados com judaísmo e celebrando festas judaicas logo penso na criança pequena que ganha um brinquedo caro e prefere brincar com a caixa.
A Lei dada a Moisés não se limitava aos dez mandamentos, porém incluía centenas de ordenanças registradas no Pentateuco. Cada oferenda ali nos fala de Cristo e cada sacrifício aponta para o sangue que seria derramado na cruz para a glória de Deus e a salvação do pecador. O Tabernáculo, a grande tenda que Deus ordenou como o lugar de adoração dos hebreus, era uma figura de Cristo, bem como seus utensílios e até mesmo o véu, a grande cortina que impedia o acesso ao Santo dos Santos, figura da presença de Deus. É disto que fala a carta aos Hebreus, ao mencionar o véu do Templo rasgado no momento da morte de Jesus: “Tendo, pois, irmãos, ousadia para entrar no santuário, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou, pelo véu, isto é, pela sua carne” (Hb 10:19-20).
Aarão, irmão de Moisés, era uma figura do sacerdócio de Cristo, intercedendo por nós junto a Deus. Cada detalhe de suas vestes e de seu ministério apontava para o caráter e ministério de Jesus como nosso Sumo Sacerdote. Porém, por mais preciosas que sejam as figuras do Antigo Testamento, a carta aos Hebreus nos exorta a não nos ocuparmos com tabernáculos, templos, sacerdotes humanos e rituais copiados do judaísmo, mas com a realidade que agora é Cristo. Aos Coríntios, Paulo escreveu que “estas coisas foram-nos feitas em figura” (1 Co 10:6), e Hebreus diz que “servem de exemplo e sombra das coisas celestiais” e devem ser vistas como “figura do verdadeiro” (Hb 8:5; 9:24).
“Mas, vindo Cristo, o sumo sacerdote dos bens futuros, por um maior e mais perfeito tabernáculo, não feito por mãos, isto é, não desta criação, nem por sangue de bodes e bezerros, mas por seu próprio sangue, entrou uma vez no santuário, havendo efetuado uma eterna redenção… temos um sumo sacerdote tal, que está assentado nos céus à destra do trono da majestade, Ministro do santuário, e do verdadeiro tabernáculo, o qual o Senhor fundou, e não o homem” (Hb 9:11-12; 8:1-2). Depois de saber disto, como um cristão poderia, de sã consciência, adorar a Deus em um templo feito de tijolos, com um sacerdote humano, vestido numa fantasia judaica, num altar de mentirinha e com tantos utensílios piratas, cópias baratas das figuras do Antigo Testamento?
Em Colossenses Paulo segue enfatizando “a firmeza da vossa fé em Cristo” (Cl 2:5) e o andar em Cristo, arraigados nele, edificados nele, etc. (Cl 2:6-7). Então vem o alerta contra as filosofias e tradições dos homens, que não são “segundo Cristo” (Cl 2:8), seguida de uma das passagens mais belas das Escrituras: “Porque nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade; e estais perfeitos nele, que é a cabeça de todo o principado e potestade” (Cl 2:9-10). Tendo tamanha realidade com que nos ocuparmos você teria coragem de participar dessas festinhas a fantasia para se ocupar com sombras? Até a circuncisão, que fazia parte dos ritos judaicos, é aqui deixada para trás em troca de uma “circuncisão não feita por mão no despojo do corpo dos pecados da carne”, mas pela “circuncisão de Cristo” (Cl 2:11). A seguir vem a menção ao batismo, que fala de morte, e da ressurreição, que fala de vida, lembrando da condição perdida em que estávamos nos versículos seguintes. Então ele conclui, dizendo: “Portanto, ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa dos dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados, que são sombras das coisas futuras, mas o corpo é de Cristo. Ninguém vos domine a seu bel-prazer com pretexto de humildade e culto dos anjos, envolvendo-se em coisas que não viu; estando debalde inchado na sua carnal compreensão, e não ligado à cabeça, da qual todo o corpo, provido e organizado pelas juntas e ligaduras, vai crescendo em aumento de Deus. Se, pois, estais mortos com Cristo quanto aos rudimentos do mundo, por que vos carregam ainda de ordenanças, como se vivêsseis no mundo, tais como: Não toques, não proves, não manuseies? As quais coisas todas perecem pelo uso, segundo os preceitos e doutrinas dos homens; as quais têm, na verdade, alguma aparência de sabedoria, em devoção voluntária, humildade, e em disciplina do corpo, mas não são de valor algum senão para a satisfação da carne” (Cl 2:16-23).
Fico imaginando que Bíblia é essa que esses judaizantes leem na qual veio faltando esta passagem! Digo isto porque aqui Paulo está falando claramente do problema que ocorria nas assembleias de Colosso e Laodiceia, onde os judaizantes estavam julgando os convertidos dentre os gentios por comerem alimentos impuros segundo a Lei de Moisés, não celebrarem os dias das festas judaicas e nem guardarem o sábado. Os adeptos da filosofia e do misticismo os importunavam com “culto dos anjos” e “coisas que não viu”, ou seja, as supostas visões que hoje são tão comuns nos meios pentecostais. Se já viu algum cristão se gabando de suas visões, sonhos, revelações sabe o que é uma carne orgulhosa de seus feitos. Depois o recado é para os judaizante e ascetas que traziam uma lista de proibições do tipo “não toques, não proves, não manuseies”, o que Paulo chama de “doutrinas dos homens” e “aparência de sabedoria, em devoção voluntária, humildade, e em disciplina do corpo”.
Então vem o golpe final que desvenda o objetivo de tudo isso: “Não são de valor algum senão para a satisfação da carne” (Cl 2:23). A carne adora essas coisas porque por meio delas tem de que se gloriar; pode contar suas visões, pode dizer que não come isso ou aquilo, que se veste dessa ou daquela maneira. Já viu nas redes sociais quanta gente gosta de falar da dieta que está fazendo, dos exercícios da academia, da roupa que comprou, etc.? Não que estas coisas sejam erradas, mas todas elas pertencem ao homem natural e às coisas desta vida, e jamais deveriam se misturar à ocupação do cristão em sua adoração a Deus.
Se você entrar num frigorífico verá grandes peças de carne carimbadas com um carimbo azul do Ministério da Agricultura com os dizeres “Inspecionado”. Agora quando você vir cristãos celebrando festas judaicas fantasiados de judeus, soprando chifre de carneiro, comendo alimentos judaicos e até falando hebraico, tente enxergar nisso tudo um carimbo azul escrito “CARNE”. Se prestar atenção vai perceber que está lá. Como ele se manifesta? Por meio do orgulho espiritual de dizer: “Nós seguimos a lei, celebramos as festas, você não”.
“O fariseu, estando em pé, orava consigo desta maneira: O Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano. Jejuo duas vezes na semana, e dou os dízimos de tudo quanto possuo” (Lc 18:11-12).
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Posso ministrar a Palavra em grupos mistos de oração?
Você escreveu dizendo que no grupo de oração que você e seus amigos organizaram estão pedindo que você ministre a Palavra, o que obviamente gerou inquietude em você que é mulher, ou não teria entrado em contato para saber se isso seria correto.
A ordem de 1 Coríntios 14:34-37 foi dada no sentido de a mulher permanecer calada nas reuniões da igreja ou assembleia, quando o ministério da Palavra deve ser exclusivamente exercido por varões. Ali diz:
“As vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar; mas estejam sujeitas, como também ordena a lei. E, se querem aprender alguma coisa, interroguem em casa a seus próprios maridos; porque é vergonhoso que as mulheres falem na igreja. Porventura saiu dentre vós a palavra de Deus? Ou veio ela somente para vós? Se alguém cuida ser profeta, ou espiritual, reconheça que as coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor” (1 Co 14:34-37).
Aprendemos também de 1 Timóteo 2:10-15 que a mulher não deve ensinar e nem exercer autoridade de homem. “A mulher aprenda em silêncio, com toda a submissão. E não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem; esteja, porém, em silêncio. Porque, primeiro, foi formado Adão, depois, Eva. E Adão não foi iludido, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão” (1 Tm 10-15 ARA). Então, como a mulher deveria agir em um grupo misto de oração do qual participam irmãos e irmãs?
Entendo que sempre que o ministério da Palavra estiver envolvido e homens estiverem presentes, cabe aos varões assumirem esse encargo. Em Atos 21:9-10 nos é dito que Filipe tinha “quatro filhas virgens, que profetizavam”, mas o Espírito Santo não usou nenhuma delas para profetizar a Paulo, e sim “um profeta, por nome Agabo” que chegou à casa de Filipe com essa missão. A mente sensível irá perceber nesse episódio o modo de proceder do Espírito.
Numa reunião informal e exclusivamente entre mulheres ou com crianças, não há problema em irmãs orarem e se encorajarem mutuamente falando das Escrituras, mas sempre tendo o cuidado de não ensinar doutrina. Normalmente as coisas da Bíblia visando a vida prática são as que fazem parte do ministério de mulheres para mulheres, e o que o apóstolo Paulo escreveu a Tito pode servir de referência, como um menu de assuntos a serem ensinados entre mulheres:
“As mulheres idosas, semelhantemente, que sejam sérias no seu viver, como convém a santas, não caluniadoras, não dadas a muito vinho, mestras no bem; para que ensinem as mulheres novas a serem prudentes, a amarem seus maridos, a amarem seus filhos, a serem moderadas, castas, boas donas de casa, sujeitas a seus maridos, a fim de que a palavra de Deus não seja blasfemada” (Tt 2:3-5)
Mas em nenhuma parte de Atos e das epístolas vemos mulheres tomando uma posição pública de ministério da Palavra, embora ministrassem para os irmãos em suas necessidades materiais. Encontramos sim Priscila ajudando seu marido Áquila a instruir melhor Apolo nos caminhos do Senhor, mas isso parece ter sido feito em seu lar e em submissão ao seu marido.
“E chegou a Éfeso um certo judeu chamado Apolo, natural de Alexandria, homem eloquente e poderoso nas Escrituras. Este era instruído no caminho do Senhor e, fervoroso de espírito, falava e ensinava diligentemente as coisas do Senhor, conhecendo somente o batismo de João. Ele começou a falar ousadamente na sinagoga; e, quando o ouviram Priscila e Áquila, o levaram consigo e lhe declararam mais precisamente o caminho de Deus” (At 18:24-26).
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Por que você é ríspido com algumas pessoas?
Devemos sempre ter a Bíblia como nosso guia de como agir em cada situação. E quando o assunto é o tratamento a ser dado aos hereges e ímpios zombadores encontramos que o Senhor deu um tratamento ríspido aos fariseus que se opunham abertamente a ele, e os apóstolos nas epístolas nos ensinaram a fazermos o mesmo. Portanto guarde o tratamento brando e o politicamente correto para os pecadores morais e contritos, como prostitutas, ladrões, homossexuais, adúlteros, corruptos, publicanos, etc., como o próprio Senhor fez, mas aplique a rispidez e a severidade no tratamento quando falar com hereges e lobos vorazes.
É inevitável que fazendo assim você nem sempre ganhará amigos e irá parecer aos olhos dos outros como mal educado, prepotente, orgulhoso, soberbo, “dono da verdade” ou coisas do tipo, mas com a verdade não existe meio termo. Não se pode dar tapinhas nas costas dos inimigos da cruz de Cristo e nem os suportar em suas loucuras. O melhor é evitá-los, mas existem situações em que eles vêm até você com suas palavras enganosas e aí o jeito é deixar claro que você não está para brincadeira quando se trata da defesa da fé. Repare que os apóstolos não economizaram palavras para ensinar como devemos tratar hereges, sectários, falsos profetas, lobos em pele de cordeiro, blasfemos, mercadores de homens, inimigos da fé, etc.
“Assim, como já vo-lo dissemos, agora de novo também vo-lo digo. Se alguém vos anunciar outro evangelho além do que já recebestes, seja anátema [maldito]” (Gl 1:9).
“E entre esses foram Himeneu e Alexandre, os quais entreguei a Satanás, para que aprendam a não blasfemar” (1 Tm 1:20).
“Estes são manchas em vossas festas de amor, banqueteando-se convosco, e apascentando-se a si mesmos sem temor… Estes são murmuradores, queixosos da sua sorte, andando segundo as suas concupiscências, e cuja boca diz coisas mui arrogantes, admirando as pessoas por causa do interesse” (Jd 1:12-16).
“E, vendo ele muitos dos fariseus e dos saduceus, que vinham ao seu batismo, dizia-lhes: Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira futura?” (Mt 3:7).
“Serpentes, raça de víboras! como escapareis da condenação do inferno?” (Mt 23:33).
“Muitos me dirão naquele dia: Senhor, Senhor, não profetizamos nós em teu nome? e em teu nome não expulsamos demônios? e em teu nome não fizemos muitas maravilhas? E então lhes direi abertamente: Nunca vos conheci; apartai-vos de mim, vós que praticais a iniquidade” (Mt 7:22-23); “Mas disse-lhe Pedro [a Simão, o mago]: O teu dinheiro seja contigo para perdição, pois cuidaste que o dom de Deus se alcança por dinheiro. Tu não tens parte nem sorte nesta palavra, porque o teu coração não é reto diante de Deus. Arrepende-te, pois, dessa tua iniquidade, e ora a Deus, para que porventura te seja perdoado o pensamento do teu coração; pois vejo que estás em fel de amargura, e em laço de iniquidade” (At 8:20-23); “Todo aquele que prevarica, e não persevera na doutrina de Cristo, não tem a Deus. Quem persevera na doutrina de Cristo, esse tem tanto ao Pai como ao Filho. Se alguém vem ter convosco, e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem tampouco o saudeis. Porque quem o saúda tem parte nas suas más obras” (2 Jo 1:9-11); “Porque há muitos desordenados, faladores, vãos e enganadores, principalmente os da circuncisão, aos quais convém tapar a boca; homens que transtornam casas inteiras ensinando o que não convém, por torpe ganância… Portanto, repreende-os severamente, para que sejam sãos na fé. Não dando ouvidos às fábulas judaicas, nem aos mandamentos de homens que se desviam da verdade” (Ti 1:10-14).
“E não sejais cúmplices nas obras infrutíferas das trevas; antes, porém, reprovai-as. Porque o que eles fazem em oculto, o só referir é vergonha” (Ef 5:11-12).
“Rogo-vos, irmãos, que noteis bem aqueles que provocam divisões e escândalos, em desacordo com a doutrina que aprendestes; afastai-vos deles porque esses tais não servem a Cristo, nosso Senhor, e sim a seu próprio ventre; e, com suaves palavras e lisonjas, enganam o coração dos incautos” (Rm 16:17-18) “Nós vos ordenamos, irmãos, em nome do Senhor Jesus Cristo, que vos aparteis de todo irmão que ande desordenadamente e não segundo a tradição que de nós recebestes” (2 Ts 3:6).
“Evita o homem faccioso, depois de admoestá-lo primeira e segunda vez, pois sabes que tal pessoa está pervertida, e vive pecando, e por si mesma está condenada” (Tt 3:10-11).
Como pode ver, não faltam exortações de como devemos tratar com dureza os inimigos da verdade. Nunca sabemos com certeza se estamos diante de um crente que está equivocado, um falso profeta que está deliberadamente buscando discípulos ou até mesmo um emissário de Satanás. Todos estes se enquadram no tratamento ríspido e severo que devemos dar àqueles que se opõem à Verdade.
“Eu sei que, depois da minha partida, entre vós penetrarão lobos vorazes, que não pouparão o rebanho. E que, dentre vós mesmos, se levantarão homens falando coisas pervertidas para arrastar os discípulos atrás deles. Portanto, vigiai, lembrando-vos de que, por três anos, noite e dia, não cessei de admoestar, com lágrimas, a cada um” (At 20:29-31).
“Mas o que faço e farei é para cortar ocasião àqueles que a buscam com o intuito de serem considerados iguais a nós, naquilo em que se gloriam. Porque os tais são falsos apóstolos, obreiros fraudulentos, transformando-se em apóstolos de Cristo. E não é de admirar, porque o próprio Satanás se transforma em anjo de luz. Não é muito, pois, que os seus próprios ministros se transformem em ministros de justiça; e o fim deles será conforme as suas obras” (2 Co 11:12-15).
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O que é a “doutrina de Cristo”?
O que seria a “doutrina de Cristo”? Esta é uma expressão que encontrei duas vezes na Bíblia traduzida por João Ferreira de Almeida, mas que aparentemente só deveria aparecer uma vez. Digo isto porque uma delas, em Hebreus 6:1, parece não ter sido traduzida adequadamente para o português. Na versão de João Ferreira de Almeida diz: “Por isso, deixando os rudimentos da doutrina de Cristo, prossigamos até à perfeição, não lançando de novo o fundamento do arrependimento de obras mortas e de fé em Deus…”. Outras versões mais fiéis ao original trazem: “deixando a doutrina dos princípios elementares de Cristo” (Tradução Brasileira), “leaving the word of the beginning of the Christ” (J. N. Darby), “deixemos agora as instruções elementares sobre Cristo” (CNBB), “deixemos os ensinos elementares a respeito de Cristo” (NVI), etc.
O assunto da passagem são os rudimentos da fé cristã, que já haviam sido ensinados pelos profetas do Antigo Testamento muito antes da vinda de Cristo e eram também os mesmos no judaísmo. Coisas como “arrependimento de obras mortas e de fé em Deus, e da doutrina dos batismos, e da imposição das mãos, e da ressurreição dos mortos, e do juízo eterno” eram ensinos já conhecidos, mas obviamente não abarcavam tudo o que se pode conhecer de Cristo, portanto não poderiam ser apropriadamente chamados de “doutrina de Cristo”. Por isso o autor de Hebreus nem se preocupa em levar adiante esse ensino por acreditar que aqueles hebreus, criados no judaísmo, já sabiam aquelas coisas. No versículo 6 ele diz: “E isto faremos, se Deus o permitir”.
A outra passagem onde a expressão “doutrina de Cristo” é usada é mais acurada em sua tradução e significado. Ela diz: “Porque já muitos enganadores entraram no mundo, os quais não confessam que Jesus Cristo veio em carne. Este tal é o enganador e o anticristo… Todo aquele que prevarica, e não persevera na doutrina de Cristo, não tem a Deus. Quem persevera na doutrina de Cristo, esse tem tanto ao Pai como ao Filho. Se alguém vem ter convosco, e não traz esta doutrina [de Cristo], não o recebais em casa, nem tampouco o saudeis. Porque quem o saúda tem parte nas suas más obras” (2 Jo 1:7, 9-11).
Podemos recorrer a outras passagens do ministério do mesmo apóstolo João, aquele que em seu evangelho já tinha se concentrado na divindade de Cristo, para entendermos melhor a “doutrina de Cristo”. Ela é a que revela que Cristo é o Filho Eterno de Deus encarnado, Deus e Homem. João se refere “à divindade do Senhor, sua Humanidade perfeita, sua vida impecável na terra, sua morte expiatória na cruz do Calvário, sua ressurreição de entre os mortos, sua vinda outra vez, o testemunho que Cristo dá das Escrituras e o testemunho que as Escrituras dão de Cristo. É muito evidente que a ‘doutrina de Cristo’ é algo muito vital e fundamental concernente à Pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo” (“The Doctrine of The Christ”, por A. J. Pollock) .
Para complementar a passagem de 2 João 1:9-11 podemos recorrer a outras passagens das cartas do mesmo apóstolo para entender a “doutrina de Cristo” à qual ele se referia. Em sua primeira carta ele escreve: “Amados, não creiais a todo o espírito, mas provai se os espíritos são de Deus, porque já muitos falsos profetas se têm levantado no mundo. Nisto conhecereis o Espírito de Deus: Todo o espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é de Deus; e todo o espírito que não confessa que Jesus Cristo veio em carne não é de Deus; mas este é o espírito do anticristo, do qual já ouvistes que há de vir, e eis que já está no mundo” (1 Jo 3:1-3).
Confessar que “Jesus Cristo veio em carne” é admitir que ele é Deus pré-existente, porque para “vir” era preciso estar antes em algum outro lugar, ou seja, fora do mundo no qual Jesus nasceu. Jesus é a resposta à pergunta feita em 2 Crônicas 6:18: “Habitará Deus com os homens na terra? Eis que os céus, e o céu dos céus, não te podem conter, quanto menos esta casa que tenho edificado?”. Sim, Deus veio habitar com os homens quando “o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade” (Jo 1:14).
O interessante é como a “Young’s Literal Translation” de 1898 traz esta passagem: “And the Word became flesh, and did tabernacle among us”. Outra edição, a “Literal Translation of the Holy Bible” de 1976 por Jay P. Green, Sr. traz assim: “And the Word became flesh and tabernacled among us”. Em português seria algo como “o Verbo” ou “a Palavra se fez carne e tabernaculou entre nós”, ou seja, acampou em uma tenda de carne, uma clara referência ao Tabernáculo, a habitação de Deus na peregrinação de Israel pelo deserto. Aquele estágio da encarnação de Jesus foi passageiro, pois ele iria morrer e ressuscitar em seu corpo de carne e ossos, mas não mais sujeito às limitações do corpo humano natural. Hoje existe um Homem de carne e ossos no céu, o protótipo ou “primícias” da nova criação.
É por isso que somos exortados a olhar para Cristo em sua condição atual, e não na fraqueza de seu corpo de carne quando andou aqui: “Ainda que também tenhamos conhecido Cristo segundo a carne, contudo agora já não o conhecemos deste modo” (2 Co 5:16) e “Vemos, porém, coroado de glória e de honra aquele Jesus que fora feito um pouco menor do que os anjos, por causa da paixão da morte, para que, pela graça de Deus, provasse a morte por todos” (Hb 2:9).
O evangelho de João começa com a afirmação: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez” (Jo 1:1-3). Até uma criança é capaz de entender que, se todas as coisas foram feitas por ele e sem ele nada do que foi feito se fez, obviamente ele não poderia ser uma criatura como um anjo ou arcanjo, ou ter criado a si mesmo, como alguns costumam pensar. Jesus é o a segunda Pessoa da Trindade contida na expressão plural “Elohim” da Criação em Gênesis. Ele é o mesmo Jeová que se manifestou ao povo de Israel do Antigo Testamento, e que veio habitar em um corpo de carne. Ele é o mesmo Filho do Homem que voltará como Juiz para julgar os vivos e os mortos.
“Sabemos que já o Filho de Deus é vindo, e nos deu entendimento para conhecermos o que é verdadeiro; e no que é verdadeiro estamos, isto é, em seu Filho Jesus Cristo. Este é o verdadeiro Deus e a vida eterna” (1 Jo 5:20). Esta é a “doutrina de Cristo” à qual João se refere. Diante dos ataques constantes de seitas como as Testemunhas de Jeová, Mórmons, Kardecistas e outros, tenha sempre em mente que “todo aquele que prevarica, e não persevera na doutrina de Cristo, não tem a Deus. Quem persevera na doutrina de Cristo, esse tem tanto ao Pai como ao Filho” (2 Jo 1:9). O verbo “prevaricar” significa agir de má fé traindo um princípio, violando ou desviando-se de algo já estabelecido. É muito usado em direito quando um advogado passa por cima da lei na tentativa de salvar a pele de seu cliente, ou quando um juiz comete abuso de poder.
Negar a divindade de Cristo, como fazem essas seitas às quais me referi, anda junto com a negação da Trindade, um Deus em três Pessoas divinas, Pai, Filho e Espírito Santo. Ainda que o discurso dessas religiões pareça querer resguardar a divindade e honra do Pai, o efeito é justamente o contrário. Jesus declarou: “Para que todos honrem o Filho, como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que o enviou” (Jo 5:23).
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Por que um incrédulo bom vai para o inferno?
Você perguntou a razão de um incrédulo, que vive de modo honesto, justo, amoroso, fiel à esposa, livre de vícios, não ir para o céu, enquanto um marginal, que apenas creu em Jesus como seu Salvador, receber o perdão de todos os seus pecados e ir morar no céu com Cristo.
A resposta é que, para limpar o pecado do homem, era preciso um sacrifício de sangue de uma vítima pura e sem defeito que substituísse o homem no juízo de Deus. Ninguém será salvo por seu bom proceder porque o padrão de Deus para o Homem perfeito é Cristo, que era sem pecado. Eu e você nascemos pecadores, portanto já começamos nossa vida com o pé esquerdo, precisando de um Salvador. Veja o que Deus diz do homem em seu estado natural, seja ele um Bin Laden ou uma Madre Teresa de Calcutá: “Não há um justo, nem um sequer [e isso inclui eu e você]. Não há ninguém que entenda; Não há ninguém que busque a Deus. Todos se extraviaram, e juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem um só. A sua garganta é um sepulcro aberto; com as suas línguas tratam enganosamente; peçonha de áspides está debaixo de seus lábios; cuja boca está cheia de maldição e amargura. Os seus pés são ligeiros para derramar sangue. Em seus caminhos há destruição e miséria; e não conheceram o caminho da paz. Não há temor de Deus diante de seus olhos. Ora, nós sabemos que tudo o que a lei diz, aos que estão debaixo da lei o diz, para que toda a boca esteja fechada e todo o mundo seja condenável diante de Deus. Por isso nenhuma carne será justificada diante dele pelas obras da lei, porque pela lei vem o conhecimento do pecado” (Rm 3:10-20).
Olhar para um cidadão honesto, bom, justo, fiel, porém incrédulo, e achar que ele possa merecer a salvação eterna por sua conduta exterior, é como a Chapeuzinho Vermelho acreditar que aquela bondosa velhinha de olhos grandes, nariz grande e boca grande era mesmo sua vovozinha. Na história Chapeuzinho Vermelho quase paga com a vida por não perceber que o Lobo Mau tinha engolido a vovó. Nós já nascemos engolidos pelo Lobo Mau do pecado, ainda que nossa aparência exterior seja da bondosa vovozinha. De vez em quando os olhos grandes, o nariz grande e a boca grande do Lobo Mau que nos engoliu aparecem em nossas atitudes, porém mais em uns que em outros, que fingem melhor. Assim como o Caçador da história, somente Cristo podia destruir esse Lobo Mau em nós, e é por isso que sem um Salvador ninguém poderá ser salvo.
Talvez você fique confuso porque vê na TV pregadores de quem você não compraria um carro usado, de tão picaretas que são, ou pessoas que se dizem “crentes” e são desonestas, implacáveis, invejosas, piores até que muitos marginais. Não se engane, pois Jesus previu que muitos diriam “Senhor, Senhor!” só da boca para fora. Onde está a diferença então? Uma pessoa que, pela ação do Espírito Santo ao lhe aplicar a Palavra de Deus, recebe vida para sentir o peso de seus pecados e crer em Cristo como Salvador, recebe o selo do Espírito Santo para habitar nela. Deste ponto em diante ela já está salva e NUNCA irá para a perdição como os demais. Em João 10:28 Jesus prometeu: “E dou-lhes a vida eterna, e NUNCA hão de perecer, e NINGUÉM as arrebatará da minha mão”.
Repare que é Jesus quem dá a vida eterna, não é a pessoa que a conquista como se fosse uma recompensa por bom comportamento. Os que acham que possuem um bom comportamento nunca irão crer em Cristo, porque ao se considerarem assim planejam salvar a si mesmos. Diga para um religioso fariseu que sua religião, fidelidade, caridade, etc., não poderá salvá-lo e você verá os olhos do Lobo Mau nele ficarem injetados de ódio. Você mexeu no ego dele, inflado por se considerar a última bolacha do pacote em termos de bondade quando se compara com os vis pecadores ao seu redor. Se eu precisasse desenhar esse comportamento emprestaria o desenho que Jesus fez em Lucas 18: “Dois homens subiram ao templo, para orar; um, fariseu, e o outro, publicano. O fariseu, estando em pé, orava consigo desta maneira: O Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano. Jejuo duas vezes na semana, e dou os dízimos de tudo quanto possuo. O publicano, porém, estando em pé, de longe, nem ainda queria levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: O Deus, tem misericórdia de mim, pecador! Digo-vos que este desceu justificado para sua casa, e não aquele; porque qualquer que a si mesmo se exalta será humilhado, e qualquer que a si mesmo se humilha será exaltado” (Lc 18:10-14).
Por ainda possuir em si a velha natureza — a carne — todo ser humano, mesmo aquele que nasceu de novo e foi salvo por Cristo, está sujeito a pecar. Mas agora ele tem uma nova vida, não é mais a porca imunda de antes, mas uma ovelha coberta de pura e branca lã. Do mesmo modo como uma porca transformada em ovelha ainda pode escorregar para a lama, a diferença é que a ovelha — que não é mais porca —, irá sentir-se mal e querer sair da lama o mais rápido possível. Se ainda fosse porca iria gostar e se lambuzar. A não compreensão disso leva alguns a acharem que um crente verdadeiro pode perder sua salvação, mas não pode porque a salvação não foi uma conquista ou mérito dele, mas um presente de Deus. Por isso se chama “graça”. “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie” (Ef 2:8-9). Aquele que parecia ser crente e um dia voltou à velha vida de pecados não perdeu a salvação. Ele simplesmente não a possuía, mas ao adotar exteriormente um modo de viver segundo a Bíblia, passou um tempo livre das corrupções do mundo, mas nunca deixou de ser “porca” e nem foi transformado verdadeiramente em “ovelha”. É isto que diz esta passagem: “Porquanto se, depois de terem escapado das corrupções do mundo, pelo conhecimento [intelectual apenas] do Senhor e Salvador Jesus Cristo, forem outra vez envolvidos nelas e vencidos, tornou-se-lhes o último estado pior do que o primeiro. Porque melhor lhes fora não conhecerem o caminho da justiça, do que, conhecendo-o, desviarem-se do santo mandamento que lhes fora dado; deste modo sobreveio-lhes o que por um verdadeiro provérbio se diz: O cão voltou ao seu próprio vômito, e a porca lavada ao espojadouro de lama” (2 Pe 2:20-22).
Mas, e a ovelha, ainda é capaz de pecar? Sim, porque a ressurreição ainda não aconteceu para ela ser transformada em um corpo glorioso à semelhança do corpo de nosso Senhor Jesus. A ovelha verdadeira tem um Advogado intercedendo por ela, e se disser que não peca já estaria pecando por mentir.
“Se dissermos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e não há verdade em nós. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a injustiça. Se dissermos que não pecamos, fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós… Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo, para que não pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o justo. E ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo” (1 Jo 1:8-10; 2 Jo 2:1-2).
Muitos dizem ter crido em Jesus porque se filiaram a alguma igreja, passaram a andar com uma Bíblia no sovaco e a se vestir na ‘moda evangélica’, mas na verdade nunca nasceram de novo. Pergunte a alguém assim se ele morrer naquela hora para onde vai. Provavelmente dirá que não sabe, que não tem a certeza de vida eterna, ou se for hipócrita como os fariseus, dirá que procura fazer o melhor que pode, que não tem vícios, que persevera, ajuda os pobres, dá o dízimo, faz ofertas, prega o evangelho, etc. O verdadeiro crente é aquele que um dia se reconheceu tão perdido que entendeu não ter em si mesmo qualquer recurso para se salvar. Então ele OUVE o evangelho, CRÊ em Deus que enviou a Cristo para morrer, TEM a vida eterna, NÃO ENTRARÁ em condenação, mas PASSOU da morte para a vida (Jo 5:24).
Então quando você vê essas pessoas que se dizem cristãs praticarem barbaridades, não é porque perderam a salvação, mas porque nunca a tiveram. Um crente genuíno que eventualmente caia em pecado pode perder a comunhão com o Pai, mas nunca a salvação; jamais deixará de ser um filho de Deus nascido do alto. Deus pode até tirar sua vida neste mundo se ele insistir em andar errado, mas ainda assim será salvo. O homem de 1 Coríntios 5 dormia com a madrasta, algo que Paulo diz não ser aceito nem entre os pagãos incrédulos, e se não se arrependesse seria entregue a Satanás para ser morto (como Jó foi entregue para sofrer). Porém no final ele seria salvo por já estar salvo desde o momento em que se converteu. Ao contrário dos que não conhecem a graça e acham que isso é como uma licença para pecar, saiba que Deus pode até permitir sua morte para ele não se envolver em problemas mais sérios e atrapalhar o testemunho de Deus na terra. Veja a passagem que mencionei: “Geralmente se ouve que há entre vós fornicação, e fornicação tal, que nem ainda entre os gentios se nomeia, como é haver quem abuse da mulher de seu pai. Estais ensoberbecidos, e nem ao menos vos entristecestes por não ter sido dentre vós tirado quem cometeu tal ação. Eu, na verdade, ainda que ausente no corpo, mas presente no espírito, já determinei, como se estivesse presente, que o que tal ato praticou, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, juntos vós e o meu espírito, pelo poder de nosso Senhor Jesus Cristo, seja entregue a Satanás para destruição da carne, para que o espírito seja salvo no dia do Senhor Jesus” (1 Co 5:1-5).
Se você acha que alguém que vive de modo honesto, justo, amoroso, fiel à esposa e livre de vícios tem o direito de ser salvo, e o marginal não, temo dizer que a religião em que você acredita não é diferente do islamismo e de muitas outras religiões que ensinam uma salvação por boas obras. Os muçulmanos também acreditam que uma pessoa que viva de forma honesta e correta herdará o Paraíso, porque eles negam a divindade de Cristo, a salvação pela fé, a graça de Deus e o valor do sangue de Jesus para purificar os pecados. Então a você eu só posso dizer que precisa realmente se converter a Cristo e aceitar a graça que ele oferece por ter consumado (terminado) a obra de salvação na cruz.
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Noé tinha filhos quando foi avisado do fim do mundo?
Acredito que Noé ainda não tivesse filhos quando foi avisado por Deus que o mundo seria destruído por um dilúvio. Lendo a história toda, do capítulo 5 ao 9 de Gênesis, e fazendo algumas contas com as idades também de outros capítulos, você irá descobrir que Noé não tinha filhos quando soube que o mundo iria terminar e foi instruído a construir a arca.
Se você já escutou algum casal dizer que não quer filhos porque o mundo está ruim então já dá para ter uma ideia do que Deus pensa disso. Noé não só vivia em um mundo ruim; Noé vivia em um mundo condenado a ser destruído, um mundo com data de vencimento. Mesmo assim ele decidiu ter filhos, pois era um homem de fé. É disto que estou falando, da fé que confia e espera em Deus e não se aflige com as circunstâncias.
Noé é uma figura do crente neste mundo que caminha para o juízo. Com o que Noé estava ocupado? Certamente não com a melhoria do mundo para sua família, mas com a salvação de si mesmo, de sua família e de qualquer um que acreditasse na mensagem que ele pregava. Noé era um pregador da justiça divina, avisando a todos do dilúvio que viria e mostrando na prática que cria no que Deus disse.
Evidentemente os outros deviam achar que ele fosse louco por falar em dilúvio quando nem chuva havia, como podemos deduzir de Gênesis 2:5-6. A enorme arca que construía em terra seca num tempo em que a vegetação era regada, não por chuvas, mas por neblina, era bem visível a todos. Naquelas condições os homens de então viviam mais e Noé devia ter uns 480 anos quando foi avisado por Deus do juízo que viria e recebeu instruções de como se salvar por meio da Arca, que é uma figura de Cristo.
Se eu não estiver enganado em meus cálculos, e se tomarmos Gênesis 6:3 não como uma data limite para a vida humana, mas como uma contagem regressiva para a destruição de toda a carne, então Deus devia estar avisando Noé que o dilúvio viria cento e vinte anos após o momento da ordem para construir a arca. “Então disse o Senhor: Não contenderá o meu Espírito para sempre com o homem; porque ele também é carne; porém os seus dias serão cento e vinte anos” (Gn 6:3). Então o dilúvio teria vindo cento e vinte anos mais tarde, ou quando “era Noé da idade de seiscentos anos, quando o dilúvio das águas veio sobre a terra” (Gn 6:7).
Considerando que o dilúvio tenha vindo quando Noé tinha seiscentos anos, então subtraindo os 120 anos da contagem regressiva podemos deduzir que o aniversário de 480 anos de Noé ocorreu no ano em que ele recebeu a ordem para construir a arca. Baseado em Gênesis 5:32 ele já estaria trabalhando há pelo menos vinte anos na construção quando nasceu seu primeiro filho: “Era Noé da idade de quinhentos anos e gerou a Sem, Cam e Jafé”. Isto não quer dizer que Noé teve trigêmeos quando tinha quinhentos anos, todos no mesmo ano, mas que por volta dessa idade foi que começou a ter filhos. Apesar de a passagem apresentar a ordem “Sem, Cão e Jafé”, talvez não tenha sido Sem o primogênito, e sim Jafé, ficando Cam ou Cão na posição de caçula.
Digo isto porque existem dúvidas sobre a melhor tradução de Gênesis 10:21. J. N. Darby traduziu a Bíblia dos originais hebraicos e gregos para o inglês, o que em português seria: “E a Sem — a ele também nasceram filhos; ele é o pai de todos os filhos de Eber, o irmão de Jafé o mais velho”. De acordo com Gênesis 11:10 Sem devia ter 98 anos de idade quando ocorreu o dilúvio, mas na genealogia de Gênesis 5:32 ele aparece primeiro por ser dele que viria a linhagem de Israel. “Estas são as gerações de Sem: Sem era da idade de cem anos e gerou a Arfaxade, dois anos depois do dilúvio”.
Se meus cálculos estiverem corretos, Noé tinha 480 anos e ainda não tinha filhos quando recebeu o aviso de que o mundo que conheceu até então seria destruído e que deveria construir uma arca. Vinte anos mais tarde começaram a nascer seus três filhos e cento e vinte anos depois do aviso veio o dilúvio. Assim quando você achar que o mundo atual está ruim para colocar filhos nele, pense em Noé, que é citado em Hebreus dentre os homens de fé: “Pela fé Noé, divinamente avisado das coisas que ainda não se viam, temeu e, para salvação da sua família, preparou a arca, pela qual condenou o mundo, e foi feito herdeiro da justiça que é segundo a fé” (Hb 11:7).
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Os sonhos e visões de muçulmanos são o cumprimento de Joel 2?
Sua dúvida é se os relatos de muçulmanos que tiveram sonhos e visões e se converteram a Cristo seria o cumprimento da profecia de Joel 2. Não, a profecia de Joel cumpriu-se em parte em Atos 2, quando a Igreja foi formada por judeus que se arrependeram e creram em Cristo, como o próprio Pedro demonstrou. A segunda parte deverá se cumprir quando um remanescente de Israel se converter em tempos de grande tribulação e na instalação do reino de mil anos de Cristo. Então ela se cumprirá na totalidade. Repare que nos dois casos existem elementos comuns: judeus arrependidos e crendo no Cristo.
A profecia inteira está aqui: “E há de ser que, depois derramarei o meu Espírito sobre toda a carne, e vossos filhos e vossas filhas profetizarão, os vossos velhos terão sonhos, os vossos jovens terão visões. E também sobre os servos e sobre as servas naqueles dias derramarei o meu Espírito. E mostrarei prodígios no céu, e na terra, sangue e fogo, e colunas de fumaça. O sol se converterá em trevas, e a lua em sangue, antes que venha o grande e terrível dia do Senhor. E há de ser que todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo; porque no monte Sião e em Jerusalém haverá livramento, assim como disse o Senhor, e entre os sobreviventes, aqueles que o Senhor chamar” (Joel 2:28-32).
Se você mora no mesmo planeta que eu, então aposto como ainda não viu “prodígios no céu e na terra, sangue e fogo, colunas de fumaça, o sol convertido em trevas e a lua em sangue”, portanto Joel 2 ainda não se cumpriu 100%. O que tem acontecido nos países islâmicos é que pessoas estão se convertendo e relatam terem sido atraídas a Cristo por sonhos e visões. Deus pode usar diferentes maneiras de atrai-las para o evangelho, embora continue sendo a Palavra de Deus e o Espírito Santo os elementos essenciais a uma conversão. O que vier a mais é figuração.
É bom lembrar que em momentos assim também existem as “maria-vai-com-as-outras”, uma prática muito comum nas igrejas pentecostais, com pessoas inventando sonhos e visões para não se sentirem inferiores aos que fazem sucesso ali com testemunhos mirabolantes. Também existem os pregadores oportunistas que contratam pessoas que contam um conto e aumentam um ponto para garantir seu cachê. É isso mesmo, no meio evangélico existe um pujante mercado de testemunhos e as pessoas com as conversões mais dramáticas são as mais requisitadas e com cachês mais altos. Os pastores as contratam porque elas garantem audiência e aumento de receita pelas ofertas.
Por isso não mergulhe de cabeça nas afirmações de livros e sites sobre o assunto, achando que tudo seja verdade. Já viu esses filmes com os dizeres “Baseado em Fatos Reais”? Já viu aquelas caixinhas no supermercado que dizem “Contém Suco da Fruta”? Então não preciso explicar como são essas coisas. Mantenha o desconfiômetro ligado e dê glória a Deus pelos que se converteram, mas não queira fazer do modo de conversão de outros um padrão de conversão, nem se sinta frustrada por em sua conversão não ter sonhado, tido visões ou entrado num êxtase como o de Santa Teresa de Ávila na escultura de Gian Lorenzo Bernin.
O que importa não é o modo COMO somos levados a Cristo, mas a Pessoa a QUEM somos levados. Ocupar-se demais com sinais que porventura tenham acompanhado uma conversão é o mesmo que uma mãe embalar nos braços a placenta ao invés de cuidar do bebê que nasceu.
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O que é a sã doutrina?
Que “sã doutrina” seria essa de que Paulo falava ao dizer que alguns não a suportariam? “Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si doutores conforme as suas próprias concupiscências; e desviarão os ouvidos da verdade, voltando às fábulas” (2 Tm 4:3-4).
Acredito que a resposta para “o que é a sã doutrina” seja toda a doutrina dos apóstolos, mas em especial a doutrina que foi revelada ao apóstolo Paulo, a qual é hoje largamente desprezada na cristandade. É só continuar lendo o capítulo para ver que Paulo (e por conseguinte sua doutrina) já estava sendo desprezado por muitos no final de sua vida. A segunda epístola a Timóteo é sua última carta que chegou até nós antes de ele ser morto. Ali ele escreve: “Porque Demas me desamparou, amando o presente século, e foi para Tessalônica, Crescente para Galácia, Tito para Dalmácia. Só Lucas está comigo… Alexandre, o latoeiro, causou-me muitos males… Ninguém me assistiu na minha primeira defesa, antes todos me desampararam” (2 Tm 4:10-16).
Uma vez alguém me enviou um vídeo de um conhecido pastor batista no qual ele sugere que Paulo deveria ter estudado teologia para poder explicar melhor suas ideias. Recentemente alguém escreveu mostrando grande indignação por ter escutado o mesmo pregador insinuar que a “água viva” que Jesus oferece à mulher de Samaria em João 4 seria o líquido seminal masculino, uma ideia que esse pregador deve ter aprendido com os hereges gnósticos, que já atuavam no segundo século da era cristã. Não é de surpreender que das escolas de teologia saiam pessoas assim, que são “ordenadas” para pastorear rebanhos denominacionais, pois o que mais se aprende lá é conhecimento humano, e não a “sã doutrina”. Alguns alegam que as escolas de teologia seguem a instrução dada por Paulo a Timóteo: “O que de mim, entre muitas testemunhas, ouviste, confia-o a homens fiéis, que sejam idôneos para também ensinarem os outros” (2 Tm 2:2). Será? Não creio.
Esta foi uma ordem pessoal de Paulo a Timóteo, pois ele tinha recebido ensinos e revelações que outros apóstolos não tinham recebido e isso precisava ser compartilhado numa sequência envolvendo Paulo, Timóteo, homens fiéis, outros homens fiéis. Esta era a maneira de disseminar a sã doutrina. A ordem de Paulo a Timóteo era que ele confiasse esse ensino “a homens fiéis”, obviamente se referindo a irmãos experimentados e idôneos para ensinarem outros. Seria ingenuidade considerar alguém que passa num vestibular ou paga uma taxa de inscrição numa faculdade de teologia como um “homem fiel”. Qualquer um pode sentar-se na carteira de uma escola assim, independentemente de seu caráter moral, pois na maioria delas o que vale é o “QI”, no sentido regular e alternativo do termo.
Não se pode ler este versículo de 2 Timóteo 2:2 sem levar em consideração o estado de ruína do testemunho e abandono da pessoa e doutrina de Paulo que naquele momento estava no início, e só iria aumentar com o passar dos séculos. “Bem sabes isto, que os que estão na Ásia todos se apartaram de mim… Demas me desamparou, amando o presente século, e foi para Tessalônica, Crescente para Galácia, Tito para Dalmácia… Alexandre, o latoeiro, causou-me muitos males… todos me desampararam” (2 Tm 1:15; 4:10-22). A sã doutrina já estava sendo atacada de todos os lados, daí a exortação “evita os falatórios profanos, porque produzirão maior impiedade. E a palavra desses roerá como gangrena; entre os quais são Himeneu e Fileto; os quais se desviaram da verdade” (2 Tm 2:16-18).
E quem era esse Paulo que esses homens abandonavam, desprezavam e criticavam, a exemplo do que fazem muitos pregadores modernos? Ninguém menos que o apóstolo a quem haviam sido revelados e confiados mistérios inestimáveis nunca antes conhecidos dos profetas do Antigo Testamento e nem mesmo dos apóstolos que vieram antes dele. Quais mistérios ou segredos eram esses? Os mistérios do evangelho da graça de Deus (Rm 16:25-26), do endurecimento de Israel por um tempo (Rm 11:25-27), do arrebatamento e da ressurreição do corpo de Cristo (1 Co 15:51-53), do um só corpo, a Igreja (Ef 3:1-9), da cidadania ou vocação celestial do crente no corpo de Cristo (Ef 1:3; Fp 3:20-21), do propósito de Deus de reunir todas as coisas em Cristo na dispensação da plenitude dos tempos (Ef 1:9-10), da graça de Deus (Rm 6:14), da identificação do crente com Cristo (1 Co 15:1-4), da iniquidade e do anticristo (2 Ts 2:6-12) e outras verdades decorrentes destas.
Então quando Paulo diz a Timóteo para confiar “a homens fiéis, que sejam idôneos para também ensinarem os outros” (2 Tm 2:2) as coisas que lhe tinham sido passadas, ele não estava de brincadeira. Certamente não estava dizendo para Timóteo abrir um Instituto Bíblico, uma Faculdade de Teologia ou um site na Web oferecendo algum curso livre com direito a um certificado de papel e a possibilidade de ser “ordenado pastor” e “abrir um trabalho”, como se costuma dizer no meio evangélico. Paulo falava sério da necessidade de compartilhar a homens sérios e idôneos as coisas sérias que ele tinha recebido por revelação.
Tudo fará mais sentido se você juntar isso com o alerta do apóstolo no capítulo 3, no qual o assunto é continuação do capítulo 2 onde ele descreveu a condição da “casa de Deus” (1 Tm 3:15) que deveria ter sido “coluna e firmeza da Verdade”, mas pela ação de homens inidôneos havia se transformado numa “grande casa” (2 Tm 2:20) onde havia vasos para honra e desonra. Veja o que o capítulo 3 fala dos homens que haviam tomado de assalto a “grande casa” e agora angariavam seguidores com promessas vãs. Foi disso que Paulo alertou os anciãos de Éfeso em Atos 20:29-31, quando disse: “eu sei isto que, depois da minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não pouparão ao rebanho; e que de entre vós mesmos se levantarão homens que falarão coisas perversas, para atraírem os discípulos após si. Portanto, vigiai, lembrando-vos de que durante três anos, não cessei, noite e dia, de admoestar com lágrimas a cada um de vós”. Os comentários entre chaves são meus para explicar melhor: “Sabe, porém, isto: que nos últimos dias sobrevirão tempos trabalhosos. Porque haverá homens amantes de si mesmos, avarentos, presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes a pais e mães, ingratos, profanos, sem afeto natural, irreconciliáveis, caluniadores, incontinentes, cruéis, sem amor para com os bons, traidores, obstinados, orgulhosos, mais amigos dos deleites do que amigos de Deus, tendo aparência de piedade [não se apresentam como bandidos], mas negando a eficácia dela. Destes afasta-te. Porque deste número são os que se introduzem pelas casas, e levam cativas mulheres néscias carregadas de pecados, levadas de várias concupiscências [concupiscência: desejo ardente de possuir algo]; que aprendem sempre, e nunca podem chegar ao conhecimento da verdade. E, como Janes e Jambres resistiram a Moisés [imitando os milagres de Deus], assim também estes resistem à verdade, sendo homens corruptos de entendimento e réprobos quanto à fé. Não irão, porém, avante; porque a todos será manifesto o seu desvario, como também o foi o daqueles” (2 Tm 3:1-9).
Os homens desta passagem certamente não podem ser qualificados como “homens fiéis” para aprenderem com Timóteo. Além do mais, o encargo que Paulo dava a Timóteo não era baseado em idade ou formação, pois sabemos que Timóteo era um jovem que até mesmo devia enfrentar o preconceito de irmãos mais velhos. “Ninguém despreze a tua mocidade” (1 Tm 4:12), escreve Paulo. Portanto para considerar escolas de teologia como aquilo que é descrito por Paulo em 2 Timóteo 2:2 seria preciso admitir que um vestibular ou o pagamento de uma taxa de inscrição e outras mensalidades é tudo o que se requer de “homens fiéis”. Além disso, se era para Timóteo encontrar homens assim para receber o ensino do Espírito dado através do apóstolo Paulo, seria preciso que esses “homens fiéis” tivessem um grande apreço por Paulo e sua doutrina, e não um desprezo declarado como é encontrado dentro das paredes dessas instituições. Ali é justamente o ensino de Paulo o mais rechaçado, pois muitos teólogos o consideram um machista recalcado que escrevia coisas que só serviam para sua época e costumes.
Quer um exemplo? Na maioria dessas escolas de teologia são admitidas mulheres para ensinar, algo totalmente fora daquilo que Paulo ensinou. Algumas estudantes sairão qualificadas, segundo o padrão humano, para receberem títulos pomposos, como “pastoras”, “bispas” e “apóstolas”, exercendo “autoridade de homem” (1 Tm 2:12 ARA). Quando Paulo ordenou que as mulheres ficassem caladas nas igrejas (1 Coríntios 14:33-37) ele concluiu dizendo que as coisas que ele escrevia eram “mandamentos do Senhor”. Em 1 Timóteo 2:11-15 Paulo ampliaria o escopo de seu ensino sobre o lugar da mulher proibindo-a de ensinar e assumir autoridade designada ao homem. Seria ingenuidade pensar que as escolas de teologia ensinem isso, pois se os “pastores” saíssem levando esse ensino não encontrariam emprego em nenhuma denominação moderna.
Nessas escolas o que acontece é o que Pedro previu que aconteceria, ao se referir ao ministério de Paulo: “E tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor; como também o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada; falando disto, como em todas as suas epístolas, entre as quais há pontos difíceis de entender, que os indoutos e inconstantes torcem, e igualmente as outras Escrituras, para sua própria perdição. Vós, portanto, amados, sabendo isto de antemão, guardai-vos de que, pelo engano dos homens abomináveis, sejais juntamente arrebatados, e descaiais da vossa firmeza” (2 Pe 3:15-17).
A leitura usual que se faz desta passagem é que Paulo escrevia difícil e que não sabia se expressar corretamente, portanto o que ele escreveu não é exatamente o que ele queria dizer e nem deve ser entendido ao pé da letra, muito pelo contrário. Pois bem, é justamente dos “indoutos e inconstantes” que usam desse raciocínio para torcerem os escritos de Paulo “e igualmente as outras Escrituras”, que Pedro está falando. E repare que ao falar das cartas de Paulo, o apóstolo Pedro as coloca em pé de igualdade com “as outras Escrituras”, mostrando que elas são tão inspiradas quanto todo o cânon do Antigo Testamento, que era o que conheciam na época.
Mas antes que ache que o assunto de Paulo eram apenas as mulheres, lembre-se dos muitos mistérios que mencionei um pouco antes, os quais foram revelados em primeira mão a esse apóstolo, tudo aquilo “sabedoria de Deus, oculta em mistério, a qual Deus ordenou antes dos séculos para nossa glória” (1 Co 2:7). O que ele escreveu sobre o lugar da mulher e outras ordenanças não estão na lista dos “mistérios”, mas são “mandamentos do Senhor” (1 Co 14:37) abrangendo muitas áreas da vida prática do cristão e da assembleia.
Portanto, não é nas escolas de teologia que você irá aprender a sã doutrina, mas muito mais “aos pés de Jesus” (Lc 10:39), aquela escola que um irmão norte-americano, que já está com o Senhor, costumava apelidar de “Saint Mary’s at Jesus’ Feet Theological Seminary” (“Seminário Teológico de Santa Maria aos Pés de Jesus”), referindo-se ao episódio em que Marta, ocupada com muitas coisas, é repreendida pelo Senhor que aponta para Maria, aprendendo aos seus pés, como alguém que escolheu a melhor parte. Esse irmão também costumava fazer trocadilho de “Theological Seminary” (“Seminário Teológico”) com “Theological Cemetery” (“Cemitério Teológico”), porque o que podia se aprender ali nada mais era do que as obras mortas do conhecimento intelectual humano.
Dessas escolas podem sair muitos peritos em assuntos como os que copiei da grade curricular de um curso de teologia: Antropologia, Ciências, Epistemologia, Filosofia, História, Hermenêutica, Língua Portuguesa, Psicologia, Redação, Grego, Hebraico, Metodologia da Pesquisa Científica, Sociologia, Metodologia Exegética, Ética Filosófica, Teologia Sistemática, Aconselhamento, Fenomenologia da Religião, Comunicação, etc. Aparentemente Timóteo não iria conseguir ensinar tudo isso a “homens idôneos”, pois nem ele estudou essas disciplinas e nem estaria qualificado a ensinar pelos padrões das escolas de teologia. Antes ele teria de conquistar um título de “Mestre” ou “Doutor”. Tudo isso realmente serve para alimentar o intelecto do homem natural, mas não são o ensino do Espírito de Deus. E sabemos que “o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente” (1 Co 2:14).
Termino lembrando de um triste episódio no início dos anos oitenta. Depois de congregar alguns meses com irmãos de uma denominação religiosa numa cidadezinha no interior de Goiás, onde não havia pastor e o encargo de pregar era assumido informalmente por mim e outro irmão local, comecei a entender que devia congregar somente ao nome do Senhor, fora do sistema religioso denominacional. Como os líderes da denominação responsável por aquela congregação tinham percebido alguns predicados que me qualificariam a me tornar pastor, enviaram um obreiro para conversar comigo. Sua missão era me fazer desistir da ideia de recusar o batismo daquela denominação, pois eu já tinha sido batizado em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, portanto já tinha recebido um batismo cristão.
Quando aquele obreiro viu que nenhum argumento adiantava, apelou para a avareza existente em minha carne e na carne de qualquer um. O que ele me disse foi algo assim: “Estamos prontos para oferecer a você a possibilidade de estudar em nossa faculdade de teologia sem precisar frequentar as aulas. Nós enviaríamos os livros e as lições, daríamos um jeito em suas faltas, e você só precisaria ir à faculdade (distante de quatro a seis horas, dependendo das chuvas e das estradas) uma vez por mês para fazer as provas. Em quatro anos você se tornará pastor, e se na metade disso se inscrever num curso de direito eliminando algumas matérias, além de pastor sairá também advogado e ganhará muito mais do que ganha como professor de ginásio”.
Quando expliquei a ele que eu já era formado em Arquitetura e Urbanismo e estava ali ensinando a garotada por idealismo, ele não disse palavra. Virou as costas e foi embora. E se eu tinha alguma dúvida se devia ou não abandonar aquela pequena congregação onde eu pregava e minha esposa ensinava na Escola Dominical, naquele momento todas elas se dissiparam e escrevi aos irmãos de uma assembleia congregada somente ao nome do Senhor pedindo meu lugar à comunhão à mesa do Senhor.
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Apóstatas irão para o céu?
Você perguntou: “Se todos os que creem em Cristo são salvos, então apóstatas também irão para o céu?”. Bem, antes de responder é preciso definir o que é apostasia e quem é o apóstata. O “Concise Bible Dictionary” define “apostasia” assim: ‘Embora a palavra ‘apostasy’ não ocorra na Bíblia King James, a palavra grega da qual deriva a palavra inglesa pode ser encontrada. Em Atos 21:21 foi dito a Paulo que ele era acusado de ensinar os judeus que estavam entre os gentios a apostatarem de Moisés. Paulo ensinava a liberação da lei pela morte de Cristo e isso parecia aos judeus mais rigorosos como apostasia. A mesma palavra é usada em 2 Tessalonicenses 2:3, onde é ensinado que o dia do Senhor não poderia vir até que viesse ‘a apostasia’, ou o desvio do cristianismo em conexão com a manifestação do homem de pecado ou ‘anticristo’. Apesar de que a apostasia generalizada mencionada ali não possa ocorrer antes que os santos sejam levados para o céu, pode ocorrer, como tem ocorrido, desvios individuais. Veja, por exemplo, Hebreus 3:12, 10:26-29 e a epístola de Judas. ‘Vede, irmãos, que nunca haja em qualquer de vós um coração mau e infiel, para se apartar do Deus vivo’ (Hb 3:12). ‘Porque, se pecarmos voluntariamente, depois de termos recebido o conhecimento da verdade, já não resta mais sacrifício pelos pecados, mas uma certa expectação horrível de juízo, e ardor de fogo, que há de devorar os adversários. Quebrantando alguém a lei de Moisés, morre sem misericórdia, só pela palavra de duas ou três testemunhas’ (Hb 10:26-29).
‘Há também avisos solenes de que esse tipo de apostasia estaria cada vez mais generalizada conforme se aproximasse o final da presente dispensação (1 Timóteo 4:1-3). Ora, para que ocorra um desvio é necessário estar em uma posição da qual se possa cair, ou uma profissão que possa ser deliberadamente abandonada. Isso é, como exemplifica as Escrituras, semelhante ao cão que retorna ao seu vômito, e a porca ao lamaçal. Não se trata de um cristão caindo em algum pecado, do qual a graça possa recuperá-lo, mas sim de uma renúncia definitiva ao cristianismo. As Escrituras não dão qualquer esperança para o caso de alguém em deliberada apostasia, apesar de nada ser impossível ao Senhor’.
Portanto, um apóstata não é necessariamente alguém que creu em Jesus como Salvador, mas um que conheceu a mensagem do evangelho e as doutrinas cristãs e apenas adotou exteriormente uma profissão de fé, passando a conviver como um cristão entre cristãos. Judas usa o termo “e introduziram” e mostra que eram homens que “já antes estavam escritos para este mesmo juízo” (Jd 1:4). Dois apóstatas notórios são Judas Iscariotes e o anticristo. Ambos são chamados de “filhos da perdição” porque este era já o seu destino, mas aparentavam ser “religiosos” o suficiente para enganarem a muitos, até mostrarem suas garras. “Estando eu com eles no mundo, guardava-os em teu nome. Tenho guardado aqueles que tu me deste, e nenhum deles se perdeu, senão o filho da perdição, para que a Escritura se cumprisse” (Jo 17:12). “Ninguém de maneira alguma vos engane; porque não será assim sem que antes venha a apostasia, e se manifeste o homem do pecado, o filho da perdição” (2 Ts 2:3).
Simão, o mago, também se qualificaria para o posto de apóstata, pois logo demonstrou que seu interesse no evangelho era apenas monetário.
“E estava ali um certo homem, chamado Simão, que anteriormente exercera naquela cidade a arte mágica, e tinha iludido o povo de Samaria, dizendo que era uma grande personagem; ao qual todos atendiam, desde o menor até ao maior, dizendo: Este é a grande virtude de Deus. E atendiam-no, porque já desde muito tempo os havia iludido com artes mágicas. Mas, como cressem em Filipe, que lhes pregava acerca do reino de Deus, e do nome de Jesus Cristo, se batizavam, tanto homens como mulheres. E creu até o próprio Simão; e, sendo batizado, ficou de contínuo com Filipe; e, vendo os sinais e as grandes maravilhas que se faziam, estava atônito. Os apóstolos, pois, que estavam em Jerusalém, ouvindo que Samaria recebera a palavra de Deus, enviaram para lá Pedro e João. Os quais, tendo descido, oraram por eles para que recebessem o Espírito Santo (Porque sobre nenhum deles tinha ainda descido; mas somente eram batizados em nome do Senhor Jesus). Então lhes impuseram as mãos, e receberam o Espírito Santo. E Simão, vendo que pela imposição das mãos dos apóstolos era dado o Espírito Santo, lhes ofereceu dinheiro, dizendo: Dai-me também a mim esse poder, para que aquele sobre quem eu puser as mãos receba o Espírito Santo. Mas disse-lhe Pedro: O teu dinheiro seja contigo para perdição, pois cuidaste que o dom de Deus se alcança por dinheiro. Tu não tens parte nem sorte nesta palavra, porque o teu coração não é reto diante de Deus. Arrepende-te, pois, dessa tua iniquidade, e ora a Deus, para que porventura te seja perdoado o pensamento do teu coração; pois vejo que estás em fel de amargura, e em laço de iniquidade” (At 8:9-23).
Um irmão comenta essa passagem dizendo que nesse dia a “casa de Deus” ficou maior que “o corpo de Cristo”, que é a Igreja. Isto porque você é acrescentado ao corpo de Cristo quando realmente crê em Jesus como seu Salvador, mas à casa de Deus, que é a esfera exterior da profissão cristã, você é acrescentado pelo batismo. E isso nos leva a outra passagem que fala da casa de Deus que havia se transformado em uma grande casa onde havia vasos de todos os tipos, uns para honra, outros para desonra. Você pode ver isso em sua Bíblia em 2 Timóteo 2, e depois no capítulo 3 da mesma carta uma descrição dos apóstatas vivendo nessa grande casa, caracterizados como homens “amantes de si mesmos, avarentos (que adoram dinheiro), presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes a pais e mães, ingratos, profanos, sem afeto natural, irreconciliáveis, caluniadores, incontinentes, cruéis, sem amor para com os bons, traidores, obstinados, orgulhosos, mais amigos dos deleites do que amigos de Deus, tendo aparência de piedade mas negando a eficácia dela”, os quais seduzem mulheres carregadas de desejos extremos por coisas e sensações, e também imitam os milagres de Deus, como fizeram os magos de Faraó no Antigo Testamento.
O trecho termina mostrando o fim da carreira de um apóstata, que nunca creu realmente no Salvador: “Estes resistem à verdade, sendo homens corruptos de entendimento e réprobos quanto à fé. Não irão, porém, avante; porque a todos será manifesto o seu desvario, como também o foi o daqueles” (2 Tm 3:1-9). Por “aqueles” Paulo está se referindo aos falsos operadores de sinais e milagres energizados pelo diabo que trabalhavam para Faraó.
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A partir de que momento o pecador está salvo para sempre?
A resposta simples e direta é que o pecador está salvo para sempre a partir do momento em que creu em Jesus, mas este pequeno questionário pode servir de exercício para você mesmo chegar a esta conclusão.
Primeiro, em que momento a pessoa TEM a vida eterna? Em que momento ela deixou de estar sujeita ao juízo? Em que momento ela PASSOU da morte para a vida? Analise os tempos dos verbos das palavras do próprio Jesus e você saberá responder. Ele disse: “Em verdade, em verdade vos digo: quem OUVE a minha palavra e CRÊ naquele que me enviou TEM a vida eterna, NÃO ENTRA em juízo, mas PASSOU da morte para a vida” (Jo 5:24).
Segundo, quando é que o Espírito Santo vem habitar no crente? Paulo escreveu aos efésios, que já eram salvos por sua fé em Jesus e na obra consumada no calvário, explicando que “Cristo, em quem também vós ESTAIS, DEPOIS que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também CRIDO, FOSTES SELADOS com o Santo Espírito da promessa” (Ef 1:13).
Terceiro, quando é que um verdadeiro crente poderia perder o Espírito Santo, que veio habitar no salvo conforme o versículo anterior? “E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja PARA SEMPRE convosco” (Jo 14:16). Também Jesus afirma: “E dou-lhes a vida eterna, e NUNCA hão de perecer, e NINGUÉM as arrebatará da minha mão… E todo aquele que vive, e crê em mim, NUNCA morrerá” (Jo 10:28; 11:26).
Como você já deve ter deduzido deste pequeno questionário e das respostas claras das Escrituras, o pecador é salvo quando crê em Cristo como seu Salvador, recebe o Espírito Santo como consequência de ter crido no Salvador, sendo esse mesmo Espírito o Selo prometido pelo Senhor, e nunca irá perder esse Selo, já que Jesus prometeu que ele estaria “para sempre” com os seus.
“E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre” (Jo 14:16).
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Quem praticar um destes pecados se perderá eternamente?
Sua dúvida é: como alguém poderá ser salvo eternamente se esta passagem de Apocalipse diz que “ficarão de fora os cães e os feiticeiros, e os que se prostituem, e os homicidas, e os idólatras, e qualquer que ama e comete a mentira?” (Ap 22:15).
Sim, a passagem afirma assim e nem poderia ser diferente, pois na presença de Deus não pode entrar pecado. Todos os que chegarem à presença de Cristo no céu terão sido antes perfeitamente perdoados ainda em vida aqui na terra. Mas lembre-se de que tanto Pedro, nos evangelhos, quanto João, em Apocalipse, cometeram pecado de idolatria quando se prostraram diante de um anjo, e a passagem da pena do próprio João diz que não entrarão os idólatras. Seriam eles idólatras de carteirinha? Não, eles apenas escorregaram nesse pecado. O processo é este descrito por Paulo:
“Não sabeis que os injustos não hão de herdar o reino de Deus? Não erreis: nem os devassos, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os sodomitas, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os bêbados, nem os maldizentes, nem os roubadores herdarão o reino de Deus. E é o que alguns têm sido; mas haveis sido lavados, mas haveis sido santificados, mas haveis sido justificados em nome do Senhor Jesus, e pelo Espírito do nosso Deus. Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm. Todas as coisas me são lícitas, mas eu não me deixarei dominar por nenhuma” (1 Co 6:9-12).
Isto quer dizer que um crente verdadeiro jamais irá pecar em uma dessas modalidades? Não é esta a questão aqui, porque o crente está sujeito a cair em qualquer um desses pecados. Mas ele já foi lavado, santificado, justificado, o que equivale dizer que já não são essas coisas que o caracterizam, mas a vida nova que agora tem em Cristo. Uma porca transformada em ovelha não vai querer sujar sua lã, mas pode eventualmente escorregar e cair na lama. Se isso acontecer sua natureza é a de querer sair logo da lama e vai se sentir péssima enquanto não sair. Porém a porca que não foi transformada em ovelha cai na lama e adora ficar ali. É da sua natureza chafurdar na lama.
Um homem de bem pode dar um soco em outro na hora da raiva, mas ele não é um pugilista, ele é um homem de bem. Já o pugilista é reconhecido como tal por viver distribuindo socos na cara das pessoas. Eu já dei remédios para meus filhos por minha conta, e também já ajudei em parto, mas não sou médico e nem parteiro. O fato de eu ter praticado algo não me caracteriza como alguém que tem naquilo a sua prática normal e diária. Um salvo que comete um pecado de furto, por exemplo, perderá sua comunhão com o Pai, mas não sua salvação. Ele terá de confessar seu pecado e poderá desfrutar do perdão que já lhe foi garantido, como ensinam os primeiros dois capítulos de 1 João. Mas você não iria dizer que roubar é a profissão dele.
Então é possível alguém, que tenha sido lavado, santificado, justificado, venha a cometer alguns dos pecados das passagens citadas? Sim, é perfeitamente possível, embora seja altamente condenável. Porque se um salvo por Cristo disser que não peca então já está pecando por mentir.
“Se dissermos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e não há verdade em nós. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a injustiça. Se dissermos que não pecamos, fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós… Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo, para que não pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o justo. E ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo… Filhinhos, escrevo-vos, porque pelo seu nome vos são perdoados os pecados” (1 Jo 1:8-10; 2:1-2, 12).
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Qual a melhor hora para se ler a Bíblia?
É importante ler a Bíblia sempre que possível, e lê-la de tal maneira que nossos pensamentos sejam formados por ela. Hoje isso ficou até mais fácil porque temos tecnologia não apenas para ler em qualquer lugar, mas para ouvir também. Alguns preferem ler de manhã, outros à tarde, outros à noite.
A Bíblia pode ser lida também em conjunto com algum livro devocional ou de comentários para ajudar a entender algumas passagens, mas é importante sempre saber a origem e autoria desses textos. Alguns livros, principalmente de autores católicos e pentecostais, mais atrapalham do que ajudam. Eu costumo sugerir aos que me escrevem que usem o bom e breve comentário de autoria de Norman Berry, um irmão em Cristo que vivia no Canadá e já partiu para estar com o Senhor. Ele costumava ficar em minha casa quando vinha ao Brasil.
Norman deixou sua profissão numa grande agência de publicidade para dedicar-se em tempo integral a pregar o evangelho, comprando uma tenda que costumava armar em diferentes localidades para pregar a Palavra de Deus. Nessa época publicava em mimeógrafo um panfleto chamado “Chapter-a-Day”, ou “um capítulo por dia”, que era enviado gratuitamente por correio a milhares de pessoas. Traduzi seus textos para o português e no início da Internet eu enviava por e-mail a milhares de pessoas que solicitavam. Depois publiquei no site www.stories.org.br/chaday em um formato que você pode ler como se fosse um calendário com uma mensagem para cada dia do ano. Uma irmã canadense traduziu grande parte dos textos também para o francês.
Quando meus filhos eram pequenos líamos todos os dias de manhã dois capítulos e cantávamos um hino. Quando ficaram maiores, e os compromissos com o emprego e a escola já não permitiam, líamos cada um por si, geralmente de manhã. Mas à noite a família se reunia na sala para ler dois capítulos (5 versículos cada um) e cantar um hino. Mas não pense que isso fosse uma obrigação ou que meus filhos faziam isso de má vontade. Todos desfrutavam daquele momento e realmente sentíamos falta quando algum compromisso impedia nossa leitura, porque não ficava apenas na leitura, mas acabava se transformando em uma conversa entre amigos que incluía aquele “Amigo” que é mais chegado que um irmão (Pv 18:24).
Existe um princípio no Antigo Testamento que pode ser de ajuda. Quando os israelitas colhiam o maná, o pão que caía do céu, eles faziam isso cedo de manhã, antes de o sol esquentar o chão, e deviam colher todos os dias, exceto aos sábados. Este princípio do Antigo Testamento nos ensina que o melhor é nos ocuparmos com o pão do céu quando o sol das atividades diárias ainda não esquentou nossa cabeça. Vamos ler alguns trechos da passagem.
“Então, disse o Senhor a Moisés: Eis que vos farei chover do céu pão, e o povo sairá e colherá diariamente a porção para cada dia, para que eu ponha à prova se anda na minha lei ou não. Dar-se-á que, ao sexto dia, prepararão o que colherem; e será o dobro do que colhem cada dia….
E, quando se evaporou o orvalho que caíra, na superfície do deserto restava uma coisa fina e semelhante a escamas, fina como a geada sobre a terra. Vendo-a os filhos de Israel, disseram uns aos outros: Que é isto? Pois não sabiam o que era. Disse-lhes Moisés: Isto é o pão que o Senhor vos dá para vosso alimento. Eis o que o Senhor vos ordenou: Colhei disso cada um segundo o que pode comer, um gômer por cabeça, segundo o número de vossas pessoas; cada um tomará para os que se acharem na sua tenda. Assim o fizeram os filhos de Israel; e colheram, uns, mais, outros, menos. Porém, medindo-o com o gômer, não sobejava ao que colhera muito, nem faltava ao que colhera pouco, pois colheram cada um quanto podia comer. Disse-lhes Moisés: Ninguém deixe dele para a manhã seguinte. Eles, porém, não deram ouvidos a Moisés, e alguns deixaram do maná para a manhã seguinte; porém deu bichos e cheirava mal. E Moisés se indignou contra eles. Colhiam-no, pois, manhã após manhã, cada um quanto podia comer; porque, em vindo o calor, se derretia…
Deu-lhe a casa de Israel o nome de maná; era como semente de coentro, branco e de sabor como bolos de mel. Disse Moisés: Esta é a palavra que o Senhor ordenou: Dele encherás um gômer e o guardarás para as vossas gerações, para que vejam o pão com que vos sustentei no deserto, quando vos tirei do Egito. Disse também Moisés a Arão: Toma um vaso, mete nele um gômer cheio de maná e coloca-o diante do Senhor, para guardar-se às vossas gerações. Como o Senhor ordenara a Moisés, assim Arão o colocou diante do Testemunho para o guardar. E comeram os filhos de Israel maná quarenta anos, até que entraram em terra habitada; comeram maná até que chegaram aos limites da terra de Canaã. Gômer é a décima parte do efa” (Êx 16).
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Ossos e relíquias de santos podem fazer milagres?
Você escreveu contando que seu amigo católico acredita que ossos de santos podem fazer milagres e baseia sua crença em 2 Reis 13:21, que diz: “E sucedeu que, enterrando eles um homem, eis que viram uma tropa, e lançaram o homem na sepultura de Eliseu; e, caindo nela o homem, e tocando os ossos de Eliseu, reviveu, e se levantou sobre os seus pés.” Mas será que isso poderia justificar as “relíquias”, aquelas partículas de ossos, madeira, tecido, etc. que são colocadas em pingentes ou expostas nos templos católicos?
De fato, aquilo aconteceu mesmo com o defunto colocado em contato com os ossos de Eliseu e é inegável que foi um milagre de Deus. Mas acredito que Deus queria mostrar que o ministério do profeta tão rechaçado por Israel ainda era capaz de dar vida àquela nação morta em sua idolatria, porque é este o contexto de todo o ministério de Eliseu e seu predecessor Elias às dez tribos de Israel que se separaram de Judá e Benjamim para se entregarem à idolatria.
Aquele episódio explica também o cuidado de Deus em indicar que Jesus foi sepultado em “um sepulcro novo, onde ninguém jamais fora colocado” (Jo 19:41). Nenhum judeu iria poder alegar que a ressurreição ocorreu pelo contato do corpo de Jesus com os ossos de algum profeta. Existe um outro episódio nos evangelhos quando uma mulher que sofria de um fluxo de sangue tocou o manto de Jesus e foi curada. Mas ali a intenção dela era claramente tocar em Jesus, mas sua timidez a impediu de ser tão ousada. Mesmo assim a bênção que ela recebeu não foi do tecido, mas da Pessoa de Cristo.
Há também os episódios em que “Deus pelas mãos de Paulo fazia maravilhas extraordinárias. De sorte que até os lenços e aventais se levavam do seu corpo aos enfermos, e as enfermidades fugiam deles, e os espíritos malignos saíam” (At 19:11-12). Isso é apenas um relato, não uma instrução para fazermos o mesmo. Deus, na sua misericórdia e graça, estava agindo em grande poder no início da Igreja, e Paulo era um de seus principais instrumentos para que os judeus incrédulos, que buscavam sinais, pudessem crer no Messias que eles tinham crucificado. “Porque os judeus pedem sinal” (1 Co 1:22).
O próprio livro é chamado de Atos dos Apóstolos por não ser um livro de instruções para a Igreja, como são as cartas, mas um relato do que aconteceu naquele período de transição entre o judaísmo e o cristianismo, e a questão é: Se aquelas pessoas que levavam lenços e aventais do corpo de Paulo aos enfermos tivessem tão somente crido e orado a Deus pelas curas, será que elas não teriam acontecido? Será que Deus diria que não iria atendê-las porque elas não vieram com lenços e aventais, como costuma acontecer em alguma repartição pública quando esquecemos um documento? De que Deus mesmo estamos falando? do “Deus [que] pelas mãos de Paulo fazia maravilhas extraordinárias”.
Alguns podem argumentar que se Deus agia assim ali, então deverá agir assim sempre, mas é um engano pensar assim. Ao longo da Bíblia você encontra altos e baixos no nível de manifestações de Deus visando chamar a atenção das pessoas para crerem nele e na Palavra dita por seus profetas. É claro que Deus pode agir sempre, mas não devemos nos esquecer de que os apóstolos e os que eram por eles delegados contavam com poderes sobrenaturais que foi dado a eles e a mais ninguém.
Lembre-se de que os apóstolos e profetas do Novo Testamento foram dados como alicerces para a “casa de Deus” e não existem hoje nem apóstolos, nem sucessão apostólica. Eles eram uma classe especial de homens que o próprio Senhor designou e que, dentre seus atributos, deviam ter andado com o Senhor. Paulo foi uma exceção por ter sido chamado pelo Senhor glorificado para receber revelações que nenhum outro tinha recebido. A própria passagem dos lenços e aventais continua mostrando claramente a insanidade de alguns que querem se fazer passar por apóstolos ou usar um poder que fora dado apenas a eles, como se fossem prepostos daqueles homens que Jesus escolheu:
“E alguns dos exorcistas judeus ambulantes tentavam invocar o nome do Senhor Jesus sobre os que tinham espíritos malignos, dizendo: Esconjuro-vos por Jesus a quem Paulo prega. E os que faziam isto eram sete filhos de Ceva, judeu, principal dos sacerdotes. Respondendo, porém, o espírito maligno, disse: Conheço a Jesus, e bem sei quem é Paulo; mas vós quem sois? E, saltando neles o homem que tinha o espírito maligno, e assenhoreando-se de todos, pôde mais do que eles; de tal maneira que, nus e feridos, fugiram daquela casa” (At 19:13-16).
Portanto, encontraremos sim, ocasiões em que Deus usou objetos para mostrar algum sinal ou milagre. Mas daí a criar objetos místicos visando sorte, curas e milagres — como são as “relíquias” — existe uma grande diferença. A Bíblia em nenhum lugar ensina ou autoriza isso, ao contrário, até mesmo a serpente de bronze que Moisés fez com ordem de Deus (Números 21:6-9) como figura de Cristo levantado no madeiro (João 3:14-15) precisou ser destruída séculos mais tarde por Ezequias porque a tinham transformado numa “relíquia” ou objeto de culto (2 Reis 18:4).
Portanto toda devoção e culto envolvendo objetos como o suposto “Santo Sudário”, roupas, objetos e ossos de “santos”, ou a versão neopentecostal disso com sabonetes, sal do Mar Morto, azeite do Monte das Oliveiras, lenços com suor do pastor, pedras de Israel, etc., não passam de superstição e idolatria, coisas largamente condenadas nas Escrituras.
Se o seu amigo acredita mesmo que pode se basear na passagem de 2 Reis para ser abençoado, sugiro que deixe em testamento a ordem para seu corpo ser jogado na sepultura de algum profeta do Antigo Testamento para ver se consegue ressuscitar. Aí estará aplicando a passagem bíblica dentro de seu contexto.
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Por que o exame prévio para participar da ceia e ministério?
Você perguntou se os irmãos com os quais estou congregado fazem um exame prévio na pessoa que deseja participar da comunhão antes que possa estar à mesa do Senhor. Sim, e o mesmo vale para ministrar a Palavra nas reuniões. Embora a maioria dos cristãos já tenha ouvido falar da ceia do Senhor, poucos entendem o que seja a mesa do Senhor, que é o lugar onde se expressa comunhão, do mesmo modo como a mesa de nossa casa é onde temos comunhão com família e amigos mais chegados. Você dificilmente irá convidar alguém para comer com você em sua casa se não conhecer a pessoa até certo ponto. Se existe um cuidado assim com sua mesa, quanto maior deve ser o cuidado com a recepção à mesa do Senhor.
Se vivêssemos nos tempos dos apóstolos, quando havia uma mesma doutrina e todos até chegavam a viver tendo tudo em comum, não teríamos muito com que nos preocupar. Mas com a entrada do mal na “casa de Deus, que é a igreja do Deus” de 1 Timóteo 3:15, que deveria ter sido “a coluna e firmeza da verdade”, esta se transformou no final “numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra” (2 Tm 2:20). À semelhança do que aconteceu com Israel, passamos daquela condição dos tempos de sua glória no reinado de Salomão para os tempos de ruína encontrados nos livros de Esdras e Neemias. A ordem dada para as tribos remanescentes naquela ruína em que se tornou Israel era de não abrir os portões da cidade de Jerusalém, a menos que o sol estivesse a pino, para não existir sombra de dúvida quanto a quem entrava, se era amigo ou inimigo.
“Sucedeu que, depois que o muro foi edificado, eu levantei as portas; e foram estabelecidos os porteiros, os cantores e os levitas. Eu nomeei a Hanani, meu irmão, e a Hananias, líder da fortaleza, em Jerusalém; porque ele era homem fiel e temente a Deus, mais do que muitos. E disse-lhes: Não se abram as portas de Jerusalém até que o sol aqueça, e enquanto os que assistirem ali permanecerem, fechem as portas, e vós trancai-as; e ponham-se guardas dos moradores de Jerusalém, cada um na sua guarda, e cada um diante da sua casa. E era a cidade larga de espaço, e grande, porém pouco povo havia dentro dela; e ainda as casas não estavam edificadas” (Ne 7:1-4).
Por isso a assembleia tem esse cuidado na recepção de irmãos à comunhão à mesa do Senhor. Você ficaria tranquilo participando da ceia do Senhor ao lado de um adúltero, pedófilo ou herege? Não que sejamos perfeitos, mas existem pecados graves e comprometedores para o testemunho do Senhor, e estes devem ser resolvidos antes de alguém tomar seu lugar à mesa do Senhor. A autoridade para receber é a mesma usada para excluir da comunhão (não do corpo de Cristo) pessoas em pecado, como vemos em 1 Coríntios 5. Paulo escreveu àquela assembleia:
“Geralmente se ouve que há entre vós fornicação, e fornicação tal, que nem ainda entre os gentios se nomeia, como é haver quem abuse da mulher de seu pai. Estais ensoberbecidos, e nem ao menos vos entristecestes por não ter sido dentre vós tirado quem cometeu tal ação… Não é boa a vossa jactância. Não sabeis que um pouco de fermento faz levedar toda a massa? Alimpai-vos, pois, do fermento velho, para que sejais uma nova massa, assim como estais sem fermento. Porque Cristo, nossa páscoa, foi sacrificado por nós. Por isso façamos a festa, não com o fermento velho, nem com o fermento da maldade e da malícia, mas com os ázimos da sinceridade e da verdade. Já por carta vos tenho escrito, que não vos associeis com os que se prostituem; isto não quer dizer absolutamente com os devassos deste mundo, ou com os avarentos, ou com os roubadores, ou com os idólatras; porque então vos seria necessário sair do mundo. Mas agora vos escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se irmão, for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com o tal nem ainda comais. Porque, que tenho eu em julgar também os que estão de fora? Não julgais vós os que estão dentro? Mas Deus julga os que estão de fora. Tirai, pois, dentre vós a esse iníquo” (1 Co 5:1-13).
Seguindo estes preceitos é também colocado fora da comunhão à mesa do Senhor aquele que porventura tenha caído em um pecado grave que comprometa o testemunho. Tal pessoa, à semelhança da figura que encontramos no leproso do Antigo Testamento, é colocada fora da comunhão e convívio dos irmãos até demonstrar um arrependimento genuíno, para só então ser restaurada. Não se trata de excluir do corpo de Cristo ou da igreja, como alguns costumam dizer, porque nenhum membro do corpo de Cristo pode ser excluído de seu corpo. A exclusão é do lugar que representa comunhão, isto é, a mesa do Senhor. Neste caso faz todo sentido o que Paulo escreve: “com o tal nem ainda comais”.
Quanto aos que ministram nas reuniões, deve existir igual cuidado, pois nunca sabemos se aquele desconhecido que entra no local da reunião dizendo-se cristão está associado a alguma seita herética. Se deixado livre para falar, depois de derramar seu veneno contaminante o mal já terá sido feito. Entendo que podemos aplicar para o ministério da Palavra para as necessidades espirituais o mesmo princípio que os apóstolos utilizavam para o ministério do suprimento das necessidades materiais. Para a escolha de diáconos a ordem era: “E também estes sejam primeiro provados, depois sirvam, se forem irrepreensíveis” (1 Tm 3:10). Mas mesmo entre os conhecidos que ministram a Palavra nas reuniões da assembleia de irmãos congregados ao nome do Senhor é exercitado aquilo que o apóstolo escreveu: “falem dois ou três e os outros julguem” (1 Co 14).
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Por que o Deus de Moisés era mau?
Você pergunta como pode crer que o “deus” do Antigo Testamento seja o mesmo Deus do Testamento — e colocou “deus” entre aspas e em minúsculas. Você ainda questiona como pode Deus ser justo, bom, misericordioso, verdadeiro, se ele for inflexível e implacável como o que é mostrado no Antigo Testamento.
Ao criar o homem em Gênesis, Elohim (Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo, pois o nome é plural) disse: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança” (Gn 1:26). Agora você vai na contramão de Deus e decide: “Farei Deus à minha imagem, conforme a minha semelhança”. Isto porque você acusa o Criador de não ser do jeito que você acha que ELE deveria ser, porque não o considera “justo, bom, misericordioso, verdadeiro etc.”.
Mas quem você acha que colocou em você a noção do que é ser “justo, bom, misericordioso, verdadeiro”? Você acha que nasceu com esses atributos? Que são produto de sua suposta evolução? Conhece algum outro ser vivo que seja assim? Ah, talvez diga que seu cãozinho é justo, bom, misericordioso, verdadeiro, mas isso porque foi treinado por você que recebeu esses conceitos de Deus. Tente enfiar a mão na boca de uma hiena selvagem para ver se ela vai morder com justiça, bondade, misericórdia e verdade.
Você diz que não crê no Deus do Antigo Testamento porque ELE não é do jeito que VOCÊ gostaria que fosse. E no Jesus do livro de Apocalipse, você crê? Aquele livro foi escrito pelo mesmo João que escreveu o evangelho e suas epístolas, as que mais falam de amor, bondade, respeito, etc. Mas em Apocalipse Jesus aparece tão ou mais implacável que o Jeová do Antigo Testamento, que é o próprio Jesus em sua manifestação ao mundo naquelas circunstâncias. Ou como você interpreta alguém que irá governar com vara de ferro? “E da sua boca saía uma aguda espada, para ferir com ela as nações; e ele as regerá com vara de ferro; e ele mesmo é o que pisa o lagar do vinho do furor e da ira do Deus Todo-Poderoso” (Ap 19:15).
Se você não crê no Deus do Antigo Testamento então está criando um deus só seu. E se não crê no Deus revelado nos escritos de Moisés no Antigo Testamento também não crê em Jesus, porque ele próprio afirmou isso: “Não cuideis que eu vos hei de acusar para com o Pai. Há um que vos acusa, Moisés, em quem vós esperais. Porque, se vós crêsseis em Moisés, creríeis em mim; porque de mim escreveu ele. Mas, se não credes nos seus escritos, como crereis nas minhas palavras?” (Jo 5:45-47).
O simples fato de você querer julgar a Deus já demonstra que está longe de conhecê-lo de verdade. Isto porque nenhum marginal está em condições de julgar o juiz que irá condená-lo, mas o contrário é o que sucede. E eu e você nascemos marginais e pecadores aos olhos de Deus, necessitados de perdão e salvação. Por isso sugiro que coloque sua boca no pó antes de falar mal de Deus ou querer dizer como ELE deveria ser e agir para se enquadrar nos seus padrões. Um verdadeiro filho de Deus condena-se a si mesmo e justifica a Deus, reconhecendo que é incapaz de entender a Deus e a todos os seus desígnios. “Mas a sabedoria é justificada por todos os seus filhos” (Lc 7:35).
‘É da maior importância moral vermos que, sempre que justificamos a nós mesmos, condenamos a Deus; por outro lado, sempre que condenamos a nós mesmos, justificamos a Deus. “A sabedoria é justificada por seus filhos”‘. Este é um ponto de grande importância. O coração verdadeiramente quebrantado e contrito irá defender a Deus custe o que custar. “Seja Deus verdadeiro, e todo o homem mentiroso; como está escrito: Para que sejas justificado em tuas palavras, E venças quando fores julgado” (Rm 3:4). No final será Deus quem terá a supremacia; e é prova de verdadeira sabedoria dar a ele a supremacia agora. No momento em que uma alma é quebrantada em um verdadeiro julgamento próprio, Deus surge diante dela em toda a majestade da sua graça como Justificador. Mas enquanto formos controlados por um espírito de auto justificação e auto complacência, continuaremos completos ignorantes da profunda bênção dada ao homem a quem Deus atribui justiça sem obras. A maior tolice da qual uma pessoa pode ser culpada é justificar-se a si mesma; considerando que neste caso Deus deverá imputar a ela o pecado. Mas a sabedoria mais verdadeira está em condenar-se a si mesmo, pois neste caso Deus se torna o Justificador’. (The Mackintosh Treasury – Miscellaneous Writtings – Vol. 3 – Lessons from the Old Testament – C. H. Mackintosh).
“Porque diz a Escritura a Faraó: Para isto mesmo te levantei; para em ti mostrar o meu poder, e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra. Logo, pois, compadece-se de quem quer, e endurece a quem quer. Dir-me-ás então: Por que se queixa ele ainda? Porquanto, quem tem resistido à sua vontade? Mas, ó homem, quem és tu, que a Deus replicas? Porventura a coisa formada dirá ao que a formou: Por que me fizeste assim? Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra?” (Rm 9:17-21).
“E vi o céu aberto, e eis um cavalo branco; e o que estava assentado sobre ele chama-se Fiel e Verdadeiro; e julga e peleja com justiça. E os seus olhos eram como chama de fogo; e sobre a sua cabeça havia muitos diademas; e tinha um nome escrito, que ninguém sabia senão ele mesmo. E estava vestido de uma veste salpicada de sangue; e o nome pelo qual se chama é a Palavra de Deus. E seguiam-no os exércitos no céu em cavalos brancos, e vestidos de linho fino, branco e puro. E da sua boca saía uma aguda espada, para ferir com ela as nações; e ele as regerá com vara de ferro; e ele mesmo é o que pisa o lagar do vinho do furor e da ira do Deus Todo-Poderoso. E no manto e na sua coxa tem escrito este nome: Rei dos reis, e Senhor dos senhores” (Ap 19:11-16).
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O pregador profetizou que eu encontraria emprego?
Você disse que o pregador “profetizou” que viu um carimbo em seu nome e algum tempo depois você encontrou um emprego com carteira assinada. Considerando que com ou sem “profecia” você teria arranjado emprego de qualquer jeito (o que faz de uma profecia assim algo inútil ou mera adivinhação), num país com tantos desempregados alguém pode profetizar isso todos os dias para diferentes audiências e alguns acharem que a profecia se cumpriu. O difícil teria sido ele profetizar que você não encontraria emprego e isso se cumprir.
Isto ocorre em razão de um aspecto psicológico de nossa mente que faz com que ninguém se importe de se lembrar das tantas vezes que alguém fez uma previsão e não aconteceu. Todos os anos os jornais falam de algum “astrólogo” cujas previsões se cumpriram no ano que findou, mas nenhum jornal fala dos astrólogos que erraram porque faltaria papel para publicar tudo. No caso de sua “profecia de emprego”, algo que lhe foi falado sem data para se cumprir sempre vai ter a possibilidade de acontecer ainda que seja daqui a 50 anos. Para você entender como funciona esse tipo de “profetada”, vou contar duas historinhas para você entender o comportamento humano, uma de ilustração e outra real.
Um sujeito tinha um burro e este adoeceu e morreu. Todos na vila sabiam que ele tinha um burro, mas ninguém ficou sabendo da morte do animal. Aproveitando-se da ignorância do povo, ele lançou uma rifa para sortear o burro ao custo de cinquenta centavos cada bilhete. Muita gente comprou e a rifa rendeu quinhentos reais, mas obviamente apenas um ganhou. Quando ele entregou o burro morto o homem pediu seu dinheiro de volta e ele devolveu os cinquenta centavos ficando com quatrocentos e noventa e nove reais e cinquenta centavos, o que ainda foi um bom negócio. Nenhum dos que não foram sorteados se importou em reclamar os cinquenta centavos.
O outro caso me contaram como real, mas vou resumir porque o processo era mais longo e envolvia mais gente. Um golpista pegou uma lista de cem pessoas que costumavam apostar em corridas de cavalo e enviou cem cartas pelo correio dando uma dica para o próximo prêmio. Em dez cartas ele colocou que o ganhador seria o cavalo “A”, em dez o cavalo “B” e assim por diante. Como havia dez cavalos no páreo, ao menos um cavalo ganhou e quem recebeu justamente a carta com aquela dica, tendo ou não apostado, ficou sabendo que o remetente da dica sabia das coisas. Obviamente os dez deste caso não conheciam as outras 90 cartas com dicas erradas que outros receberam.
O passo seguinte do golpista foi enviar dez cartas, uma para cada pessoa do grupo do cavalo ganhador, e mais uma vez cada carta tinha um cavalo diferente como ganhador. No final um ganhou e este já estava convicto de que o remetente conhecia mesmo os resultados das corridas, pois no caso dele acertou “todas”. Lembre-se que também desta vez o que recebeu a carta com a dica certa não sabia das outras nove cartas com dicas erradas.
Então o golpista apareceu na casa desse “ganhador” e fez uma proposta para o grande páreo da semana seguinte: ele entraria com a dica e se responsabilizaria em fazer a aposta, e o outro com um volume grande de dinheiro para apostar. Não preciso explicar o que aconteceu com o dinheiro da vítima.
Esses que saem por aí disparando “profetadas” a torto e direito não têm escrúpulos, tanto em semear falsas esperanças nas pessoas, como às vezes levá-las a tomar decisões erradas que podem arruinar uma vida ou uma família. Conheci pessoas de uma seita em que a “pastora” profetizava que algumas pessoas ali deviam se separar de seu cônjuge para se casar com outro membro da igreja, e o surpreendente é que alguns seguiram aquela falsa profetiza e destruíram suas famílias.
Deus previu que essas coisas aconteceriam e deixou um alerta em Deuteronômio 18:20, 22: “O profeta que tiver a presunção de falar alguma palavra em meu nome, que eu não lhe tenha mandado falar… esse profeta morrerá. Quando o profeta falar em nome do Senhor, e essa palavra não se cumprir, nem suceder assim; esta é palavra que o Senhor não falou; com soberba a falou aquele profeta; não tenhas temor dele”. Se ainda vivêssemos nos tempos da Lei dada a Israel iriam faltar pedras para apedrejar todos os falsos profetas e profetizas que se apresentam nos púlpitos de algumas igrejas pentecostais e neopentecostais. O objetivo deles é encher o ego de suas audiências e o próprio bolso com as ofertas.
Então como saber se as manifestações vistas em algumas igrejas vêm mesmo do Espírito Santo? Existem vários cuidados que podem ser tomados, e um deles está em 1 Coríntios 12:7-10 que começa dizendo que “a manifestação do Espírito é dada a cada um, PARA O QUE FOR ÚTIL”. Portanto a manifestação do Espírito tem um objetivo utilitário, ou seja, não é mera exibição de poder, adivinhação ou algo como um número de mágico de circo. Também não tem nada a ver com pessoas histéricas sapateando, dando piruetas, rodopiando e fazendo malabarismos. Qualquer pessoa com um mínimo de bom senso, diante de algo assim, perguntaria: “Que utilidade tem isso?”.
Para quem vive atrás de profecias, premonições, revelações, etc., aqui vai uma dica sobre o funcionamento de nosso cérebro: Nós mesmos costumamos ter mil “premonições”, e então quando uma se realiza o nosso cérebro se esquece das 999 que não se realizaram e nem cogita ter sido apenas coincidência, ou um caso de “déjà vu”. A expressão significa uma forma de ilusão da memória que leva o indivíduo a crer já ter visto ou vivenciado alguma coisa ou situação de fato desconhecida ou nova para si. Às vezes chamado de paramnésia. A psiquiatria explica assim:
“O cérebro possui vários tipos de memória, como a memória imediata, responsável, por exemplo, pela capacidade de repetir imediatamente um número de telefone que é dito – e logo em seguida esquecê-lo; a memória de curto prazo, que dura algumas horas ou dias, mas que pode ser consolidada; e a memória de longo prazo, que dura meses ou até anos, exemplificada pelo aprendizado duma língua. O déjà vu ocorre quando há uma falha cerebral: os fatos que estão acontecendo são armazenados diretamente na memória de longo ou médio prazo, sem passar pela memória imediata, o que nos dá a sensação de o fato já haver ocorrido” (fonte Wikipedia).
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O que cometi foi adultério?
Você escreveu dizendo que cometeu adultério por sofrer o que chamou de “influências”, mas também admitiu que “em parte” foi culpa sua. Você disse estar profundamente arrependido e gostaria de saber se o que cometeu é adultério mesmo, pois está em dúvida se o que solteiros cometem é adultério ou isso vale apenas para casados.
Eu acho que a pergunta mais importante agora seria: Será que se arrependeu profundamente? Ao meu ver parece você estar agindo como Eva, que colocou a culpa na serpente, ou Adão, que colocou a culpa na mulher e em Deus que lhe dera uma esposa. O arrependimento genuíno é quando você reconhece que o pecado foi culpa sua e de mais ninguém. Caso contrário poderíamos culpar Satanás por todos os pecados, pois afinal é ele o tentador, não é? E Deus só precisaria julgar o diabo no final e todos sairiam livres.
Na Bíblia você encontrara pessoas com um arrependimento parcial assim, culpando outros por parte de sua queda. Além do caso de Adão e Eva, você encontra também Arão, que culpou o povo por ter feito o bezerro de ouro, Saul, que culpou o povo por não ter cumprido a ordem de Samuel, etc. Isso não é um arrependimento profundo, mas parcial. É como o caso do advogado que tentou provar que o que causou a morte da vítima foi a bala, não seu cliente. Me contaram isso como tendo sido um caso real.
Na Bíblia você encontra também aqueles que assumem totalmente sua culpa, pois sabem que se quisessem poderiam muito bem ter fugido do pecado, como fugiu José da esposa de Potífar. Se não fugiram foi porque quiseram pecar. Davi poderia ter culpado Bate-Seba que dormiu com ele, mas chegou a esse arrependimento individual quando reconheceu que o pecado era seu e de mais ninguém. Ele escreveu: “Contra ti, contra ti somente [EU] pequei, e [EU] fiz o que é mal à tua vista, para que sejas justificado quando falares, e puro quando julgares” (Sl 51:4). O filho pródigo também não culpou as más influências quando retornou ao pai: “Pai, pequei contra o céu e perante ti, e já não sou digno de ser chamado teu filho” (Lc 15:21).
Você encontra também pessoas que nem tinham culpa direta no pecado, porém o confessaram como se a culpa fosse deles, como fez Daniel que confessou o pecado de toda a nação dizendo: “Pecamos, e cometemos iniquidades, e procedemos impiamente, e fomos rebeldes, apartando-nos dos teus mandamentos e dos teus juízos” (Dn 9:5).
O exemplo máximo da culpa assumida é do Senhor Jesus, que sendo Deus e Homem e não tendo qualquer pecado e nada a ver com o pecado, foi feito pecado por nós na cruz onde também carregou, como se fossem seus, os pecados daqueles que veio salvar, e declarou ali profeticamente através do salmista: “Tu, ó Deus, bem conheces a minha estultice; e os MEUS PECADOS não te são encobertos” (Sl 69:5).
O que me surpreendeu foi que sua dúvida está em saber se o que cometeu é adultério ou não, já que você é solteiro e acredita que só seria adultério se fosse casado. Será que entendi que aquilo que está afligindo você é uma dúvida de semântica?! Bem, então isso pode ser resolvido com a ajuda de um dicionário ou glossário. Mas não creio que seu problema seja de Língua Portuguesa, e sim da falta de um exame mais aprofundado de seu coração para ver se não está se achando apenas meio pecador, como a garota que acha que está “meio grávida”.
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Posso jogar a Bíblia no lixo?
Você disse que sua mãe tem uma Bíblia bem velha, caindo aos pedaços, e que nem serve para dar a alguém. O que fazer com ela? Seria errado jogar uma Bíblia no lixo? Pode jogar no lixo, não é pecado não. Ou melhor, coloque no lixo de recicláveis. Se você visitar uma gráfica que produz Bíblias irá encontrar caixas de Bíblias que não passaram no controle de qualidade e serão descartadas. Às vezes pequenos defeitos, como alguma dobra em uma página, erro no corte, falha no material da capa, etc., são razões suficientes para elas serem jogadas no lixo.
Obviamente se você jogar fora uma Bíblia não estará fazendo isso como um ato de desprezo a Deus, mas apenas por ter comprado uma Bíblia nova ou ter ficado impossível ler na antiga. Mas existem pessoas que fazem isso por outros motivos, como as que desdenham da Bíblia e fazem questão de usá-la como objeto desprezível, não estão desdenhando do livro em si, mas de Deus e sua Palavra inspirada. Inclua-se aí os que usam suas páginas para fumar maconha ou pendurá-las no banheiro como papel higiênico, como costuma fazer o ator Ian McKellen (o mago Gandalf de “O Senhor dos Anéis”). Em entrevista à revista “Details” ele, que é gay, contou que ganhou de amigos que também são gay um pacote de quarenta páginas de Levítico 18:22, passagem que condena o homossexualismo, e as pendurou em seu banheiro. Disse ele: “Estão em meu banheiro, mas é mais por curiosidade do que por ter a intenção de usá-las”. Ele também contou na entrevista que costuma arrancar essa página das Bíblias que encontra em quartos de hotéis onde fica hospedado.
Se os que desdenham estão no extremo da rebelião contra Deus, os que adoram o objeto Bíblia se enquadram na idolatria e superstição. Falo de pessoas que acham que uma Bíblia aberta na sala de casa ou no balcão da loja ou escritório pode dar sorte. Alguns colocam também um vaso com plantas como “Espada de São Jorge” e “Comigo Ninguém Pode”, um terço e uma vela para reforçar, ou penduram uma figa no retrovisor do carro e amarram uma fitinha que ganharam em Salvador no para-choque traseiro para ninguém bater (Uma fitinha?! Sério?!). Acreditar que objetos tenham poder de causar bem ou mal não é atitude cristã. É fazer como fazem os pagãos. É claro que existem objetos que podem causar danos, como balas, punhais, granadas, etc., mas não é disso que estou falando, e sim de amuletos como o pé de coelho. Veja você que o pobre animal tinha quatro pés e mesmo assim foi morto.
Se fosse pecado descartar uma Bíblia velha impressa em papel, também seria pecado deletar uma Bíblia eletrônica do celular ou computador. Já imaginou você guardar todos os celulares e computadores que já teve só porque instalou uma Bíblia neles e não pode deletá-la? Mas pode ser o caso de você querer guardar uma Bíblia por questões sentimentais, e não há nenhum mal nisso. Eu mesmo tenho uma Bíblia velha que minha mãe usava, e a conservo porque posso vê-la em minha memória sentada todos os dias de manhã no sofá lendo e grifando suas páginas. Acho que é uma boa lembrança para ter comigo. Quando olho para o livro também me lembro de meu pai, sempre muito prático, que na falta de uma fita adesiva mais apropriada consertou a Bíblia com fita isolante para as folhas não se espalharem.
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O que significava “vida eterna” para um israelita?
Você perguntou qual era a concepção de “vida eterna” para um israelita vivendo nos tempos do Antigo Testamento, ou mesmo para aquele jovem rico que abordou Jesus perguntando como alcançá-la. A resposta é que para eles “vida eterna” era um conceito diferente daquilo que temos como salvos por Cristo, pois para o israelita “vida eterna” era mais no sentido de vida perene ou vida perpétua aqui na terra.
O céu não era a recompensa prometida aos israelitas, e sim uma vida de abundância, saúde e prosperidade na terra. Mas para o cristão, “tendo, porém, sustento, e com que nos cobrirmos, estejamos com isso contentes… a nossa cidade está nos céus, de onde também esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará o nosso corpo abatido, para ser conforme o seu corpo glorioso, segundo o seu eficaz poder de sujeitar também a si todas as coisas” (1 Tm 6:8; Fp 3:20-21).
No Antigo Testamento a promessa era que aquele que guardasse a Lei viveria pela lei, ou seja, não morreria. “Portanto, os meus estatutos e os meus juízos guardareis; os quais, observando-os o homem, viverá por eles… Ora Moisés descreve a justiça que é pela lei, dizendo: O homem que fizer estas coisas viverá por elas” (Lv 18:5; Rm 10:5). Agora você vai entender melhor o diálogo entre o jovem judeu rico e o Senhor no evangelho: “E eis que, aproximando-se dele um jovem, disse-lhe: Bom Mestre, que bem farei para conseguir a vida eterna? E ele disse-lhe: Por que me chamas bom? Não há bom senão um só, que é Deus. Se queres, porém, entrar na vida, guarda os mandamentos” (Mt 19:16-17).
Obviamente nenhum judeu conseguia guardar todos os mandamentos da Lei por serem todos pecadores, e o jovem mentia quando dizia que tudo tinha guardado desde a sua mocidade. Você teria coragem de dizer que tem guardado todos os mandamentos desde sua mocidade? E aquele que diz “não cobiçarás”? Nunca olhou para algo ou alguém com um sentimento de cobiça ou um desejo impuro em seu coração? Aquele jovem rico não iria obter vida eterna, no sentido judaico da expressão, pois acabaria morrendo antes de conseguir cumprir toda a Lei. Por isso Jesus, que era sem pecado e o único capaz de cumprir a Lei, nunca teria morrido se não tivesse entregado a própria vida. Ninguém o matou, ele entregou sua vida.
“Por isto o Pai me ama, porque dou a minha vida para tornar a tomá-la. Ninguém ma tira de mim, mas eu de mim mesmo a dou; tenho poder para a dar, e poder para tornar a tomá-la. Este mandamento recebi de meu Pai… E, quando Jesus tomou o vinagre, disse: Está consumado. E, inclinando a cabeça, entregou o espírito” (Jo 10:17-18; 19:30).
Portanto, a noção de “vida eterna” para um judeu era diferente da que é garantida ao cristão pela fé em Cristo. As promessas de vida no Antigo Testamento tinham o significado de uma vida que não terminaria aqui na terra, e assim será durante o reino de Cristo no milênio, quando haverá saúde para todos, e o apóstolo João descreve um “rio puro da água da vida, claro como cristal, que procedia do trono de Deus e do Cordeiro. No meio da sua praça, e de um e de outro lado do rio, estava a árvore da vida, que produz doze frutos, dando seu fruto de mês em mês; e as folhas da árvore são para a saúde das nações” (Ap 22:1-2).
Mas a vida eterna oferecida ao judeu e às nações no milênio não é a que qualquer um que crê em Cristo na presente dispensação pode desfrutar desde o momento em que creu. Esta “vida eterna” se trata da própria vida que vem de Deus, que não tem começo e nem fim. Lembre-se de que eterna não é algo sem fim, mas é algo sem começo também porque eternidade não inclui tempo.
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O pastor de minha igreja adota o título de Profeta. Isso é correto?
Depois de ler algo que escrevi onde expliquei que os dons de apóstolo e profeta só existiram no início da igreja, você ficou com dúvidas sobre o “pastor” da igreja que frequenta. Você disse que ele diz ser “profeta”, e você acredita que ele esteja dizendo isso no sentido de falar da Palavra de Deus. Sua dúvida é: Seria correto alguém hoje se intitular “Profeta”?
Em Efésios diz que Cristo, depois que subiu às alturas, “deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores, querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo” (Ef 4:11-12). Os dons de apóstolo e profeta realmente cessaram com a morte dos mesmos apóstolos e profetas do Novo Testamento e, portanto, não existem mais. Restam evangelistas, pastores e doutores.
Portanto não existe mais a profecia no sentido dado aos profetas do início, que era de revelarem a Palavra numa época onde ninguém podia dizer “Vamos abrir nossa Bíblia em..”. Eles não iam às reuniões da igreja com um livro nas mãos como fazemos hoje, mas a Palavra era revelada de primeira mão pelos apóstolos e profetas.
Hoje qualquer cristão quando fala da Palavra de Deus que já foi revelada e escrita, está profetizando no sentido de estar proferindo a Palavra de Deus. Então neste sentido sim, a carta aos Coríntios ensina que nas reuniões da igreja “falem dois ou três profetas, e os outros julguem… Porque todos podereis profetizar, uns depois dos outros; para que todos aprendam, e todos sejam consolados. E os espíritos dos profetas estão sujeitos aos profetas” (1 Co 14:29-32).
Mas isso é muito diferente de alguém usar “Profeta” como título ou função, o que seria uma grande pretensão principalmente quando diz que “todos podereis profetizar”. Deverão todos então usarem um crachá com o título “Profeta”? É claro que não. Isso é coisa mundana, tipo gente que gosta de ser chamado de “Doutor”. Você teria coragem de andar com um crachá escrito “Profeta” ou “Apóstolo”, ou qualquer título eclesiástico para se sobressair em relação aos seus irmãos? “Reverendo”, por exemplo, que é o mesmo que dizer: “Ei, vocês, sou Reverendo, sou digno de ser reverenciado!”.
Jesus criticou duramente os clérigos judeus e deixou bem claro que essa distinção entre clérigos e leigos não deveria existir entre seus discípulos, os quais seriam todos chamados simplesmente de “irmãos”. “E fazem todas as obras a fim de serem vistos pelos homens; pois trazem largos filactérios, e alargam as franjas das suas vestes, e amam os primeiros lugares nas ceias e as primeiras cadeiras nas sinagogas, e as saudações nas praças, e o serem chamados pelos homens; Rabi, Rabi. Vós, porém, não queirais ser chamados Rabi, porque um só é o vosso Mestre, a saber, o Cristo, e todos vós sois irmãos” (Mt 23:5-8).
Não se engane: a carne — e principalmente a carne religiosa — sempre irá querer ser alguém e principalmente alguém mais distinto e elevado que os demais irmãos. Por isso a religião cristã emprestou do judaísmo a noção da divisão da congregação entre “clero” e “leigos”. Os monges da Idade Média não tinham alguém em posição elevada entre eles, pois isso iria contra a própria filosofia de igualdade em que viviam nos mosteiros. Eles diziam que eram todos iguais entre si, por isso ninguém levava um título que o diferenciasse de seus irmãos. Como o ser humano sempre arranja um jeitinho, eles acabaram adotando para quem se sobressaía entre eles a expressão “O mais igual dentre os iguais”.
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Se somos sacerdotes não podemos beber vinho?
Você escreveu dizendo que na igreja que frequenta é proibido o consumo de bebida alcoólica entre os membros. O argumento usado ali é o de que os crentes em Cristo são hoje um sacerdócio santo e devem viver como viviam Aarão e os sacerdotes do Antigo Testamento, que não bebiam vinho. Será que existe fundamento para este argumento?
Se alguém não deseja beber bebida alcoólica, isso é uma decisão pessoal, e não falo aqui de embriagar-se, o que obviamente a Bíblia condena. Mas considerando que fomos ensinados por Jesus a até mesmo celebrar a ceia do Senhor com vinho, seria um exagero ir buscar na Lei do Antigo Testamento argumento para se abster totalmente do álcool. E mais exagero ainda querer se basear nas restrições dadas a Aarão e aos sacerdotes do judaísmo para determinar o modo como um cristão deve viver hoje.
Quando você perde de vista a razão da Lei e dos preceitos do Antigo Testamento que, para nós cristãos são símbolos, figuras e sombras, acaba criando regras que não cabem ao cristão. O ensino dos apóstolos é claro. O que foi escrito no Antigo Testamento teve sua função literal na época e tem sua função hoje para o cristão, porém na forma de princípios, figuras, sombras, exemplos, etc. “Ora, tudo isto lhes sobreveio como figuras, e estão escritas para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos séculos” (1 Co 10:11). “De sorte que era bem necessário que as figuras das coisas que estão no céu assim se purificassem; mas as próprias coisas celestiais com sacrifícios melhores do que estes” (Hb 9:23). “Portanto, ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa dos dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados, que são sombras das coisas futuras” (Cl 2:16,17).
Perca isso de vista e você nunca irá entender o Antigo Testamento e muito menos o Novo Testamento. Embora hoje os crentes sejam chamados de “sacerdócio santo” (1 Pe 2:5) e “sacerdotes” (Ap 1:6), isto não significa que são da tribo de Levi e da linhagem de Aarão, como era exigido da classe sacerdotal no judaísmo. Você alega que o sacerdócio levita era perpétuo, e realmente era porque o Senhor irá restaurá-lo no reino milenial na terra. Mas a igreja não tem nada a ver com a terra e nem com Israel. Sua cidadania é celestial. Repare que até nosso Salvador e Sumo Sacerdote não veio da tribo de Levi, mas de Judá.
Além disso a carta aos Hebreus até mesmo exorta a não nos ocuparmos com as coisas com que se ocupavam os sacerdotes levitas, quando diz: “Não vos deixeis levar em redor por doutrinas várias e estranhas, porque bom é que o coração se fortifique com graça, e não com alimentos que de nada aproveitaram aos que a eles se entregaram. Temos um altar, de que não têm direito de comer os que servem ao tabernáculo” (Hb 13:9-10).
É realmente triste que alguns cristãos finjam ser israelitas, e alguns até adotem “Levita” antes do nome. Será que não perceberam que Deus rejeitou toda aquela ordem de coisas do judaísmo e até permitiu a destruição do Templo, exortando os judeu-cristãos do primeiro século a saíram do arraial (Hb 13:13)?
Mas se você deseja seguir os mandamentos dados a Aarão para o sacerdócio (que era perpétuo porque Deus irá restaurá-lo para Israel no Milênio, não para a Igreja nos céus), então boa sorte. Mas é bom saber que terá de seguir também algumas outras obrigações, além de precisar ser da descendência de Aarão. Veja aqui a lista de coisas que um sacerdote não podia ser ou fazer: Não podia beber vinho e bebidas fortes (Lv 10:8-10) Não podia tocar um cadáver, exceto parente próximo (Lv 21:1-4) Não podia raspar a cabeça (Lv 21:5)
Não podia aparar a barba (Lv 21:5)
Não podia fazer tatuagem (Lv 21:5)
Não podia se casar com prostituta ou divorciada (Lv 21:7) Não podia deixar viver a filha que se prostituísse (Lv 21:9) Não podia se casar com mulher que não seja vigem (Lv 21:13-14) Não podia ter defeito algum (Lv 17)
Não podia ser cego. (Lv. 21:18)
Não podia ser coxo. (Lv. 21:18).
Não podia ter nariz chato. (Lv.21:18).
Não podia ter membros demasiadamente compridos. (Lv.21:18).
Não podia ter pé quebrado. (Lv.21:19).
Não podia ter a mão quebrada. (Lv.21:10).
Não podia ser corcunda. (Lv.21:20).
Não podia ser anão. (Lv.21:20).
Não podia ter defeito no olho. (Lv.21:20).
Não podia ter sarna. (Lv 21:20).
Não podia ter impinges. (Lv 21:20).
Não podia ter testículo mutilado. (Lv 21:20).
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Romanos 2 ensina salvação por obras?
Em Romanos 2 Paulo não está ensinando que a salvação eterna seja recebida por meio de boas obras. A passagem que citou é: “Ou desprezas tu as riquezas da sua benignidade, e paciência e longanimidade, ignorando que a benignidade de Deus te leva ao arrependimento? Mas, segundo a tua dureza e teu coração impenitente, entesouras ira para ti no dia da ira e da manifestação do juízo de Deus; o qual recompensará cada um segundo as suas obras; a saber: A vida eterna aos que, com perseverança em fazer bem, procuram glória, honra e incorrupção; mas a indignação e a ira aos que são contenciosos, desobedientes à verdade e obedientes à iniquidade; tribulação e angústia sobre toda a alma do homem que faz o mal; primeiramente do judeu e também do grego; glória, porém, e honra e paz a qualquer que pratica o bem; primeiramente ao judeu e também ao grego; porque, para com Deus, não há acepção de pessoas” (Rm 2:4-11).
Se reparar você verá que a própria passagem diz que é “a benignidade de Deus” que leva uma pessoa ao arrependimento, ou seja, a salvação começa em Deus, não no homem; começa de cima, não de baixo, e se nos aprofundarmos no assunto veremos que ela começa na eternidade, e não no tempo. Da nossa parte tudo o que é exigido é a fé na Palavra de Deus e na Pessoa de Jesus, o Salvador. Quando os discípulos perguntaram “Que faremos para executarmos as obras de Deus?” a resposta de Jesus foi “A obra de Deus é esta: Que creiais naquele que ele enviou” (Jo 6:28-29).
Portanto a salvação começa na maior de todas as obras que alguém pode fazer, que é crer naquele que Deus enviou ao mundo — o seu Filho Eterno — para morrer no lugar do pecado. O andar do crente e suas boas obras são resultado de uma fé genuína assim, e foram preparadas por Deus, como também afirma Paulo em Efésios 2: “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie; porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas” (Ef 2:8-10).
Usar a passagem de Romanos como argumento de que a vida eterna seja recebida por obras é ignorar as dezenas de passagens na Bíblia que afirmam que a salvação, justificação ou vida eterna é recebida pela fé. Só para citar algumas: “Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra, e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida” (Jo 5:24); “Tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo” (Rm 5:1); “Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que creem no seu nome” (Jo 1:12). Alguém contou mais de 150 passagens da Bíblia que falam da fé que salva.
O que diz em Romanos, que “recompensará cada um segundo as suas obras; a saber: a vida eterna aos que, com perseverança em fazer bem, procuram glória, honra e incorrupção…” pode ser também entendido como a recompensa estar sendo dada aos que buscam glória, honra e incorrupção, coisas que só podem ser encontradas em Cristo. Mas também acredito que possa ser entendida mais ou menos como o professor que entra na sala de aula e diz:
“Ontem eu disse a vocês que reprovaria quem não acreditasse em mim e viesse para a aula sem o trabalho que mandei fazer. Hoje vamos ver quem realmente creu em mim. Apresentem seus trabalhos!”.
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O que é pregar o evangelho?
Pregar o evangelho é primeiro ter em mente que “as armas da nossa milícia não são carnais, mas sim poderosas em Deus para destruição das fortalezas; destruindo os conselhos, e toda a altivez que se levanta contra o conhecimento de Deus, e levando cativo todo o entendimento à obediência de Cristo” (2 Co 10:4).
Embora o assunto específico de Paulo neste capítulo fosse outro, o princípio que ele estabelece aqui é útil em muitas circunstâncias, principalmente na evangelização. Primeiro, porque o cristão não milita usando de esforços, energia e inteligência humanas, mas movido pelo Espírito Santo. Nenhuma universidade ou seminário humano faz um evangelista, pois é um dom dado pelo próprio Senhor, que “concedeu… uns para evangelistas” (Ef 4:11). Ainda que nem todos tenham o dom, todo cristão é exortado a fazer “o trabalho de um evangelista” (2 Tm 4:5).
Segundo, a destruição dos conselhos ou argumentos não se dá por raciocínios falazes construídos por ciência humana, mas pelo poder intrínseco à Palavra de Deus, pois “o evangelho… é o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê” (Rm 1:16). Se alguém não for convencido pela Palavra de Deus aplicada pelo Espírito na alma, Palavra esta da qual o evangelista é apenas um portador, não haverá conversão genuína.
É graças a essa mesma Palavra que muitas pessoas acabam se convertendo em pregações de homens ímpios que só estão interessados em arrancar dinheiro delas, pois no momento em que um desses mesmos homens, provavelmente incrédulos, lê um versículo da Palavra de Deus, é como se ele lançasse sobre sua audiência uma bomba atômica que ele mesmo jamais teria capacidade de construir. Por isso é bom sempre ter em mente que, se algum dia você foi convertido a Cristo, isso não foi por causa da “igreja” que frequentou ou pelo pregador que pregou. Foi a Palavra de Deus que exerceu seu poder sobre sua alma.
Finalmente, o cristão sábio saberá levar “cativo todo o entendimento à obediência de Cristo”, ou seja, evitará ao máximo sair do foco. Um incrédulo quando colocado “na parede” irá querer escapar lançando bombas de fumaça para longe de si para atrair o cristão para questões que não têm a menor importância da perspectiva do Evangelho.
Pregar o evangelho a alguém é um exercício de tautologia, isto é, dizer sempre a mesma coisa sob diferentes ângulos e não meramente satisfazer a curiosidade humana ou saciar algum desejo de paz, tranquilidade, prosperidade, saúde, etc., para a vida aqui. Levar o entendimento cativo é pregá-lo na cruz como Cristo foi pregado, e certificar-se de que seu ouvinte não saia dali até que possa sair nova criação, ressuscitado com Cristo pela fé nele.
Pregar o evangelho é ajudar seu ouvinte a chegar naquele ponto em que ele de si mesmo confesse com sua boca que crê em Jesus e tem nele o seu Senhor, e não mandá-lo repetir algum mantra do tipo “EU… eu… CREIO… creio… EM JESUS… em Jesus…”. É poder ouvir dele, não repetindo as palavras do que pregou, mas tendo elas nascidas em seu próprio peito: “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim” (Gl 2:20).
Pregar o evangelho é ajudá-lo a chegar a considerar-se morto com Cristo e participante da mesma graça de Deus que…
“…sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo, —pela graça sois salvos, e, juntamente com ele, nos ressuscitou, e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus; para mostrar, nos séculos vindouros, a suprema riqueza da sua graça, em bondade para conosco, em Cristo Jesus. Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie. Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas” (Ef 2:4-10).
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Você participa de debates?
Já fui convidado algumas vezes para debates em programas de rádio e TV e também para entrevistas em sites, jornais e revistas. Sempre respondo deixando claro que só participo dessas mídias quando o assunto é meu trabalho profissional de consultor e palestrante e para falar de temas de negócios. Nunca participo para falar de temas ligados ao evangelho porque é terreno pantanoso.
Geralmente esses programas e publicações possuem uma agenda, que é a de promover alguma religião, conquistar simpatizantes ou vender espaço para publicidade. Além disso, a confusão que reina hoje na chamada cristandade é tão grande que eu correria o risco de ficar meia hora debatendo com alguém que rejeita as verdades cardeais da fé cristã e até mesmo a divindade de Cristo, apesar de trazer sobre si algum título eclesiástico cristão.
Um dia uma emissora de TV me convidou para um debate sobre igreja e pelo fato de eu estar congregado somente ao Nome do Senhor, fora das denominações. Como sempre faço em casos assim, não aceitei, e educadamente coloquei minhas razões. Depois alguém me mandou um vídeo desse programa, e vi que a pessoa que haviam convidado em meu lugar era um sujeito totalmente herege que afirmava não congregar nas denominações, estar fora do sistema religioso, etc. Havia também um pastor e teólogo, além do apresentador do programa que devia ser também um pastor de alguma igreja.
Foi um verdadeiro desastre porque o apresentador e o teólogo pastor ficavam abismados com as bobagens que dizia o sujeito que afirmava ser cristão congregado fora do sistema religioso. Numa situação como aquela eu até acabaria ficando do lado dos dois pastores e criando um mal entendido. Além de situações inesperadas como essa, programas assim são uma armadilha, por isso evito participar para não entrar numa saia justa. Assim também evito que alguém pense que eu tenha alguma coisa a ver com a igreja que promove o debate.
Lembro-me de algo que aconteceu há muitos anos, quando eu era diretor de uma empresa de Tecnologia da Informação. Tínhamos uns dos primeiros provedores de internet do Brasil e extávamos com um stand em uma feira de Tecnologia, quando veio uma equipe da TV para uma entrevista ao vivo. Sugeri ao repórter que falássemos sobre os aspectos educacionais da Internet, de como as crianças poderiam fazer trabalhos pesquisas, trabalhos escolares, aprender mais etc.
Quando entramos no ar o entrevistador repórter improvisou uma abertura mais ou menos assim: “Estamos aqui com o Sr. Mario Persona, diretor da empresa tal, e estávamos até agora olhando as páginas do site da Playboy na Internet, com essas garotas maravilhosas, etc.”. Ele inventou aquilo! Ele inventou para quebrar o gelo e criar uma situação cômica na abertura da entrevista, e você já pode imaginar com que cara eu apareci na TV.
O grande problema que estávamos tendo na empresa na época era de mães que cancelavam a assinatura de Internet, preocupadas que seus filhos tivessem acesso a pornografia, e o repórter me abre a entrevista com uma bobagem desse tamanho! Se já é complicado dar entrevistas quando envolve negócios, fica mais difícil ainda quando a entrevista envolve o Evangelho e é feita por alguém que pode querer “esquentar” as perguntas para tornar o programa mais interessante para sua audiência.
Recebo verdadeiros xingamentos de leitores e espectadores por eu não permitir comentários em meus textos e vídeos nos quais falo da Palavra de Deus. A própria maneira desrespeitosa desses que me xingam já demonstra que estavam ávidos por um palco para derramarem suas ideias profanas. Mas não é apenas por isso que fecho a área de comentários, mas sigo também o que estão fazendo os principais sites do mundo para evitar ações por danos morais. Quando ocorre um crime de calúnia nos comentários o dono do canal pode ser envolvido como corresponsável.
Muitos dos que me procuram para debater algo mesmo em correspondência privada, mas simplesmente pelo prazer do debate, costumam se apresentar candidamente como quem está desejando apenas aprender o que penso. Mas tão logo apresento “a razão de minha fé” com base nas Escrituras é provável que ele parta para o ataque. Então expressões como “ignorante”, “imaturo”, “mente fechada”, “dono da verdade”, “idiota”, “falso profeta”, etc. passam a fazer parte de seu acervo de adjetivos, até chegar ao “covarde”, que é quando você diz que prefere retirar-se do debate porque aquilo não vai levar a coisa alguma.
A Bíblia nos exorta a estarmos sempre preparados para defender aquilo que cremos: “Antes, santificai ao Senhor Deus em vossos corações; e estais sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós, tendo uma boa consciência, para que, naquilo em que falam mal de vós, como de malfeitores, fiquem confundidos os que blasfemam do vosso bom porte em Cristo” (1 Pe 3:15-16).
Existem também aqueles que fazem vídeos refutando o que falei, inclusive usando trechos de meus vídeos para em seguida desconstruírem meus argumentos. Geralmente são ateus, Testemunhas de Jeová, ou membros de outras seitas heréticas, pessoas que não creem na divindade de Cristo, não creem na Trindade, não creem na salvação pela fé, na graça de Deus, e nas doutrinas básicas do cristianismo. Criam vídeos assim e depois me instigam desafiando: “E aí, você não vai responder?”, “E aí, você não vai falar nada?”, “Ô covarde, tem medo hein?”.
Teve um que enviou uma foto de um avestruz com a cabeça enfiada na terra me chamando de medroso. Outro, que viu algo que eu disse sobre a denominação à qual ele está aprisionado, a Torre de Vigia das Testemunhas de Jeová, enviou um vídeo ridicularizando, não só as minhas ideias, mas também a minha pessoa, com estas palavras: “Viu no que dá mexer com o vespeiro”? Obviamente, achei bem apropriado o termo que ele usou — “vespeiro” — porque vespeiro é um lugar que tem vespas, tem ferrão, tem veneno, mas não tem mel, não tem nenhuma graça, não tem nenhum sabor, nenhuma doçura. Não passa de um lugar de regras, ordens e escravidão.
Por isso é preciso ter sabedoria em distinguir se aquilo que se nos apresenta como uma oportunidade de expressarmos nossa fé, como é o caso de uma entrevista, será ou não de proveito para salvos e perdidos. Hoje a coisa fica um pouco mais complicada, porque vivemos em um ocidente cristianizado onde a maior parte das pessoas sequer crê no Deus da Bíblia ou nela como sendo a Palavra de Deus.
Existem profecias na Bíblia que mostram que o Ocidente cristianizado será uma terra desolada durante o milênio, durante o Reino de Cristo aqui. Por que? Porque foi a terra mais abençoada com a Verdade do cristianismo, com a Verdade do Evangelho, e a que mais a rejeitou, apesar de suas catedrais. No entanto, aquelas terras como Arábia, Oriente e outras, que hoje são avessas ao cristianismo, mas não o deturpam como fez a cristandade, essas serão abençoadas. Você encontra isso nas profecias bíblicas para o Reino Milenial de Cristo.
Por isso hoje, num mundo ocidental cristianizado como este em que vivemos, qualquer argumento do tipo “a Palavra de Deus diz…” já não tem qualquer efeito sobre ouvintes que estão mais prontos a seguir suas próprias ideias, o que diz sua religião, seu líder, seu profeta, apóstolo, bispo, menos o que diz a Bíblia.
Acredito que os debates públicos entre cristãos professos tenham se popularizado por volta do terceiro século, quando o cristianismo foi oficializado como religião no Império Romano. Sem a ameaça da perseguição, que obviamente impedia cristãos de debaterem em público, e com o surgimento de heresias que denegriam a Pessoa e obra de Cristo, os chamados “pais da Igreja” se viram envolvidos em debates públicos. Fazendo isso eles acabavam atropelando a ordem dada pelo apóstolo inspirado em Tito 3:9-11, de não debater com hereges, mas apenas admoestá-los uma ou duas vezes e depois evitá-los.
“Não entres em questões loucas, genealogias e contendas, e nos debates acerca da lei; porque são coisas inúteis e vãs. Ao homem herege, depois de uma e outra admoestação, evita-o, sabendo que esse tal está pervertido, e peca, estando já em si mesmo condenado” (Tt 3:9-11).
Ao contrário do que pensam muitas religiões cristãs católicas e protestantes, não são os “pais da Igreja” o exemplo e doutrina que temos de seguir, mas o que ensinam as escrituras inspiradas dadas aos apóstolos e profetas do Novo Testamento. Paulo participava de debates com judeus nas sinagogas e lugares públicos, mas era com o objetivo de evangelizar. O mesmo faziam outros discípulos, como Apolo, que colocou sua eloquência e facilidade de comunicação a serviço do Senhor depois de ter sido devidamente instruído por Priscila e Áquila:
“E chegou a Éfeso um certo judeu chamado Apolo, natural de Alexandria, homem eloquente e poderoso nas Escrituras. Este era instruído no caminho do Senhor e, fervoroso de espírito, falava e ensinava diligentemente as coisas do Senhor, conhecendo somente o batismo de João. Ele começou a falar ousadamente na sinagoga; e, quando o ouviram Priscila e Áquila, o levaram consigo e lhe declararam mais precisamente o caminho de Deus. Querendo ele (Apolo) passar para a Acaia, os irmãos animaram-no, e escreveram aos discípulos que o recebessem. Tendo ele chegado, auxiliou muito aqueles que pela graça haviam crido; pois com grande poder refutava publicamente os judeus, mostrando pelas Escrituras que Jesus era o Cristo” (At 18:24-28).
O que Priscila e Áquila fizeram foi corrigir Apolo, algo que todo cristão deveria fazer ao encontrar um cristão que está animado, que quer levar a Palavra, levar o Evangelho. Corrigir, e não apagar essa vela. Se encontrar alguém assim, encaminhe, mas não apague essa chama, por favor, não apague essa chama. O próprio Senhor Jesus não veio pisar o fogo que estava queimando ou a cana quebrada. Mesmo para aquela mínima fé, aquela chaminha pequenininha, ele veio dar mais oxigênio. E assim deve ser: um cristão não deve pisar no pescoço daquele que está animado a levar a Palavra, mas que ainda tem umas arestas que precisam ser aparadas. Ele se senta com ele, ajuda, explica, corrige. Foi o que Priscila e Áquila fizeram com Apolo.
Em outras ocasiões podemos aprender do modo como Paulo lidava com isso quando os ouvintes endureciam o coração e passavam a blasfemar. Aí ele tinha um comportamento seletivo seguindo a ordem de Jesus de não lançar suas pérolas aos porcos, como mostra esta passagem:
“E, entrando na sinagoga, falou ousadamente por espaço de três meses, disputando e persuadindo-os acerca do reino de Deus. Mas, como alguns deles se endurecessem e não obedecessem, falando mal do Caminho perante a multidão, retirou-se deles, e separou os discípulos, disputando todos os dias na escola de um certo Tirano. E durou isto por espaço de dois anos; de tal maneira que todos os que habitavam na Ásia ouviram a palavra do Senhor Jesus, assim judeus como gregos” (At 19:8-10).
Precisamos ter este discernimento de parar de debater ou pregar quando vemos uma oposição que comece a denegrir a doutrina, a corromper a Verdade, a rebaixar a Pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo. Aí é hora de parar. Se você encontrou um desses, sejam eles Testemunhas de Jeová, mórmons ou espíritas, que não creem na divindade de Cristo, pare! Vá embora e vá conversar com quem está desejoso de conhecer a Verdade, de conhecer a salvação que há na pessoa de Cristo Jesus, não numa religião, não numa organização religiosa.
Nem sempre um debate é construtivo, pois existem aqueles irmãos que Paulo chama de “enfermos” ou “débeis na fé”, que podem ser sensíveis demais para suportar uma discussão e acabarem desanimando. “Ora, quanto ao que está enfermo na fé, recebei-o, não em contendas sobre dúvidas… tomai o propósito de não pordes tropeço ou escândalo ao vosso irmão… Assim, pois, seguimos as coisas da paz e também as da edificação de uns para com os outros” (Rm 14).
A Timóteo Paulo orienta a evitar debates, que chama de “contendas de palavras”. “Recomenda estas coisas. Dá testemunho solene a todos perante Deus, para que evitem contendas de palavras que para nada aproveitam, exceto para a subversão dos ouvintes” (2 Tm 2:14).
João em sua epístola nos ensina a lidar com os que negam a divindade de Cristo, que é o assunto do que ele chama de “doutrina”, ou seja, que não aceita que Jesus tenha vindo em carne, uma expressão que é muito mais ampla do que o fato de ter nascido. Jesus vir em carne implica sua pré-existência como Filho Eterno de Deus, o Criador de todas as coisas que em um determinado momento entrou na história do mundo na forma humana.
Ainda que algumas religiões heréticas, ou baseadas em paganismo ou anticristãs, possam às vezes até afirmar que Jesus estava num plano elevado, era um espírito privilegiado antes de vir ao mundo, e que entrou num corpo humano ou algo assim, não é isso que a Bíblia ensina. Ele é Deus, e antes dele, nada do que foi feito se fez. Ele fez todas as coisas. Ele é Deus Criador. Mas para isso nós teríamos de entrar em outro assunto, que é a Trindade, uma doutrina rechaçada pelos que não têm a Verdade.
“Porque já muitos enganadores entraram no mundo, os quais não confessam que Jesus Cristo veio em carne. Este tal é o enganador e o anticristo… Todo aquele que ultrapassa a doutrina de Cristo e nela não permanece não tem Deus; o que permanece na doutrina, esse tem tanto o Pai como o Filho. Se alguém vem ter convosco e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem lhe deis as boas-vindas. Porquanto aquele que lhe dá boas-vindas faz-se cúmplice das suas obras más” (2 Jo 1:7, 9-10).
Às vezes alguém pode dizer: “É, mas a religião tal não crê na divindade de Cristo, mas eles afirmam que ele veio em carne, porque ele existia antes de vir em carne”. Veja que não é apenas a questão de ele vir em carne, mas de saber que ele era Deus já na eternidade. Essa é a doutrina. Além disso, João não está falando daqueles que duvidam que Jesus nasceu, pois lembre-se de que ele escreveu isso numa época e lugar onde e quando a notícia do nascimento e vida de Jesus já era um fato comum e corrente entre muitas pessoas.
Neste ponto você deve estar querendo que eu responda de forma breve se deve ou não participar de um debate público com outros cristãos. Considerando a profusão de erros e heresias existente hoje na cristandade, eu não aconselharia. Uma coisa é você refutar publicamente esses erros em textos, áudios e vídeos, outra é debater, pois no debate ambos têm igual direito de apresentar suas razões.
Vale aqui o ditado popular, ‘São precisos dois para se dançar o tango’, ou seja, sem você para debater publicamente, o herege não terá a chance de destilar seu veneno para uma audiência que talvez não iria ouvir um “disco solo” do herege, mas que compareceu ao debate por apreciar o que você prega ou ensina. Então que não seja você a proporcionar ao herege o holofote que ele está procurando ou, como alguém disse, ‘viajar ao seu lado só para usar sua janelinha’.
A Bíblia nos exorta: “Não saia da vossa boca nenhuma palavra torpe, mas só a que for boa para promover a edificação, para que dê graça aos que a ouvem” (Ef 4:29). Então seja sábio e não dê chance ao outro de sair da boca dele palavras torpes que não irão promover edificação ou graça aos ouvintes.
Uma outa questão que você fez bem em lembrar é a atitude de alguns que participam desses debates como se estivessem em um ringue buscando um prêmio por suas ideias. Então não se privam de humilhar os outros para poderem aparecer como vencedor. No entanto, nas coisas de Deus ninguém é convencido por inteligência humana, mas pelo Espírito e poder de Deus. Paulo deixou muito claro o modo como ele se apresentou aos gregos de Corinto quando levou a eles a mensagem do Evangelho:
“E eu, irmãos, quando fui ter convosco, anunciando-vos o testemunho de Deus, não fui com sublimidade de palavras ou de sabedoria. Porque nada me propus saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado. E eu estive convosco em fraqueza, e em temor, e em grande tremor. A minha palavra, e a minha pregação, não consistiram em palavras persuasivas de sabedoria humana, mas em demonstração de Espírito e de poder; para que a vossa fé não se apoiasse em sabedoria dos homens, mas no poder de Deus” (1 Co 2:1-5).
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Os salvos no céu veem o que ocorre na terra?
Alguém perguntou se os salvos no céu estariam vendo o que acontece na terra. A Bíblia não diz que os salvos estejam no céu ocupados com o que está acontecendo na terra, mas diz que eles estão ocupados com Cristo. No caso dos mártires da Grande Tribulação tudo indica que eles terão ciência do que seus irmãos estarão passando na terra, pois pedem vingança:
“E, havendo aberto o quinto selo, vi debaixo do altar as almas dos que foram mortos por amor da palavra de Deus e por amor do testemunho que deram. E clamavam com grande voz, dizendo: Até quando, ó verdadeiro e santo Dominador, não julgas e vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra? E foram dadas a cada um, compridas vestes brancas e foi-lhes dito que repousassem ainda um pouco de tempo, até que também se completasse o número de seus conservos e seus irmãos, que haviam de ser mortos como eles foram” (Ap 6:9-11).
Mas não sei se eles clamam porque estão vendo o sofrimento dos que estão na terra, ou porque sabem o que eles estão passando porque eles mesmos terão vindo de lá e conservam a memória e a consciência. Acredito que esta última interpretação seja mais correta. Estes obviamente não são os salvos da presente dispensação, mas principalmente mártires do remanescente judeu fiel que irá se levantar depois do arrebatamento da igreja. Seria esta também a razão da preocupação do rico de Lucas 16:19-31 com o destino de seus irmãos que ainda estavam vivos quando ele deixou esta terra para entrar no Hades.
“Portanto nós também, pois que estamos rodeados de uma tão grande nuvem de testemunhas, deixemos todo o embaraço, e o pecado que tão de perto nos rodeia, e corramos com paciência a carreira que nos está proposta” (Hb 12:1).
Alguns interpretam esta passagem como se os salvos no céu estivessem todos debruçados no peitoril de uma grande sacada e assistindo de camarote o que acontece na terra, mas não creio que seja correta a interpretação. Me parece que a única coisa de que os salvos no céu são informados é a da conversão de alguém. Ao menos é o que diz a passagem:
“Digo-vos que assim haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento” (Lc 15:7).
Mas outra passagem acrescenta que essa alegria é “diante dos anjos de Deus”, o que parece indicar que estes sim estejam o tempo todo monitorando os acontecimentos aqui. “Assim vos digo que há alegria diante dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende” (Lc 15:10).
Leia também sobre o quanto seremos capazes de reconhecer no céu as pessoas que amamos na terra, e que seja de consolo em seu coração saber que depois de glorificados jamais seremos menos do que fomos em nossa vida aqui. Exceto o pecado e os pensamentos pecaminosos, teremos lembranças e consciência de nossa vida terrena, caso contrário, como iríamos nos regozijar da salvação que recebemos se nos esquecêssemos de onde Cristo nos tirou?
Mas que fique bem claro que isso não inclui os que morreram interferirem de algum modo ou ajudarem os que ainda estão vivos. Quando o rico pediu que alguém fosse enviado para seus irmãos não teve seu pedido atendido, pelo contrário, lhe foi dito que tudo o que os seus irmãos precisavam eles encontrariam nas Escrituras.
“E disse ele (o rico): Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes à casa de meu pai Pois tenho cinco irmãos; para que lhes dê testemunho, a fim de que não venham também para este lugar de tormento. Disse-lhe Abraão: Têm Moisés e os profetas; ouçam-nos. E disse ele: Não, pai Abraão; mas, se algum dentre os mortos fosse ter com eles, arrepender-se-iam. Porém, Abraão lhe disse: Se não ouvem a Moisés e aos profetas, tampouco acreditarão, ainda que algum dos mortos ressuscite” (Lc 16:27-31).
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Estarei seguro congregando fora das denominações?
Assisti a uma palestra de um especialista em segurança do trabalho que deu o exemplo de dois motoristas. Um seria dono de uma Hilux novinha, freios ABS, vários air bags e outros dispositivos de segurança. O outro, dono de um Chevette 1971 caindo aos pedaços. O motorista do Chevette, quando viaja a sessenta por hora e vê um caminhão a um quilômetro de distância, começa a bombear seu freio para a eventualidade de o caminhão estar parado na pista e poder conseguir frear quando chegar lá. O motorista da Hilux, todo confiante a cento e cinquenta por hora, deixa para frear quando está a poucos metros do caminhão.
O ponto que o palestrante queria ressaltar era que os EPIs ou Equipamentos de Proteção Individual adotados nas indústrias, como capacetes, botas, luvas, cintos, óculos, etc., nem sempre tornam o trabalho mais seguro, mas apenas elevam o nível de risco ao qual o trabalhador irá se sujeitar. Um trabalhador da construção civil não iria se arriscar a passar sem capacete sob alguém martelando algo no quinto andar, com medo de ser morto caso a ferramenta escapasse da mão do pedreiro. Mas com a falsa sensação de segurança que um capacete lhe dá ele irá se arriscar. O que ele não sabe é que um martelo caindo do quinto andar chegará ao seu capacete de plástico a oitenta quilômetros por hora. Seria fatal.
O mesmo exemplo serve para quem sai do sistema denominacional para congregar em um grupo de irmãos sem denominação achando que isso seja uma apólice de seguro contra o erro. Não é. Basta ler as epístolas à assembleia que estava em Corinto para ver as coisas escabrosas que estavam ocorrendo ali e precisaram da intervenção do apóstolo Paulo, como o caso do homem que dormia com a madrasta no capítulo 5 da primeira carta. “Geralmente se ouve que há entre vós fornicação, e fornicação tal, que nem ainda entre os gentios se nomeia, como é haver quem abuse da mulher de seu pai. Estais ensoberbecidos, e nem ao menos vos entristecestes por não ter sido dentre vós tirado quem cometeu tal ação” (1 Co 5:1-2).
Muitos grupos de cristãos que alegam estar congregados somente ao nome do Senhor e fora dos sistemas denominacionais podem ter doutrinas malignas que não são encontradas nem mesmo nas religiões cristãs tradicionais. Alguns desses grupos negam a divindade de Cristo, a Trindade, o pecado original, a salvação por graça, etc. Outros são divisões que ocorreram no passado entre irmãos congregados ao nome do Senhor, e os que se unem a eles não se dão ao trabalho de investigar sua origem que começou com um pecado ou ato de insubordinação de algum herege excluído da comunhão. A associação com o mal, ainda que por ignorância, pode contaminar.
Uma assembleia congregada ao nome do Senhor que exercite o julgamento conforme é exigido pela doutrina apostólica, obviamente estará menos propensa a ter o erro disseminado em seu meio, mas não devemos ser ingênuos ao ponto de pensar que o erro não possa existir em estado embrionário latente. Como só é possível julgar àquilo que conhecemos, quando o erro se manifesta e é trazido à tona, seguem-se medidas disciplinares que podem envolver o silenciamento daquele que ensina o erro ou até mesmo sua exclusão. O que é ensinado numa assembleia deve ser obrigatoriamente julgado, conforme ensina 1 Coríntios 14:29: “E falem dois ou três profetas, e os outros julguem”. Não é o caso de julgar a pessoa, mas sim suas palavras e ações. No capítulo 5 o apóstolo havia falado do julgamento do mal moral, mas aqui o assunto é o mal doutrinário, pois este também pode levedar toda a massa como no outro caso.
Todavia, nos tempos de ruína em que vivemos, nem sempre existe conhecimento e maturidade suficientes para exercitar esse julgamento, principalmente em assembleias mais novas onde todos estão crescendo praticamente juntos no conhecimento da sã doutrina. Mas o problema também pode ser encontrado entre irmãos de assembleias mais antigas, e aí não é por falta de conhecimento, mas por excesso de orgulho de possuir o conhecimento apenas no cérebro. Então a peneira fica mais discriminatória, como era a dos fariseus, coando mosquitos e deixando passar enormes camelos por pura conveniência. Grandes danos já foram causados em assembleias de irmãos congregados ao nome do Senhor por uma atitude do tipo: “Se foi o irmão Fulano que disse, então está tudo bem”. Devemos nos lembrar de que “daqui por diante a ninguém conhecemos segundo a carne” (2 Co 10:2).
Veja que até nos primeiros dias da igreja, e mesmo com discípulos de grande reputação entre os irmãos, o inimigo sempre encontrava uma brecha na carne desses para semear o erro, como estava acontecendo entre os cristãos da Galácia, assediados pelos judaizantes que plantavam a ideia de que os cristãos ainda estariam sob a Lei mosaica e seriam obrigados a observá-la. Paulo conta que foi a Jerusalém, e menciona os “falsos irmãos que se intrometeram, e secretamente entraram a espiar a nossa liberdade, que temos em Cristo Jesus, para nos porem em servidão; aos quais nem ainda por uma hora cedemos com sujeição, para que a verdade do evangelho permanecesse entre vós. E, quanto àqueles que pareciam ser alguma coisa (quais tenham sido noutro tempo, não se me dá; Deus não aceita a aparência do homem), esses, digo, que pareciam ser alguma coisa, nada me comunicaram… E, chegando Pedro à Antioquia, lhe resisti na cara, porque era repreensível. Porque, antes que alguns tivessem chegado da parte de Tiago, comia com os gentios; mas, depois que chegaram, se foi retirando, e se apartou deles, temendo os que eram da circuncisão. E os outros judeus também dissimulavam com ele, de maneira que até Barnabé se deixou levar pela sua dissimulação” (Gl 2:1-13).
Mas nem sempre os que Paulo chama de “falsos irmãos” semeiam sua má doutrina à luz do dia. Muitos a dissimulam misturando-a com verdades e especialmente apelando para os sentimentos de seus ouvintes. Conheci mais de um que, durante anos, ministrou o erro embutido em seu ministério com toques de sabedoria humana e também misticismo. Um deles, quando desmascarado pela assembleia onde congregava, acabou causando um cisma que abalou grandemente o testemunho por já ter feito vários discípulos entre os irmãos.
O herege de carteirinha costuma ser cuidadoso o suficiente para não vomitar suas heresias em público. Ele é mais ladino e atua nas sombras dos bastidores, convidando ora um, ora outro, para injetar neles pequenas doses de erro como faz um traficante com suas primeiras ofertas gratuitas. Os cordeiros do rebanho, mais tenros e vulneráveis, são assim viciados pelo afago do herege até chegarem ao ponto de considerarem uma injustiça quando a assembleia decide julgá-lo e excluí-lo da comunhão. Aí não é apenas aquela “estrela” sombria que é afastada, mas ela arrasta consigo todos os satélites que orbitavam ao seu redor atraídos pela gravidade de sua persuasão.
Então, voltando à questão original, que era se você estaria seguro saindo do sistema religioso para congregar com irmãos somente ao nome do Senhor, a resposta é “depende”. Primeiro, depende de você examinar bem a origem daqueles irmãos com os quais está se associando. Segundo, depende de ter discernimento para perceber qualquer ação de discipulado de bastidores, como o que mencionei. Terceiro, depende de ter em mente que todo ser humano, por mais que pareça ser alguma coisa ou tenha sido alguma coisa no passado, está sujeito a cair no engano e pecado. A única apólice de seguro que você pode ter em qualquer lugar ou circunstância é o Senhor, o apego à sua Palavra, e o discernimento de enxergar aqueles que porventura circulem entre os irmãos trazendo um anzol escondido em seu ministério para fisgar discípulos. Paulo falou disso ao se despedir dos anciãos de Éfeso:
“Porque eu sei isto que, depois da minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não pouparão ao rebanho; e que de entre vós mesmos se levantarão homens que falarão coisas perversas, para atraírem os discípulos após si. Portanto, vigiai, lembrando-vos de que durante três anos, não cessei, noite e dia, de admoestar com lágrimas a cada um de vós. Agora, pois, irmãos, encomendo-vos a Deus e à palavra da sua graça; a ele que é poderoso para vos edificar e dar herança entre todos os santificados” (At 20:29-32).
Um alerta especial cabe para estes novos tempos das redes sociais, pois aqueles que conhecemos no virtual nem sempre são a mesma coisa no real. As bandeiras “anti-denominação”, “anti-dízimo”, “anti-clero”, etc., acabaram se tornando tão fortes ao ponto de unirem cristãos, não à verdade ou ao nome do Senhor, mas ao ataque aos erros dos sistemas religiosos. Onde quer que você congregue fora das denominações, procure perguntar: “Se não existissem denominações, pastores corruptos, dízimos, venda de talismãs etc., será que ainda teríamos assunto ou motivo para congregar?” Se a resposta for não, sinto dizer que você não está congregado ao nome do Senhor, mas a alguma causa anti-igrejas.
Outro aspecto envolvendo Internet e redes sociais é que, se por um lado ficou mais fácil levar a Verdade a mais pessoas, o mesmo passou a valer para a mentira. Mas atenção, porque enquanto você está levando a Verdade no “atacado”, o herege tem sua estratégia voltada para o ‘varejo’. O que quero dizer é que ele teria um trabalho imenso pescando no oceano da cristandade em geral para perverter a mente de alguns, pois ali existe de tudo um pouco, e mais perdidos do que salvos. Por isso, ele estrategicamente procura jogar sua isca nas lagunas daqueles que se separaram do “atacado” com um propósito maior em guardar a Verdade.
Quando uma empresa contrata um vendedor, ela obviamente está interessada em sua capacidade de vender, mas muito mais em sua carteira de clientes, pois ainda que aquele vendedor amanhã venha a sair da empresa, sua lista de contatos irá ficar. E uma das estratégias dos hereges da era das redes sociais é justamente se valer dos contatos daqueles que ele considera que valerá a pena desviar da Verdade, e estes são encontrados em pequenos grupos. Já vi pessoas participarem de grupos ou comunidades virtuais de cristãos apenas para obter a “carteira de clientes” e depois abordar por fora um a um para vender suas ideias.
Portanto fica aqui o alerta e a solução. O alerta é que não basta se apartar da iniquidade, como ensina 2 Timóteo, mas também apartar-se dos vasos de desonra como ensina a continuação da passagem:
“Todavia o fundamento de Deus fica firme, tendo este selo: O Senhor conhece os que são seus, e qualquer que profere o nome de Cristo aparte-se da iniquidade. Ora, numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra. De sorte que, se alguém se purificar destas coisas, será vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra” (2 Tm 2:19-21). É preciso também atenção para com aqueles que promovem agitação em função de sua imaturidade pelas “paixões da mocidade” e seguir “a justiça, a fé, o amor, e a paz com os que, com um coração puro, invocam o Senhor” (2 Tm 2:22).
Alguns acreditam que o fato de participar de algum grupo ou comunidade com um propósito comum “anti-denominações” garanta algo, mas o objetivo deve ser sempre seguir “a justiça, a fé, o amor, e a paz com os que, com um coração puro — ou purificado do erro — invocam o Senhor”. Isso é a essência de estar congregado e em comunhão à mesa do Senhor, pois a admissão a esta implica em um julgamento feito previamente pela assembleia local quanto à idoneidade moral, doutrinária e eclesiástica da pessoa. Mas como já expliquei, isto é um bom capacete, mas não irá funcionar sem oração, discernimento e uma boa dose de prudência.
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O que teria acontecido se os judeus tivessem recebido Jesus?
Para sua dúvida sobre o que teria acontecido se os judeus tivessem recebido Jesus, acredito que um texto de Edward Dennett possa ajudar. Ele escreveu:
“Se os judeus tivessem recebido João Batista, eles teriam também recebido o Messias e o reino seria então estabelecido em poder. Então, se isso acontecesse, Malaquias 4:5-6 teria se tornado realidade no que diz respeito a João: “Eis que eu vos enviarei o profeta Elias, antes que venha o grande e terrível dia do Senhor e ele converterá o coração dos pais aos filhos, e o coração dos filhos a seus pais; para que eu não venha, e fira a terra com maldição.”.
Mas não foi o que aconteceu, pois apesar das multidões que se ajuntaram ao redor de João quando ele primeiro clamou “Arrependei-vos, porque é chegado o reino dos céus” (Mt 3:2), havia pouco exercício de consciência e quase nenhuma conversão do “coração dos pais aos filhos, e o coração dos filhos a seus pais”. Por fim, conforme sabemos, João morreu pelas mãos de seus executores em uma solitária prisão. Portanto, embora sua missão fosse “no espírito e poder de Elias” (Lc 1:17), e caso os judeus o tivessem recebido ele teria sido o Elias em tudo o que sua missão significava, não teria sido ele o cumprimento da profecia. Por isso Deus irá ainda enviar o “profeta Elias, antes que venha o grande e terrível Dia do Senhor” (Ml 4:5). Mesmo assim João Batista foi o mensageiro do Senhor e preparou o caminho diante dele ao anunciar a sua vinda e pregar o batismo de arrependimento. Apesar do pequeno número de pessoas que o receberam, ele sem dúvida alguma preparou o caminho do Senhor. (Veja João 1:35-51) – “Malachi or The State of Things in The End” – Edward Dennett.
Talvez você pergunte como ficaria a Igreja no caso de Israel aceitar seu Messias. Talvez este texto possa ajudar no entendimento de como as coisas funcionam na profecia:
“A Igreja não faz parte dos desígnios de Deus para com Israel na terra. A Igreja não pertence ao tempo, mas à eternidade. Ela não é terrena, mas celestial. Ela é chamada à existência durante um intervalo não previsto — uma pausa ou parêntese como consequência de o Messias ter sido cortado. Humanamente falando, se Israel tivesse recebido o Messias, então as setenta semanas ou quatrocentos e noventa anos teriam se cumprido; mas Israel rejeitou seu Rei, e Deus se recolheu ao seu lugar até eles reconhecerem sua iniquidade. Deus suspendeu suas tratativas públicas com Israel na terra, apesar de continuar controlando todas as coisas por sua providência e mantendo seus olhos sobre a semente de Abraão, sempre amada por causa daquele patriarca. Enquanto isso Deus está chamando da terra e de entre os gentios esse corpo chamado Igreja, para ser companheira de seu Filho na glória celestial — para estar completamente identificada com ele em sua atual rejeição aqui, e para aguardar em santa paciência o Seu glorioso advento” – “A Vinda do Senhor” – C. H. Mackintosh
O que você lê nos evangelhos deve entender que ali os discípulos estão na qualidade de judeus pertencentes a um remanescente que esperava pelo Messias. Depois de ser rejeitado, morrer e ressuscitar, Jesus enviou o Espírito Santo para formar a igreja. É como se Deus tivesse apertado a tecla “PAUSE” na “música” de Israel, o povo terreno de Deus, para tocar a “música” da Igreja, que é celestial.
Depois que a igreja for arrebatada Deus apertará a tecla “PLAY” e a “música” de Israel voltará a tocar com um remanescente judeu que irá aguardar o Messias, à semelhança dos discípulos nos evangelhos. Este remanescente pregará o evangelho do Reino e será perseguido, até Cristo descer dos céus com sua Igreja para estabelecer seu Reino de mil anos na terra destinado a Israel e as nações que estiverem aqui.
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Cristo é um mero conscientizador de meus erros?
Você escreveu contando que o pastor da igreja onde congrega ouviu você dizer que Cristo foi seu substituo na cruz e que você não entraria em juízo, e prontamente ele corrigiu sua afirmação, dizendo que estava errada. Segundo ele, o juízo de Deus continua pairando sobre nós a todo momento, e Cristo seria um mero conscientizador dos nossos erros e o meio para corrigi-los. Teria ele razão? Não, esse pastor está errado e você está certo.
Quando digo que é preciso pregar o evangelho a cristãos católicos, protestantes, evangélicos, etc. é a coisas assim que estou me referindo. A maioria das pessoas que enchem as igrejas nunca creu ou entendeu a obra expiatória de Cristo morrendo por nossos pecados e ressuscitando para nossa justificação. Continuam pensando em Jesus como um homem santo que veio nos dar exemplo de como devemos ser para irmos morar no céu.
Pensar assim não é muito diferente do que pensam os adeptos de religiões como o islamismo, budismo, hinduísmo, espiritismo… sempre tentando se justificar pela melhoria de si mesmos por seus próprios esforços, ou fazendo obras de caridade para merecer a salvação. A verdade é que por mais que Jesus tenha sido um exemplo de vida para nós, se ele não tivesse morrido e ressuscitado estaríamos perdidos eternamente. Por que você acha que a semente precisa cair no solo e morrer? Para dar um exemplo ou para multiplicar vida dando muito fruto?
Embora Cristo seja o melhor exemplo que temos do Homem perfeito, se você tentar imitar Jesus para obter a salvação, terá de começar sendo sem pecado, pois Jesus veio ao mundo sem pecado. O problema é que eu e você viemos ao mundo com uma natureza arruinada que nos fez pecadores desde a concepção. É impossível que, pela imitação, você se torne puro e sem pecado. Por mais que um cão imite um gato, o máximo que conseguirá talvez seja latir com um som de “miau”. Mas ele continuará sendo um cão em sua essência e natureza.
A verdade é que, na cruz, Jesus foi o “Substituto” perfeito; aquele que era sem pecado foi feito por Deus pecado por nós, e castigado com o juízo divino em três horas de trevas e abandono para então morrer no lugar do pecador. A sua morte, portanto, não apenas resolveu eternamente a questão do pecado como também foi o meio de salvação para aqueles que creem nele. Estes não passarão pelo juízo e poderão desfrutar desde já da salvação eterna, algo que infelizmente muitos dos que professam ser cristãos não desfrutam por não crerem verdadeiramente na obra substitutiva de Jesus.
“Aquele que não conheceu pecado, ele [Deus] o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Co 5:21).
“… carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados” (1 Pe 2:24).
“Pois também Cristo morreu, uma única vez, pelos pecados, o justo pelos injustos” (1 Pe 3:18).
“Mas ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados” (Is 53:5).
Para mim estes versículos são claros o suficiente para eu descansar em um sacrifício consumado e na certeza de que todos os meus pecados foram pagos na cruz. Não passarei sequer pelo juízo final, por ter sido salvo pela fé ainda em vida.
“Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna, não entra em juízo, mas passou da morte para a vida” (Jo 5:24).
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Qual nível de bondade devo atingir para ser salvo?
Se as pessoas soubessem o que é o pecado e a enormidade da ofensa aos olhos de Deus, entrariam naquele pânico de horror dos que estão no corredor da morte. A vida não é uma competição para decidir se podemos participar das Olimpíadas da bondade. A vida é a antessala de um tribunal para o encontro com Cristo como Juiz. A questão do ser humano é judicial, você está, de nascença, na condição de réu aguardando o julgamento.
“Como está escrito: Não há um justo, nem um sequer. Não há ninguém que entenda; Não há ninguém que busque a Deus. Todos se extraviaram, e juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem um só” (Rm 3:10-12).
Se nesse meio tempo você aceitar a graça de Deus crendo em Jesus e o recebendo como Salvador, receberá o perdão e vida eterna e escapará de ter de dobrar seus joelhos diante dele como Juiz e Algoz. Porque todo joelho se dobrará, com certeza, uns em vida, outros depois. Eventualmente o que assim creu e foi perdoado poderá receber também recompensa ou galardão se praticar as obras que Deus preparou para si, mas isso não é salvação.
Quem acha que pode chegar lá fundamentado na sua própria bondade é porque procura ser melhor que alguém que está um milímetro acima de si em bondade. Mas enquanto você se achar um pouquinho pior que a Madre Teresa de Calcutá, e bem melhor que um ladrão, homicida ou estuprador, não haverá salvação para você. Você se sente justo ao comparar-se com eles? Pois é, este é o seu problema, igual ao do fariseu que, no Templo de Jerusalém, se comparava com o publicano contrito.
“O fariseu, estando em pé, orava consigo desta maneira: O Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano. Jejuo duas vezes na semana, e dou os dízimos de tudo quanto possuo. O publicano, porém, estando em pé, de longe, nem ainda queria levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: O Deus, tem misericórdia de mim, pecador! Digo-vos que este desceu justificado para sua casa, e não aquele; porque qualquer que a si mesmo se exalta será humilhado, e qualquer que a si mesmo se humilha será exaltado” (Lc 18:11-14).
Não é com o corrupto, publicano ou bandido que você deve se comparar, e sim com Jesus, o Homem perfeito. Ele é o gabarito com qual somos comparados por Deus. Você é perfeito como Jesus? Você é sem pecado como Jesus? É claro que não! Então pegue a senha e entre na fila dos que só podem ser salvos por graça, e não por obras, pois nenhum esforço ou mérito seu tem o poder de limpar pecados. Só o sangue de Cristo pode fazer isso.
Para entender, imagine Deus traçando um risco no chão e de um lado está Jesus. Aí ele diz para todos os que forem perfeitos como o Filho de Deus para que passem para o lado de Jesus. Quantos passariam? Você passaria? Nem eu. No fim descobriríamos que eu, você, o homicida, o traficante, a prostituta… todos, estaríamos do mesmo lado do risco e somente pela graça de Deus poderíamos ser transportados para o outro lado. Isso você obtém pela fé em Cristo e no seu sacrifício na cruz, a única obra que poderia satisfazer as justas e santas exigências de Deus. Aí sim você estará habilitado a fazer boas obras, não para ser salvo, mas como fruto de um coração grato a Deus pela salvação que recebeu de graça.
“Dando graças ao Pai que nos fez idôneos para participar da herança dos santos na luz; o qual nos tirou da potestade das trevas, e nos transportou para o reino do Filho do seu amor; em quem temos a redenção pelo seu sangue, a saber, a remissão dos pecados” (Cl 1:12-14).
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O que este bispo diz de Darby procede?
Você escreveu dizendo que viu um vídeo de um bispo de uma certa denominação que contestava os ensinamentos de John Nelson Darby sobre o arrebatamento, e quer saber se os argumentos dele procedem. Quando vejo um clérigo fazer algum tipo de crítica a irmãos do século 19 que congregavam somente ao nome do Senhor e ministravam a Palavra, sei que o problema não estava exatamente em assuntos como dispensacionalismo, lugar de Israel e da Igreja, arrebatamento, mesa do Senhor, dízimo, etc. O problema tinha mais a ver com o que comprometia a carreira dos clérigos.
No século 19 John Nelson Darby e outros irmãos congregados somente ao nome do Senhor trouxeram à tona diversas verdades, entre elas as dispensações e o arrebatamento. Eles não tiveram novas revelações, simplesmente resgataram o que já estava revelado na Palavra e tinha ficado durante séculos sob o entulho doutrinário do catolicismo e protestantismo. Heinz Brikmann, que também congregava ao nome do Senhor e partiu no início deste século 21, identificou pelo menos 26 pontos ou verdades que teriam sido resgatadas no século 19 e que não eram conhecidos do protestantismo da época, pois se fossem eles saberiam que: 1. A vocação da igreja e do crente é celestial.
2. Temos franca entrada no santo dos santos (o santuário celestial) pelo sangue de Jesus.
3. Existe uma diferença entre a igreja e o reino.
4. Existe uma diferença entre o evangelho do reino e o evangelho da graça de Deus.
5. O reino futuro foi prometido para Israel.
6. Existe a necessidade de se apartar do pecado de Pérgamo.
7. É preciso compreender o que significa estar em Cristo.
8. Nossa posição é perfeita diante de Deus.
9. A verdade do corpo de Cristo foi revelada a Paulo. (Será que conhecer o termo é o mesmo que conhecer esta verdade?) 10. A verdade da casa de Deus e sua ordem não era conhecida antes de Paulo.
11. É preciso guardar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz.
12. O batismo nas águas não tem qualquer ligação com ser membro da igreja.
13. O sacerdócio é de Cristo, principalmente no sentido de Ele ser ministro do santuário.
14. Uma ação da assembleia é tomada com a autoridade do Senhor em seu meio.
15. É preciso praticar a verdade relacionada à presença do Espírito de Deus na igreja, que dirige e usa quem Ele quer.
16. É um erro o sistema clerical.
17. Vivemos no tempo da ruína da igreja e numa época de um testemunho remanescente.
18. Que o arraial é todo o sistema cristão inspirado no judaísmo.
19. Podemos desfrutar da libertação, isto é, do fato de estarmos mortos com Cristo, e da justificação que traz a vida.
20. Existe diferença entre pecado e pecados.
21. Cristo não guardou a lei para nós.
22. A lei não é nossa regra de vida.
23. Havia um mistério não revelado aos profetas e escondido em Deus.
24. Somos herdeiros de Deus e coerdeiros com Cristo.
25. Existe diferença entre nossa posição e condição.
26. Existe diferença entre perdão eterno e governamental.
Mas o problema dos clérigos nunca foi exatamente com o dispensacionalismo ou o arrebatamento. O problema dos clérigos sempre esteve na afirmação que aqueles autores faziam, e demonstravam pelas Escrituras, da inexistência de um sistema clerical na igreja, ao contrário do que existia em Israel. Como ficaria muito óbvio atacar este ponto que compromete justamente seus cargos e posições eclesiásticas, os clérigos costumam apontar suas armas para outros pontos, como faz esse “bispo” que você citou atacando um dos autores a escrever sobre a verdade do arrebatamento. É bom entender que Darby não foi o primeiro a escrever sobre o arrebatamento. Existem até versões de que Darby teria aprendido sobre o arrebatamento com uma jovem possessa de demônios.
Obviamente esse “bispo” segue a linha teológica da maioria dos cristãos fundamentalistas católicos e protestantes que não diferenciam o que é Israel e o que é Igreja, e suas respectivas posições e esperanças nos planos de Deus. Eles criam desses dois povos, que são distintos nas Escrituras, uma única salada mista. Esse “bispo” também está enganado em algumas de suas premissas. Por exemplo, Darby não inventou nada. Quando lhe perguntaram a respeito do arrebatamento ele disse que ouviu pela primeira vez de outro irmão.
Portanto, como costumo dizer, lembre-se sempre do mágico, que chama sua atenção para uma mão a fim de esconder a outra que ele usa para fazer o truque. É o que faz esse “bispo” criticando aquilo que não é exatamente o cerne do que ele gostaria de criticar.
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Existem pessoas que vendem a alma ao diabo?
Você andou lendo na Internet histórias escabrosas de pessoas que fizeram pacto com o diabo oferecendo sua alma em troca de dinheiro, saúde ou sucesso. Obviamente existe muita gente que deve fazer esse tipo de coisa, pois não existe nada que o ser humano não seja capaz de fazer em termos de loucura e atrocidade. Nem mesmo os animais são capazes de agir com o grau de maldade com que um ser humano age. Lembre-se de que somos os únicos seres vivos capazes de destruir o próprio planeta em que vivemos, como aquele proverbial lenhador que serrou o galho em que estava sentado.
Mas será que o diabo precisa que alguém tome essa iniciativa de lavrar um contrato com ele em troca da própria alma? A única passagem na Bíblia em que o diabo parece querer fazer um pacto com um ser humano é quando Jesus é tentado. Mas obviamente ali a iniciativa da tentação ou prova não tinha sido do diabo, mas do Espírito Santo que levou Jesus ao deserto para ser tentado. Uma melhor tradução seria “testado”, pois o objetivo daquele teste era só deixar claro que ele era quem deveria ser, o Filho de Deus vindo em carne, ou seja, o próprio Criador em um corpo humano. Mas nunca se esqueça de que não foi por iniciativa de Satanás que Jesus se viu naquela situação.
“Então foi conduzido Jesus pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo” (Mt 4:1).
Você conhece a história e sabe que Satanás não conseguiu fazer o pacto que desejava. Ele basicamente provou Jesus nos mesmos pontos em que Adão tinha sido provado no Jardim do Éden por intermédio de Eva. A diferença é que Jesus não caiu e nem poderia cair em nenhuma tentação.
“E, tendo jejuado quarenta dias e quarenta noites, depois teve fome; e, chegando-se a ele o tentador, disse: Se tu és o Filho de Deus, manda que estas pedras se tornem em pães. Ele, porém, respondendo, disse: Está escrito: Nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus. Então o diabo o transportou à cidade santa, e colocou-o sobre o pináculo do templo, e disse-lhe: Se tu és o Filho de Deus, lança-te de aqui abaixo; porque está escrito: Que aos seus anjos dará ordens a teu respeito, E tomar-te-ão nas mãos, Para que nunca tropeces em alguma pedra. Disse-lhe Jesus: Também está escrito: Não tentarás o Senhor teu Deus. Novamente o transportou o diabo a um monte muito alto; e mostrou-lhe todos os reinos do mundo, e a glória deles. E disse-lhe: Tudo isto te darei se, prostrado, me adorares. Então disse-lhe Jesus: Vai-te, Satanás, porque está escrito: Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a ele servirás. Então o diabo o deixou; e, eis que chegaram os anjos, e o serviam” (Mt 4:2-11).
Ao apelar para a fome que Jesus sentia depois de quarenta dias sem comer, Satanás tentava despertar nele um desejo ardente para satisfazer seu corpo. Ao expor numa vitrine o poder e glória de todos os reinos do mundo, o diabo queria despertar uma inexistente cobiça dos olhos na natureza santa e perfeita do Filho de Deus. E ao sugerir que ele saltasse das alturas do templo para ser amparado por anjos e obter publicidade e prestígio, o diabo apelava para a soberba da vida, algo que jamais seria encontrado em Jesus, Deus e Homem. Não existiam na natureza santa de Jesus esses três estímulos que pudessem ser acionados por algum agente exterior.
Porém nós, que não somos o Filho de Deus, mas seres humanos comuns, temos estes três botões em nós prontos para responderem quando acionados. Eles foram ligados lá no Éden e vieram no pacote da natureza pecaminosa que herdamos de Adão. Na tentação do Éden “viu a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento; tomou do seu fruto, e comeu, e deu também a seu marido, e ele comeu com ela” (Gn 3:6). O apóstolo João, em sua primeira epístola, chama a isso de “concupiscência — ou cobiça — da carne, concupiscência dos olhos e soberba da vida” (1 Jo 2:16).
Por causa do pecado nosso corpo, alma e espírito ficaram vulneráveis às tentações que prometem satisfação física, glória mundana, e reconhecimento público. Ser tentado não é pecar — Jesus foi tentado e sabe se compadecer dos que são tentados. Porém cair em tentação, isto sim é pecado, e nós estamos sujeitos a quedas. Felizmente Deus é fiel e não permite que os que pertencem a ele sejam tentados além do que podem suportar. Mas, quando são tentados, Deus lhes dá um meio de escapar dela (1 Co 10:13). Isto você obtém também de três maneiras: dependência de Deus, devoção a Deus e confiança em Deus.
Fora isso, não me lembro de nenhuma passagem de algum pacto que o diabo tenha tentado fazer com alguém em troca da alma da pessoa, como se Satanás estivesse interessado em algum tipo de pacto por iniciativa de seres humanos. Não está. Ele não precisa de um pacto para prender alguém em suas algemas e ter domínio sobre a pessoa. Cada ser humano já nasce escravizado pelo diabo, pelo pecado e por suas próprias concupiscências, então não há necessidade de algum contrato lavrado em algum cartório das trevas para confirmar isso. Todo ser humano já nasce andando “segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos da desobediência… nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos”. Somos todos “por natureza filhos da ira” (Ef 2:2-3).
Portanto, se você ainda não se converteu a Cristo, continua como todo ser humano a serviço do diabo, independentemente de ter feito algum pacto. Você só não sabe disso, mas quando descobre pela revelação das Escrituras que pode sair dessa condição se crer em Cristo como Salvador, é hora de tomar uma decisão. Este sim é o pacto que Deus quis fazer com Israel e quer fazer com os homens: “Eu lhes serei por Deus, E eles me serão por povo… Porque serei misericordioso para com suas iniquidades, e de seus pecados e de suas prevaricações não me lembrarei mais” (Hb 8:10-12).
Os que ainda não tomaram essa decisão de crer em Jesus como Salvador e Senhor continuam na escravidão e nem precisam se preocupar que o diabo possa arrastá-los para o lago de fogo. Já estão nesse caminho e quem vai lavrar a sentença final é o próprio Senhor, “porque não receberam o amor da verdade para se salvarem” (2 Ts 2:10). Jesus deixa um recado solene: “Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma; temei antes aquele que pode fazer perecer no inferno a alma e o corpo.” (Mt 10:28).
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Por que o Salmo 91 parece não funcionar comigo?
Você leu o Salmo 91, viu que ele promete muitas coisas, porém nada parece funcionar com você. Por que será? Porque você ainda não chegou à última página. Vou tentar explicar. Quando Paulo escreveu a Timóteo para manejar bem a Palavra da Verdade, o sentido era cortar ou dividir com precisão cada parte para ser aplicada dentro de cada contexto. Então se você não entender as diferentes divisões da Bíblia vai ficar confuso.
Por exemplo, temos todo o Antigo Testamento e também os evangelhos voltados aos judeus, enquanto a partir de Atos temos uma nova realidade que é a Igreja, os salvos da presente dispensação. Se você não conhece ou não acredita nas diferentes dispensações ou maneiras de Deus agir ao longo das eras, então nem siga adiante porque nada do que vou dizer fará sentido para você.
As promessas no Antigo Testamento eram para um povo terreno, Israel, e os gentios associados a esse povo. As promessas de Deus para a Igreja, que encontramos nas epístolas, são celestiais. Por isso, enquanto vivemos na terra não devemos nos espantar se passarmos por dificuldades. Então quando você lê o Salmo 91 que promete proteção e sustento em todas as circunstâncias, entenda que isso é uma promessa ainda a ser cumprida para um remanescente judeu que irá se converter e juntamente com outras tribos de Israel e gentios habitará no reino milenial de Cristo na terra.
Mas se você discorda desta forma de entender a Bíblia, então tente explicar como foi que todos os apóstolos, exceto João, morreram de forma violenta nas mãos dos adversários da fé cristã? Será que não habitavam “no esconderijo do Altíssimo” e nem descansavam “à sombra do Onipotente”? Porque teriam sido presa do “laço do passarinheiro e da peste perniciosa”? Recebi uma mensagem de uma irmã em Cristo indignada porque na denominação que frequenta o pastor pregou que a culpa da morte de Estêvão foi da igreja, que não orou como orou por Pedro quando este foi preso e depois libertado. Faltou ele explicar por que Pedro mais tarde também seria executado. Ou porque todos os cristãos nos últimos dois mil anos morreram. Teria sido falta de orações fervorosas? No caso de todos os apóstolos, discípulos e cristãos que morreram de forma violenta no passado e nos dias atuais, como os degolados por radicais islâmicos, como fica a promessa que diz que “caiam mil ao teu lado, e dez mil à tua direita; tu não serás atingido”?
Em Hebreus você lê de homens e mulheres fieis do Antigo Testamento que “pela fé venceram reinos, praticaram a justiça, alcançaram promessas, fecharam as bocas dos leões, apagaram a força do fogo, escaparam do fio da espada, da fraqueza tiraram forças, na batalha se esforçaram, puseram em fuga os exércitos dos estranhos” (Hb 11:33-34). Mas na continuação o texto fala de homens e mulheres não menos fieis que “experimentaram escárnios e açoites, e até cadeias e prisões. Foram apedrejados, serrados, tentados, mortos ao fio da espada; andaram vestidos de peles de ovelhas e de cabras, desamparados, aflitos e maltratados (dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos, e montes, e pelas covas e cavernas da terra” (Hb 11:36-38). Qual teria sido a falha deles? Não, eles não falharam, pelo contrário são citados nas Escrituras por sua fé e perseverança em Deus. A questão é que ainda não estavam na última página.
Para os cristãos que desde o início da Igreja foram traspassados por lanças e espadas, crucificados, queimados vivos, degolados, enforcados, a história não tem sido diferente. Será que teriam falhado? Afinal, o Salmo 91 prometia que “nenhum mal te sucederá, praga nenhuma chegará à tua tenda, porque aos seus anjos dará ordens a teu respeito, para que te guardem em todos os teus caminhos. Eles te sustentarão nas suas mãos, para não tropeçares nalguma pedra”. Para aqueles santos que eram estraçalhados nas arenas romanas certamente não funcionou a promessa “pisarás o leão e a áspide, calcarás aos pés o leãozinho e a serpente”, porque acabaram mortos de qualquer maneira. Mas volto a insistir que não tire conclusões antes de chegar ao final da história.
Percebe como promessas como as do Salmo 91 não podem ser evocadas por alguém da presente dispensação, a não ser na forma de princípios de proteção, porém não literalmente? Sim, eu tenho certeza de que é verdade também para mim o que Deus diz: “Porque a mim se apegou com amor, eu o livrarei; pô-lo-ei a salvo porque conhece o meu nome. Ele me invocará, e eu lhe responderei; na sua angústia eu estarei com ele, livrá-lo-ei e o glorificarei. Saciá-lo-ei com longevidade e lhe mostrarei a minha salvação”, porque estas são promessas que de algum modo me serão cumpridas, mas se para os israelitas elas apontam para a nova terra, para mim e todos os salvos da presente dispensação da graça de Deus elas apontam para os novos céus. A última página está escrita lá, na eternidade.
Mas talvez você conteste, pois como eu disse um pouco antes, também os israelitas sempre sofreram muitos suplícios e estas promessas não valeram para eles. Tem razão, porque afinal a aplicação primeira e mais direta deste Salmo não é para judeus nem gentios, mas para o próprio Senhor Jesus. O Salmo é messiânico como muitos outros. Jesus é aquele que habita no esconderijo do Altíssimo como nenhum outro.
No primeiro capítulo do Evangelho de Marcos há sete testemunhos acerca de Jesus. Sabemos que na Bíblia o número sete é o número de Deus e representa a perfeição. Primeiro, é o próprio Marcos quem testemunha que “Jesus Cristo” é “o Filho de Deus” (Mc 1:1). Depois, nos versículos 2 e 3 de Marcos, o testemunho vem dos profetas referindo-se a Jesus como o Jeová do Antigo Testamento. Apenas para citar a origem do versículo 3, é uma profecia de Isaías que diz: “Voz do que clama no deserto: Preparai o caminho de Jeová, endireitai as suas veredas” (Is 40:3), referindo-se a João Batista que viria para anunciar a chegada de Jesus. Em terceiro lugar vem o testemunho do próprio João Batista, que diz: Ele é “mais poderoso do que eu”. O quarto testemunho vem do Pai no versículo 11, que diz: “Tu és o meu Filho amado em quem me comprazo”. Obviamente quem não crê ou entende a Trindade não vai conseguir entender isso, mas apenas para esclarecer: Um Deus, três Pessoas distintas, Pai, Filho e Espírito Santo.
Nos versículos 12 e 13 de Marcos capítulo 1 encontramos os últimos três testemunhos. O quinto é providenciado pelo Espírito Santo para mostrar que Jesus era sem pecado e impermeável à tentação. Ele “o Espírito o impeliu para o deserto. E ali esteve no deserto quarenta dias, tentado por Satanás.”. O sexto testemunho é dado pela Criação, sobre a qual o Filho de Deus tem o domínio, pois “vivia entre as feras” e estas, nenhum dano lhe causaram. O sétimo testemunho nós vemos quando “os anjos o serviam”, e um bom leitor da Bíblia saberá que isto tem a ver com Hebreus 1:6-8, que diz: “Quando introduz no mundo o primogênito, diz: E todos os anjos de Deus o adorem. E, quanto aos anjos, diz: Faz dos seus anjos espíritos, E de seus ministros, labareda de fogo. Mas, do Filho, diz: O Deus, o teu trono subsiste pelos séculos dos séculos; Cetro de equidade é o cetro do teu reino”.
Mas Jesus um dia chegou ao ponto de clamar a Deus na cruz por tê-lo abandonado, mas aquilo foi só momentâneo. Sabemos que ele morreu, mas também que ressuscitou e está hoje glorificado nos céus provando serem verdadeiras todas as promessas do Salmo a respeito dele. Se este Salmo 91 tem sido de consolo e auxílio para muitos que sofrem ao longo de milênios é porque encontraram descanso não em promessas vazias, mas em promessas cumpridas acerca de Cristo e que se cumprirão também em sua totalidade a respeito de cada salvo de cada dispensação. Não tire conclusões de uma história até chegar à última página. Não ouse duvidar da Palavra de Deus em nenhuma circunstância, porque há coisas que eu e você só entenderemos depois da última página, quando entrarmos na eternidade.
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Por que protestantes e católicos criticam o dispensacionalismo?
Muitos líderes católicos e protestantes, principalmente os das correntes fundamentalistas dessas religiões, não gostam nem de ouvir falar de dispensacionalismo porque tal ideia toca dois pontos nevrálgicos da cristandade institucional: um é a questão de Israel ainda “estar na jogada”, isto é, “Deus não rejeitou o seu povo, que antes conheceu” (Rm 11:2), porém apenas permitiu um endurecimento temporário para introduzir um parêntese na profecia a fim de que Cristo tivesse sua Noiva, a Igreja. Ao menos é o que Paulo escreve aos Romanos: “Porque não quero, irmãos, que ignoreis este segredo (para que não presumais de vós mesmos): que o endurecimento veio em parte sobre Israel, até que a plenitude dos gentios haja entrado. E assim todo o Israel será salvo, como está escrito: De Sião virá o Libertador, E desviará de Jacó as impiedades. E esta será a minha aliança com eles, quando eu tirar os seus pecados. Assim que, quanto ao evangelho, são inimigos por causa de vós; mas, quanto à eleição, amados por causa dos pais. Porque os dons e a vocação de Deus são sem arrependimento” (Rm 11:25-29) Para entender melhor, onde você lê “segredo”, leia “mistério”, porque faz parte dos mistérios que estavam escondidos em Deus. Esses mistérios incluem a revelação dada inicialmente com exclusividade a Paulo, já que nenhum profeta do Antigo Testamento teve acesso a essa informação: “A mim, o mínimo de todos os santos, me foi dada esta graça de anunciar entre os gentios, por meio do evangelho, as riquezas incompreensíveis de Cristo, e demonstrar a todos qual seja a dispensação do mistério, que desde os séculos esteve oculto em Deus, que tudo criou por meio de Jesus Cristo; para que agora, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades nos céus, segundo o eterno propósito que fez em Cristo Jesus nosso Senhor” (Ef 3:8-11).
Duas expressões devem ser entendidas para se entender o contexto profético: “O tempo dos gentios” (Lc 21:24) e “A plenitude dos gentios” (Rm 11:25). O “tempo dos gentios” começou quando Deus entregou a Nabucodonosor o comando do mundo, deixando de lado Israel que falhou em sua missão de cabeça, como Deus havia prometido caso fossem obedientes: “E o Senhor te porá por cabeça, e não por cauda; e só estarás em cima, e não debaixo, se obedeceres aos mandamentos do Senhor teu Deus, que hoje te ordeno, para os guardar e cumprir” (Dt 28:13).
A história demonstra o quanto isso foi verdadeiro a respeito dos judeus, conforme Deus anunciara: “O estrangeiro, que está no meio de ti, se elevará muito sobre ti, e tu mais baixo descerás; ele te emprestará a ti, porém tu não emprestarás a ele; ele será por cabeça, e tu serás por cauda. E todas estas maldições virão sobre ti, e te perseguirão, e te alcançarão, até que sejas destruído; porquanto não ouviste à voz do Senhor teu Deus, para guardares os seus mandamentos, e os seus estatutos, que te tem ordenado” (Dt 28:43-45). A história dos judeus é também a história dos bancos, pois eles parecem ter tentado reverter essa maldição se transformando nos maiores banqueiros do mundo — os que emprestam, e não que pedem emprestado.
Desde Nabucodonosor o poder está nas mãos dos gentios, e se Israel aparece palidamente hoje como nação, é somente graças à misericórdia de Deus em preservar um povo para o cumprimento das profecias ainda futuras. E para preservá-los, Deus usa nações de gentios como Estados Unidos e Inglaterra, como usou a Babilônia do passado, mas que estas nações não se achem grande coisa por isso. Profeticamente elas ficarão tão desoladas quanto Babilônia ficou. Quando Jesus esteve no mundo tudo parecia normal em Israel, e tinham até seu templo restaurado. Porém eles mesmos eram apenas um resíduo do que tinham sido as doze tribos, dez das quais desaparecidas entre as nações, e estavam debaixo de Herodes, um rei fantoche que nem judeu era, mas idumeu, e este respondia ao César romano. Alguém poderia pensar que esse “tempo dos gentios” tivesse terminado por Israel estar hoje sob o domínio dos judeus. Será?
Basta ver os enclaves palestinos em seu território para saber que não é bem assim. E se considerar que na pérola da coroa de Israel — Jerusalém — os judeus só detêm parte da cidade, pergunte a algum judeu se consegue dormir com um barulho desse. Além da divisão da cidade entre judeus e árabes, tendo estes o pé fincado no mais santo lugar de Jerusalém, a esplanada do Templo, lembre-se também de que diferentes religiões cristãs reclamam seu direito a porções do território consideradas sagradas pela cristandade.
Portanto, o “tempo dos gentios” tem a ver com os procedimentos administrativos e disciplinatórios de Deus para com Israel, e a “plenitude dos gentios” com o modo de Deus agir com todos os homens em graça. Esse período todo compreende a história da humanidade desde Nabucodonosor, e a “plenitude dos gentios” tem a ver com a graça com que Deus tem tratado o mundo desde a rejeição, morte, ressurreição e ascensão de nosso Senhor Jesus. Sendo assim, a queda dos judeus foi efetivamente razão de bênção para os gentios, tanto no passado como no presente. Basta ver o quanto a mensagem da graça de Deus se espalhou pelo mundo desde a formação da Igreja no dia de Pentecoste. Todavia, “Jerusalém será pisada pelos gentios, até que os tempos dos gentios se completem” (Lc 21:24). Quando o último membro for acrescentado ao corpo de Cristo, as profecias concernentes a Israel voltarão a se desenrolar e o relógio profético, parado há dois mil anos, voltará a bater.
Mas veja que Deus também não pega leve com os gentios em suas responsabilidades governamentais. Onde está Babilônia? Há muito se transformou num montão de ruínas. E os gregos, que eram o outro império representado pela estátua do sonho de Nabucodonosor? Existem ainda como nação, mas sem a grandeza do passado. Os romanos também tiveram o mesmo fim e hoje formam apenas mais um país dentre muitos. E os judeus continuam aí, perseguidos, mas indestrutíveis porque Deus os preserva para mostrar graça para com eles quando se arrependerem como nação, o que só se dará após o arrebatamento da Igreja. “Porque, se a sua rejeição é a reconciliação do mundo, qual será a sua admissão, senão a vida dentre os mortos?” (Rm 11:15).
A falta de entendimento — ou recusa em aceitar a verdade dispensacional — leva muitos cristãos a adotarem costumes judaicos, como templos, clérigos, dízimos, etc. Consideram a Igreja uma continuação de Israel e herdeira das mesmas promessas terrenas de prosperidade feitas àquele povo. Se pensar que foram “cristãos”, e não muçulmanos, os que mais se esforçaram em destruir os judeus nos últimos dois mil anos, fica bem claro que agiram como o filho bastardo que não tem escrúpulos em matar o herdeiro para ficar com a herança. A história se repete pois, os judeus fizeram o mesmo com o Filho de Deus. Mas a Igreja nada tem a ver com Israel, pois é um “mistério que, durante as épocas passadas, foi mantido oculto em Deus” (Ef 3:9). E tampouco ela tem sua esperança na Terra, como Israel, mas foi abençoada “com todas as bênçãos espirituais nas regiões celestiais em Cristo” (Ef 1:3). Seu destino não é viver aqui, pois “a nossa cidadania está nos céus, de onde esperamos ansiosamente um Salvador, o Senhor Jesus Cristo” (Fp 3:20). Portanto, a Bíblia fala sim em prosperidade, mas não para a Igreja. A prosperidade prometida no Antigo Testamento irá se cumprir em Israel quando este for restaurado.
Portanto, o primeiro “nervo” dolorido para católicos e protestantes é a questão sionista: Como iriam os líderes dessas duas correntes religiosas admitir que o domínio do mundo futuro não foi dado à Igreja, mas a Israel? Como reconhecer o erro histórico cometido pelos cristãos que perseguiram e mataram judeus nas inquisições católica e protestante? Como explicar a razão de terem se apropriado, além de seus bens, também de suas tradições religiosas transformando-as num cristianismo pirata? Sim, pois coisas como sacerdotes, reverendos, templo, altares, vestes talares, clero, corais de músicos, dízimos, sacrifícios etc. nada têm a ver com a doutrina dos apóstolos, mas com judaísmo. Sugiro que pesquise sobre “Teologia do Domínio” para ver o quanto a cristandade está envolvida na tentativa de dominar o mundo, não no sentido de evangelização dos perdidos, mas no sentido de deter o poder secular e religioso sobre toda a humanidade na terra. O slogan de fachada é: “Queremos preparar o mundo para Cristo poder vir estabelecer seu reino”.
Antes que você ache que apenas católicos perseguiram judeus, faça uma busca do texto de Martinho Lutero denominado: “Dos judeus e suas mentiras”. Você ficará estarrecido com o ódio destilado por aquele grande reformador contra o povo terreno de Deus. Mas desconto seja dado a Lutero por ser esse o pensamento geral e corrente de sua época. Se fosse feita uma enquete de opinião pública em seus dias ela diria que 99% dos judeus deveriam ser convertidos à força ao cristianismo ou então exterminados. E seus bens deveriam ficar com… não preciso nem dizer.
E qual seria o segundo nervo que o “dedo” do dispensacionalismo aperta e dói tanto em católicos e protestantes? A questão do clero, pois no momento em que se entende que TODOS os salvos são igualmente sacerdotes e têm igual acesso a Deus, sem intermediários humanos, ao contrário do que acontecia no judaísmo que separava esse acesso simbolicamente por um véu, como fica a profissão dos clérigos? Como fica a vida de pompa e circunstância que muitos deles sempre levaram? Como fica a reputação de líderes religiosos, tanto católicos como protestantes, hoje paparicados por políticos ateus em busca de favores? Como fica?
Não é de admirar que muitos deles combatam com unhas e dentes o dispensacionalismo e irmãos que no século dezenove trouxeram à tona esta verdade com a correta divisão da Palavra de Deus, dentre eles G. V. Wigram, F. W. Grant, J. N. Darby, W. Kelly, J. G. Bellet, C. H. Mackintosh, A. Miller, C. Stanley, E. Dennett, W. Trotter, J. L. Harris, F. G. Patterson, H. L. Rossier, e outros mais contemporâneos que elaboraram sobre os escritos daqueles irmãos, como W. W. Fereday, A. J. Pollock, H. Smith, C. H. Brown, G. C. Willis, B. Anstey e muitos outros.
Esses trouxeram à tona verdades esquecidas por séculos de entulho doutrinário que nenhuma empreiteira católica ou protestante irá querer remover, pois ficará evidente a corrupção que causaram na verdade na tentativa de ocultar tesouros preciosos à fé cristã. Geralmente eles não tentam refutar a questão clerical denunciada por aqueles irmãos porque isso daria muito na vista, então contestam verdades como o arrebatamento da Igreja, a posição inabalável do crente em Jesus, a inexistência de denominações na Bíblia e o lugar que Israel ocupa nas profecias.
Do ponto de vista institucional corporativo, o primeiro nervo dói bastante, pois exige que a cristandade diga: “Ok, judeus, nos perdoem por não termos apenas pisado na bola com vocês, mas queimado a bola, furado a bola, estraçalhado a bola…”. Dentre os que tocaram esse nervo existem também clérigos, como Cyrus I. Scofield, que ficou conhecido por sua “Bíblia Anotada por Scofield”, porém que adotou apenas parte das verdades trazidas à tona pelos irmãos do século dezenove, deixando de fora justamente o segundo “nervo” ao qual me referi e isso por razões óbvias relacionadas à sua posição de clérigo. É que do ponto de vista pessoal o segundo nervo dói até mais, pois exige que o clérigo desça de seu patamar e lugar de comando e se coloque lado a lado com aqueles que hoje ele chama de “leigos”, mas que são igualmente ovelhas de Cristo, o único e verdadeiro Pastor das ovelhas.
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Esses irmãos guardam a unidade do corpo?
Você disse que alguns irmãos visitaram sua igreja e lá pregaram dizendo que fazem parte de um grupo que procura preservar ao máximo a unidade do corpo de Cristo. Bem, a Bíblia não nos exorta a preservarmos a unidade do Corpo de Cristo, já que essa é inabalável e não precisa do homem para ser preservada. Mas a Bíblia nos exorta a guardarmos a unidade do Espírito. Antes de explicar a diferença, vamos ao que afirmam os membros desse grupo que seguem os ensinamentos de um líder oriental e afirmam praticar o que diz em 1 Coríntios 1:10: “Rogo-vos, porém, irmãos, pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que digais todos uma mesma coisa, e que não haja entre vós dissensões; antes sejais unidos em um mesmo pensamento e em um mesmo parecer”.
Na tentativa de colocar isso que chamaram de “unidade” em prática, em todas as cidades do mundo eles leem a mesma passagem das Escrituras no mesmo dia, acompanhada da leitura dos mesmos ensinos dos mesmos autores orientais. Ou seja, todos eles, todos os dias, em todos os lugares, falam uma mesma coisa, aprendem uma mesma doutrina, ocupam-se com um mesmo assunto da Bíblia. E invocam: “Ó Senhor Jesus!”. Bem, o que eles não contaram para você é que possuem um líder mundial que dirige tudo a partir de uma sede mundial, de onde partem as ordens para as diferentes cidades. Possuem também uma imprensa oficial mundial de onde sai tudo o que devem ler naquele determinado dia. Não, eu não estou falando do Papa, de Roma, dos escritos que passam pela chancela da Sé romana, e nem daquele folheto entregue no início da missa — a Homília — que procura manter todas as suas igrejas ocupadas com um mesmo tema num mesmo dia. Mas é bem parecido, não é? Portanto esse grupo não faz nada original. A Igreja Católica vem fazendo isso há séculos.
Obviamente não é disso que a Bíblia fala quando se refere à união do Corpo de Cristo, que não pode ser abalada, ou à unidade do Espírito que os crentes devem guardar. Se observar as sete cartas às sete igrejas em Apocalipse 2 e 3 elas eram distintas, porque cada igreja ali passava por exercícios distintos. E nas cartas dos apóstolos às igrejas eles tratavam também de questões muito particulares de cada assembleia, apesar de encorajarem que uma igreja lesse a carta enviada à outra — e todos nós lemos hoje todas elas por formarem a doutrina apostólica. Mas é inegável que cada assembleia de irmãos reunidos passa por diferentes problemas e dificuldades, e que a direção para cada uma é dada pelo Espírito Santo presente naqueles e no meio daqueles reunidos.
O princípio encontrado nas Escrituras é que o Espírito Santo — e não um líder sentado no trono de uma sede mundial — é quem conhece essas dificuldades locais e saberá como tratá-las. “A manifestação do Espírito é dada a cada um para o que for útil… Mas um só e o mesmo Espírito opera todas essas coisas, repartindo particularmente a cada um como [ELE] quer” (1 Co 12:7). Tampouco os crentes, quando reunidos, devem ficar sujeitos ao ministério de algum clero formado por líderes, mas o Espírito pode usar quem ele quiser para trazer aquilo que ele achar necessário. O único texto que é absoluto entre todos os salvos é a Bíblia, a Palavra de Deus. “Porque todos podereis profetizar, uns depois dos outros; para que todos aprendam, e todos sejam consolados” (1 Co 14:31).
Portanto, o grupo que visitou sua denominação e se apresentou como a última bolacha do pacote não é bem assim. Trata-se de uma “denominação” que se apresenta “sem denominação”, mas arvorando ser “a igreja” nesta ou naquela localidade. No mais, nada diferem das denominações, com um líder ou conselho supremo, uma sede mundial, preletores treinados e ordenados para esse trabalho, etc. Estes, em particular, trazem uma doutrina perniciosa que separa os crentes em Cristo entre “vencedores” e “perdedores”. A primeira classe, obviamente dos que “se acham” mais espirituais, não passará pela tribulação, mas a outra, que eu chamaria de sinceros, passará para uma espécie de purificação — ou purgatório — de seus pecados, pois não alcançaram o nível dos mais espirituais. Creio que você já viu que o que eles dizem talvez seja até mais pernicioso do que aquilo que é ensinado dentro da denominação que frequenta. Mas digo isto, não como um aval ou aprovação à sua denominação, pois o fato de separar os crentes por diferentes nomes já é algo ruim o suficiente para você se apartar desse sistema.
A alegação de que preservam a unidade do corpo de Cristo é falsa, pois o único que preserva isso é o próprio Cristo. Esse corpo não pode de maneira alguma ser desmembrado ou desfigurado, pois Cristo não permitiria que um só membro fosse arrancado. A igreja é um corpo, portanto todos os salvos fazem parte desse único corpo e estão sob a direção de uma só cabeça no céu, Cristo, independentemente de onde estejam congregados. “Porque, assim como o corpo é um, e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, são um só corpo, assim é Cristo também” (1 Co 12:12). Esse “um corpo” foi formado apenas uma vez, e isso aconteceu no dia de Pentecostes em Jerusalém e é descrito como todos os salvos por Cristo tendo sido “batizados em um Espírito”. Veja o que o apóstolo Paulo escreveu em sua carta aos crentes de Corinto: “Pois todos nós fomos batizados em um Espírito, formando um corpo, quer judeus, quer gregos, quer servos, quer livres, e todos temos bebido de um Espírito” (1 Co 12:13).
Lembre-se de que quando aquele batismo “em um Espírito” aconteceu, nem Paulo, nem os Coríntios aos quais ele escreve, eram sequer convertidos. Esse é o único batismo no Espírito que temos na Bíblia, feito uma vez e que incluiu todos os salvos que estavam em Jerusalém naquele momento e todos os que ainda iriam se converter ou até mesmo nascer nos séculos que se seguiriam. O batismo em um Espírito foi o que Deus usou para formar a Igreja. Hoje cada crente que se converte a Cristo não é “batizado em um Espírito”, porque isso implicaria criar novamente a Igreja, mas é selado com o Espírito. “Em quem [Cristo] também vós estais, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação; e, tendo nele também crido, fostes selados com o Espírito Santo da promessa. O qual é o penhor da nossa herança, para redenção da possessão adquirida, para louvor da sua glória” (Ef 1:13-14).
Não existia Igreja antes de Cristo ter subido ao céu e os crentes na terra terem recebido o Espírito Santo. Se o Israel do Antigo Testamento fosse a Igreja, o corpo de Cristo, esse teria sido um corpo acéfalo — sem cabeça — porque a Cabeça, que é Cristo, precisava ser glorificada antes de o corpo ser formado. Para isso, Cristo primeiro ressuscitou e ascendeu ao céu, dando dons aos homens. O Espírito desceu no dia de Pentecostes, para unir os crentes a esse Jesus Cristo, o Homem glorificado nos céus. O corpo vive na terra, mas a Cabeça está nos céus. Isto fica claro nesta passagem: “E isto disse ele do Espírito que haviam de receber os que nele cressem; porque o Espírito Santo ainda não fora dado, por ainda Jesus não ter sido glorificado” (Jo 7:39). O Espírito só seria dado depois de Jesus glorificado.
Tudo isso nos fala da união que existe entre o corpo e a cabeça, uma união fundamentada na obra completa de Cristo, que inclui morte, ressurreição e glorificação. O corpo só pode estar ligado à cabeça em vida ressurreta, que é a vida que agora possui todo verdadeiro crente em Cristo que tem o Espírito habitando em si. Os santos do Antigo Testamento não podiam dizer de si mesmos: “Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos abençoou com todas as bênçãos espirituais nos lugares celestiais em Cristo… E nos ressuscitou juntamente com ele e nos fez assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus… Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra da esquina; no qual todo o edifício, bem ajustado, cresce para templo santo no Senhor. No qual também vós juntamente sois edificados para morada de Deus em Espírito” (Ef 1:3; 2:6; 2:21-22).
Se a união é entre o corpo e a cabeça, a unidade, por sua vez, é entre os membros do corpo. Esta existe pela presença do Espírito Santo que habita em cada um e permite que todos tenham o mesmo sentimento e o mesmo entendimento das Escrituras; que possam agir em uníssono como duas cordas de violões diferentes afinadas no mesmo tom e que vibram juntas, quando apenas uma é tocada. Quando estas coisas não são visíveis, existe algum problema no guardar essa unidade. Lembrando mais uma vez que é impossível comprometer a união do corpo, que existe entre os crentes e a Cabeça, que é Cristo na glória, mas muitas coisas podem atrapalhar a manifestação visível da unidade do Espírito.
Essa unidade é do Espírito, não é dos crentes e não somos exortados a produzi-la (pois ela já existe), mas a “guardar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (Ef 4:3). Esse vínculo ou elo é a harmonia entre os crentes que serve de testemunho para o mundo. “Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros… Para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 13:35; 17:21). Nem preciso dizer o quanto essa unidade tem sido comprometida por todas as divisões que vemos hoje no testemunho cristão no mundo. O corpo de Cristo é um, único, indissolúvel, mas o testemunho que foi deixado sob a responsabilidade do homem está dividido e o que o mundo vê não é unidade, mas diversidade, fragmentação e vergonha.
Preocupados com isso, muitos cristãos têm pavor da ideia de se separarem de sua denominação, achando até que todas as denominações deveriam se unir para demonstrar que são um só corpo. Mas isso encontra alguns problemas: primeiro, a Palavra de Deus nunca disse que o corpo de Cristo seja formado por diferentes denominações, mas sim por diferentes indivíduos — pessoas — que foram salvas por Cristo e, apesar de não andarem unidas na prática, elas estão todas unidas à única cabeça no céu, que é Cristo. Unir denominações ou organizações religiosas não é jamais a vontade de Deus, pois ele nem mesmo autorizou a existência delas. A Palavra nos exorta sim a nos apartarmos (separarmos) do mal e da iniquidade, e é impossível fazer isso andando junto com aqueles que pregam o erro, mesmo que sejam irmãos em Cristo e membros do mesmo corpo. A Palavra também nos exorta a nos separarmos dos vasos de desonra e a nos juntarmos aos que, com um coração já purificado desses erros, invocam o nome do Senhor. É este o sentido desta passagem: “O fundamento de Deus fica firme, tendo este selo: O Senhor conhece os que são seus, e qualquer que profere o nome de Cristo aparte-se da iniquidade. Ora, numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra. De sorte que, se alguém se purificar destas coisas, será vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra. Foge também das paixões da mocidade; e segue a justiça, a fé, o amor, e a paz com os que, com um coração puro, invocam o Senhor” (2 Tm 2:19-22).
O outro problema da tentativa de unir as diversas denominações cristãs em uma grande colcha de retalhos é que isso exigiria nivelar a verdade pelo mínimo denominador comum. Ou seja, aqueles grupos que possuam uma maior fidelidade à verdade das Escrituras terão de abrir mão de muitas delas para descerem ao nível dos que nem sequer consideram a Bíblia a Palavra de Deus. Isso não produziria unidade, mas uma enorme colcha de retalhos que só traria desonra ao nome de Cristo; seria oficializar a derrota e violentar a consciência dos crentes individualmente, pois alguns seriam obrigados, por essa união compulsória, a engolir sapos de todos os tipos e tamanhos. “Aquele que sabe fazer o bem e não o faz, comete pecado” (Tg 4:17). Um texto de J. N. Darby pode ajudar a compreender isso: “O próprio Deus deve ser a fonte e o centro da unidade, e somente ele pode estar no comando e preeminência. Qualquer centro de unidade fora de Deus será uma completa negação da sua divindade e glória. Considerando que existe o mal — sim, é esta a nossa condição natural — não pode existir uma união da qual o santo Deus seja o centro e o poder, senão por meio da separação do mal. A separação é o primeiro elemento de unidade e união”.
Outro texto que pode ser de ajuda é tirado do livro “A ordem de Deus”, de Bruce Anstey: “Nas palavras que o Senhor dirige às sete igrejas em Apocalipse capítulos 2 e 3 há um ponto em que o Senhor já não reconhece a massa da profissão cristã, e a partir daí passa a tratar com um testemunho remanescente. Ele distingue um remanescente ao dizer: ‘Mas eu vos digo a vós, e aos restantes [ou remanescentes]...’ E é neles que o Senhor passa a tratar a partir de então (Ap 2:24-29). A razão disso é que o estado da igreja chegou a um ponto em que já não existe conserto. A partir daí ocorre uma mudança notória na maneira como o Senhor trata com a igreja. Isto é indicado pela expressão ‘ouça o que o Espírito diz às igrejas’, que passa a vir depois da promessa ao que vencer, ao invés de precedê-la, como tinha sido o padrão até aquele ponto. Nas palavras do Senhor às três primeiras igrejas, a recompensa ao que vencer era colocada diante de toda a igreja, pois o Senhor ainda tratava com ela como um todo. Mas desse ponto em diante já não é mais assim. A expressão ‘ouça o que o Espírito diz às igrejas’ só é dada a um remanescente, pois somente os que fazem parte dele irão ouvir e vencer. Walter Scott disse que a razão dessa mudança é que a grande massa da profissão cristã passa a ser tratada como incapacitada de ouvir, arrepender-se e praticar a verdade.
“W. Kelly disse: ‘Desse ponto em diante o Senhor coloca a promessa [ao que vencer] primeiro, e o faz porque é inútil esperar que a igreja como um todo irá recebê-la… apenas um remanescente irá vencer, e a promessa é para os que fazem parte dele; no que diz respeito aos outros, é caso encerrado’. Portanto, já que é assim, não podemos esperar que em nossos dias o princípio divino da unidade seja praticado em meio à massa da profissão pública, mas apenas dentro de um testemunho remanescente. Na prática, alguém que se une a uma determinada denominação em detrimento das outras, já não tem autoridade para criticar aqueles que querem se separar das denominações, pois foi exatamente o que fez! Ao limitar-se a uma denominação, acabou deixando de lado todas as outras, pois ninguém pode ser Batista e Presbiteriano ao mesmo tempo. Portanto, ao unir-se à denominação de sua escolha, sua atitude o excluiu de todas as outras, deixando assim de guardar a unidade do Espírito. Quem quiser argumentar sobre este ponto precisará primeiro praticar por si mesmo a unidade que espera que os outros pratiquem.” — Bruce Anstey em “A ordem de Deus”.
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Qual a origem do homossexualismo?
Você perguntou qual seria origem do homossexualismo e se ela seria uma forma de possessão demoníaca. Não, nada tem a ver com possessão demoníaca, mas com aquilo que todos nós temos em nós e que permite termos também latente os mais variados comportamentos contrários à vontade de Deus. Portanto não culpe a influência do meio, a genética ou os demônios por comportamentos que são responsabilidade do ser humano. E fuja dos pregadores que gostam de demonizar um determinado comportamento pecaminoso, para escolher seus próprios e execráveis pecados, e falo aqui dos pregadores da Teologia da Prosperidade.
Com a queda de nossos ancestrais no pecado lá no jardim do Éden, TODOS os seres humanos passaram a nascer pecadores. Enquanto em uns os frutos dessa raiz torta se manifesta de uma maneira, que às vezes pode ser até incentivada pela sociedade e opinião pública, como a opção ou diversidade sexual, e avareza ou amor ao dinheiro, em outros os pecados se manifestam de outras maneiras. Mas a fonte é a mesma e todos nós nascemos com ela, variando apenas as torneiras que são abertas à expressão de nossa vontade própria.
O homossexualismo aparece na Bíblia ao lado de muitas outras práticas que são pecados na opinião de Deus (não estamos falando aqui de opinião pública ou do que a legislação de um país aprova). Juntamente com tudo o mais que praticamos e desagrada a Deus, o homossexualismo é fruto da incredulidade e de todos os seres humanos (eu e você incluídos) terem nascido com as costas voltadas para Deus, para se entregarem à idolatria, que atinge neste século seu ponto máximo com a adoração do homem, geralmente chamada de “humanismo”. A sociedade, em especial a ocidental, tem hoje o homem como centro do universo e dispensa Deus. Quem conhece a Europa sabe que foi a esse ponto que sua população chegou, e hoje é comum encontrar lá professores ateus lecionando religião.
Quando digo que o pecado afetou a TODOS os seres humanos é porque isso inclui também os pregadores da prosperidade que vivem atirando seletivamente pedras em homossexuais para criarem bombas de fumaça que desviem a atenção do público de que eles próprios, os pregadores, são culpados de avareza, que é o amor ao dinheiro. Não são diferentes dos fariseus que pegaram uma mulher em “flagrante adultério” (Jo 8:4) e levaram apenas a mulher a Jesus (o homem talvez fosse um deles). Um flagrante de adultério exige no mínimo dois culpados.
Se ler a passagem do primeiro capítulo de Romanos verá que o homossexualismo não tem nada a ver com genética, doença ou possessão demoníaca. É uma consequência de Deus ter entregue homens e mulheres à vontade deles (convenientemente chamada hoje de “opção” ou “orientação sexual”), para fazerem o que bem entendessem de seus corpos, livres dos limites estabelecidos por Deus. Essa falsa ideia de liberdade é como pensar em um trem que deseja ser livre dos trilhos ou um peixe que não quer mais viver oprimido pela água. Em todos os casos o resultado é um desastre. Mas veja que no final da passagem de Romanos há também uma lista de pecados que inclui “avareza” (Rm 1:29) ou “ganância” ou “amor ao dinheiro”, que é o principal motor da Teologia da Prosperidade pregada na grande maioria das igrejas pentecostais e neopentecostais, em especial pelos pregadores que são estrelas hoje no rádio e TV. “Porque o amor do dinheiro é a raiz de toda espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé e se traspassaram a si mesmos com muitas dores” (1 Tm 6:10). Mas vamos à passagem de Romanos 1, que dispensa mais explicações:
“Porque do céu se manifesta a ira de Deus sobre toda a impiedade e injustiça dos homens, que detêm a verdade em injustiça. Porquanto o que de Deus se pode conhecer neles se manifesta, porque Deus lho manifestou. Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se veem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis; porquanto, TENDO CONHECIDO A DEUS, NÃO O GLORIFICARAM COMO DEUS, antes em seus discursos [raciocínios] se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu. Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos. E mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de HOMEM corruptível, e de aves, e de quadrúpedes, e de répteis.
“Por isso também DEUS OS ENTREGOU às concupiscências de seus corações, à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si; pois mudaram a verdade de Deus em mentira, e honraram e serviram mais a criatura do que o Criador, que é bendito eternamente. Amém. Por isso Deus os abandonou às paixões infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural, no contrário à natureza. E, semelhantemente, também os homens, deixando o uso natural da mulher, se inflamaram em sua sensualidade uns para com os outros, homens com homens, cometendo torpeza e recebendo em si mesmos a recompensa que convinha ao seu erro.
“E, como eles não se importaram de ter conhecimento de Deus, assim Deus os entregou a um sentimento perverso, para fazerem coisas que não convêm; estando cheios de toda a iniquidade, prostituição, malícia, avareza, maldade; cheios de inveja, homicídio, contenda, engano, malignidade; sendo murmuradores, detratores, aborrecedores de Deus, injuriadores, soberbos, presunçosos, inventores de males, desobedientes aos pais e às mães; néscios, infiéis nos contratos, sem afeição natural, irreconciliáveis, sem misericórdia; os quais, conhecendo a justiça de Deus (que são dignos de morte os que tais coisas praticam), não somente as fazem, mas também consentem aos que as fazem” (Rm 1:18-32).
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Cristãos devem promover conferências?
Você soube que os irmãos com os quais congrego costumam promover conferências e quis entender melhor o que é isso e por que elas são dirigidas aos irmãos, e não aos incrédulos. Creio que uma dificuldade para entender isso é porque nas denominações a igreja se reúne principalmente para pregar o evangelho. Tem um pregador à frente e no final ele faz um apelo para que creiam em Jesus. Esse modelo não tem fundamento bíblico para uma reunião da assembleia ou igreja, a qual não se reúne para incrédulos, mas para a edificação dos santos, adoração e oração.
Outra confusão geralmente ocorre porque algumas denominações religiosas ou mesmo grupos sem denominação promovem conferências no sentido de unificar a crença daquele grupo. Neste caso a conferência é uma ação de cima para baixo, dos líderes clericais para os leigos. Isso existe tanto no protestantismo como no catolicismo, com suas “Convenções” e “Conferências”. Então a sede mundial ou regional da organização determina a necessidade desses encontros periódicos.
Mas as conferências que costumo frequentar não tem nada a ver com isso e nem é uma ação determinada por alguma sede ou organização, já que essas coisas não existem entre os irmãos congregados somente ao nome do Senhor. As conferências são iniciativas locais, de uma ou mais assembleias que promovem reuniões especiais para exercitar a comunhão entre os santos e também o aprendizado da Palavra. O fato de algumas assembleias promoverem conferências ou reuniões especiais pode ser entendido com o que costumamos fazer em nossa vida diária. Almoçamos e jantamos todos os dias, mas em algum momento do ano convidamos todos os parentes para um almoçou ou jantar, tanto para reencontrarmos e conhecermos novos membros acrescentados à família, como para nos animarmos mutuamente. Assim é uma conferência entre os irmãos.
Eventualmente os irmãos da assembleia que promovem e recepcionam os irmãos nessas conferências podem criar um programa que, além de incluir a ceia do Senhor, ministério da palavra por dois ou três e orações, inclui também pregações para crentes e reuniões de estudo bíblico. Além disso, pode-se também querer convidar alguns irmãos para pregarem o evangelho, dando assim oportunidade aos irmãos de convidarem amigos e parentes incrédulos para essas pregações.
Alguns irmãos costumam gravar e publicar ou transmitir ao vivo essas pregações do evangelho voltadas aos incrédulos, mas em minha opinião uma transmissão das reuniões da assembleia, como ceia, ministério e oração, soaria estranho, pois são reuniões de um caráter muito mais íntimo e reservado. A ceia do Senhor não é celebrada para espectadores, e muito menos a reunião de oração. Ainda que as reuniões de ministério possam ser úteis para os que não estão congregados (e por isso costumam ser gravadas em áudio), transmiti-las em vídeo criaria alguns problemas, como a preocupação com a imagem, da parte do que fala, ou mesmo constrangimento de alguns irmãos que poderiam deixar de falar por se sentirem pouco confortáveis diante de uma câmera. Além disso não devemos nos esquecer que a fé vem pelo ouvir, não pelo ver ou assistir.
As conferências são momentos preciosos para os que participam e vemos esse intercâmbio e “festas de amor” acontecendo entre os santos do Novo Testamento. No Antigo Testamento temos princípios que nos levam a apreciar esses encontros, como é o caso de Neemias 8. Ali temos um bom exemplo de qual é o sentimento quando irmãos se reúnem em caráter extraordinário para se dedicarem à Palavra e ao auxílio mútuo em um evento como é uma conferência. Vamos à passagem de Neemias:
“Assim, quando chegou o sétimo mês, os israelitas estavam instalados em suas cidades e casas. Todo o povo se reuniu então, como um só homem, na praça que ficava diante da porta da Água, e pediu a Esdras, o escriba, que trouxesse o livro da Lei de Moisés, que o Senhor havia prescrito a Israel. O sacerdote Esdras trouxe a lei diante da assembleia de homens, mulheres e de todas as crianças que fossem capazes de compreender. Era o primeiro dia do sétimo mês.
“Esdras fez então a leitura da lei, na praça que ficava diante da porta da Água, desde a manhã até o meio-dia, na presença dos homens, mulheres e das crianças capazes de compreender; todos escutavam atentamente a leitura. O escriba Esdras postou-se num estrado de madeira que haviam construído para a ocasião; a seu lado encontravam-se, à direita, Matatias, Semeías, Anias, Urias, Helcias e Maasias; à esquerda, Fadaías, Misael, Melquias, Hasum, Hasbadana, Zacarias e Mosolão. Esdras abriu o livro à vista do povo todo; ele estava, com efeito, elevado acima da multidão. Quando o escriba abriu o livro, todo o povo levantou-se.
“Esdras bendisse o Senhor, o grande Deus; ao que todo o povo respondeu, levantando as mãos: Amém! Amém! Depois inclinaram-se e prostraram-se diante do Senhor com a face por terra.E Josué, Bani, Serebias, Jamin, Acub, Seftai, Odias, Maasias, Celita, Azarias, Josabed, Hanã, Falaías e outros levitas explicavam a lei ao povo, e cada um ficou no seu lugar. Liam distintamente no livro da lei de Deus, e explicavam o sentido, de maneira que se pudesse compreender a leitura.
“Depois Neemias, o governador, Esdras, sacerdote e escriba, e os levitas que instruíam o povo, disseram a toda a multidão: Este é um dia de festa consagrado ao Senhor, nosso Deus; não haja nem aflição, nem lágrimas. Porque todos choravam ao ouvir as palavras da lei. Neemias disse-lhes: Ide para as vossas casas, fazei um bom jantar, tomai bebidas doces, e reparti com aqueles que nada têm pronto; porque este dia é um dia de festa consagrado ao nosso Senhor; não haja tristeza, porque a alegria do Senhor será a vossa força. Os levitas acalmavam o povo. Calai-vos, diziam eles, este é um dia santo; não vos aflijais. E todo o povo se foi para beber e comer, dar porções aos pobres e entregar-se a grandes alegrias. Porque haviam entendido o sentido das palavras que lhes foram explicadas” (Ne 8:1-12).
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O que aconteceu com os corpos de Enoque e Elias?
Sua dúvida é se Enoque e Elias, que foram arrebatados, estariam hoje no céu no mesmo corpo em que habitavam na terra? Não, porque um corpo humano não glorificado não poderia viver no céu. O único em corpo de carne e ossos agora lá é também o único que ressuscitou e foi glorificado, Jesus, as primícias (ou primeiros frutos) dos que dormem. Então de algum modo Deus, em algum momento do arrebatamento de Enoque e Elias, deu um jeito em seus corpos e a Bíblia não diz como isso foi feito. Mas, como isso aconteceu antes da ressurreição de Jesus, é certo que eles não subiram em corpos ressuscitados ou transformados porque Cristo precisaria antes ser o primeiro neste sentido.
Mas se a dúvida parasse aí, tudo bem. Acontece que temos o caso de Elias, aparecendo em corpo glorificado ao lado de Moisés e Jesus no monte da transfiguração (Mateus 17; Marcos 9; Lucas 9). Então a dúvida fica até maior, pois deveríamos perguntar também: Em que corpo Jesus apareceu ali, se ele ainda não tinha morrido, ressuscitado e sido glorificado? Bem, aparentemente não era em seu corpo natural, pois ele brilhava em glória e isso nada tinha a ver com o Servo humilde que veio habitar aqui, que não tinha aparência nem formosura (Isaías 53), que padecia fome e sede (João 4), ao qual nem mesmo os soldados que foram prendê-lo conseguiam identificar, daí a necessidade do beijo de Judas para lhes indicar quem era Jesus (Mateus 26). Mas também não era em um corpo ressuscitado como o que Tomé tocou (Lucas 24), e nem glorificado como o que ele está agora na glória e foi visto por Estêvão (Atos 7). Ou será que era?
Primeiro, é bom lembrar que muitos anjos já apareceram em um corpo visível na terra, começando por Satanás na forma de uma serpente (Gênesis 3). Depois temos o caso dos anjos que deixaram sua posição e condição tomando para si mulheres e gerando nelas os valentes da antiguidade (Gênesis 6). Também temos o caso do anjo Gabriel que visitou Maria, e também o próprio Senhor que apareceu várias vezes em forma visível no Antigo e Novo Testamentos, às vezes identificado como “o anjo do Senhor”. Anjos também foram vistos como “homens” — em forma humana — ao longo de toda a Bíblia, dois deles tendo sido assediados pelos habitantes de Sodoma depois de comerem uma refeição com Abraão debaixo de uma árvore, da qual participou o próprio Jeová em um corpo visível e tangível (Gênesis 18). Com tudo isso, o melhor é você descansar no fato de que Deus tem uma maneira de apresentar seres do plano espiritual e celestial de modo visível e tangível no plano físico material. Até o Espírito Santo já foi visto na forma de uma pomba no batismo de Jesus.
Outra possibilidade que existe para a cena da transfiguração é que os três — Jesus, Moisés e Elias — estariam ali verdadeiramente em corpos glorificados, porém não no mesmo momento em que a cena se desenrolava diante dos olhos dos três discípulos, mas numa fresta espaço-tempo através da qual os três discípulos podiam espiar e ver uma cena passando-se na eternidade, ou extra tempo. O fato de eles estarem conversando sobre a morte de Jesus que se daria em poucos dias (Lc 9:31) não é dificuldade alguma, pois a morte de Jesus é o assunto eterno nos céus, conforme Apocalipse 5, e a informação de que ela se daria em alguns dias pode ter sido dada apenas para situá-la no tempo, uma variável que não existe na eternidade.
Então, o melhor mesmo é simplesmente admitir que não sabemos tudo, mas apenas aquilo que nos foi revelado. Que estes fatos aconteceram, a Palavra de Deus afirma e a fé não irá negar, pois estão registrados e revelados. O modo como alguns desses fatos aconteceram nós só vamos descobrir na glória, mesmo porque são coisas que não dizem respeito exclusivamente à terra, mas aos céus e ao estado das coisas lá. Lembre-se do que Paulo disse de sua visita ao terceiro céu quando ouviu “palavras inefáveis, que ao homem não é lícito falar” (1 Co 12:4).
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Por que o livro de Enoque não faz parte da Bíblia?
Sua dúvida é: Se Judas utilizou o livro de Enoque, por que ele não faz parte da Bíblia? A passagem que costuma levantar dúvidas como a sua está em Judas 1:14: “E destes profetizou também Enoque, o sétimo depois de Adão, dizendo: Eis que é vindo o Senhor com milhares de seus santos”. Se ler atentamente toda a epístola de Judas verá que ele não fala de nenhum “Livro de Enoque”, mas só menciona o que Enoque disse. Como estamos lendo uma carta inspirada, pode muito bem ter sido que Judas recebeu esta informação por revelação direta do Espírito Santo. Judas não diz que utilizou o livro de Enoque ou que tenha obtido sua citação de um tal livro. Ele simplesmente disse que Enoque profetizou algo, mas como ele soube disso não nos é dito.
Os livros que chamamos de canônicos eram os utilizados pelos cristãos no início da Igreja e também considerados por eles como inspirados, uma decisão que eu creio firmemente que teve a direção do Espírito Santo, ou aqueles irmãos do passado não saberiam discernir. Não li o “Livro de Enoque” que você mencionou, mas li alguns comentários de pessoas que analisaram o livro e apontaram umas duas dezenas de incongruências com o ensino geral das Escrituras. Portanto se você quiser ficar seguro quanto à sã doutrina, permaneça dentro daquilo que foi revelado pelo Espírito nos livros inspirados que tem aí mesmo em sua Bíblia. Confiar em registros científicos, históricos ou arqueológicos, que mudam com cada nova descoberta, ou em textos que não passaram pelo crivo de irmãos do início da igreja, que sabiam quais circulavam entre as assembleias e quais eram incongruentes com a doutrina, colocará você em um terreno pantanoso.
Existem muitas provas da inspiração dos livros que temos na Bíblia, seja no Antigo ou no Novo Testamento. Neste você descobre detalhes que seriam impossíveis de serem conhecidos por qualquer um dos autores usados pelo Espírito de Deus, por terem sido coisas que ocorreram quando não tinha mais ninguém por perto para relatá-las, ou que envolviam os sentimentos do Senhor ou a opinião que o próprio Deus tinha de alguém. Por exemplo, como Lucas saberia que Zacarias e Isabel “eram justos aos olhos de Deus” (Lc 1:6), se o próprio Deus não tivesse lhe revelado esta impressão? Ou como poderia escrever da angústia de Jesus e as palavras de sua oração no Monte das Oliveiras quando ele orou sozinho? Ou de seu suor, como gotas de sangue e do anjo que o confortava, se os discípulos estavam dormindo e ninguém mais viu aquilo? (Lc 22:40-43). Tudo isso está naquele evangelho, mas geralmente lemos sem prestar atenção suficiente para perguntar: Como é que Lucas sabia?!
Veja que interessantes estas duas citações de 1 Timóteo 5:18: “A Escritura diz: ‘Não amordace o boi enquanto está debulhando o cereal’, e ‘o trabalhador merece o seu salário’”. Paulo cita uma passagem do Antigo Testamento e outra de Lucas 10, chamando ambas de “A Escritura”, termo comumente usado pelo Senhor e pelos discípulos para se referir à Palavra de Deus. Paulo, que escreveu pouco depois de Lucas, já atribuía ao seu texto o status de Sagradas Escrituras. E Pedro, no capítulo 3 de sua segunda carta, chama de “escrituras” também as cartas de Paulo. Crer em Jesus implica crer também na Bíblia como a inerrante Palavra de Deus. Afinal, como você teria conhecido Jesus se não fosse pela revelação feita aos quatro evangelistas e confirmada pelas epístolas dos apóstolos?
Existe hoje um “Livro de Enoque” apócrifo, mas tudo indica que foi escrito poucos séculos antes da era cristã por alguém que queria se passar por Enoque ou que fez uma compilação de lendas atribuídas a Enoque. Ou pode até ter sido escrito depois de Judas escrever sua epístola e seu autor ter se apropriado da citação feita por Judas, não sabemos. Mas não existe qualquer evidência de que Enoque tenha deixado um livro que teria escapado das águas do dilúvio para chegar aos nossos dias. Muitos — talvez a maioria — dos que me escrevem perguntando sobre o apócrifo “Livro de Enoque” nunca leram todos os livros inspirados da Bíblia e já estão querendo se ocupar com apócrifos (existem dezenas deles). Minha sugestão sempre é: Depois que você terminar de ler e entender tudo o que a Bíblia diz, aí pode dar uma espiadinha nos apócrifos. Se sobrar tempo, evidentemente.
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Existe alguma profecia que fale do futuro do Brasil?
Sim, existe, e tudo o que você desejar saber sobre o futuro do Brasil é só buscar saber mais de “Babilônia, a grande” de Apocalipse. O Brasil e outros países das Américas são extensões dos países da Europa, com suas línguas e costumes, inclusive se identificando como países que acolheram o cristianismo, ao contrário dos países do Oriente Médio e Extremo Oriente. Portanto creio que esses países das Américas entrem na mesma condenação reservada à Europa cristianizada, que durante o reino de mil anos de Cristo na terra irá se transformar em um deserto inabitável.
Ao contrário dos que pensam que o cristianismo no Ocidente esteja crescendo e prosperando, a verdade é que o que está crescendo é a árvore de mostarda, com suas aves malignas aninhadas em seus galhos, e a massa fermentada de má doutrina, duas coisas em Mateus 13 para representar o reino dos céus aqui na terra. O reino dos céus não é o céu, mas a esfera da profissão dos que reconhecem o Rei e Senhor Jesus, não necessariamente crendo nele ou se sujeitando a ele. No reino dos céus existem joio e trigo convivendo. O que cresce no Ocidente é também o fato de que o nome de Cristo é cada dia mais tripudiado nessa grande casa que é a cristandade, chamada de Babilônia em Apocalipse. A Europa teve seu momento de conhecer o evangelho, teve muitos tocados pelo mesmo evangelho e promoveu uma era sem precedentes de evangelização do mundo. Só para abandonar de vez toda confissão cristã e até transformar suas antigas capelas em casas de shows. Agora nas Américas é a vez dos pregadores da prosperidade literalmente sapatearem sobre o cristianismo.
No arrebatamento Cristo virá buscar TODOS os salvos espalhados por essas terras e pelas “igrejas” que os homens criaram, deixando apenas a casca das organizações, ainda cheias de professos, mas vazias de salvos. Os perdidos que permanecerem nessas cascas de aparência cristã, um dia rejeitaram o amor da verdade e isso fará com que creiam na mentira do anticristo. Deus mesmo fará com que creiam assim. Então, no reino milenar de Cristo na terra, no qual entrarão os que se converterem após o arrebatamento da Igreja, as terras que antes receberam a luz do evangelho, como Europa e Américas, passarão mil anos em desolação.
Bruce Anstey, em seu livro “Acontecimentos Proféticos”, faz este comentário:
“Nas nações ocidentais as pessoas serão tão raras quanto ouro. Isto será por causa da morte decorrente das catástrofes, doenças e guerras. Mas principalmente porque os anjos de Deus passarão por essas terras tirando delas os ímpios (vivos) e lançando-os no lago de fogo (a Colheita). A população diminuirá ainda mais (depois que os anjos passarem por essas terras) porque muitos dos que sobrarem irão retornar às suas pátrias de origem. Isaías 13:12, 14:23, 24:6; Jeremias 50:3, 39, 51:2; Apocalipse 6:3-8; Mateus 13:41-42, 24:36:41. As grandes cidades da Europa e América ficarão praticamente desabitadas durante o Milênio, depois que os anjos passarem por elas fazendo a colheita e separando os ímpios dos justos. As feras do campo rugirão nas casas e edifícios das cidades desoladas” Isaías 13:19-22; Jeremias 50:3, 39-40, 51:26, 29, 43”.
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Será que o que você prega é a Verdade?
Você me enviou um e-mail com a pergunta: “Será que o que você prega é a Verdade?”. Fiquei intrigado com sua pergunta, seguida de um longo texto detalhando os grandes feitos da organização religiosa da qual você é um militante. Você disse que seus irmãos dessa organização “se esforçam ao máximo para seguir os ensinos de Jesus”, o que é louvável. Disse que “creem em Jesus como sendo o único meio provido por Jeová para que sejam salvas e tenham vida eterna”, o que também creio. Você continuou dizendo que eles “exercem fé em Jesus e pregam as boas novas do reino conforme ele ordenou”. Então lançou seu desafio: “Você conhece outra religião que faça a pregação como Jesus e os apóstolos fizeram?”.
Bem, não sei o que quis dizer com isso porque não encontrei nenhuma religião na Bíblia que tivesse boca para pregar. Encontrei apenas pessoas com bocas pregando, e a mensagem delas nunca foi religião ou o convite para que as pessoas se filiassem a uma. Encontrei apenas pessoas pregando a Cristo, que morreu e ressuscitou, que é o que também prego em meus textos e vídeos na Web. Então por que depois de ler e ouvir o que prego você teria levantado a dúvida “Será que o que você prega é a Verdade?”. Se eu prego a Jesus, o Salvador, e tenho muitas provas bíblicas de que ele é “o caminho, e a verdade e a vida” e que ninguém vai ao Pai senão por ele (Jo 14:6), em que você viu falta? Será que você não acha que ele seja a Verdade? Então o que é a Verdade para você?
A continuação de seu e-mail deu algumas pistas do que você acha que seja a Verdade, e no seu entender ela não seria uma Pessoa — Jesus —, mas uma organização religiosa, a qual seria também a responsável por salvar alguém eternamente. E pelo que escreveu no final pude crer que você acha que se eu não me filiar a essa organização não existe salvação para mim, mas terei minha existência sumariamente deletada com o aniquilamento total de minha pessoa. Sério?!
Então você me convidou a ir ao site de sua organização para ler o anuário com os relatórios que mostram que os militantes desse sistema religioso “pregaram cerca de 2 bilhões de horas no último ano de serviço e dirigiram cerca de 10.115.264 estudos da Bíblia”. Realmente impressionante, mas eu pergunto: Devo parar de teclar para aplaudir os militantes de sua organização religiosa por esse esforço hercúleo em divulgar a própria organização religiosa? Sério que eles marcam o tempo de pregação? Será que existe algum prêmio para quem pregar mais tempo ou fizer visitas mais demoradas? E se o militante falar devagar, enrolar, tem alguma penalidade? Como operacionalizam isso? Cada um leva um taxímetro? E se a visita for à noite, tem bandeira 2, tipo tempo dobrado? Agora fiquei curioso em imaginar se os primeiros cristãos levavam uma ampulheta ou um relógio de sol quando saíam para evangelizar. Seu discurso estaria OK se você estivesse tentando me vender ações de uma empresa, um plano de saúde ou título de clube de campo. Mas qual a razão de fazer propaganda dessa organização?
“Foram gastos na divulgação da mensagem do reino mais de 213 milhões de dólares no ano passado”, acrescentou você em seu esforço de convencimento. Então, num arremedo de justiça própria, acrescentou que os militantes de sua organização têm “amor entre si”, o que os caracterizaria como os verdadeiros discípulos de Cristo. Neste ponto, por alguma razão, me vêm à memória Provérbios 27:2: “Que um outro te louve, e não a tua própria boca; o estranho, e não os teus lábios”.
Você me informa que os jovens militantes dessa organização religiosa, fundada por volta de 1870, “não fazem tiro de guerra ou exército e por isso muitos passam anos presos”. É mesmo? E onde na Bíblia você viu que Deus proibiu o cristão de ser militar? Quando Pedro pregou a Cornélio, o centurião romano, ele não disse nada a respeito, mas concentrou-se na Pessoa e obra de Cristo.
E repare que Pedro começa seu discurso dizendo “nós somos TESTEMUNHAS de todas as coisas que fez, tanto na terra da Judeia como em Jerusalém, ao qual mataram, pendurando-o num madeiro. A este ressuscitou Deus ao terceiro dia, e fez que se manifestasse, não a todo o povo, mas às TESTEMUNHAS que Deus antes ordenara; a nós, que comemos e bebemos juntamente com ele, depois que ressuscitou dentre os mortos. E nos mandou pregar ao povo e testificar que ele é o que por Deus foi constituído juiz dos vivos e dos mortos. A este dão testemunho todos os profetas, de que todos os que nele creem receberão o perdão dos pecados pelo seu nome” (At 10:39-43).
Por duas vezes Pedro diz que ele e os outros discípulos eram TESTEMUNHAS, um título que você e os de sua organização gostam de utilizar, mas em nenhum momento Pedro diz a Cornélio para ele deixar a farda e a carreira militar. João Batista não incentivou os soldados de seu tempo à deserção, mas quando alguns lhe perguntaram como deviam agir, ele simplesmente disse para tratarem bem as pessoas e se contentarem com o salário. Acho que eu e você concordamos que as pessoas que deviam ser bem tratadas não eram os marginais, mas os cidadãos de bem. “E uns soldados o interrogaram também, dizendo: E nós que faremos? E ele lhes disse: A ninguém trateis mal nem defraudeis, e contentai-vos com o vosso soldo” (Lc 3:14). O “evangelho” que você prega condiciona a pessoa, não apenas a ser membro dessa organização, mas a desertar se for soldado ou policial e sofrer as consequências de sua deserção, apesar de não ter nenhum caso semelhante na Bíblia para apresentar.
Você terminou seu texto com uma crítica e desafio dirigido a mim: “É fácil ficar atrás da tela de um computador e dizer o que acredita, mesmo sem conhecer a fundo o assunto [você quis dizer sua organização que critiquei em um de meus artigos que leu]… Na Bíblia Jeová nos ordena que devemos avisar para não termos culpa de sangue no caso de a pessoa não retroceder de seu caminho”.
Dá para perceber que você se deu a todo esse trabalho de escrever para mim, não por estar preocupado com minha salvação, mas para livrar a sua cara, pois aparentemente estava pensando no texto de Ezequiel 3:16-19, que começa dizendo: “Veio a palavra do Senhor a mim, dizendo: Filho do homem: Eu te dei por atalaia sobre a casa de Israel…” Bem, você nem precisava se incomodar em me avisar, porque isso não foi dito a você, mas a Ezequiel, o profeta, e a mensagem que ele tinha de passar não era para mim, mas para “a casa de Israel”, sobre a qual tinha sido colocado por profeta. Fique tranquilo, pois Deus não iria requerer seu sangue por não ter me avisado de que eu deveria me filiar à sua organização. Afinal, acho que nem Ezequiel fazia ideia na época de que deveria avisar a casa de Israel a se filiar à sua organização.
É realmente intrigante a pergunta que me fez — “Será que o que você prega é a Verdade?” — porque fiquei com vontade de perguntar o mesmo a você. Se você viu, leu ou ouviu o material que publico, deve ter percebido que não sigo nenhuma organização religiosa, não faço propaganda de nenhuma e nem convido pessoas a se juntarem a uma. Não apresento relatórios de grandes feitos, porque só falo de um grande feito, que é o mesmo evangelho que Paulo pregava: “Primeiramente vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras, e que foi sepultado, e que ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras” (1 Co 15:3-4). Curiosamente Paulo e os outros apóstolos nunca convidaram ninguém para se filiar a alguma denominação ou organização religiosa, e muito menos uma que seria criada quase dois mil anos depois de Jesus andar aqui.
Se não prego alguma denominação religiosa é porque “em nenhum outro há salvação, porque também debaixo do céu nenhum outro nome há, dado entre os homens, pelo qual devamos ser salvos” (At 4:12) e tampouco convido pessoas para se filiarem a alguma, porque os apóstolos não falaram de uma organização, mas de um organismo, um corpo vivo: a igreja, o corpo de Cristo. Mas os mesmos apóstolos e discípulos nunca convidavam alguém a se tornar membro desse corpo porque homem algum tem poder para isso. E quando digo que homem algum tem o poder de se fazer membro desse corpo é porque o próprio Jesus é quem acrescenta os que são seus, e para isso vou usar um versículo da versão da Bíblia que você utiliza: “Ao mesmo tempo, Jeová continuava a ajuntar-lhes diariamente os que estavam sendo salvos” (At 2:47).
Eu realmente não entendi esse seu método de evangelização que consiste em desfilar os predicados e grandes feitos da organização à qual faz parte. Me fez lembrar do fariseu no Templo querendo impressionar a Deus pelos seus feitos, enquanto desprezava o publicano contrito. Embora eu faça um trabalho de evangelização, seria inútil eu querer conquistar pessoas apresentando a um pecador perdido algum relatório com o número de pessoas que são alcançadas por meus textos, áudios e vídeos, porque nem eu sei o quanto desse trabalho vem realmente do Espírito ou é apenas esforço de minha carne. Deixo para o Senhor julgar isso quando eu estiver diante do Tribunal de Cristo, que é o julgamento, não do crente, mas de suas obras. Lá ele será o único capaz de dizer o que é “ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno, palha” (1 Co 3:12). Mas isso não é agora, e nem espero receber louvor de homens, “portanto, nada julgueis antes de tempo, até que o Senhor venha, o qual também trará à luz as coisas ocultas das trevas, e manifestará os desígnios dos corações; e então cada um receberá de Deus o louvor” (1 Co 4:5).
Finalizando, pelo que entendi não pregamos o mesmo evangelho, pois apesar de eu dizer às pessoas para crerem em Cristo para serem salvas, eu não as convido para se filiarem à organização que você tentou me vender com seus relatórios. E por eu não ter aceitado seu convite a me juntar às 20 milhões de pessoas em todo o mundo que fazem parte de sua organização, isso me coloca na fila dos que não irão sofrer eternamente no lago de fogo, como creio que seja o destino dos perdidos, mas estarei entre os que serão deletados para sempre, como ensina sua organização. Aniquilamento total do ímpio, no caso eu. Me fez lembrar o que disse um rapaz ateu que recebeu no portão um dos militantes de sua organização, e quando este o ameaçou do aniquilamento eterno, ele fez questão de pedir uma confirmação:
— Você garante que serei aniquilado no final, que deixarei de existir?
— Garanto — respondeu o outro guardando suas revistas na pasta.
— OBRIGADO! MUITO OBRIGADO! Era tudo o que eu queria ouvir! Não tenho nenhum interesse em continuar existindo.
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Quem era o vulgo que saiu do Egito?
A passagem de sua dúvida é esta: “E o vulgo, que estava no meio deles, veio a ter grande desejo; pelo que os filhos de Israel tornaram a chorar, e disseram: Quem nos dará carne a comer? Lembramo-nos dos peixes que no Egito comíamos de graça; e dos pepinos, e dos melões, e dos porros, e das cebolas, e dos alhos. Mas agora a nossa alma se seca; coisa nenhuma há senão este maná diante dos nossos olhos. E era o maná como semente de coentro, e a sua cor como a cor de bdélio” (Números 11:4-7).
Ela pode indicar que eram egípcios e pessoas de outras nacionalidades que moravam no Egito e, depois das pragas, viram que Deus estava a favor dos israelitas. Outras versões dizem “o populacho”, “a grande mistura de gente”, “um grupo de pessoas”, “estrangeiros”, indicando que não eram israelitas. Considerando o tempo que os israelitas viveram no Egito é bem possível que tivessem simpatizantes, parentes e amigos entre os egípcios e também entre os povos estrangeiros que habitavam aquela nação. O Egito era uma nação cosmopolita, um verdadeiro caldo de povos e culturas, como são as grandes cidades do mundo.
À semelhança daqueles que atravessaram o mar aberto com os israelitas, mas não eram genuínos representantes do povo de Deus de outrora, hoje existem muitos que caminham juntamente com os cristãos por este deserto que é o mundo, mas estão nesta jornada por motivos diversos. Pode ser medo de ser condenado com o mundo, superstição, amizade com algum crente, interesse em alguma garota ou garoto, desejo de uma carreira eclesiástica pelo dinheiro e fama, status, busca por votos na carreira política, desejo de agradar um patrão crente, etc.
Estes são cristãos professos, apenas “da boca pra fora”, e vivem misturados com verdadeiros. São joio no meio do trigo, que não têm uma nova vida, nem a salvação, nem qualquer apreciação por Jesus, aquele que disse “Eu sou o pão que desceu do céu” (João 6:41). O maná era uma figura de Cristo, e os que estão nessa jornada por puro interesse nenhum prazer encontram nesse Pão vindo do céu. Para esses, Cristo não é apenas desinteressante, mas pode ser até intragável, como era: “Coisa nenhuma há senão esse maná diante de nossos olhos”, diziam eles, ou “a nossa alma tem fastio deste pão tão vil” (Nm 21:5). Eram esses que reclamavam, “Quem nos dará carne a comer? Lembramo-nos dos peixes que no Egito comíamos de graça; e dos pepinos, e dos melões, e dos porros, e das cebolas, e dos alhos. Mas agora a nossa alma se seca; coisa nenhuma há senão este maná diante dos nossos olhos” (Nm 11:4-6).
Se você estiver entre esse “vulgo” — se você for cristão apenas por amizade e interesse —, é melhor acordar para o fato de que sua jornada não terminará na “Canaã celestial”, mas no lago de fogo. Você pode enganar a muitos, mas não a Deus, pois naquele dia você não terá desculpa nem argumento para ter rejeitado crer verdadeiramente no Salvador, e ficará mudo na presença do Rei que estará, não mais como o humilde Jesus que caminhou aqui, mas como Juiz, o Filho do Homem que há de julgar vivos e mortos.
“E o rei, entrando para ver os convidados, viu ali um homem que não estava trajado com veste de núpcias. E disse-lhe: Amigo, como entraste aqui, não tendo veste nupcial? E ele emudeceu. Disse, então, o rei aos servos: Amarrai-o de pés e mãos, levai-o, e lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá pranto e ranger de dentes. Porque muitos são chamados, mas poucos escolhidos” (Mt 22:11-14).
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Jesus foi ao inferno tomar a chave das mãos do diabo?
Jesus nunca foi ao inferno tomar do diabo alguma chave dos portões infernais. Quando se mistura Bíblia com lendas, gibi, ficção científica, filmes de terror e livros de Dan Brown o resultado é uma salada conspiratória. Primeiro, Cristo foi direto ao Paraíso assim que morreu, e seu corpo foi sepultado (é isto que significa que “tinha descido às partes mais baixas da terra” – Ef 4:9). Segundo, o diabo não tem nenhuma chave e nem mora no inferno. No presente momento ele circula entre a terra e o céu, e se ler os dois primeiros capítulos do livro de Jó verá Satanás ali em uma audiência com o Senhor.
Algumas versões da Bíblia confundem por traduzir as palavras Geena (hebraico), Hades (grego) e “lago de fogo” indistintamente por um genérico “inferno”. Mas são coisas com significados diferentes e que também dependem do contexto para serem entendidas. O “lago de fogo” (Ap 19:20; 20:10, 14-15) é onde serão lançados os perdidos mortos após terem recebido de volta seus corpos no juízo final do “Grande Trono Branco”. Esse lugar — também chamado de “fogo eterno” — não foi preparado para os homens e sim para Satanás e seus anjos, como o Senhor ensinou: “Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos” (Mt 25:41).
Deus não destinou o homem para a perdição, mas este, caindo em pecado e não aceitando a graça salvadora que trouxe Cristo até a cruz para nos remir, será lançado no lago de fogo que arde eternamente, juntamente com os anjos caídos. Mas não tem ninguém nesse lago de fogo eterno hoje, e os primeiros a inaugurarem suas chamas serão a besta e o anticristo. “E a besta foi presa, e com ela o falso profeta, que diante dela fizera os sinais, com que enganou os que receberam o sinal da besta, e adoraram a sua imagem. Estes dois foram lançados vivos no lago de fogo que arde com enxofre” (Ap 19:20). Mil anos depois, “o diabo… foi lançado no lago de fogo e enxofre, onde está a besta e o falso profeta; e de dia e de noite serão atormentados para todo o sempre” (Ap 20:10).
Hoje, quem morre tem seu corpo transformado em pó na terra e seu espírito e alma condicionados ao Hades, que não é exatamente um lugar físico, mas uma condição de morte e separação do corpo. Por isso o rico em Lucas 16 estava no Hades e podia ver de lá Lázaro no “seio de Abraão”, uma figura do acolhimento que o crente desfruta junto a Deus dentro de uma perspectiva judaica. Mas como aprendemos da morte do malfeitor convertido e da promessa que Jesus fez a ele de estarem juntos naquele mesmo dia no Paraíso (Lc 23:43), podemos estar certos de que todo aquele que fecha seus olhos aqui na terra na fé em Cristo, irá abri-los imediatamente depois no céu na presença dele. Quem morre salvo por Cristo fica ali aguardando a ressurreição de seu corpo, e os que morrem sem Cristo estão na condição de Hades — separação do espirito e alma do corpo — aguardando receber de volta seus corpos para serem lançados no lago de fogo no juízo final.
E as chaves? Bem, quem tem as chaves de qualquer coisa tem o controle, como é o caso do carcereiro, que pode abrir ou trancar alguém na cela. Sempre foi assim, e o mesmo vale para as coisas de Deus. Somente Cristo conquistou ou venceu a morte e saiu da sepultura ressuscitado, subindo ao céu glorificado. Mais ninguém até agora experimentou isso. Somente ele pode determinar quem entra na morte e no Hades, e mais tarde no “lago de fogo”, e somente ele possui as chaves. Ele é quem tem autoridade sobre a morte e sobre o destino dos mortos, mais ninguém.
Satanás nunca teve chave alguma neste sentido e ele próprio está destinado a habitar no lago de fogo, um lugar onde até agora ele nunca esteve porque está vazio. Ou você ainda tem na cabeça aquela imagem de gibi, de um diabo de rabo e chifres sentado num trono em meio às chamas e cutucando as pessoas com seu garfo? Ou talvez tenha acreditado no “Inferno de Dante”, um autor que conhecia as coisas eternas tanto quanto Leonardo Da Vinci entendia de santa ceia, quando pintou a cena com todos sentados à moda europeia do mesmo lado de uma mesa elevada como se posassem para uma foto. Na Judeia dos tempos de Jesus as pessoas se reclinavam no chão em torno de uma mesa baixa, e é por isso que não há nada de estranho na expressão: “Ora, um de seus discípulos, aquele a quem Jesus amava, estava reclinado no seio de Jesus” (Jo 13:23).
Apocalipse deixa muito claro QUEM tem o poder sobre a morte e a perdição eterna, e seria ir além do que está escrito querer sugerir que talvez no passado ele não tivesse esse poder e precisasse roubá-lo do diabo. Ele diz: “Eu sou o primeiro e o último; E o que vivo e fui morto, mas eis aqui estou vivo para todo o sempre. Amém. E tenho as chaves da morte e do inferno” (Ap 1:17-18). Jesus não precisou lutar contra o diabo para conquistar coisa alguma, e até a obra na cruz, que aos olhos do diabo foi uma derrota para Jesus, sabemos que foi a vitória. “E, despojando os principados e potestades (aqui fala do diabo e seus anjos), os expôs publicamente e deles triunfou em si mesmo” (Cl 2:15).
Mas existe sim um sentido no qual Jesus subtraiu algo do diabo. Começou quando andou aqui curando as pessoas oprimidas pelo diabo e libertando-as de seu jugo. Pedro, em seu discurso a Cornélio e seus amigos, fala de “como Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com virtude; o qual andou fazendo o bem e curando a todos os oprimidos do diabo, porque Deus era com ele” (At 10:38). Em Mateus 12:29 era a isso que Jesus se referia: “Ou, como pode alguém entrar em casa do homem valente, e furtar os seus bens, se primeiro não maniatar o valente, saqueando então a sua casa?”. O “homem valente” é o diabo, que Jesus despojou de seus bens.
Hoje o diabo continua perdendo militantes para Jesus. É graças a Deus que os que creem podem afirmar que ele nos libertou “da potestade das trevas, e nos transportou para o reino do Filho do seu amor” (Cl 1:13). E a obra completa de libertação se deu na morte de Cristo na cruz para que, “pela morte aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabo; e livrasse todos os que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à servidão” (Hb 2:14-15).
Neste momento o diabo passeia pela terra e o céu, mas haverá um momento ainda futuro quando será expulso das esferas celestiais e lançado na terra em dias de grande tribulação. Antes que você se surpreenda em saber que o diabo tem acesso aos lugares celestiais, lembre-se dos dois primeiros capítulos do livro de Jó e também da exortação quanto ao lugar onde estão os verdadeiros inimigos do crente, que não são seres humanos, mas anjos caídos (o termo caído não é no sentido de cair de um lugar, mas cair de uma posição, o que aconteceu em tempos imemoráveis quando se rebelou contra Deus): “Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes contra as astutas ciladas do diabo. Porque não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas, sim, contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais” (Ef 6:11-12).
E agora um vislumbre do que o futuro reserva para o diabo e seus anjos, lembrando que aqui ele é identificado claramente como a mesma serpente da tentação no Jardim do Éden: “E houve batalha no céu; Miguel e os seus anjos batalhavam contra o dragão, e batalhavam o dragão e os seus anjos; mas não prevaleceram, nem mais o seu lugar se achou nos céus. E foi precipitado o grande dragão, a antiga serpente, chamada o Diabo, e Satanás, que engana todo o mundo; ele foi precipitado na terra, e os seus anjos foram lançados com ele. E ouvi uma grande voz no céu, que dizia: Agora é chegada a salvação, e a força, e o reino do nosso Deus, e o poder do seu Cristo; porque já o acusador de nossos irmãos é derrubado, o qual diante do nosso Deus os acusava de dia e de noite. E eles o venceram pelo sangue do Cordeiro e pela palavra do seu testemunho; e não amaram as suas vidas até à morte. Por isso alegrai-vos, ó céus, e vós que neles habitais. Ai dos que habitam na terra e no mar; porque o diabo desceu a vós, e tem grande ira, sabendo que já tem pouco tempo. E, quando o dragão viu que fora lançado na terra, perseguiu a mulher [Israel] que dera à luz o filho homem [Jesus, a semente da mulher prometida no Éden]” (Ap 12:7-13).
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No lago de fogo as pessoas serão aniquiladas e deixarão de existir?
O lago de fogo, também chamado de “fogo eterno”, não foi preparado para os homens e sim para Satanás e seus anjos, como o Senhor ensinou: “Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos” (Mt 25:41). Hoje ele está vazio e será inaugurado pela besta e pelo falso profeta, descritos em Apocalipse. Mil anos mais tarde será lançado nele Satanás e também os perdidos, que receberão antes seus corpos no juízo final, o Grande Trono Branco de Apocalipse 20:
“E vi um grande trono branco, e o que estava assentado sobre ele, de cuja presença fugiu a terra e o céu; e não se achou lugar para eles. E vi os mortos, grandes e pequenos, que estavam diante de Deus, e abriram-se os livros; e abriu-se outro livro, que é o da vida. E os mortos foram julgados pelas coisas que estavam escritas nos livros, segundo as suas obras. E deu o mar os mortos que nele havia; e a morte e o inferno deram os mortos que neles havia; e foram julgados cada um segundo as suas obras. E a morte e o inferno foram lançados no lago de fogo. Esta é a segunda morte. E aquele que não foi achado escrito no livro da vida foi lançado no lago de fogo” (Ap 20:11-15).
Quanto à ideia de um aniquilamento dos perdidos no lago de fogo, isso é invenção de religiões de falsos profetas, e é muito fácil entender que ninguém é aniquilado ali vendo o que acontecerá com a besta e o anticristo, que ficarão mil anos no lago de fogo sem serem aniquiladas.
“E a besta foi presa, e com ela o falso profeta, que diante dela fizera os sinais, com que enganou os que receberam o sinal da besta, e adoraram a sua imagem. Estes dois foram lançados vivos no lago de fogo que arde com enxofre” (Ap 19:20).
Repare que por ocasião dessa condenação da besta e do anticristo ou falso profeta, Satanás é preso por mil anos, que é o tempo de duração do reino de Cristo na terra:
“E vi descer do céu um anjo, que tinha a chave do abismo, e uma grande cadeia na sua mão. Ele prendeu o dragão, a antiga serpente, que é o Diabo e Satanás, e amarrou-o por mil anos. E lançou-o no abismo, e ali o encerrou, e pós selo sobre ele, para que não mais engane as nações, até que os mil anos se acabem. E depois importa que seja solto por um pouco de tempo” (Ap 20: 1-3).
Passados os mil anos do reino de Cristo, Satanás é solto para arregimentar um exército para lutar contra Cristo, o qual é rapidamente destruído, daí a expressão “por um pouco de tempo”. Então… “o diabo, que os enganava, foi lançado no lago de fogo e enxofre, onde está a besta e o falso profeta; e de dia e de noite serão atormentados para todo o sempre” (Ap 20:10).
Se prestar atenção nestas passagens verá que é mentira o que ensinam algumas religiões que dizem que o lago de fogo seja o aniquilamento completo do ser. Reparou que a besta e o falso profeta foram lançados no lago de fogo, mas que o diabo foi apenas preso? Reparou que mil anos depois, quando o diabo é lançado no lago de fogo a besta e o falso profeta continuam lá? Não terão sido aniquilados e nunca serão.
Portanto, o lago de fogo será um lugar de eterno juízo, sofrimento e perdição. Isso é demonstrado pela palavra “NUNCA” repetida diversas vezes para descrevê-lo. Marcos 9:43-48 diz: “E, se a tua mão te escandalizar, corta-a: melhor é para ti entrares na vida aleijado do que, tendo duas mãos, ires para o inferno, para o fogo que NUNCA se apaga”. Preste muita atenção nisto: não diz apenas que o fogo “não se apaga”, mas o Senhor repete também no versículo 45, que ele “NUNCA se apaga”.
Se alguém disser a você que se não se converter sofrerá um aniquilamento total e completo, deixando de existir, não caia nessa. Uma pessoa com tendências suicidas que escute algo assim não hesitará em levar adiante seu plano achando que irá deixar de existir. Só será surpreendida quando abrir os olhos e se encontrar consciente e sofrendo no Hades, a condição de morte e separação do espírito e alma do corpo que vai para a sepultura. Estará como o rico citado por Jesus:
“Ora, havia um homem rico, e vestia-se de púrpura e de linho finíssimo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente… e morreu também o rico, e foi sepultado. E no Hades, ergueu os olhos, estando em tormentos… E, clamando, disse… estou atormentado nesta chama” (Lc 16:19-25).
O tormento no Hades é passageiro e ali o perdido está apenas com seu espírito e alma; o tormento no lago de fogo será definitivo, quando então o perdido já terá recebido de volta seu corpo.
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Somente governantes justos são ministros de Deus?
Você perguntou se somente um governante que siga a lei e os mandamentos de Deus pode ser considerado ministro de Deus e revestido de autoridade delegada por Deus conforme o ensino de Romanos 13. Não, todo governante é ministro de Deus, e isso não depende de sua condição moral ou religiosa. É Deus quem determinou isso. Imagine a bagunça que seria um guarda de trânsito mandar você parar e, antes de obedecê-lo, você gritar pela janela do carro: “Prove que você é ministro de Deus para eu saber se devo lhe obedecer ou não; recite os Dez Mandamentos!”.
“Toda a alma esteja sujeita às potestades superiores; porque não há potestade que não venha de Deus; e as potestades que há foram ordenadas por Deus. Por isso quem resiste à potestade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos a condenação. Porque os magistrados não são terror para as boas obras, mas para as más. Queres tu, pois, não temer a potestade? Faze o bem, e terás louvor dela. Porque ela é ministro de Deus para teu bem. Mas, se fizeres o mal, teme, pois não traz debalde a espada; porque é ministro de Deus, e vingador para castigar o que faz o mal. Portanto é necessário que lhe estejais sujeitos, não somente pelo castigo, mas também pela consciência. Por esta razão também pagais tributos, porque são ministros de Deus, atendendo sempre a isto mesmo” (Rm 13:1-6).
Se apenas as autoridades sujeitas a Deus e obedientes à sua vontade fossem realmente ministros de Deus, ou autoridades revestidas por Deus de poder para governar, Pilatos devia ter sido um homem muito santo e piedoso, mas sabemos que ele estava longe de ser assim. Todavia, o próprio Jesus afirmou que o poder ou autoridade que Pilatos tinha até mesmo para mandar crucificar o Filho de Deus tinham lhe sido dados do alto, ou seja, do próprio Deus.
“Disse-lhe, pois, Pilatos: Não me falas a mim? Não sabes tu que tenho poder para te crucificar e tenho poder para te soltar? Respondeu Jesus: Nenhum poder terias contra mim, se de cima não te fosse dado” (Jo 19:10-11).
Portanto é errado cristãos quererem impor um comportamento cristão nas nações deste mundo, pois o cristão é um estrangeiro e não se pode exigir que os governantes sejam cristãos por decreto. Até mesmo o Israel da antiguidade perdeu o direito a ser uma teocracia por causa de sua desobediência. Deus tirou o poder civil deles e entregou aos gentios e isso vai ser assim até Cristo voltar para estabelecer seu reino. Quando Jesus esteve aqui o poder já não estava nas mãos dos reis de Israel, e sim nas mãos de César. Herodes era um fantoche dos romanos e nem sequer era israelita, mas idumeu.
Muito antes dos tempos de Jesus aqui, Israel havia perdido o poder civil de ser cabeça das nações, e tinha se transformado em cauda. Deus havia deixado a eles só o poder religioso por meio dos sacerdotes, aos quais o próprio Jesus ordenava que as pessoas se submetessem, mas que depois também seriam deixados de lado com o advento da Igreja. Até mesmo os profetas de Israel, que eram a terceira via de autoridade no judaísmo (antigamente governados pela autoridade civil, religiosa e profética) desapareceram, tendo sido João Batista o último grande profeta.
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Deus não seria injusto salvando um filho que se desviou?
Você escreveu discordando de que uma vez salvo, alguém esteja salvo para sempre, e afirmando que Deus seria injusto se premiasse com a salvação eterna um filho que deliberadamente viesse a se afastar da casa do Pai. É aí que está o seu erro: Você acha que a vida eterna é um prêmio por bom comportamento. O perdão dos pecados não é um favor merecido pelo pecador, mas completamente imerecido. O homem é réu, Deus é Juiz, um réu precisa ser condenado a menos que pague a pena. Como homem nenhum seria capaz de pagar, Deus enviou o seu Filho para morrer no lugar do pecador culpado e agora convida você para que aceite o juízo já executado, ou seus pecados continuarão sendo seus.
Para quem acha que tem qualquer merecimento na salvação vale o que Paulo escreveu aos Gálatas, que estavam sendo influenciados por falsos mestres que falavam de uma salvação baseada em merecimento: “Maravilho-me de que tão depressa passásseis daquele que vos chamou à graça de Cristo para outro evangelho; o qual não é outro, mas há alguns que vos inquietam e querem transtornar o evangelho de Cristo. Mas, ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos anuncie outro evangelho além do que já vos tenho anunciado, seja anátema. Assim, como já vo-lo dissemos, agora de novo também vo-lo digo. Se alguém vos anunciar outro evangelho além do que já recebestes, seja anátema” (Gl 1:6-9).
Você erra também ao enxergar a salvação como um processo, quando ela é um fato consumado e imediato para aquele que OUVE e CRÊ, que TEM vida eterna neste momento, NÃO ENTRARÁ em julgamento futuro, mas PASSOU da morte para a vida. Jesus prometeu: “Na verdade, na verdade vos digo que quem ouve a minha palavra, e crê naquele que me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida” (Jo 5:24).
Os quatro pontos que você colocou como sendo exigências para alguém ser salvo podem parecer corretos numa leitura apressada, mas se analisar detalhadamente verá que eles fazem do homem seu próprio salvador, pois não levam em consideração a graça de Deus. Esses pontos que você colocou como necessários são (1) arrependimento, (2) fé, (3) confissão pública pelo batismo e (4) uma vida de humilhação constante diante de Deus procurando seguir as instruções do Pai e desviando-se do mal. Todavia, repare que tudo isso, por mais bíblico que seja, só funciona se tiver sua origem em Deus, e não no homem:
1. O arrependimento genuíno é gerado por Deus: “Desprezas tu as riquezas da sua benignidade, e paciência e longanimidade, ignorando que a benignidade de Deus te leva ao arrependimento?… Porque a tristeza segundo Deus opera arrependimento para a salvação, da qual ninguém se arrepende; mas a tristeza do mundo opera a morte” (Rm 2:4; 2 Co 7:10).
2. A fé é dom de Deus, como Paulo explica em Efésios 2:8: “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus”.
3. O batismo é uma ordenança e fazemos bem em cumpri-la, mas não pode salvar pois se pudesse teríamos dois “salvadores”, Cristo e a pessoa que batiza. Se um deles faltasse estaríamos perdidos. Esta, juntamente com a ceia do Senhor, é uma das duas ordenanças deixadas pelo Senhor que devemos cumprir, mas nenhuma delas tem qualquer poder ou influência sobre nossa salvação. Lembre-se de que o malfeitor arrependido teve a garantia de uma salvação imediata, naquele mesmo dia, mesmo sem ter sido batizado ou participado de uma ceia.
4. Seu quarto ponto deveria ser suficiente para qualquer pessoa sem hipocrisia perceber que não consegue cumpri-lo. Responda com sinceridade: Você conseguiria levar uma vida de humilhação constante diante de Deus procurando seguir as instruções do Pai e desviando-se do mal? Se conseguir terá um problema, pois “Cristo Jesus veio ao mundo, para salvar os pecadores” (1 Tm 1:15), não pessoas que levam uma vida de humilhação. E Paulo deixou claro que Deus “justifica o ímpio” (Rm 4:5), não o justo. Qualquer vida de humilhação só pode ser gerada pelo Espírito Santo habitando no crente DEPOIS DE SALVO. Veja dois versículos que atestam o bom proceder e as boas obras como resultado de uma salvação já recebida e garantida:
“Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. não vem das obras, para que ninguém se glorie; porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas” (Ef 2:8-10).
“Assim, meus amados, como sempre vocês obedeceram, não apenas em minha presença, porém muito mais agora na minha ausência, ponham em ação a salvação de vocês com temor e tremor, pois é Deus quem efetua em vocês tanto o querer quanto o realizar, de acordo com a boa vontade dele” (Fp 2:12-13 NVI).
“Nosso Salvador Jesus Cristo; o qual se deu a si mesmo por nós para nos remir de toda a iniquidade, e purificar para si um povo seu especial, zeloso de boas obras” (Tt 2:13-14).
Quando é que você vai deixar de lado o orgulho de se achar capaz de ser salvo por seus próprios esforços e se render sem reservas nos braços do Salvador? Enquanto o afogado se debate o salva-vidas não entra em ação. Ele aguarda a vítima se cansar e deixar de tentar salvar-se para então abraçá-lo.
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As mulheres são proibidas de julgar?
Sua dúvida é se os “mandamentos do Senhor” (1 Co 14:37) de que “as vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido falar; mas estejam sujeitas, como também ordena a lei. E, se querem aprender alguma coisa, interroguem em casa a seus próprios maridos; porque é vergonhoso que as mulheres falem na igreja” (1 Co 14:34-35) seria para impedir que elas julguem o que é dito pelos profetas que ministram.
Sua dúvida surgiu quando assistiu ao vídeo de um “Reverendo” (título dado a Deus em Sl 111:9 na versão King James), dizendo que em 1 Coríntios 11 Paulo estaria autorizando a mulher a profetizar (falar da parte de Deus), livremente e em qualquer lugar, inclusive nas reuniões da igreja; mas em 1 Coríntios 14:34-35 a proibição seria apenas no sentido de ela julgar o que estaria sendo dito pelos dois ou três profetas citados no versículo 29 do mesmo capítulo, que diz: “E falem dois ou três profetas, e os outros julguem”.
Confesso que já tinha escutado várias desculpas para se deixar de lado aquilo que Paulo chama de “mandamentos do Senhor” (1 Co 14:37), mas este argumento é novidade para mim. Alguns dizem que Paulo proibia mulheres de se expressarem por ser um solteirão recalcado e machista. Outros afirmam que ele estaria seguindo o que era costume corrente na época em uma sociedade machista, que impedia as mulheres de falarem em reuniões públicas. Já ouvi também o argumento de que a ordem ali era só no sentido de tagarelar, cochichar e fofocar, e me espanto quando vejo alguma mulher cristã concordar com este argumento que reduz a mulher à condição de fofoqueira. Agora me chega esta nova versão, que diz que a ordem teria sido dada para proibir a mulher julgar o que estivesse sendo dito pelos dois ou três profetas que ministrassem na reunião.
Eu particularmente acredito que uma mulher cristã seja perfeitamente capaz de julgar o que ela escuta alguém dizer e também creio que a ordem ali em 1 Coríntios 14 não seja neste sentido. A mulher pode sim julgar, mas não deve manifestar publicamente seu julgamento por ser esta a tarefa dos outros profetas, ou seja, dos outros que ministram: “E falem dois ou três profetas, e os outros [profetas] julguem”. Para uma mulher apontar o ensino falho implicaria ela apresentar também qual seria o ensino correto, o que equivaleria a ensinar publicamente. E Paulo, inspirado pelo Espírito Santo, escreve em 1 Timóteo que “a mulher aprenda em silêncio, com toda a submissão. E não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem; esteja, porém, em silêncio. Porque, primeiro, foi formado Adão, depois, Eva. E Adão não foi iludido, mas a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão” ( 1 Tm 2:11-14).
Mas uma irmã espiritual pode muito bem identificar um equívoco no ensino trazido na reunião da assembleia por um irmão que ministra e, se nenhum varão percebeu ou apontou o erro, chegar em casa e alertar seu marido (ou um irmão, caso seja solteira), indagando se aquilo que foi dito estaria de acordo com o ensino das Escrituras. Isso serve de dupla checagem no que foi ministrado quando a mulher atua em consonância com seu marido. Assim como qualquer irmão em Cristo, as irmãs têm o Espírito Santo habitando nelas e discernimento para entender a Palavra de Deus.
Aliás, muitas têm um conhecimento e discernimento muito maior do que o de muitos irmãos, pois elas também foram vestidas da nova natureza ou “novo homem”, “que se renova para o conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou; onde não há grego, nem judeu, circuncisão, nem incircuncisão, bárbaro, cita, servo ou livre; mas Cristo é tudo em todos” (Cl 3:10-11). O que lhe é vedado é ensinar com autoridade de homem e também falar nas reuniões da igreja ou assembleia.
Um belo exemplo desse trabalho conjunto esposa-marido você encontra em Áquila e Priscila, o casal que ajuda Apolo a entender melhor as coisas de Deus. Na passagem que relata esse episódio aprouve ao Espírito Santo colocar o nome de Priscila antes do de Áquila, e eu particularmente não creio que tenha sido apenas por educação ou cavalheirismo. Ali diz:
“Nesse meio tempo, chegou a Éfeso um judeu, natural de Alexandria, chamado Apolo, homem eloquente e poderoso nas Escrituras. Era ele instruído no caminho do Senhor; e, sendo fervoroso de espírito, falava e ensinava com precisão a respeito de Jesus, conhecendo apenas o batismo de João. Ele, pois, começou a falar ousadamente na sinagoga. Ouvindo-o, porém, Priscila e Áquila, tomaram-no consigo e, com mais exatidão, lhe expuseram o caminho de Deus” (At 18:24-27).
Na saudação de 1 Coríntios 16:9 Paulo cita primeiro Áquila e depois Priscila, “com a igreja que está em sua casa”, colocando a ordem instituída por Deus no lar, o que é corroborado também em 1 Coríntios 11:3, que aponta que “Cristo é a cabeça de todo o homem, e o homem a cabeça da mulher; e Deus a cabeça de Cristo”. Mas no episódio envolvendo Apolo, o Espírito Santo menciona Priscila antes de Áquila. Sobre isso escreve William Kelly:
“Apolo nos é apresentado sendo ensinado por Áquila e Priscila, que ‘tomaram-no consigo e, com mais exatidão, lhe expuseram o caminho de Deus’. Eu duvido que estaria de acordo com a vontade de Deus que uma mulher fizesse isso sozinha, mas aqui ela, juntamente com seu marido, instruiu Apolo o melhor que puderam. Ora, não tenho dúvida de que Priscila conhecia mais que seu marido, portanto era desejável que ela contribuísse com sua parte nessa ajuda. Todavia, a maneira de Deus continua a ser invariavelmente sábia, e fica bastante evidente que ela fez isso em conjunto com seu marido, e não independente dele, quando essa importante tarefa foi executada” – “Introductory Lectures on Acts”, W. Kelly.
Cabe aqui uma curiosidade. Quando visitei a Casa da Moeda do Brasil descobri que existe uma seção ali onde são empregadas apenas mulheres. Homens não servem para fazer o trabalho de examinar cuidadosamente as grandes folhas de papel impresso com as cédulas antes de serem cortadas. A razão, segundo me informaram, é que as mulheres são naturalmente mais bem capacitadas que os homens para descobrir falhas de impressão, e também por possuírem uma visão periférica mais ampliada. Aquilo apenas confirmou o que todo marido sabe: que as mulheres são melhores que os homens para detectar falhas. Obviamente essa é uma capacidade natural da mulher, e estamos falando aqui dos aspectos espirituais, e para isso cabe uma observação feita por Charles Mackintosh, ao comentar as várias citações de Priscila e Áquila nas Escrituras:
“O que eles teriam feito? Eles eram colaboradores do apóstolo. Eles ‘expuseram as suas cabeças’ (Rm 16:4) — arriscaram a própria vida. E Paulo acrescenta, “o que não só eu lhes agradeço, mas também todas as igrejas dos gentios’. Todos podiam perceber isso. Eles haviam conquistado uma boa reputação. Haviam conquistado a confiança e estima do apóstolo e de todas as assembleias. Assim deve ser. Não podemos pular de uma hora para outra para dentro da confiança e afeição das pessoas. Devemos nos encomendar a nós mesmos por uma vida de justiça prática e devoção pessoal. ‘Assim nos recomendamos à consciência de todo o homem, na presença de Deus’ (2 Co 4:2)”. — “David’s Companions and Paul’s Friends”, C. H. Mackintosh.
Nunca é demais falar do exemplo de Priscila e Áquila em detectar o conhecimento deficiente que Apolo possuía até ali, conhecendo apenas o batismo de João Batista, e ajudá-lo a entender melhor a completa revelação de Deus. Muitas vezes somos mais prontos a criticar alguém com pouco conhecimento da Palavra do que a nos dispormos a ajudar em sua instrução, como fez esse casal: “tomaram-no consigo e, com mais exatidão, lhe expuseram o caminho de Deus” (At 18:26). C. E. Stuart comenta:
“[Apolo] ensinava o que conhecia, mas em termos de um completo ensino cristão ele ainda estava deficiente… Priscila e Áquila perceberam isso ao ouvi-lo e, levando-o consigo para casa, lhe ensinaram o caminho de Deus mais perfeitamente… Provavelmente a esposa estava mais apta em passar conhecimento que seu esposo. Na privacidade do lar os dois podiam assim servir, comunicando a verdade que um dia também desconheceram, mas que certamente haviam aprendido de seu convívio com Paulo” — “Tracings from Acts of the Apostles”, C. E. Stuart.
Mas, voltando à questão que você trouxe, será que em 1 Coríntios 14:34 estaria escrito: “As vossas mulheres estejam caladas nas igrejas; porque não lhes é permitido JULGAR?”. Não, a proibição não é no sentido de “julgar”, mas de “falar”, um verbo com uma abrangência muito maior. Portanto sinto dizer que o “Reverendo” está equivocado ou deliberadamente torcendo o significado da passagem para adaptá-la aos ditames da organização à qual pertence. Ele também parece confundir os capítulos 11 e 14 como se fosse tudo a mesma coisa. O capítulo 11 nos fala da ordem estabelecida por Deus na Criação, daí a expressão: “Não vos ensina a mesma natureza que é desonra para o homem ter cabelo crescido? Mas ter a mulher cabelo crescido lhe é honroso, porque o cabelo lhe foi dado em lugar de véu” (1 Co 11:14-15). O assunto ali é na natureza ou Criação, que envolve também uma ordem estabelecida na qual “Cristo segundo a carne” aparece hierarquicamente sob Deus, muito embora ele sempre foi, é e será “sobre todos, Deus bendito eternamente” (Rm 9:5).
Repare também que em 1 Coríntios 11:4-5 é colocada uma ordem não apenas à mulher (de cobrir a própria cabeça), mas também ao homem (de descobri-la) quando ora ou profetiza (fala da parte de Deus). O assunto é genérico, na esfera da Criação, mas em 1 Coríntios 14 o assunto é a reunião da igreja ou assembleia. Portanto, de um modo geral e independente de onde esteja, a mulher deve ter a cabeça coberta quando ora ou profetiza, e o homem a cabeça descoberta.
Curiosamente costumamos ler a passagem do capítulo 11 atentando apenas para o que é dito da mulher, e alguns acham machismo da parte de Paulo aconselhar as mulheres a cobrirem a cabeça durante essas atividades, mas nunca vi ninguém acusar o apóstolo de interferir no modo como os homens devem se portar obrigando-os a tirar o chapéu nessas situações.
Portanto, em 1 Coríntios 11 o assunto é no contexto geral, e em 1 Coríntios 14 é a condição no particular, na reunião da Igreja. Para entender isso, pense na velocidade máxima permitida no Brasil que é de 120 km/h. Porém nas ruas ela pode ser limitada a 10, 20, 30, 40, 50 ou 60 km/h dependendo da placa que assinale essa limitação para uma condição em particular. Vá tentar explicar para o policial que a 120 km/h na frente de uma escola você está com a razão. Vá explicar ao Senhor que por em 1 Coríntios 11 a Palavra de Deus dizer que a mulher profetiza que na reunião da igreja de 1 Coríntios 14 ela estaria livre para fazer o mesmo.
Qual a lição que você deve tirar disso e da mensagem do vídeo gravado pelo clérigo que você viu? Que alguém comprometido em obedecer um determinado sistema religioso irá necessariamente obedecer às diretrizes determinadas por esse sistema, mesmo quando elas forem contrárias ao texto da Bíblia. Por isso aconselho você a não ter amarras com nenhuma religião, denominação ou sistema religioso e assim ficar livre para obedecer somente a Palavra de Deus. Em seu texto “One-sided Theology”, C. H. Mackintosh comenta da dificuldade de se permanecer fiel às Escrituras quando sujeito a uma organização religiosa ou corrente teológica. Ele escreve:
“Deus… não se prendeu aos estreitos limites de alguma escola de doutrina, seja ela alta, baixa ou moderada. Deus se revelou. Ele expôs os profundos e preciosos segredos de seu coração. Ele descortinou seus conselhos eternos relativos à Igreja, a Israel, aos gentios e à Criação como um todo. Os homens podem tentar confinar o oceano em baldes que eles próprios criaram, do mesmo modo como tentam confinar o vasto espectro da revelação divina dentro dos frágeis recipientes dos sistemas humanos de doutrina. É impossível fazê-lo e jamais deveria ser tentado. O melhor é deixar de lado os sistemas e escolas de divindade e se aproximar como uma criança da eterna fonte das Sagradas Escrituras, e ali beber dos ensinos vivos do Espírito de Deus.
“Nada é mais prejudicial à verdade de Deus, mais estéril para a alma, ou mais subversivo para qualquer crescimento e progresso espiritual do que a mera teologia, seja ela alta ou baixa — calvinista ou arminiana. É impossível que alguém progrida além dos limites do sistema ao qual está ligado. Se sou instruído nos ‘Cinco Pontos’ do calvinismo como se fossem eles ‘a fé dos eleitos de Deus’, não poderei sequer pensar em buscar algo além disso, desaparecendo assim de meu campo de visão o mais glorioso campo de verdade celestial. Fico atrofiado, estreito, parcial; e corro o risco de cair naquele estado de espírito estéril e pedregoso que acaba me deixando ocupado com meros pontos doutrinários ao invés de ocupar-me com Cristo. Um discípulo da alta escola calvinista de doutrina não ouvirá falar de um evangelho anunciado a todo o mundo — do amor de Deus para o mundo, das boas novas para cada criatura sob os céus. Tudo o que possui é um evangelho para os eleitos. Por outro lado, um discípulo da baixa escola, ou arminiana, não escutará da segurança eterna do povo de Deus. Sua salvação dependerá em parte de Cristo e em parte de si mesmo. De acordo com esse sistema doutrinário, a canção dos redimidos deveria ser alterada. Ao invés de ‘Digno é o Cordeiro’ seríamos obrigados a acrescentar ‘…e digno somos nós’. Poderíamos estar salvos hoje, porém perdidos amanhã. Tudo isso desonra a Deus e priva o cristão de qualquer paz verdadeira.
“Não escrevemos com a intenção de ofender o leitor, longe de nós tal pensamento. Não estamos falando de pessoas, mas de escolas de doutrina e sistemas de divindade, os quais gostaríamos sinceramente de exortar nossos amados santos a abandonarem de uma vez para sempre. Nenhum deles contém a completa verdade de Deus. Existem certos elementos de verdade em todos eles, mas a verdade geralmente é neutralizada pelo erro, e mesmo que encontrássemos um sistema que não apresentasse nada além da verdade, ainda assim ele não conteria toda a verdade. O efeito desses sistemas sobre a alma é o mais pernicioso possível, pois leva as pessoas a se gabarem de possuírem a verdade de Deus, quando na verdade possuem apenas um sistema humano parcial… Volto a dizer que raramente encontramos um discípulo sequer de qualquer escola de doutrina que possa encarar as Escrituras como um todo. Ele irá citar passagens favoritas de modo contínuo e reiterado, mas descartará como inadequada uma grande parte das Escrituras”.— “One-sided Theology”, C. H. Mackintosh.
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Estas passagens dizem que Deus aboliu o véu?
Alguém tentou provar a você que a mulher não precisa mais cobrir a cabeça com um véu conforme 1 Coríntios 11:1-16 porque Deus teria abolido o véu e mostrou essas passagens que você enviou. Eu já tinha ouvido esses argumentos sendo usados na tentativa de invalidar aquilo que o Espírito Santo ordenou em 1 Coríntios 11:1-16, e geralmente quem usa desse argumento não entendeu o que o apóstolo inspirado escreveu ali e nem percebeu que é uma ordem dada, não apenas à mulher (para cobrir-se), mas também para o homem (para não se cobrir).
As passagens que citou são:
“Destruirá neste monte a face da cobertura, com que todos os povos andam cobertos, e o véu com que todas as nações se cobrem” (Is 25:7).
“E dize: Assim diz o Senhor Deus: Ai das que cosem almofadas para todas as axilas, e que fazem véus para a cabeça de pessoas de toda a estatura, para caçarem as almas! Porventura caçareis as almas do meu povo, e as almas guardareis em vida para vós? E vós me profanastes entre o meu povo, por punhados de cevada, e por pedaços de pão, para matardes as almas que não haviam de morrer, e para guardardes em vida as almas que não haviam de viver, mentindo assim ao meu povo que escuta a mentira? Portanto assim diz o Senhor Deus: Eis aí vou eu contra as vossas almofadas, com que vós ali caçais as almas fazendo-as voar, e as arrancarei de vossos braços, e soltarei as almas, sim, as almas que vós caçais fazendo-as voar. E rasgarei os vossos véus, e livrarei o meu povo das vossas mãos, e nunca mais estará em vossas mãos para ser caçado; e sabereis que eu sou o Senhor” (Ez 13:18:21).
“Tendo, pois, tal esperança, usamos de muita ousadia no falar. E não somos como Moisés, que punha um véu sobre a sua face, para que os filhos de Israel não olhassem firmemente para o fim daquilo que era transitório. Mas os seus sentidos foram endurecidos; porque até hoje o mesmo véu está por levantar na lição do velho testamento, o qual foi por Cristo abolido; e até hoje, quando é lido Moisés, o véu está posto sobre o coração deles. Mas, quando se converterem ao Senhor, então o véu se tirará. Ora, o Senhor é Espírito; e onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade, Mas todos nós, com rosto descoberto, refletindo como um espelho a glória do Senhor, somos transformados de glória em glória na mesma imagem, como pelo Espírito do Senhor” (2 Co 3:12-18).
Sem entrar na questão do que significam estas passagens, que certamente nada têm a ver com 1 Coríntios 11:1-16, a resposta para sua dúvida é muito simples: Não existe a palavra “véu” nos primeiros versículos de 1 Coríntios 11:1-16. Se você ler no original ou em alguma tradução literal verá que onde está “…se a mulher não se cobre com véu” no original está “…se a mulher não estiver velada (“não se velar”), e “… que ponha o véu” está “…que esteja velada (ou “se vele”)”. É um verbo, não um substantivo, e como verbo “velar” não significa apenas ficar de vigia ou participar de um funeral, mas também cobrir ou proteger algo.
A palavra “véu” só vai aparecer mais adiante no versículo 15, “o cabelo lhe foi dado em lugar de véu”, mas aí está associando a cobertura que a mulher deve trazer sobre a cabeça com a cobertura que naturalmente as mulheres têm quando comparadas com os homens. O sentido aí é de “algo para velar ou cobrir”, por isso fala do cabelo. No caso do homem, ele por natureza não tem uma cobertura natural tão abundante quanto a da mulher, pois costuma ter cabelo curto ou maior probabilidade de ficar calvo do que as mulheres. É o que a natureza nos ensina (que é o exemplo usado aí pelo apóstolo).
Não sei a razão das traduções aparecerem assim. Um palpite é que os tradutores teriam trocado “…se a mulher não estiver velada” por “…se a mulher não se cobre com véu” porque alguns iriam pensar que ele estaria falando de uma mulher morta sendo velada no funeral. Ou talvez tenham deixado de usar o verbo “velar” para alguns não acharem que estivesse falando de pingar cera de vela sobre a cabeça. Ok, agora estou exagerando, mas acho que você entendeu.
Para não deixar você velado ou no escuro quanto aos três versículos que citou, em Isaías o assunto é a ignorância ou as trevas em que as pessoas estavam, e é esta a condição natural de todo ser humano, pois Satanás faz tudo para lhes cegar o entendimento (daí o véu sobre a cabeça para não pensarem como deviam). A passagem de Ezequiel parece ter mais a ver com costumes de religiões pagãs e suas feitiçarias. A passagem de 2 Coríntios também fala de obscurecer ou velar o entendimento.
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Você ganha dinheiro pregando o evangelho na Internet?
Não, eu não ganho dinheiro com o evangelho. Meu sustento vem de meu trabalho como consultor e palestrante empresarial e de outras fontes, mas nada relacionado ao evangelho. Ou melhor, como o de qualquer outra pessoa, vem de Deus que provê para minhas necessidades. Mas os meus vídeos de evangelismo e ensino bíblico no Youtube não participam do programa AdSense do Youtube e Google, o qual gera ganhos com propaganda. Quando criei os canais “O Evangelho em 3 Minutos” e “O que respondi” decidi não aplicar esse programa neles. Apenas os vídeos de meu canal “TV Barbante”, de vídeos de carreira e negócios, é que participam do AdSense e geram algum ganho. Mas a audiência deste canal é muito menor que dos outros dois.
Quando criei os canais de evangelismo cheguei até a fazer alguns testes com propagandas, mas a primeira que apareceu foi um vídeo de um comercial de perfume com um casal rolando na cama sob lençóis de seda, e achei que nem eu, nem algum de meus espectadores, iríamos clicar no “Vá direto para o vídeo”, mas todos acabariam esperando para ver o comercial até o final. Então vi que a participação nesse programa de inclusão de propagandas poderia criar situações embaraçosas para minha audiência, além de começarem a aparecer propagandas de igrejas e pastores mercenários que só iriam confundir as pessoas.
Ao contrário do que alguns pensam, também não ganho dinheiro com meus livros sobre o evangelho, apesar de não achar problema caso recebesse direitos autorais por eles. Autores cristãos sempre receberam direitos autorais por seu trabalho e alguns acabam até mesmo usando esses recursos na própria obra do evangelho. Os meus e-books são distribuídos de graça no Smashwords e Draft-to-Digital e os impressos são vendidos pela editora “Clube de Autores”, mas neste caso ela fica com o valor integral (inclusive no caso dos e-books vendidos no site deles) porque estipulei ganho zero para direitos autorais. Assim os livros ficam mais baratos para quem compra. A editora é comercial e tem custos para imprimir e vender, portanto é normal que cobrem por isso. Os únicos livros pelos quais recebo direitos autorais são os de marketing, carreira e negócios que são vendidos nos mesmos sites Smashwords, Draft-to-Digital e Clube de Autores.
A verdade é que eu não só não ganho dinheiro com o trabalho que faço na Internet, mas até mesmo gasto dinheiro, pois existem despesas mensais para manter domínios, hospedar sites, serviço de hospedagem de rádio do “O que respondi” e “O Evangelho em 3 Minutos”, serviço de aplicativo do “Evangelho em 3 Minutos” para iPhone e Android etc. Para isso tudo pago mensalidades em diferentes provedores de serviços, e o Senhor tem suprido tudo por meio de meu trabalho de consultor e palestrante empresarial.
Mas eu não vejo problema com autores que vendem seus livros para ganhar porque, como expliquei, existem custos e sei de autores cristãos que não têm outra ocupação, como eu tenho, e se não recebessem pela venda de seus livros não teriam tempo para escrever. Isso é uma opção pessoal e cada um irá responder ao Senhor de como fez esse trabalho, se foi por avareza ou se foi para servir ao Senhor. Mas digo isso de mídias e trabalhos que de alguma forma envolvem custos. Já a pregação do evangelho não deve ser uma atividade remunerada, pois de graça recebemos e de graça devemos dar.
Por isso, e também por não concordar com o sistema denominacional, nunca aceito os convites que recebo de pastores e igrejas para pregar mediante cachê em suas igrejas. Sim, recebo pedidos assim perguntando pelo cachê porque infelizmente é assim que as coisas funcionam entre muitos pregadores da cristandade. Recentemente recebi um e-mail de alguém indignado porque sua esposa faz parte de uma denominação e estava sendo pressionada a fazer campanhas e arrecadar dinheiro para trazer um pregador famoso que viaja de jato particular e cobra caro para pregar.
Considero errado o cristão pedir dinheiro de doações para manter seu trabalho evangelístico, mesmo que este tenha custos. Se o Senhor da seara não suprir suas necessidades é porque não é para ele trabalhar na seara. Se tiver necessidades, que peça ao Senhor da seara e ele moverá o coração de irmãos para agirem com liberalidade custeando a obra. Acho um absurdo entrar em um site evangelístico e ver aquele famoso pedido de dinheiro com o número da conta bancária. Como pedir assim publicamente sem nem mesmo saber se esse recurso virá de um salvo por Cristo ou do Rei de Sodoma? Abraão não aceitou nem uma correia da sandália dele e o cristão não deve aceitar também. Hoje existem meios de se praticar lavagem de dinheiro usando igrejas, e há também os políticos que “patrocinam” igrejas em troca de votos. Para quem acha normal pedir dinheiro sem saber sua origem ou objetivo, fica aqui estes versículos:
“E o rei de Sodoma disse a Abrão: Dá-me a mim as pessoas, e os bens toma para ti. Abrão, porém, disse ao rei de Sodoma: Levantei minha mão ao Senhor, o Deus Altíssimo, o Possuidor dos céus e da terra, jurando que desde um fio até à correia de um sapato, não tomarei coisa alguma de tudo o que é teu; para que não digas: Eu enriqueci a Abrão” (Gn 14:21-23).
“Porque pelo seu Nome saíram, nada tomando dos gentios” (3 Jo 1:7).