Uma Cena no Tribunal de Pequenos Delitos em Manchester
— JÁ DISSE que não o roubei. Comprei-o! — repetia, até que por fim os magistrados se viram obrigados a mandar que se calasse.
Deduzia-se que Kelly fora preso, acusado de ter roubado um relógio de bolso. Não havia dúvida alguma de que o relógio tinha sido roubado e que fora encontrado em poder de Kelly, o que constituía, na opinião tanto dos policiais como dos magistrados, prova suficiente para o condenar. Justamente no momento em que os magistrados pareciam ter chegado a uma decisão quanto à pena a aplicar a Kelly, pedi licença para depor como testemunha.
— O que deseja? — perguntou o magistrado.
— Quero falar algo a respeito deste caso, senhor.
Ao ouvir as minhas palavras, Kelly virou-se para mim, encolerizado:
— Não queiram ouvi-lo. Ele nada sabe disto. Só vai mentir com o propósito de me incriminar. Quer agravar a minha pena!
Foi quase inútil eu dizer ao Kelly que sossegasse e que me escutasse. Parecia julgar que, vestindo eu a farda de sargento da Polícia, não podia deixar de ser contra ele. Finalmente os magistrados conseguiram fazê-lo calar, e me mandaram depor.
— Há algumas semanas, eu levava, de trem, dois presos para a cadeia de Strangeways. Eu estava sentado de um lado do vagão e os dois presos estavam sentados do lado oposto. Ouvi um deles dizer ao seu companheiro:
— Enganei o Kelly há alguns dias!
— Ah! Sim? E como fez isso? — perguntou o outro.
— Vendi a ele um relógio por trinta shillings, e nem sequer cinco shillings valia!
Como se transformaram os rostos de todos no tribunal! Quanto ao Kelly, olhou para mim como se quisesse me beijar! Logo se vê que foi absolvido, apesar das provas circunstanciais que lhe eram contrárias. O meu depoimento pesou mais do que tudo quanto havia contra ele. Porém, entenda que se ele tivesse conseguido o seu desejo de me impedir de falar, nunca teria chegado a descobrir que eu, afinal, só nutria a maior boa vontade para com ele.
É assim mesmo que muitos tratam a Deus. Não O querem ouvir, pois julgam que é contra eles, quando na verdade Deus é a favor deles. “Porque Deus enviou Seu Filho ao mundo, não para que condenasse o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por Ele” (João 3.17). Kelly era inocente; mas o coração de Deus pode, com toda a justiça, sentir boa vontade para com o culpado, absolvendo-o e deixando-o sair em liberdade. Não há nenhum tribunal que possa assim proceder sem sacrificar seu nome e caráter. Porém Deus pode ser, ao mesmo tempo, um “Deus Justo e Salvador (Isaías 45.21). Pode ser “Justo e Justificador daquele que tem fé em Jesus” (Romanos 3.26). E pode ainda ser Aquele “que justifica o ímpio” (Romanos 4.5).
Na verdade, Deus, que parece ser contra o homem, como testemunha de acusação, tem por nós muito amor, o que nos leva à seguinte questão: Como pode esse Deus justo, com base na justiça perfeita, perdoar e libertar o homem, quando o próprio Deus já demonstrou ser o homem culpado? A resposta é: Por meio de substituição.
Esta é a única resposta possível. Na Cruz de Cristo vemos evidenciado o amor de Deus para com o pecador, pela dádiva do Seu Filho, o ÚNICO capaz de tomar o lugar do pecador, por ser Ele próprio isento de pecado. Cristo levou Ele mesmo os pecados do pecador (1 Pedro 2.24), padeceu por amor do pecador (1 Pedro 3.18), morreu pelo pecador (Romanos 5,6), e, portanto, o ímpio pecador pode ser perdoado e sair livre.
Retirado do Livro QUAL O TEU DESTINO?