Vamos examinar esta passagem das Escrituras (Lc 9:28-36), naquilo em que ela mostra de que se consistirá nosso gozo na glória. Temos a garantia de 2 Pedro 1:16 que diz que esta cena representa para nós a virtude e a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo.
E é isso o que aguardamos. Nossa alma não estará sã se não estivermos aguardando pelo Filho de Deus vindo do céu. A igreja não estará com suas esperanças guiadas pela Palavra e pelo Espírito de Deus, se não estiver esperando por Ele como o Salvador vindo do céu (Fp 3:20). E a passagem em Lucas 9:28-36 é importante para nós por apresentar de uma maneira especial aquilo que será nossa porção quando Ele vier. Há muitas outras coisas nesta passagem, como o relacionamento mútuo entre o povo terrenal e o celestial no Reino, que podem ser muito instrutivas, mas não é o nosso propósito considerá-las agora.
O que queremos agora considerar é a revelação que temos aqui da natureza daquele gozo que iremos herdar na vinda, e pela vinda, do Senhor. Outras passagens, tais como as promessas àqueles que vencerem, em Apocalipse 2 e 3, e a descrição da cidade celestial em Apocalipse 21 e 22, nos dão instruções acerca do mesmo assunto; mas olhemos agora particularmente para a cena no monte santo.
“E aconteceu que, quase oito dias depois destas palavras, tomou consigo a Pedro, a João e a Tiago, e subiu ao monte a orar. E, estando Ele orando, transfigurou-se a aparência do Seu rosto, e o Seu vestido ficou branco e mui resplandecente” (Lc 9:28-29). Foi quando Jesus estava no reconhecimento da dependência, “estando Ele orando”, que ocorreu a transformação. É esta, portanto, a primeira coisa que encontramos aqui – uma transformação tal qual a que vai ocorrer nos santos vivos quando Jesus vier.
“E eis que estavam falando com Ele dois varões, que eram Moisés e Elias” (v.30). Eles estavam com Ele. E será este também o nosso gozo; estaremos com Jesus. Em 1 Tessalonicenses 4, após apresentar a ordem em que acontecerá a ressurreição dos que dormem e a transformação dos santos vivos, e que seremos, tanto uns como os outros, arrebatados juntamente para encontrar o Senhor nos ares, tudo o que o apóstolo diz acerca disso é, “e assim estaremos sempre com o Senhor”.
Porém, nesta passagem não se trata apenas do estar com Cristo, mas há também um relacionamento de familiaridade com Ele. “E eis que estavam falando com ele dois varões” (v.30). Não diz que Ele falava com eles, embora sem dúvida isto também fosse verdadeiro; mas Ele poderia ter feito isso com os dois estando longe de Si.
Porém quando lemos que eles falavam com Ele, isto nos dá a idéia de uma liberdade de relacionamento das mais familiares. Pedro e os outros sabiam o que era ter um relacionamento assim com Jesus na Sua humilhação; mas que gozo deve ter sido terem essa prova de que aquele relacionamento com Ele seria também desfrutado na glória! Também é dito que eles “apareceram com glória” (v.31), mas trata-se de algo secundário em relação ao que estamos considerando.
Nos é dito que eles estavam com Ele, e também que eles apareceram em glória. Eles compartilhavam daquela mesma glória em que Ele foi manifestado. E assim será conosco. “Quando Cristo que é a nossa vida, Se manifestar, então também vós vos manifestareis com Ele em glória” (Cl 3:4). “E Eu dei-lhes a glória que a Mim Me deste, para que sejam um, como Nós somos um. Eu neles, e Tu em Mim, para que eles sejam perfeitos em unidade, e para que o mundo conheça que Tu Me enviaste a Mim, e que os tens amado a eles como Me tens amado a Mim” (Jo 17:22-23).
Mas há ainda uma outra coisa. Não nos é dito apenas que eles estavam com Ele, que eles falaram com Ele e apareceram em glória juntamente com Ele, mas nos é dado o privilégio de conhecer o assunto da conversa. Eles “falavam da Sua morte, a qual havia de cumprir-se em Jerusalém” (v.31). Era a cruz o tema da conversa deles na glória – os sofrimentos de Cristo, que Ele teria que passar em Jerusalém. E certamente será esse o nosso gozo por toda a eternidade, quando em glória com Cristo, ocuparmo-nos com este tema: Sua morte consumada em Jerusalém. Lemos, então, que Pedro e os que estavam com ele se encontravam carregados de sono. Isto nos mostra o que é a carne em presença da glória de Deus. Pedro cometeu também um grande erro; mas passemos adiante.
“E, dizendo Ele isto, veio uma nuvem que os cobriu com a sua sombra; e, entrando eles na nuvem, temeram. E saiu da nuvem uma voz que dizia: Este é o Meu amado Filho; a Ele ouvi.” Pedro nos diz que aquela voz veio da magnífica glória. “Porquanto ele recebeu de Deus Pai honra e glória, quando da magnífica glória Lhe foi dirigida a seguinte voz: Este é o Meu Filho amado, em Quem Me tenho comprazido” (2 Pd 1:17).
Agora Pedro e os outros entraram na nuvem; e assim vemos esse maravilhoso fato de que na glória, de onde a voz veio, os santos têm o privilégio de permanecer, e ali, naquela glória, compartilhar do prazer do Pai no Seu amado Filho. Não somos apenas chamados para ter a comunhão do Filho de Deus, Jesus Cristo, mas somos também chamados para ter comunhão com o Pai. Somos admitidos por Deus Pai para compartilhar de Sua satisfação no Seu amado Filho.
“E, tendo soado aquela voz, Jesus foi achado só” (v.36). Toda a visão se fora – a nuvem, a voz, a glória, Moisés, Elias – mas Jesus ficou, e eles ficaram para continuar seu caminho com Jesus, conhecendo-O agora à luz daquelas cenas de glória que tinham presenciado. E é para isto que nos servem as vívidas demonstrações de coisas espirituais que podemos às vezes constatar. Não é o caso de podermos estar sempre desfrutando delas e de nada mais. Mas quando elas se vão, após as termos experimentado por alguns momentos como ocorreu com a visão no monte santo, ficamos a sós com Jesus, para prosseguir no caminho de nossa peregrinação com Ele em espírito, por enquanto; com Ele na luz e poder daquela profunda consciência, que recebemos no monte, de estarmos com Ele, e de termos a comunhão do gozo do Pai nEle; e assim aguardarmos pelo momento da Sua volta, quanto tudo isso, e mais do que nossos corações podem imaginar, deverá se cumprir para nós para todo o sempre.
J.N.Darby – The Bible Treasury – 1857